C-267/99 - Adam

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EUR-Lex - 61999J0267 - PT

61999J0267

Acórdão do Tribunal (Segunda Secção) de 11 de Outubro de 2001. - Christiane Adam, de casada Urbing contra Administration de l'enregistrement et des domaines. - Pedido de decisão prejudicial: Tribunal d'arrondissement de Luxemburgo - Grão-Ducado do Luxemburgo. - Sexta Directiva IVA - Conceito de profissão liberal - Administrador de condomínio de imóveis. - Processo C-267/99.

Colectânea da Jurisprudência 2001 página I-07467


Sumário
Partes
Fundamentação jurídica do acórdão
Decisão sobre as despesas
Parte decisória

Palavras-chave


1. Questões prejudiciais - Competência do Tribunal de Justiça - Limites - Questões manifestamente destituídas de pertinência e questões hipotéticas colocadas num contexto que impede uma resposta útil - Questões sem relação com o objecto do litígio na causa principal

(Artigo 234.° CE)

2. Questões prejudiciais - Competência do Tribunal de Justiça - Limites - Interpretação solicitada devido à utilização de um conceito constante de uma disposição de direito comunitário adoptada com vista à transposição de uma directiva para direito interno, mas em condições diferentes das previstas pela disposição comunitária correspondente - Competência para proceder a essa interpretação

(Artigo 234.° CE)

3. Disposições fiscais - Harmonização das legislações - Impostos sobre o volume de negócios - Sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado - Possibilidade de os Estados-Membros aplicarem uma taxa reduzida - Exercício - Limites - Respeito do princípio da neutralidade fiscal

[Directiva 77/388 do Conselho, artigos 12.° , n.° 4, e 28.° , n.° 2, alínea e)]

4. Disposições fiscais - Harmonização das legislações - Impostos sobre o volume de negócios - Sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado - Isenções previstas na Sexta Directiva - Profissões liberais referidas no ponto 2 do anexo F - Conceito - Critérios - Actividade de administrador de condomínio de imóveis - Apreciação pelo juiz nacional

[Directiva 77/388 do Conselho, artigo 28.° , n.° 3, alínea b), e anexo F, ponto 2]

Sumário


1. No âmbito da cooperação entre o Tribunal de Justiça e os órgãos jurisdicionais nacionais instituída pelo artigo 234.° CE, compete ao juiz nacional, a quem foi submetido o litígio e que deve assumir a responsabilidade pela decisão jurisdicional a tomar, apreciar, tendo em conta as especificidades de cada processo, tanto a necessidade de uma decisão prejudicial, para poder proferir a sua decisão, como a pertinência das questões que coloca ao Tribunal de Justiça. Consequentemente, quando as questões colocadas pelo juiz nacional são relativas à interpretação do direito comunitário, o Tribunal de Justiça é, em princípio, obrigado a decidir.

Todavia, em casos excepcionais, cabe ao Tribunal de Justiça examinar as condições em que os pedidos de interpretação lhe são submetidos pelos órgãos jurisdicionais nacionais, para verificar a sua própria competência. A recusa de decisão quanto a uma questão prejudicial submetida por um órgão jurisdicional nacional só é possível quando é manifesto que a interpretação do direito comunitário solicitada não tem qualquer relação com a realidade ou com o objecto do litígio no processo principal, quando o problema é hipotético ou ainda quando o Tribunal não dispõe dos elementos de facto e de direito necessários para responder utilmente às questões que lhe são colocadas.

( cf. n.os 23-24 )

2. O Tribunal de Justiça é competente para decidir sobre pedidos prejudiciais relativos a disposições de direito comunitário, quando uma legislação nacional está em conformidade, para as soluções que dá a uma situação interna, com as soluções dadas pelo direito comunitário, a fim de assegurar um processo único em situações comparáveis. Com efeito, existe um verdadeiro interesse comunitário em que, para evitar divergências de interpretação futuras, as disposições ou noções que extraiu do direito comunitário sejam interpretadas de forma uniforme, quaisquer que sejam as condições em que se devam aplicar. E isto ainda mais quando a legislação nacional que utiliza um conceito constante de uma disposição de direito comunitário foi adoptada a fim de transpor para direito interno a directiva de que faz parte a referida disposição.

