C-152/02 - Terra Baubedarf-Handel

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Arrêt de la Cour

Processo C-152/02


Terra Baubedarf-Handel GmbH
contra
Finanzamt Osterholz-Scharmbeck



(pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Bundesfinanzhof)

«Sexta Directiva IVA – Artigos 17.°, n.° 1, e 18.°, n.os 1 e 2 – Direito à dedução do IVA a montante – Condições de exercício»

Conclusões da advogada-geral C. Stix-Hackl apresentadas em 16 de Outubro de 2003
    
Acórdão do Tribunal de Justiça (Quinta Secção) de 29 de Abril de 2004
    

Sumário do acórdão

Disposições fiscais – Harmonização das legislações – Impostos sobre o volume de negócios – Sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado – Dedução do imposto pago a montante – Exercício do direito à dedução – Período de declaração relevante – Período que preenche as condições relativas simultaneamente à entrega dos bens ou à prestação dos serviços e à posse de uma factura

[Directiva 77/388 do Conselho, artigos 17.°, n.° 2, alínea a), e 18.°, n.° 2, primeiro parágrafo] Relativamente à dedução a que se refere o artigo 17.°, n.° 2, alínea a), da Sexta Directiva 77/388, relativa à harmonização das legislações dos Estados Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios, o artigo 18.°, n.° 2, primeiro parágrafo, desse diploma deve ser interpretado no sentido de que o direito à dedução deve ser exercido a título do período de declaração em que estão preenchidas as duas condições impostas por essa disposição, ou seja, que a entrega dos bens ou a prestação de serviços tenha sido efectuada e que o sujeito passivo esteja na posse da factura ou do documento que, de acordo com os critérios fixados pelo Estado Membro em causa, a pode substituir.

(cf. n.° 38, disp.)




ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quinta Secção)
29 de Abril de 2004(1)

«Sexta Directiva IVA – Artigos 17.°, n.° 1, e 18.°, n.os 1 e 2 – Direito à dedução do IVA a montante – Condições de exercício»

No processo C-152/02,

que tem por objecto um pedido dirigido ao Tribunal de Justiça, nos termos do artigo 234.° CE, pelo Bundesfinanzhof (Alemanha), destinado a obter, no litígio pendente neste órgão jurisdicional entre

Terra Baubedarf-Handel GmbH

e

Finanzamt Osterholz-Scharmbeck,

uma decisão a título prejudicial sobre a interpretação dos artigos 17.° e 18.° da Sexta Directiva 77/388/CEE do Conselho, de 17 de Maio de 1977, relativa à harmonização das legislações dos Estados-Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios – Sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado: matéria colectável uniforme (JO L 145, p. 1; EE 09 F1 p. 54),

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quinta Secção),,



composto por: P. Jann, exercendo funções de presidente da Quinta Secção, C. W. A. Timmermans, A. Rosas, A. La Pergola e S. von Bahr (relator), juízes,

advogada-geral: C. Stix-Hackl,
secretário: M. Múgica Arzamendi, administradora principal,

vistas as observações escritas apresentadas:

em representação da Terra Baubedarf-Handel GmbH, por H.-G. Fajen e A. C. Stange, Rechtsanwälte,

em representação do Governo alemão, por W.-D. Plessing e M. Lumma, na qualidade de agentes,

em representação do Governo francês, por F. Alabrune, G. de Bergues e P. Boussaroque, na qualidade de agentes,

em representação da Comissão das Comunidades Europeias, por E. Traversa e K. Gross, na qualidade de agentes,

ouvidas as alegações da Terra Baubedarf-Handel GmbH e da Comissão, na audiência de 18 de Setembro de 2003,

ouvidas as conclusões da advogada-geral apresentadas na audiência de 16 de Outubro de 2003,

profere o presente



Acórdão



1
Por decisão de 21 de Março de 2002, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 26 de Abril seguinte, o Bundesfinanzhof submeteu, nos termos do artigo 234.° CE, uma questão prejudicial relativa à interpretação dos artigos 17.° e 18.° da Sexta Directiva 77/388/CEE do Conselho, de 17 de Maio de 1977, relativa à harmonização das legislações dos Estados‑Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios – Sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado: matéria colectável uniforme (JO L 145, p. 1; EE 09 F1 p. 54; a seguir «Sexta Directiva»).

