C-287/00 - Comissão/Alemanha

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EUR-Lex - 62000J0287 - PT

62000J0287

Acórdão do Tribunal (Quinta Secção) de 20 de Junho de 2002. - Comissão das Comunidades Europeias contra República Federal da Alemanha. - Incumprimento de Estado - Sexta Directiva IVA - Artigos 2.º, n.º 1, e 13.º, A, n.º 1, alínea i) - Actividades de investigação dos estabelecimentos públicos de ensino superior efectuados a título oneroso - Isenção. - Processo C-287/00.

Colectânea da Jurisprudência 2002 página I-05811


Sumário
Partes
Fundamentação jurídica do acórdão
Decisão sobre as despesas
Parte decisória

Palavras-chave


1. Acção por incumprimento Fase pré-contenciosa Objecto Parecer fundamentado Conteúdo Delimitação do objecto do litígio

(Artigo 226.° CE)

2. Disposições fiscais Harmonização das legislações Impostos sobre o volume de negócios Sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado Isenções previstas pela Sexta Directiva Isenção das prestações de serviços estreitamente conexas com o ensino universitário Actividades de investigação das universidades estatais efectuadas a título oneroso Exclusão

[Directiva 77/388 do Conselho, artigos 2.° e 13.° , A, n.° 1, alínea i)]

Sumário


1. No âmbito da acção por incumprimento, o procedimento pré-contencioso tem por objectivo dar ao Estado-Membro em causa a possibilidade de, por um lado, dar cumprimento às obrigações decorrentes do direito comunitário e, por outro, apresentar utilmente os seus fundamentos de defesa a respeito das acusações formuladas pela Comissão.

A regularidade desse procedimento constitui uma garantia essencial pretendida pelo Tratado não apenas para a protecção dos direitos do Estado-Membro em causa, mas igualmente para assegurar que o eventual processo contencioso tenha por objecto um litígio claramente definido.

O objecto de uma acção intentada nos termos do artigo 226.° CE é, por conseguinte, delimitado pelo procedimento pré-contencioso previsto nesta disposição. Consequentemente, a acção deve basear-se nos mesmos argumentos e fundamentos que o parecer fundamentado, o qual deve conter uma exposição coerente e detalhada das razões que criaram na Comissão a convicção de que o Estado interessado não cumpriu uma das obrigações que lhe incumbem por força do Tratado.

Ao invocar pela primeira vez na petição inicial um argumento em resposta a um fundamento de defesa suscitado também pela primeira vez pelo Estado-Membro demandado em resposta ao parecer fundamentado, a Comissão não modifica nem a definição nem o fundamento do alegado incumprimento.

( cf. n.os 16-19, 24 )

2. Uma legislação nacional que exonera operações do imposto sobre o valor acrescentado, que não é abrangida por uma isenção prevista pela Sexta Directiva 77/388, relativa à harmonização das legislações dos Estados-Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios, nem autorizada em conformidade com uma derrogação prevista por esta, constitui uma infracção ao artigo 2.° da mesma directiva.

Assim, não cumpre as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 2.° da Sexta Directiva um Estado-Membro que isenta do imposto sobre o valor acrescentado as actividades de investigação efectuadas a título oneroso por estabelecimentos públicos de ensino superior.

Com efeito, essas actividades não podem ser consideradas prestações de serviços estreitamente conexas com o ensino universitário na acepção do artigo 13.° , A, n.° 1, alínea i), da Sexta Directiva.

Se esta noção não requer uma interpretação particularmente estrita, na medida em que a isenção das referidas prestações de serviços se destina a garantir que o benefício do ensino universitário não se torne inacessível em razão do acréscimo de custos deste ensino se ele próprio, ou as prestações de serviços ou as entregas de bens com ele estreitamente conexas, fosse sujeito a imposto sobre o valor acrescentado, o facto de sujeitar a este a realização a título oneroso de projectos de investigação por estabelecimentos públicos de ensino superior não tem como efeito aumentar os custos do ensino universitário.

Além disso, embora a realização desses projectos possa ser considerada muito útil para o ensino universitário, não é indispensável para atingir o objectivo visado por este.