Daqui resulta que, nessa hipótese, a circunstância de o conceito de direito comunitário, cuja interpretação é pedida, ser aplicado, no âmbito do direito nacional, em condições diversas das previstas pela disposição comunitária correspondente, não é susceptível de afastar toda e qualquer relação entre a interpretação solicitada e o objecto do processo principal.

( cf. n.os 27-29 )

3. Incumbe a cada Estado-Membro determinar e definir as operações que podem beneficiar de uma taxa reduzida de imposto sobre o valor acrescentado por força do artigo 12.° , n.° 4, da Sexta Directiva 77/388 relativa à harmonização das legislações dos Estados-Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios, até 31 de Dezembro de 1992, e por força do artigo 28.° , n.° 2, alínea e), da mesma directiva, na redacção dada pela Directiva 92/77 que completa o sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado e que altera a Directiva 77/388 (aproximação das taxas do imposto sobre o valor acrescentado), a partir de 1 de Janeiro de 1993, desde que seja respeitado o princípio da neutralidade do imposto sobre o valor acrescentado.

Este princípio opõe-se, nomeadamente, a que mercadorias ou prestações de serviços semelhantes, que estão, portanto, em concorrência entre si, sejam tratadas de maneira diferente do ponto de vista do imposto sobre o valor acrescentado, de modo que os referidos produtos devem ser submetidos a uma taxa uniforme.

( cf. n.os 36, 41, disp. )

4. O anexo F da Sexta Directiva 77/388 relativa à harmonização das legislações dos Estados-Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios estabelece a lista das operações isentas do imposto sobre o valor acrescentado nos termos do artigo 28.° , n.° 3, alínea b), da directiva. As profissões liberais referidas no ponto 2 daquele anexo são actividades que se revestem de um acentuado carácter intelectual, exigem uma qualificação de nível elevado e estão habitualmente sujeitas a uma regulamentação profissional precisa e estrita. No exercício de tal actividade, o elemento pessoal assume especial importância, e tal exercício pressupõe, de qualquer modo, uma grande autonomia na realização dos actos profissionais. Compete ao órgão jurisdicional de reenvio determinar se, à luz destes critérios, a actividade de administrador de condomínio de imóveis, como prevista pela regulamentação nacional pertinente, deve ser considerada uma profissão liberal.

( cf. n.os 39-41, disp. )

Partes


No processo C-267/99,

que tem por objecto um pedido dirigido ao Tribunal de Justiça, nos termos do artigo 234.° CE, pelo Tribunal d'arrondissement de Luxembourg (Luxemburgo), destinado a obter, no litígio pendente neste órgão jurisdicional entre

Christiane Adam, de casada Urbing,

e

Administration de l'enregistrement et des domaines,

uma decisão a título prejudicial sobre a interpretação do anexo F, ponto 2, da Sexta Directiva 77/388/CEE do Conselho, de 17 de Maio de 1977, relativa à harmonização das legislações dos Estados-Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios - Sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado: matéria colectável uniforme (JO L 145, p. 1; EE 09 F1 p. 54),

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Segunda Secção),

composto por: N. Colneric, presidente de secção, V. Skouris (relator) e J. N. Cunha Rodrigues, juízes,

advogado-geral: A. Tizzano,

secretário: R. Grass,

vistas as observações escritas apresentadas:

- em representação de C. Urbing-Adam, por F. Entringer, avocat,

- em representação da administration de l'enregistrement et des domaines, por A. Kronshagen, avocat,

- em representação do Governo dinamarquês, por J. Molde, na qualidade de agente,

- em representação da Comissão das Comunidades Europeias, por E. Traversa e G. Berscheid, na qualidade de agentes,

visto o relatório do juiz-relator,

ouvidas as conclusões do advogado-geral apresentadas na audiência de 29 de Março de 2001,

profere o presente

Acórdão

Fundamentação jurídica do acórdão


1 Por decisão de 15 de Julho de 1999, entrada no Tribunal de Justiça em 19 de Julho seguinte, o Tribunal d'arrondissement de Luxembourg colocou, nos termos do artigo 234.° CE, duas questões prejudiciais sobre a interpretação do anexo F, ponto 2, da Sexta Directiva 77/388/CEE do Conselho, de 17 de Maio de 1977, relativa à harmonização das legislações dos Estados-Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios - Sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado: matéria colectável uniforme (JO L 145, p. 1; EE 09 F1 p. 54; a seguir «Sexta Directiva»).