2
Esta questão foi suscitada no quadro de um litígio que opõe a Terra Baubedarf‑Handel GmbH (a seguir «Terra Baubedarf») ao Finanzamt Osterholz‑Scharmbeck (a seguir «Finanzamt»), a propósito da recusa de este último aceitar a dedução, relativa ao ano de 1999, do imposto sobre o valor acrescentado (a seguir «IVA») efectuada pela Terra Baubedarf a título dos serviços que lhe haviam sido prestados ao longo desse ano e relativamente aos quais as facturas tinham sido emitidas no mês de Dezembro desse mesmo ano, embora só as tivesse recebido no mês de Janeiro de 2000.


Enquadramento jurídico

A regulamentação comunitária

3
A Sexta Directiva prevê, no artigo 10.°, n.° 2, primeiro parágrafo, primeiro período:

«O facto gerador do imposto ocorre, e o imposto é exigível, no momento em que se efectuam a entrega do bem ou a prestação de serviços. […]»

4
O artigo 17.°, n.os 1 e 2, alínea a), da Sexta Directiva dispõe:

«1.     O direito à dedução surge no momento em que o imposto dedutível se torna exigível.

2.       Desde que os bens e os serviços sejam utilizados para os fins das próprias operações tributáveis, o sujeito passivo está autorizado a deduzir do imposto de que é devedor:

a)
O imposto sobre o valor acrescentado devido ou pago [dentro do país] em relação a bens que lhe tenham sido fornecidos ou que lhe devam ser fornecidos e a serviços que lhe tenham sido prestados ou que lhe devam ser prestados por outro sujeito passivo;»

5
O artigo 18.°, n.os 1 e 2, da Sexta Directiva estabelece:

«1.     Para poder exercer o direito à dedução, o sujeito passivo deve:

a)
Relativamente à dedução prevista no n.° 2, alínea a), do artigo 17.°, possuir uma factura emitida nos termos do n.° 3 do artigo 22.°;

[...]

2.       O sujeito passivo efectuará a dedução subtraindo do montante total do imposto devido num determinado período fiscal o montante do imposto em relação ao qual, durante o mesmo período, o direito à dedução surge e é exercido por força do n.° 1.

[…]»

6
Nos termos do artigo 22.°, n.° 3, da Sexta Directiva:

«3.a)
Os sujeitos passivos devem emitir uma factura ou um documento que a substitua, em relação à entrega de bens e às prestações de serviços que efectuem a outro sujeito passivo, e conservar um duplicado de todos os documentos emitidos.

[...]

b)
A factura deve mencionar claramente o preço líquido de imposto e o imposto correspondente a cada taxa diferente e, se for o caso, a isenção;

c)
Os Estados‑Membros estabelecerão os critérios segundo os quais um documento pode servir de factura.»

A regulamentação nacional

7
O § 15, n.° 1, ponto 1, da Umsatzsteuergesetz 1999 (Lei de 1999, relativa ao imposto sobre o volume de negócios, BGBl. 1999 I, p. 1270, a seguir «UStG»), estabelece:

«O empresário pode deduzir os seguintes impostos:

1.
O imposto respeitante a entregas de bens ou a outras prestações de serviços efectuadas por outro empresário para utilização na sua empresa, especificamente mencionado nas facturas a que se refere o § 14. Se o montante do imposto especificamente mencionado se referir a um pagamento prévio à execução das referidas operações, é dedutível a partir do momento em que se disponha da factura e se efectue o pagamento.»