( cf. n.os 40, 47-49, 52, disp. )

Partes


No processo C-287/00,

Comissão das Comunidades Europeias, representada por G. Wilms e K. Gross, na qualidade de agentes, com domicílio escolhido no Luxemburgo,

demandante,

contra

República Federal da Alemanha, representada por W.-D. Plessing e T. Jürgensen, na qualidade de agentes,

demandada,

que tem por objecto obter a declaração de que, ao isentar do imposto sobre o valor acrescentado as actividades de investigação dos estabelecimentos públicos de ensino superior, em conformidade com o § 4, n._ 21a, da Umsatzsteuergesetz (lei relativa ao imposto sobre o volume de negócios), de 27 de Abril de 1993 (BGBl. 1993 I, p. 565), na redacção que lhe foi dada pelo § 4, n._ 5, da Umsatzsteuergesetz-Änderungsgesetz, de 12 de Dezembro de 1996 (BGBl. 1996 I, p. 1851), a República Federal da Alemanha não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 2._ da Sexta Directiva 77/388/CEE do Conselho, de 17 de Maio de 1977, relativa à harmonização das legislações dos Estados-Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios - Sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado: matéria colectável uniforme (JO L 145, p. 1; EE 09 F2 p. 54),

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA

(Quinta Secção),

composto por: P. Jann, presidente de secção, S. von Bahr (relator), D. A. O. Edward, A. La Pergola e C. W. A. Timmermans, juízes,

advogado-geral: F. G. Jacobs,

secretário: R. Grass,

visto o relatório do juiz-relator,

ouvidas as conclusões do advogado-geral apresentadas na audiência de 13 de Dezembro de 2001,

profere o presente

Acórdão

Fundamentação jurídica do acórdão


1 Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal de Justiça em 20 de Julho de 2000, a Comissão das Comunidades Europeias intentou uma acção, nos termos do artigo 226._ CE, a fim de obter a declaração de que, ao isentar do imposto sobre o valor acrescentado (a seguir «IVA») as actividades de investigação dos estabelecimentos públicos de ensino superior, em conformidade com o § 4, n._ 21a, da Umsatzsteuergesetz (lei relativa ao imposto sobre o volume de negócios), de 27 de Abril de 1993 (BGBl. 1993 I, p. 565), na redacção que lhe foi dada pelo § 4, n._ 5, da Umsatzsteuergesetz-Änderungsgesetz, de 12 de Dezembro de 1996 (BGBl. 1996 I, p. 1851, a seguir «UStG»), a República Federal da Alemanha não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 2._ da Sexta Directiva 77/388/CEE do Conselho, de 17 de Maio de 1977, relativa à harmonização das legislações dos Estados-Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios - Sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado: matéria colectável uniforme (JO L 145, p. 1; EE 09 F2 p. 54, a seguir «Sexta Directiva»).

Enquadramento jurídico

Regulamentação comunitária

2 O artigo 2._, n._ 1, da Sexta Directiva sujeita ao IVA as entregas de bens e as prestações de serviços efectuadas a título oneroso, no território do país, por um sujeito passivo agindo nessa qualidade.

3 Nos termos do artigo 4._, n._ 1, da referida directiva, por sujeito passivo entende-se qualquer pessoa que exerça, de modo independente, uma das actividades económicas referidas no n._ 2 do mesmo artigo. O conceito de «actividades económicas» é definido no artigo 4._, n._ 2, como sendo todas as actividades de produção, de comercialização ou de prestação de serviços, e, nomeadamente, as actividades que envolvem a exploração de um bem corpóreo ou incorpóreo com o fim de auferir receitas com carácter de permanência.

4 O artigo 4._, n._ 5, primeiro parágrafo, da Sexta Directiva precisa que os Estados, as colectividades territoriais e outros organismos de direito público não serão considerados sujeitos passivos relativamente às actividades ou operações que exerçam na qualidade de autoridades públicas, mesmo quando em conexão com essas mesmas actividades ou operações cobrem direitos, taxas, quotizações ou remunerações.

5 O artigo 13._, A, n._ 1, da referida directiva, que prevê isenções em beneficio de certas actividades de interesse geral, dispõe:

«Sem prejuízo de outras disposições comunitárias, os Estados-Membros isentarão, nas condições por eles fixadas com o fim de assegurar a aplicação correcta e simples das isenções a seguir enunciadas e de evitar qualquer possível fraude, evasão e abuso:

[...]

i) a educação da infância e da juventude, o ensino escolar ou universitário, a formação ou a reciclagem profissional, e bem assim as prestações de serviços e as entregas de bens com elas estreitamente conexas, efectuadas por organismos de direito público prosseguindo o mesmo fim e por outros organismos que o Estado-Membro em causa considere prosseguirem fins análogos.»