2 Estas questões foram suscitadas no âmbito de um litígio que opõe C. Urbing-Adam, que exerce a actividade de administradora de condomínio de imóveis, à administration de l'enregistrement et des domaines luxemburguesa (a seguir «administration»), quanto à taxa de imposto sobre o valor acrescentado (a seguir «IVA») que deve ser aplicada às operações efectuadas por C. Urbing-Adam no quadro da sua profissão durante os exercícios fiscais de 1991 a 1994.

Enquadramento jurídico

A Sexta Directiva

As disposições da Sexta Directiva que se referem ao conceito de «profissão liberal»

3 O artigo 28.° , n.° 3, alínea b), da Sexta Directiva prevê que, durante o período transitório, os Estados-Membros podem «[c]ontinuar a isentar as operações enumeradas no anexo F, nas condições em vigor no Estado-Membro».

4 O anexo F, ponto 2, da Sexta Directiva faz referência ao conceito de profissão liberal. Esta disposição tem a seguinte redacção:

«Prestações de serviços dos autores, artistas e intérpretes de obras de arte, advogados e outros membros de profissões liberais, com excepção das profissões médicas e paramédicas, desde que não se trate das prestações referidas no anexo B da Segunda Directiva do Conselho, de 11 de Abril de 1967;»

As disposições da Sexta Directiva relativas às taxas

5 Na versão anterior a 1 de Janeiro de 1993, o artigo 12.° da Sexta Directiva, que rege a matéria das taxas, dispunha, no seu n.° 4:

«Em certos casos, as entregas de bens e as prestações de serviços podem ficar sujeitas a taxas agravadas ou a taxas reduzidas. As taxas reduzidas serão fixadas de tal modo que o montante do imposto sobre o valor acrescentado resultante da aplicação dessas taxas permita normalmente deduzir a totalidade do imposto sobre o valor acrescentado, que seja dedutível nos termos do artigo 17.° »

6 A Directiva 92/77/CEE do Conselho, de 19 de Outubro de 1992, que completa o sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado e que altera a Directiva 77/388 (aproximação das taxas do IVA) (JO L 316, p. 1), que devia estar transposta o mais tardar em 31 de Dezembro de 1992, suprimiu o primeiro período do artigo 12.° , n.° 4, da Sexta Directiva, reformulou o seu artigo 28.° , n.° 2, e aditou-lhe um anexo H.

7 O artigo 28.° , n.° 2, alínea e), da Sexta Directiva, na versão resultante da Directiva 92/77, que é, no caso sub judice, a disposição pertinente, dispõe:

«Os Estados-Membros que, em 1 de Janeiro de 1991, aplicavam uma taxa reduzida a bens e serviços não contemplados no anexo H poderão aplicar a taxa reduzida, ou uma ou duas das taxas reduzidas previstas no n.° 3 do artigo 12.° , a esses bens e serviços, desde que a taxa não seja inferior a 12%.»

8 O referido anexo H, que estabelece a lista das entregas de bens e das prestações de serviços que podem ser objecto de taxas reduzidas de IVA, não menciona as profissões liberais enquanto tais.

O direito nacional

A regulamentação nacional em matéria de IVA

9 O Grão-Ducado do Luxemburgo aplicou, antes de 1 de Janeiro de 1993, uma taxa reduzida de IVA de 6% para as profissões liberais.

10 Com efeito, segundo o artigo 40.° , n.° 4, alínea b), da Lei de 5 de Agosto de 1969, alterada e completada pela Lei de 12 de Fevereiro de 1979 (a seguir «lei sobre o IVA»), a taxa reduzida de IVA aplica-se, dentro dos limites e nas condições a determinar por regulamento grão-ducal, aos serviços resultantes do exercício de uma profissão liberal.

11 O artigo 4.° do Regulamento grão-ducal de 7 de Março de 1980, que estabelece os limites e as condições de aplicação da taxa reduzida de IVA, dispõe que os serviços resultantes do exercício de uma profissão liberal referidos no artigo 40.° , n.° 4, alínea b), da lei sobre o IVA são os que resultam das actividades de procurador, advogado, notário, oficial de diligências, administrador de bens, engenheiro, arquitecto, mediador, verificador, técnico, químico, inventor, perito, revisor oficial de contas, veterinário, jornalista, repórter fotográfico, intérprete, tradutor e outras actividades análogas, independentemente de estas actividades serem exercidas a título principal ou acessório por pessoas singulares ou colectivas.