8
Nos termos da secção 192, n.° 2, quarto período, das Umsatzsteuer‑Richtlinien 2000 (orientações relativas ao imposto sobre o volume de negócios para o ano de 2000, na versão publicada em 10 de Dezembro de 1999, BStBl. I, número especial 2/1999, a seguir «UStR»):

«Quando a prestação e a recepção da factura ocorrem em períodos distintos, a dedução apenas é autorizada relativamente ao período fiscal em que se verifiquem pela primeira vez ambos os pressupostos.»


O litígio no processo principal e a questão prejudicial

9
Do despacho de reenvio resulta que a Terra Baubedarf, empresa alemã que comercializa materiais de construção, foi beneficiária de prestações de serviços ao longo do ano de 1999. Todavia, as facturas correspondentes a esses serviços, embora emitidas durante o mês de Dezembro do mesmo ano, só chegaram a essa empresa em Janeiro de 2000.

10
O Finanzamt não aceitou a dedução do IVA que a Terra Baubedarf efectuou relativamente ao ano de 1999 a título dos referidos serviços, pois, nos termos do § 15, n.° 1, ponto 1, da UStG e da secção 192, n.° 2, quarto período, das UStR, o direito à dedução só podia ser exercido, neste caso, a título do ano de 2000, ano de recepção da factura correspondente.

11
A reclamação e o recurso que se seguiu, apresentados pela Terra Baubedarf no Niedersächsisches Finanzgericht (Alemanha), não foram acolhidos, tendo este órgão jurisdicional confirmado a posição do Finanzamt.

12
A Terra Baubedarf interpôs então recurso de revista dessa decisão para o Bundesfinanzhof, sustentando que o seu direito à dedução do IVA pago a montante tinha sofrido uma limitação no tempo em violação da Sexta Directiva.

13
O Bundesfinanzhof observa que, nos termos da jurisprudência do Tribunal de Justiça, o direito à dedução da Terra Baubedarf surgiu em 1999, em conformidade com o artigo 17.° da Sexta Directiva, e que, nos termos do artigo 18.° desse mesmo diploma, esse direito só podia ser exercido em 2000, após recepção da factura (v., designadamente, acórdão de 5 de Dezembro de 1996, Reisdorf, C‑85/95, Colect., p. I‑6257, n.° 22).

14
Todavia, o órgão jurisdicional de reenvio interroga‑se sobre se esse direito à dedução pode ou deve ser invocado e produzir os seus efeitos a partir do exercício fiscal de 1999. Com efeito, o artigo 18.°, n.° 1, alínea a), da Sexta Directiva pode ser interpretado no sentido de que apenas regula os pressupostos do exercício do direito à dedução, nada estabelecendo sobre o período fiscal em que se pode ou deve invocar a dedução.

15
Nestas circunstâncias, o Bundesfinanzhof decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça a seguinte questão prejudicial:

«O sujeito passivo da obrigação tributária só pode exercer o direito à dedução relativamente ao ano civil em que possui a factura, de acordo com o artigo 18.°, n.° 1, alínea a), da Directiva 77/388/CEE, ou pode ainda exercer o direito à dedução (mesmo retroactivamente) relativa ao ano civil em que surge o direito à dedução, nos termos do artigo 17.°, n.° 1, da Directiva 77/388/CEE?»


Quanto à questão prejudicial

16
Através da sua questão prejudicial, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se, no que respeita à dedução a que se refere o artigo 17.°, n.° 2, alínea a), da Sexta Directiva, o artigo 18.°, n.° 2, primeiro parágrafo, desse mesmo diploma deve ser interpretado no sentido de que o direito à dedução deve ser exercido a título do período de declaração em que estão preenchidas as duas condições impostas por essa disposição, ou seja, que o direito à dedução tenha surgido e que o sujeito passivo possua uma factura emitida nos termos do artigo 22.°, n.° 3, da referida directiva.

Observações apresentadas ao Tribunal de Justiça

17
A Terra Baubedarf sustenta que o direito de deduzir o IVA pago a montante, nos termos do artigo 18.°, n.° 1, da Sexta Directiva, produz os seus efeitos durante o exercício fiscal em que esse direito surgiu, em conformidade com o artigo 17.°, n.° 1, da referida directiva, interpretado em conjugação com o artigo 10.°, n.° 2, desse mesmo diploma.