Regulamentação nacional

6 Segundo o § 4, n._ 21a, da UStG estão isentas de IVA «as operações efectuadas por estabelecimentos públicos de ensino superior no quadro de actividades de investigação. Não fazem parte das actividades de investigação as actividades que se limitam a aplicar os conhecimentos estabelecidos, a retoma de projectos e as actividades que não têm qualquer relação com a investigação».

Procedimento pré-contencioso

7 Considerando que a isenção de IVA concedida nos termos do § 4, n._ 21a, da UStG é contrária ao direito comunitário, a Comissão enviou ao Governo alemão, em 6 de Novembro de 1998, uma notificação para cumprimento.

8 Nesta notificação, a Comissão, depois de ter recordado o conteúdo do § 4, n._ 21a, da UStG, concluía que um estabelecimento público de ensino superior é um sujeito passivo para efeitos de IVA, na medida em que, não agindo como autoridade pública, efectua operações a título oneroso, e que as actividades de investigação efectuadas por um sujeito passivo são operações tributáveis e não isentas, à luz da Sexta Directiva. Recordava também a redacção do artigo 2._, n._ 1, da Sexta Directiva e alegava que, dado que as actividades de investigação não estão isentas, em particular ao abrigo do artigo 13._ da Sexta Directiva, considerava que, ao isentar de IVA as actividades efectuadas pelas universidades públicas, a República Federal da Alemanha não tinha cumprido as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 2._, n._ 1, da Sexta Directiva.

9 Tendo ficado sem resposta a notificação para cumprimento, apesar de, a pedido do Governo alemão, lhe ter sido concedida uma prorrogação do prazo de resposta até meados de Março de 1999, a Comissão, por carta de 26 de Agosto de 1999, emitiu um parecer fundamentado em que convidava a República Federal da Alemanha a tomar as medidas necessárias para lhe dar cumprimento no prazo de dois meses a contar da sua notificação.

10 No parecer fundamentado, depois de ter observado que, nos termos do § 4, n._ 21a, da UStG, as actividades de investigação dos estabelecimentos públicos de ensino superior estão isentas de IVA e mencionado o artigo 2._, n._ 1, da Sexta Directiva, a Comissão repetiu, no n._ 3 do referido parecer, que um estabelecimento público de ensino superior é um sujeito passivo para efeitos de IVA, na medida em que, não agindo como autoridade pública, efectua operações a título oneroso e que as actividades de investigação efectuadas por um sujeito passivo são operações tributáveis e não isentas, à luz da Sexta Directiva. Segundo a Comissão, ao isentar de IVA estas actividades efectuadas pelas universidades públicas, a República Federal da Alemanha não tinha cumprido as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 2._, n._ 1, da Sexta Directiva. Finalmente, a Comissão recordava que, nos termos do artigo 226._ CE, tinha informado o Governo alemão desta infracção do direito comunitário através da sua notificação para cumprimento de 6 de Novembro de 1998.

11 Por carta de 4 de Abril de 2000, o Governo alemão respondeu ao parecer fundamentado, mas, como esta resposta não satisfez a Comissão, esta intentou a presente acção.

Quanto à admissibilidade

Argumentos das partes

12 O Governo alemão alega que a acção intentada pela Comissão é inadmissível, invocando dois fundamentos.

13 Em primeiro lugar, o procedimento pré-contencioso, tal como é imposto pelo artigo 226._ CE, não foi respeitado pela Comissão. Com efeito, contrariamente às exigências da jurisprudência do Tribunal de Justiça (v., nomeadamente, acórdãos de 20 de Março de 1997, Comissão/Alemanha, C-96/95, Colect., p. I-1653, n.os 22 e 24, e de 28 de Outubro de 1999, Comissão/Áustria, C-328/96, Colect., p. I-7479, n._ 34), o parecer fundamentado, limitado a sete frases, não continha uma apresentação material completa nem uma apreciação jurídica pormenorizada e coerente do objecto do litígio, contentando-se essencialmente em repetir o conteúdo da notificação para cumprimento.