12 Dando cumprimento à regulamentação comunitária referida no n.° 7 do presente acórdão, o Grão-Ducado do Luxemburgo fixou, com efeitos em 1 de Janeiro de 1993, uma taxa reduzida de IVA, dita «taxa intermédia», de 12% para as profissões liberais.

13 Com efeito, o artigo 40.° , n.° 3, da lei sobre o IVA, na versão resultante da Lei orçamental de 20 de Dezembro de 1991, prevê que a taxa intermédia de 12% é aplicada aos bens e serviços previstos no anexo C da referida lei. O anexo C menciona, no seu n.° 8, os serviços resultantes do exercício de uma profissão liberal.

14 O artigo 7.° , n.° 1, do Regulamento grão-ducal de 21 de Dezembro de 1991, que estabelece os limites e as condições de aplicação das taxas reduzida, super-reduzida e intermédia do imposto sobre o valor acrescentado, define os serviços resultantes do exercício de uma profissão liberal e referidos no anexo C, n.° 8, da lei sobre o IVA, alterada, nos mesmos termos que o artigo 4.° do Regulamento grão-ducal de 7 de Março de 1980.

A regulamentação nacional relativa à actividade de administrador de condomínio

15 Segundo a Lei de 16 de Maio de 1975 sobre o estatuto do condomínio dos imóveis, alterada, os co-proprietários de um imóvel ou de um grupo de imóveis cuja propriedade se encontre dividida por várias pessoas, em lotes com uma parte privativa e partes comuns, estão obrigatoriamente agrupados num condomínio, representante legal da colectividade, dotado de personalidade jurídica.

16 Segundo as disposições do Regulamento grão-ducal de 13 de Junho de 1975 que estabelece as medidas de execução da lei relativa à compropriedade, o administrador do condomínio é designado pela assembleia geral de condóminos e as suas funções podem ser assumidas por qualquer pessoa singular ou colectiva. O administrador está encarregado de garantir a execução das disposições do regulamento do condomínio e das deliberações da assembleia geral; administra o imóvel; ocupa-se da conservação e da manutenção do mesmo; em caso de urgência, manda proceder por sua própria iniciativa à execução de quaisquer trabalhos necessários à preservação do imóvel; representa, nos termos da lei, com prévia autorização da assembleia, o condomínio nos actos civis e em juízo.

O litígio no processo principal e as questões prejudiciais

17 Considerando que a sua actividade profissional era uma profissão liberal, C. Urbing-Adam fez as suas declarações de IVA, relativas a 1991 e 1992, com base numa taxa reduzida de 6%, e as relativas aos anos de 1993 e 1994, com base na taxa intermédia de 12%. Tendo a administration considerado que a actividade de C. Urbing-Adam não era uma actividade de «administrador de bens» e não constituía portanto uma profissão liberal, mas sim uma actividade comercial, emitiu um aviso de rectificação e aplicou a taxa normal de IVA, ou seja, 15%, às operações em causa.

18 C. Urbing-Adam interpôs recurso desta decisão no Tribunal d'arrondissement de Luxembourg. Sublinhando a autonomia de que goza, nos termos da legislação luxemburguesa, um administrador de condomínio no exercício da sua actividade, defendeu que exercia uma profissão liberal na acepção dos artigos 4.° do Regulamento grão-ducal de 7 de Março de 1980 e 7.° do Regulamento grão-ducal de 21 de Dezembro de 1991. Alegou que, nesta qualidade, tinha direito à taxa reduzida, em relação a 1991 e 1992, por força do artigo 40.° , n.° 4, alínea b), da lei sobre o IVA, e à taxa intermédia, relativamente aos anos de 1993 e 1994, por força do artigo 40.° , n.° 3, do mesmo diploma, na versão resultante da Lei orçamental de 20 de Dezembro de 1991.

19 A administration, pelo contrário, contesta a natureza de profissão liberal da actividade de administrador de condomínio, conforme prevista na regulamentação luxemburguesa, alegando que se trata de uma actividade distinta da de administrador de bens, que o seu exercício não exige a posse de uma qualificação especial e que a mesma consiste na simples gestão das partes comuns de um imóvel, sob a fiscalização da assembleia de condóminos.