18
Esta interpretação é confirmada pelo artigo 18.°, n.° 2, da Sexta Directiva, disposição de aplicação da tributação que apenas visa o surgimento do direito à dedução. O exercício é, em seguida, fixado no «mesmo período».

19
Esta dedução imediata, que faz surgir em paralelo o imposto e o direito à dedução, reflecte o princípio da neutralidade. Tecnicamente, quando a factura é recebida após o período de tributação, a dedução imediata só pode ser assegurada através da retroacção do exercício do direito à dedução.

20
Além disso, as medidas que sujeitam o exercício do direito à dedução a condições complementares para garantir a cobrança do IVA, ou seja, a posse de uma factura (v. acórdão de 14 de Julho de 1988, Jeunehomme e EGI, 123/87 e 330/87, Colect., p. 4517), só estão em conformidade com o princípio da proporcionalidade se tivessem efeitos retroactivos.

21
O Governo alemão e a Comissão das Comunidades Europeias recordam que a versão alemã do artigo 18.°, n.° 2, primeiro parágrafo, da Sexta Directiva tem a seguinte redacção:

«Der Vorsteuerabzug wird vom Steuerpflichtigen global vorgenommen, indem er von dem Steuerbetrag, den er für einen Erklärungszeitraum schuldet, den Betrag der Steuer absetzt, für die das Abzugsrecht entstanden ist und wird nach Absatz 1 während des gleichen Zeitraums ausgeuebt.»

22
Sublinham que, no que respeita às modalidades de exercício do direito à dedução, esta versão não permite chegar a uma conclusão precisa sobre se o período relativamente ao qual o direito à dedução pode ser invocado significa o período durante o qual surgiu o direito à dedução ou o período durante o qual, para além do direito à dedução, estavam preenchidas as condições indicadas no n.° 1 do referido artigo. Todavia, outras versões linguísticas permitem compreender sem ambiguidade esta disposição.

23
O Governo alemão considera que resulta da interpretação literal comparada, em especial, das versões francesa e inglesa do artigo 18.°, n.° 2, primeiro parágrafo, da Sexta Directiva que o sujeito passivo apenas pode exercer o direito à dedução relativamente ao período fiscal em que já possui a factura exigida pelo n.° 1, alínea a), desse artigo. A este respeito, recordo a redacção das versões francesa e inglesa do referido artigo 18.°, n.° 2, primeiro parágrafo:

«La déduction est opérée globalement par l’assujetti par imputation, sur le montant de la taxe due pour une période de déclaration, du montant de la taxe pour laquelle le droit à déduction a pris naissance et est exercé en vertu du paragraphe 1, au cours de la même période» (versão francesa).

«The taxable person shall effect the deduction by subtracting from the total amount of value added tax due for a given tax period the total amount of the tax in respect of which, during the same period, the right to deduct has arisen and can be exercised under the provisions of paragraph 1» (versão inglesa).

24
Além disso, o direito à dedução retroactiva implica uma sobrecarga de trabalho importante tanto para os sujeitos passivos como para as autoridades fiscais. Ao fazer retroagir a dedução do IVA a montante, as declarações provisórias apresentadas para um período de declaração deveriam, com efeito, ser rectificadas – em certas circunstâncias, mesmo diversas vezes no mesmo período de declaração – e as autoridades fiscais deveriam emitir avisos rectificativos.

25
Em contrapartida, a interpretação defendida pelo Governo alemão garante um regime de IVA eficazmente aplicável e controlável no que respeita à dedução do IVA a montante.

26
A Comissão refere, para além das versões francesa e inglesa, as versões italiana e neerlandesa. Delas decorre que o período em causa é determinado pela existência cumulativa do surgimento do direito à dedução e da posse da factura.