14 Em segundo lugar, o Governo alemão sustenta que, na petição inicial, o objecto do litígio é mais amplo do que o que resulta do parecer fundamentado, o que constitui uma violação do princípio da continuidade entre a fase pré-contenciosa e a acção, que é a expressão específica do princípio do direito de ser ouvido (v. acórdão de 25 de Abril de 1996, Comissão/Luxemburgo, C-274/93, Colect., p. I-2019, n._ 11).

15 A este respeito, o Governo alemão alega que, na petição inicial, a Comissão deixou de fundamentar a acção apenas na violação do artigo 2._ da Sexta Directiva, como fez no parecer fundamentado, mas invoca, além disso, o artigo 13._, A, da Sexta Directiva. A argumentação da Comissão, na medida em que se baseia na referida disposição, constitui um aspecto essencial da acção proposta pela Comissão e, por consequência, uma nova acusação. Com efeito, o artigo 2._ da Sexta Directiva apenas define a base de incidência do IVA, ou seja, as categorias de volumes de negócios que devem em princípio integrar o sistema do referido imposto, mas não resulta directamente desta disposição que os volumes de negócios que aí são mencionados fiquem sujeitos a imposto. Esta sujeição resulta apenas dos critérios específicos de isenção fiscal dos artigos 13._ e seguintes da Sexta Directiva.

Apreciação do Tribunal

16 Deve recordar-se que, segundo jurisprudência assente, o procedimento pré-contencioso tem por objectivo dar ao Estado-Membro em causa a possibilidade de, por um lado, dar cumprimento às obrigações decorrentes do direito comunitário e, por outro, apresentar utilmente os seus fundamentos de defesa a respeito das acusações formuladas pela Comissão (v., nomeadamente, acórdãos Comissão/Alemanha, já referido, n._ 22, e acórdão de 15 de Janeiro de 2002, Comissão/Itália, C-433/99, ainda não publicado na Colectânea, n._ 10).

17 A regularidade desse procedimento constitui uma garantia essencial pretendida pelo Tratado não apenas para a protecção dos direitos do Estado-Membro em causa, mas igualmente para assegurar que o eventual processo contencioso tenha por objecto um litígio claramente definido (v. acórdão de 13 de Dezembro de 2001, Comissão/França, C-1/00, ainda não publicado na Colectânea, n._ 53).

18 Daqui resulta, em primeiro lugar, que o objecto de uma acção intentada nos termos do artigo 226._ CE é delimitado pelo procedimento pré-contencioso previsto nesta disposição. Consequentemente, a acção deve basear-se nos mesmos argumentos e fundamentos que o parecer fundamentado (v., nomeadamente, acórdão Comissão/Itália, já referido, n._ 11).

19 Em segundo lugar, o parecer fundamentado deve conter uma exposição coerente e detalhada das razões que criaram na Comissão a convicção de que o Estado-Membro interessado não cumpriu uma das obrigações que lhe incumbem por força do Tratado (v., nomeadamente, acórdão Comissão/Itália, já referido, n._ 12).

20 No caso vertente, deve salientar-se, por um lado, que, ao longo do processo, iniciado com a notificação para cumprimento, o incumprimento imputado à República Federal da Alemanha se manteve idêntico, a saber, a isenção de IVA das actividades de investigação dos estabelecimentos públicos de ensino superior, ao abrigo do § 4, n._ 21a, da UStG. A este propósito, afirma-se claramente na referida notificação que a Comissão considera que estas actividades constituem operações tributáveis, por força do artigo 2._, n._ 1, da Sexta Directiva, e que as mesmas não estão isentas.

21 Além disso, há que considerar que a Comissão não alterou o objecto do litígio através da alteração dos fundamentos do incumprimento imputado. É certo que só na petição inicial a Comissão apresenta argumentação expressa para demonstrar que o artigo 13._, A, n._ 1, alínea i), da Sexta Directiva não é aplicável à situação controvertida. Todavia, não é menos verdade que, na sua notificação, a Comissão já tinha afirmado que, na sua opinião, as actividades de investigação dos referidos estabelecimentos não estão isentas, «em especial ao abrigo do artigo 13._ da directiva». A este propósito, importa lembrar que o parecer fundamentado se refere expressamente à notificação para cumprimento.