20 Dado que a regulamentação luxemburguesa em matéria de IVA não define o conceito de profissão liberal, limitando-se a apresentar como actividades resultantes do exercício de uma profissão liberal diversas actividades que enumera bem como «outras actividades análogas», o Tribunal d'arrondissement de Luxembourg julgou que a resolução do litígio submetido à sua apreciação exigia uma interpretação do anexo F, ponto 2, da Sexta Directiva. Decidiu, assim, colocar as seguintes questões prejudiciais ao Tribunal de Justiça:

«1) O conceito de profissão liberal a que se refere o anexo F, ponto 2, da Sexta Directiva do Conselho 77/388/CEE, relativa à harmonização das legislações dos Estados-Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios, constitui um conceito autónomo de direito comunitário?

Em caso de resposta afirmativa à primeira questão:

2) O conceito de profissão liberal abrange a actividade profissional do administrador de condomínio de imóveis?»

Quanto à competência do Tribunal de Justiça

21 A administration alega que as disposições do artigo 28.° , n.° 3, e do anexo F, ponto 2, da Sexta Directiva, cuja interpretação é pedida, não estão em causa no litígio no processo principal, porque regem as isenções de IVA e não a aplicação pelos Estados-Membros de uma taxa reduzida de IVA. Esta última matéria é regida pelos artigos 12.° e 28.° , n.° 2, da Sexta Directiva, na redacção dada pela Directiva 92/77, e teria precisamente sido com fundamento nestas disposições que o Grão-Ducado do Luxemburgo teria aplicado às operações resultantes do exercício de uma profissão liberal uma taxa reduzida de 6% antes de 1 de Janeiro de 1993 e de 12% depois dessa data. Além disso, as disposições da regulamentação luxemburguesa aplicáveis no processo principal não fazem qualquer remissão para a legislação comunitária.

22 Deste modo, o órgão jurisdicional de reenvio pede ao Tribunal de Justiça que se pronuncie, a título prejudicial, sobre a interpretação de um conceito constante de uma disposição de direito comunitário manifestamente inaplicável no caso do processo principal. Assim, em conformidade com os acórdãos de 18 de Outubro de 1990, Dzodzi (C-297/88 e C-197/89, Colect., p. I-3763, n.° 40), de 8 de Novembro de 1990, Gmurzynska-Bscher (C-231/89, Colect., p. I-4003, n.os 18 e 19), e de 17 de Julho de 1997, Leur-Bloem (C-28/95, Colect., p. I-4161, n.° 26), o Tribunal de Justiça não é competente para responder às questões colocadas.

23 A este respeito, há que recordar que, nos termos de uma jurisprudência constante, no âmbito da cooperação entre o Tribunal de Justiça e os órgãos jurisdicionais nacionais instituída pelo artigo 234.° CE, compete ao juiz nacional, a quem foi submetido o litígio e que deve assumir a responsabilidade pela decisão jurisdicional a tomar, apreciar, tendo em conta as especificidades de cada processo, tanto a necessidade de uma decisão prejudicial, para poder proferir a sua decisão, como a pertinência das questões que coloca ao Tribunal de Justiça. Consequentemente, quando as questões colocadas pelo juiz nacional são relativas à interpretação do direito comunitário, o Tribunal de Justiça é, em princípio, obrigado a decidir (v., nomeadamente, acórdão de 13 de Março de 2001, PreussenElektra, C-379/98, Colect., p. I-2099, n.° 38).

24 Todavia, o Tribunal de Justiça também indicou que, em casos excepcionais, lhe cabe examinar as condições em que os pedidos de interpretação lhe são submetidos pelos órgãos jurisdicionais nacionais, para verificar a sua própria competência. A recusa de decisão quanto a uma questão prejudicial submetida por um órgão jurisdicional nacional só é possível quando é manifesto que a interpretação do direito comunitário solicitada não tem qualquer relação com a realidade ou com o objecto do litígio no processo principal, quando o problema é hipotético ou ainda quando o Tribunal não dispõe dos elementos de facto e de direito necessários para responder utilmente às questões que lhe são colocadas (v., nomeadamente, acórdão PreussenElektra, já referido, n.° 39).

25 No caso vertente, é manifesto que as questões colocadas dizem respeito à interpretação do conceito de profissão liberal constante de uma disposição da Sexta Directiva relativa às isenções de IVA, quando, no processo principal, o alcance deste conceito deve ser estabelecido não para decidir sobre uma isenção de IVA mas a fim de determinar a taxa de IVA aplicável à actividade de administrador de condomínio de imóveis, e ainda mais por força da regulamentação luxemburguesa em matéria de IVA.