27
Segundo a Comissão, esta conclusão é objectiva. O artigo 18.°, n.° 1, da Sexta Directiva garante uma aplicação correcta do regime do IVA. Ao fazer depender o período relativamente ao qual o direito à dedução pode ser invocado da posse simultânea da factura, evita‑se que o direito à dedução seja de outro modo invocado de forma necessariamente retroactiva.

28
O Governo francês sublinha que a factura desempenha a função de justificação dos direitos e obrigações do sujeito passivo em matéria de IVA, ao mesmo tempo que permite garantir a cobrança do IVA e o seu controlo pela Administração Fiscal, designadamente na perspectiva do direito à dedução (v. acórdãos Reisdorf, já referido, n.° 29, e de 17 de Setembro de 1997, Langhorst, C‑141/96, Colect., p. I‑5073, n.os 17 e 21).

29
Admitir sistematicamente que o direito à dedução possa estar ligado ao período de tributação ao abrigo do qual surgiu o direito à dedução, independentemente da data em que o sujeito passivo entra na posse efectiva da factura, comporta um risco importante para o seguimento, por cada Estado‑Membro, dos elementos que figuram nas declarações do IVA.

Apreciação do Tribunal de Justiça

30
Cabe sublinhar, antes de mais, que o artigo 18.° da Sexta Directiva é relativo às condições de exercício do direito à dedução, ao passo que a existência deste direito é disciplinada no artigo 17.° da referida directiva (v. acórdão de 8 de Novembro de 2001, Comissão/Países Baixos, C‑338/98, Colect., p. I‑8265, n.° 71).

31
Resulta do artigo 17.°, n.° 1, da Sexta Directiva que o direito à dedução surge no momento em que o imposto dedutível se torna exigível. Em conformidade com o artigo 10.°, n.° 2, desta directiva, é este o caso desde que a entrega de bens ou a prestação de serviços seja efectuada (v. acórdão de 8 de Junho de 2000, Breitsohl, C‑400/98, Colect., p. I‑4321, n.° 36).

32
Em contrapartida, resulta da leitura conjugada dos artigos 18.°, n.° 1, alínea a), e 22.°, n.° 3, da Sexta Directiva que o exercício do direito à dedução, a que se refere o artigo 17.°, n.° 2, alínea a), do mesmo diploma, está normalmente ligado à posse do original da factura ou do documento que, segundo os critérios estabelecidos pelo Estado‑Membro em causa, a pode substituir (acórdão Reisdorf, já referido, n.° 22).

33
Quanto ao período de declaração ao abrigo do qual essa dedução deve ser efectuada, importa observar que, como o Governo alemão e a Comissão sublinharam, a versão alemã do artigo 18.°, n.° 2, primeiro parágrafo, da Sexta Directiva não permite determinar com exactidão se o período relativamente ao qual o direito à dedução pode ser invocado é o período durante o qual surgiu o direito à dedução ou o período durante o qual estão preenchidas as condições de posse da factura e do direito à dedução.

34
Todavia, embora a versão alemã da referida disposição seja ambígua a este respeito, das versões francesa e inglesa da Sexta Directiva resulta, designadamente, que a dedução a que se refere o artigo 17.°, n.° 2, desta última deve ser efectuada ao abrigo do período de declaração durante o qual estão preenchidas as duas condições impostas pelo artigo 18.°, n.° 2, primeiro parágrafo, dessa mesma directiva. Noutros termos, a entrega dos bens ou a prestação de serviços deve ter sido efectuada e o sujeito passivo deve estar na posse da factura ou do documento que, de acordo com os critérios fixados pelo Estado‑Membro em causa, a pode substituir.

35
Esta interpretação está em conformidade com a jurisprudência constante segundo a qual o direito à dedução previsto nos artigos 17.° e seguintes da Sexta Directiva, que faz parte integrante do mecanismo do IVA e não pode, em princípio, ser limitado, se exerce imediatamente em relação à totalidade dos impostos que incidiram sobre as operações efectuadas a montante (v., designadamente, acórdãos de 11 de Julho de 1991, Lennartz, C‑97/90, Colect., p. I‑3795, n.° 27, e de 8 de Janeiro de 2002, Metropol e Stadler, C‑409/99, Colect., p. I‑81, n.° 42). O exercício desse direito à dedução pressupõe que, em princípio, os sujeitos passivos não efectuem pagamentos e, portanto, não liquidem o IVA a montante antes de terem recebido uma factura, ou um documento que a substitua, e que não se pode considerar que o IVA onera uma determinada operação antes da sua liquidação.