22 Por conseguinte, deve considerar-se que, no parecer fundamentado, a Comissão definiu em termos suficientemente precisos a alegada infracção e as razões pelas quais considera que a República Federal da Alemanha não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força da Sexta Directiva.

23 Além disso, é evidente que a notificação para cumprimento ficou sem resposta, embora a Comissão tenha concedido ao Governo alemão uma prorrogação do prazo de resposta. Se este último tivesse respondido à referida notificação, a Comissão estaria em condições de precisar, no parecer fundamentado, as acusações que já tinha imputado de forma mais geral na notificação para cumprimento. Numa situação como a que resulta do silêncio do referido governo, não se pode censurar a Comissão por ter retomado, essencialmente em termos quase idênticos, o conteúdo da notificação para cumprimento no parecer fundamentado.

24 Por outro lado, embora a Comissão tenha invocado, pela primeira vez na petição inicial, precisamente o artigo 13._, A, n._ 1, alínea i), da Sexta Directiva, limitou-se assim a responder a um fundamento de defesa suscitado também pela primeira vez pelo Governo alemão em resposta ao parecer fundamentado e, ao fazê-lo, não modificou nem a definição nem o fundamento do alegado incumprimento (v., neste sentido, acórdão de 15 de Dezembro de 1982, Comissão/Dinamarca, 211/81, Recueil, p. 4547, n._ 16).

25 Por conseguinte, deve considerar-se que o parecer fundamentado define de modo suficientemente preciso a alegada infracção e que a argumentação apresentada pela Comissão na sua petição inicial, segundo a qual o artigo 13._, A, n._ 1, alínea i), da Sexta Directiva não é aplicável neste caso concreto, não tem por efeito modificar o objecto do alegado incumprimento.

26 Daí resulta que a acção é admissível.

Quanto ao mérito

Argumentos das partes

27 A Comissão alega que a actividade em causa no caso vertente assenta num contrato particular, relativo a um projecto de investigação entre o estabelecimento público de ensino superior interessado e um mandante, que rege nomeadamente o tipo e a importância das prestações, bem como a contrapartida das mesmas. Quando exercem esta actividade, os estabelecimentos públicos de ensino superior aplicam, por conseguinte, as mesmas regras que uma empresa privada. Por conseguinte, a derrogação prevista no artigo 4._, n._ 5, primeiro parágrafo, da Sexta Directiva, relativamente às actividades ou operações cumpridas por organismos de direito público que agem na qualidade de autoridades públicas, não é aplicável, de forma que os referidos estabelecimentos são, em princípio, considerados sujeitos passivos na acepção desta directiva no que respeita ao contratos de investigação.

28 Sendo desenvolvidas a título oneroso e com base em contratos de prestação de serviços, estas actividades de investigação dos estabelecimentos públicos de ensino superior são prestações de serviços sujeitas a IVA, nos termos do artigo 2._ da Sexta Directiva. Esta disposição define a matéria colectável, ao precisar as actividades que, em princípio, estão sujeitas a IVA. A partir do momento em que as operações dos organismos de direito público não estejam incluídas no exercício da autoridade pública, a obrigação de os Estados-Membros sujeitarem a IVA essas operações decorre, por isso, directamente do artigo 2._ da Sexta Directiva.

29 Além disso, a isenção dos contratos de investigação dos estabelecimentos públicos de ensino superior não pode ser concedida ao abrigo do artigo 13._, A, da Sexta Directiva.

30 Com efeito, segundo jurisprudência assente do Tribunal de Justiça, resulta da economia da Sexta Directiva que os termos utilizados para designar as isenções referidas no seu artigo 13._, A, são de interpretação estrita. Esta disposição não isenta de IVA todas as actividades de interesse geral, mas apenas as que são enumeradas e descritas de forma muito pormenorizada pelo referido preceito (v. acórdãos de 12 de Novembro de 1998, Institute of the Motor Industry, C-149/97, Colect., p. I-7053, n.os 17 e 18, e de 14 de Setembro de 2000, D., C-384/98, Colect., p. I-6795, n.os 19 e 20).