26 Apesar disso, estas circunstâncias não permitem por si só concluir que a interpretação solicitada pelo órgão jurisdicional de reenvio não tem qualquer relação com o objecto do processo principal e que, assim, o Tribunal de Justiça não é competente para decidir sobre as questões colocadas.

27 Com efeito, resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça que, quando uma legislação nacional está em conformidade, para as soluções que dá a uma situação interna, com as soluções dadas pelo direito comunitário, a fim de assegurar um processo único em situações comparáveis, existe um verdadeiro interesse comunitário em que, para evitar divergências de interpretação futuras, as disposições ou noções que extraiu do direito comunitário sejam interpretadas de forma uniforme, quaisquer que sejam as condições em que se devam aplicar (v., nomeadamente, acórdãos de 17 de Julho de 1997, Giloy, C-130/95, Colect., p. I-4291, n.° 28, e de 11 de Janeiro de 2001, Kofisa Italia, C-1/99, Colect., p. I-207, n.° 32).

28 E isto ainda mais quando a legislação nacional que utiliza um conceito constante de uma disposição de direito comunitário foi adoptada a fim de transpor para direito interno a directiva de que faz parte a referida disposição.

29 Daqui resulta que, nessa hipótese, a circunstância de o conceito de direito comunitário, cuja interpretação é pedida, ser aplicado, no âmbito do direito nacional, em condições diversas das previstas pela disposição comunitária correspondente, não é susceptível de afastar toda e qualquer relação entre a interpretação solicitada e o objecto do processo principal.

30 O órgão jurisdicional de reenvio indica, na sua decisão, que «a legislação [luxemburguesa] em matéria de imposto sobre o valor acrescentado [transpõe] as directivas comunitárias correspondentes» e que, assim, «[a] legislação luxemburguesa relativa à taxa aplicável à actividade das profissões liberais deve ser interpretada em conformidade com as disposições comunitárias relativas ao IVA», e em especial o anexo F, ponto 2, da Sexta Directiva, que inclui este conceito.

31 Nestas condições e atendendo às considerações constantes dos n.os 27 a 29 do presente acórdão, a argumentação da administration quanto à inexistência de relação entre as questões prejudiciais e o objecto do processo principal não pode ser acolhida.

32 Assim, o Tribunal de Justiça é competente para decidir sobre as questões colocadas.

Quanto às questões prejudiciais

33 Com as suas duas questões, que devem ser analisadas em conjunto, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta essencialmente se as profissões liberais referidas no anexo F, ponto 2, da Sexta Directiva englobam uma actividade como a de administrador de condomínio de imóveis.

34 Dado que a questão que se coloca no processo principal é a de saber se tal actividade deve ter, para efeitos da aplicação do IVA, o tratamento reservado às profissões liberais submetidas a uma taxa reduzida em relação à taxa normal do IVA, há que precisar, a título liminar, que o artigo 12.° , n.° 4, da Sexta Directiva, na versão anterior à Directiva 92/77, permitiu aos Estados-Membros aplicarem taxas reduzidas a certas entregas de bens e a certas prestações de serviços e que o artigo 28.° , n.° 2, alínea e), da Sexta Directiva, na versão resultante da Directiva 92/77, autorizou os Estados-Membros que, em 1 de Janeiro de 1991, aplicavam uma taxa reduzida às entregas de bens e às prestações de serviços diferentes das mencionadas no anexo H a continuarem a aplicar esta taxa desde que a mesma não seja inferior a 12%. É manifesto que o anexo H não menciona as profissões liberais enquanto tais.

35 Daqui resulta que a determinação e a definição das operações que podem beneficiar de uma taxa reduzida ao abrigo destas disposições da Sexta Directiva são da competência dos Estados-Membros em causa.

36 Apesar disso, no exercício desta competência, os Estados-Membros devem respeitar o princípio da neutralidade fiscal. Este princípio opõe-se, nomeadamente, a que mercadorias ou prestações de serviços semelhantes, que estão, portanto, em concorrência entre si, sejam tratadas de maneira diferente do ponto de vista do IVA, de modo que os referidos produtos devem ser submetidos a uma taxa uniforme (v., neste sentido, acórdão de 3 de Maio de 2001, Comissão/França, C-481/98, Colect., p. I-3369, n.° 22).