36
A referida interpretação também está em conformidade com o princípio da neutralidade do IVA que, segundo a jurisprudência, é preservado quando o regime de dedução instituído pelo título XI da Sexta Directiva permite aos elos intermédios da cadeia de distribuição deduzirem à sua própria matéria colectável os montantes pagos por cada um ao respectivo fornecedor a título de IVA sobre a correspondente operação e restituírem assim à Administração Fiscal a parte do IVA correspondente à diferença entre o preço pago por cada um ao respectivo fornecedor e o preço a que a mercadoria foi entregue ao comprador (v. acórdão de 24 de Outubro de 1996, Elida Gibbs, C‑317/94, Colect., p. I‑5339, n.° 33, e de 15 de Outubro de 2002, Comissão/Alemanha, C‑427/98, Colect., p. I‑8315, n.° 42).

37
No que respeita ao princípio da proporcionalidade, não se verifica qualquer infracção a este princípio pelo facto de se exigir que o sujeito passivo efectue a dedução do IVA a montante a título do período de declaração durante o qual estão preenchidas a condição da posse da factura ou de um documento que a substitua e a do surgimento do direito à dedução. Com efeito, por um lado, esta exigência está em conformidade com um dos objectivos prosseguidos pela Sexta Directiva, que é garantir a cobrança do IVA e o seu controlo pela Administração Fiscal (v. acórdãos, já referidos, Reisdorf, n.° 24, e Langhorst, n.° 17), e, por outro, como se observou no n.° 35 do presente acórdão, o pagamento de um fornecimento de bens ou de uma prestação de serviços e, portanto a liquidação do IVA a montante, não se faz normalmente antes da recepção de uma factura.

38
Assim, importa responder à questão prejudicial que, relativamente à dedução a que se refere o artigo 17.°, n.° 2, alínea a), da Sexta Directiva, o artigo 18.°, n.° 2, primeiro parágrafo, desse diploma deve ser interpretado no sentido de que o direito à dedução deve ser exercido a título do período de declaração em que estão preenchidas as duas condições impostas por essa disposição, ou seja, que a entrega dos bens ou a prestação de serviços tenha sido efectuada e que o sujeito passivo esteja na posse da factura ou do documento que, de acordo com os critérios fixados pelo Estado‑Membro em causa, a pode substituir.


Quanto às despesas

39
As despesas efectuadas pelos Governos alemão e francês, bem como pela Comissão, que apresentaram observações ao Tribunal, não são reembolsáveis. Revestindo o processo quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional nacional, compete a este decidir quanto às despesas.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quinta Secção),

pronunciando‑se sobre a questão submetida pelo Bundesfinanzhof, por decisão de 21 de Março de 2002, declara:

Relativamente à dedução a que se refere o artigo 17.°, n.° 2, alínea a), da Sexta Directiva 77/388/CEE do Conselho, de 17 de Maio de 1977, relativa à harmonização das legislações dos Estados‑Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios – Sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado: matéria colectável uniforme, o artigo 18.°, n.° 2, primeiro parágrafo, desse diploma deve ser interpretado no sentido de que o direito à dedução deve ser exercido a título do período de declaração em que estão preenchidas as duas condições impostas por essa disposição, ou seja, que a entrega dos bens ou a prestação de serviços tenha sido efectuada e que o sujeito passivo esteja na posse da factura ou do documento que, de acordo com os critérios fixados pelo Estado‑Membro em causa, a pode substituir.

Jann

Timmermans

Rosas

La Pergola

von Bahr

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 29 de Abril de 2004.

O secretário

O presidente

R. Grass

V. Skouris


1
Língua do processo: alemão.