31 Ora, o artigo 13._, A, n._ 1, alínea i), da Sexta Directiva não faz qualquer referência às actividades de investigação dos estabelecimentos públicos de ensino superior que estão isentos de IVA nos termos do § 4, n._ 21a, da UStG. Além disso, resulta da jurisprudência referida no número anterior que a definição de «prestações de serviços estreitamente conexas com o ensino universitário», na acepção do artigo 13._, A, n._ 1, alínea i), da Sexta Directiva, abrange as prestações de serviços ou as entregas de bens directamente necessárias ao ensino, tais como a colocação à disposição do material pedagógico. O facto de as actividades de investigação em benefício de pessoas privadas poderem ser úteis ao ensino não é suficiente, todavia, para provar a existência de uma relação jurídica entre este ensino e as actividades em causa tão estreita como a que exige a referida disposição.

32 Além disso, no que respeita ao argumento do Governo alemão de que a isenção em questão permite uma simplificação fiscal e evita as despesas administrativas, a Comissão recorda que, no que respeita aos termos da fórmula que inicia o artigo 13._, B, da Sexta Directiva, cuja redacção é idêntica à que introduz o artigo 13._, A, n._ 1, desta, o Tribunal de Justiça já decidiu que as condições das isenções fixadas pelos Estados-Membros não podem incidir sobre a definição do conteúdo das isenções previstas (v. acórdão de 28 de Março de 1996, Gemeente Emmen, C-468/93, Colect., p. I-1721, n._ 19).

33 O Governo alemão sustenta que a acção não tem fundamento, em primeiro lugar, porque o artigo 2._ da Sexta Directiva não constitui nem uma obrigação nem uma proibição. Esta disposição, ao precisar que as operações indicadas estão «sujeitas» a IVA, apenas contém uma definição da base de incidência do imposto, ou seja, do que é tributável («Steuerbarkeit»), e não uma definição da incidência subjectiva do imposto («Steuerpflichtigkeit») (v. acórdão de 29 de Junho de 1999, Cofeeshop «Siberië», C-158/98, Colect., p. I-3971, n.os 14, 21 e 23). Ora, não é possível infringir uma disposição que apenas contém uma mera definição. A sujeição das actividades mencionadas na referida disposição só é possível quando esta é interpretada em conjugação com o artigo 13._, A, da Sexta Directiva, que enumera os critérios das isenções previstas em benefício de certas actividades. Por conseguinte, a acusação formulada pela Comissão na sua petição não pode proceder.

34 Em segundo lugar, o Governo alemão sustenta que o recurso não é fundamentado, porque a isenção fiscal das actividades de investigação dos estabelecimentos de ensino superior se justifica à luz do artigo 13._, A, n._ 1, alínea i), da Sexta Directiva.

35 A este propósito, sustenta que a investigação constitui um serviço estreitamente conexo com o ensino nos estabelecimentos públicos de ensino superior. As actividades de investigação e de formação nestes estabelecimentos não podem separar-se. Estes últimos têm precisamente necessidade das actividades de investigação para efectuar as suas actividades de ensino, porque as actividades de ensino lhes permitem desenvolver e transmitir novos conhecimentos. Contrariamente ao que sustenta a Comissão, a colaboração entre os estabelecimento públicos de ensino superior e o mundo económico, no âmbito de actividades de investigação financiadas por fundos provenientes de terceiros, é não apenas útil ao ensino superior, mas absolutamente indispensável, da mesma forma que o material de ensino.

36 Com efeito, nos estabelecimentos de ensino superior, a formação não é uma ocupação científica desligada de qualquer finalidade, mas permite, antes de mais, adquirir uma qualificação com vista a exercer uma actividade profissional na economia, o que corresponde também ao objectivo dos estudos, tal como é definido no artigo 7._ da Hochschulrahmengesetz (lei-quadro dos estabelecimentos de ensino superior), de 9 de Abril de 1987 (BGBl. 1987 I, p. 1170), na sua versão de 19 de Janeiro de 1999 (BGBl. 1999 I, p. 18). No âmbito do seu trabalho quotidiano, os estabelecimentos de ensino superior não poderiam garantir a ligação exigida entre o ensino superior e a vida profissional se não mantivessem eles próprios tal ligação com esta. Por esta razão, não é possível renunciar à realização de projectos de investigação mediante contrato e em colaboração com os meios económicos.