37 Tal deve ser igualmente o caso para o tratamento reservado pelo Grão-Ducado do Luxemburgo às profissões liberais que, em conformidade com as disposições da Sexta Directiva mencionadas no n.° 34 do presente acórdão, estavam sujeitas, até 31 de Dezembro de 1992, a uma taxa reduzida de 6%, que aumentou, em 1 de Janeiro de 1993, para 12%.

38 Quanto ao alcance do conceito de profissão liberal, verifica-se que a Sexta Directiva o utiliza no seu anexo F, ponto 2, sem no entanto dar do mesmo uma definição abstracta e global. Além disso, em conformidade com o artigo 28.° , n.° 3, alínea b), da Sexta Directiva, a que se refere o anexo F, é nas condições vigentes no Estado-Membro em causa que as operações referidas neste anexo podem, durante o período transitório, ser isentas de IVA.

39 Todavia, a fim de fornecer indicações úteis ao órgão jurisdicional de reenvio, há que sublinhar certos elementos que caracterizam as profissões liberais na acepção do anexo F, ponto 2, da Sexta Directiva. Como a Comissão sublinhou nas suas observações escritas, as profissões liberais referidas nessa disposição são actividades que se revestem, nomeadamente, de um acentuado carácter intelectual, exigem uma qualificação de nível elevado e estão habitualmente sujeitas a uma regulamentação profissional precisa e estrita. Acrescente-se que, no exercício de tal actividade, o elemento pessoal assume especial importância, e tal exercício pressupõe, de qualquer modo, uma grande autonomia na realização dos actos profissionais.

40 Compete ao órgão jurisdicional de reenvio determinar se, à luz destes critérios, a actividade de administrador de condomínio, como prevista pela regulamentação luxemburguesa pertinente, deve ser considerada uma profissão liberal.

41 Atendendo ao que precede, há que responder às questões colocadas que incumbe a cada Estado-Membro determinar e definir as operações que podem beneficiar de uma taxa reduzida por força do artigo 12.° , n.° 4, da Sexta Directiva, até 31 de Dezembro de 1992, e por força do artigo 28.° , n.° 2, alínea e), da Sexta Directiva, na redacção dada pela Directiva 92/77, a partir de 1 de Janeiro de 1993, desde que seja respeitado o princípio da neutralidade do IVA.

As profissões liberais referidas no anexo F, ponto 2, da Sexta Directiva são actividades que se revestem de um acentuado carácter intelectual, exigem uma qualificação de nível elevado e estão habitualmente sujeitas a uma regulamentação profissional precisa e estrita. No exercício de tal actividade, o elemento pessoal assume especial importância, e tal exercício pressupõe, de qualquer modo, uma grande autonomia na realização dos actos profissionais.

Decisão sobre as despesas


Quanto às despesas

42 As despesas efectuadas pelo Governo dinamarquês e pela Comissão, que apresentaram observações ao Tribunal, não são reembolsáveis. Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional nacional, compete a este decidir quanto às despesas.

Parte decisória


Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Segunda Secção),

pronunciando-se sobre as questões submetidas pelo Tribunal d'arrondissement de Luxembourg, por decisão de 15 de Julho de 1999, declara:

Incumbe a cada Estado-Membro determinar e definir as operações que podem beneficiar de uma taxa reduzida por força do artigo 12.° , n.° 4, da Sexta Directiva 77/388/CEE do Conselho, de 17 de Maio de 1977, relativa à harmonização das legislações dos Estados-Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios - Sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado: matéria colectável uniforme, até 31 de Dezembro de 1992, e por força do artigo 28.° , n.° 2, alínea e), da mesma directiva, na redacção dada pela Directiva 92/77/CEE do Conselho, de 19 de Outubro de 1992, que completa o sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado e que altera a Directiva 77/388 (aproximação das taxas do IVA), a partir de 1 de Janeiro de 1993, desde que seja respeitado o princípio da neutralidade do imposto sobre o valor acrescentado.

As profissões liberais referidas no anexo F, ponto 2, da Sexta Directiva 77/388 são actividades que se revestem de um acentuado carácter intelectual, exigem uma qualificação de nível elevado e estão habitualmente sujeitas a uma regulamentação profissional precisa e estrita. No exercício de tal actividade, o elemento pessoal assume especial importância, e tal exercício pressupõe, de qualquer modo, uma grande autonomia na realização dos actos profissionais.