37 Quanto ao objectivo da simplificação do pagamento do imposto, o Governo alemão afirma que o mesmo constitui não uma justificação das isenções, mas um aspecto suplementar que se evidenciou no quadro de um critério de isenção. Se um critério dessa natureza é aplicável, neste caso concreto o que consta do artigo 13._, A, n._ 1, alínea i), da Sexta Directiva, é lícito tomar em consideração as medidas de simplificação fiscal. A expressão «prestações de serviços e entregas de bens estreitamente conexas» devia, pois, também ser interpretada sob a perspectiva da simplificação fiscal. A este propósito, o Governo alemão menciona a estrita correlação entre a investigação e a formação, bem como a ineficácia e as complicações de ordem burocrática que implicaria a distinção entre os domínios sujeitos a IVA e os que estão isentos deste imposto nos estabelecimentos públicos de ensino superior.

Apreciação do Tribunal

38 Em primeiro lugar, deve recusar-se o argumento do Governo alemão de que o artigo 2._ da Sexta Directiva não contém uma definição da sujeição ao IVA. Com efeito, tal como lembrou o Tribunal de Justiça no seu acórdão de 21 de Fevereiro de 1989, Comissão/Itália (203/87, Colect., p. 371, n._ 2), esta disposição define as operações que devem ficar sujeitas ao IVA, ou seja, «as entregas de bens e as prestações de serviços, efectuadas a título oneroso, no território do país, por um sujeito passivo agindo nessa qualidade», bem como «as importações de bens».

39 A Sexta Directiva prevê isenções do IVA para determinadas categorias dessas operações, nomeadamente no título X, em que se integra o artigo 13._ Quando uma isenção não se encontra prevista na Sexta Directiva, constitui uma derrogação à regra geral do seu artigo 2._ Semelhante derrogação só pode ser compatível com o direito comunitário se for autorizada nos termos da referida directiva (v., neste sentido, acórdão de 21 de Fevereiro de 1989, Comissão/Itália, já referido, n._ 10).

40 Por conseguinte, uma legislação nacional que exonera certas operações do IVA, que não é abrangida por uma isenção prevista pela Sexta Directiva nem autorizada em conformidade com uma derrogação prevista por esta, constitui uma infracção ao artigo 2._ da mesma directiva.

41 Em segundo lugar, deve observar-se que o Governo alemão não contesta que, quando exercem as actividades de investigação em causa no presente processo, os estabelecimentos públicos de ensino superior devem, em princípio, ser considerados sujeitos passivos na acepção do artigo 4._, n._ 1, da Sexta Directiva e também não sustenta que o n._ 5 desta disposição seja aplicável a tais actividades.

42 Daí resulta que o litígio se refere exclusivamente à questão de saber se as actividades de investigação exercidas a título oneroso por estabelecimentos públicos de ensino superior constituem prestações de serviços «estreitamente conexas» com o ensino universitário, na acepção do artigo 13._, A, n._ 1, alínea i), da Sexta Directiva, e que devem enquanto tais ser isentas de IVA por força dessa disposição.

43 A este propósito, cabe recordar que os termos utilizados para designar as isenções visadas pelo artigo 13._ da Sexta Directiva são de interpretação estrita, dado que constituem derrogações ao princípio geral segundo o qual o IVA é cobrado sobre qualquer prestação de serviços efectuada a título oneroso por um sujeito passivo (v., nomeadamente, acórdão de 15 de Junho de 1989, Stichting Uitvoering Financiële Acties, 348/87, Colect., p. 1737, n._ 13, bem como os acórdãos já referidos Institute of the Motor Industry, n._ 17, e D., n._ 15).

44 É jurisprudência assente que as referidas isenções constituem noções autónomas do direito comunitário que têm como objectivo evitar divergências na aplicação do regime do IVA de um Estado-Membro para outro (v., nomeadamente, acórdãos de 25 de Fevereiro de 1999, CPP, C-349/96, Colect., p. I-973, n._ 15, e de 8 de Março de 2001, Skandia, C-240/99, Colect., p. I-1951, n._ 23).

45 Há que recordar além disso que o artigo 13._, A, da Sexta Directiva tem por objectivo isentar do IVA certas actividades de interesse geral. Esta disposição não exclui, porém, todas as actividades de interesse geral, mas apenas as que nela são enumeradas e descritas de maneira muito detalhada (v., nomeadamente, acórdão Institute of the Motor Industry, já referido, n._ 18).

46 Deve igualmente concluir-se que o artigo 13, A, n._ 1, alínea i), da Sexta Directiva não contém qualquer definição do conceito de prestação de serviços «estreitamente conexas» com o ensino universitário.

47 Esta noção não requer, porém, uma interpretação particularmente estrita, na medida em que a isenção das prestações de serviços estreitamente conexas com o ensino universitário se destina a garantir que o benefício deste não se torne inacessível em razão do acréscimo de custos deste ensino se ele próprio, ou as prestações de serviços e as entregas de bens com ele estreitamente conexas, fosse sujeito a IVA (v., por analogia, no que respeita ao artigo 13._, A, n._ 1, alínea b), da Sexta Directiva, acórdão de 11 de Janeiro de 2001, Comissão/França, C-76/99, Colect., p. I-249, n._ 23). Todavia, sujeitar ao IVA a realização a título oneroso de projectos de investigação por estabelecimentos públicos de ensino superior não tem como efeito aumentar os custos do ensino universitário.

48 Além disso, contrariamente ao que sustenta o Governo alemão, embora a realização desses projectos possa ser considerada muito útil para o ensino universitário, não é indispensável para atingir o objectivo visado por este, a saber, nomeadamente, a formação dos estudantes para lhes permitir exercerem uma actividade profissional. Com efeito, é forçoso reconhecer que muitos estabelecimentos de ensino universitário atingem este objectivo sem efectuarem projectos de investigação a título oneroso e que existem outras formas de garantir a existência de uma relação entre o ensino universitário e a vida profissional.

49 Por conseguinte, a realização de projectos de investigação a título oneroso por estabelecimentos públicos de ensino superior não pode ser considerada uma actividade estreitamente conexa com o ensino universitário na acepção do artigo 13._, A, n._ 1, alínea i), da Sexta Directiva.

50 No que respeita ao argumento da simplificação do pagamento do IVA utilizado pelo Governo alemão, deve recordar-se que, segundo jurisprudência assente, embora, nos termos da frase que inicia o artigo 13._, A, n._ 1, da Sexta Directiva, os Estados-Membros fixem as condições de isenção a fim de assegurar a sua aplicação correcta e simples e de prevenir as fraudes, a evasão e os eventuais abusos, tais condições não podem respeitar à definição do conteúdo das isenções previstas (v., nomeadamente, acórdãos de 7 de Maio de 1998, Comissão/Espanha, C-124/96, Colect., p. I-2501, n.os 11 e 12, e de 11 de Janeiro de 2001, Comissão/França, já referido, n._ 26).

51 Por conseguinte, numa situação como a do caso vertente, em que a regulamentação nacional em questão não satisfaz os critérios da isenção prevista no artigo 13._, A, n._ 1, alínea i), da Sexta Directiva, o facto de constituir uma medida de simplificação fiscal não tem qualquer pertinência.

52 Deve, pois, concluir-se que, ao isentar do IVA as actividades de investigação exercidas a título oneroso por estabelecimentos públicos de ensino superior, em conformidade com o § 4, n._ 21a, da UStG, a República Federal da Alemanha não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 2._ da Sexta Directiva.

Decisão sobre as despesas


Quanto às despesas

53 Por força do disposto no n._ 2 do artigo 69._ do Regulamento de Processo, a parte vencida é condenada nas despesas, se tal tiver sido requerido. Tendo a Comissão requerido a condenação da República Federal da Alemanha e tendo esta sido vencida, há que condená-la nas despesas.

Parte decisória


Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA

(Quinta Secção)

decide:

1) Ao isentar do imposto sobre o valor acrescentado as actividades de investigação exercidas a título oneroso por estabelecimentos públicos de ensino superior, em conformidade com o § 4, n._ 21a, da Umsatzsteuergesetz (lei relativa ao imposto sobre o volume de negócios), de 27 de Abril de 1993, na redacção que lhe foi dada pelo § 4, n._ 5, da Umsatzsteuergesetz-Änderungsgesetz, de 12 de Dezembro de 1996, a República Federal da Alemanha não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 2._ da Sexta Directiva 77/388/CEE do Conselho, de 17 de Maio de 1977, relativa à harmonização das legislações dos Estados-Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios - Sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado: matéria colectável uniforme.

2) A República Federal da Alemanha é condenada nas despesas.