Skatteministeriet e Skatteministeriet contra Fonden Marselisborg Lystbådehavn
(pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Vestre Landsret)
«Sexta Directiva IVA – Artigo 13.°, B, alínea b) – Isenções – Locação de bens imóveis – Locação de lugares para o estacionamento de veículos – Lugares para embarcações na água – Recolha de embarcações em terra»
Conclusões da advogada‑geral J. Kokott apresentadas em 14 de Outubro de 2004
Acórdão do Tribunal de Justiça (Terceira Secção) de 3 de Março de 2005
Sumário do acórdão
1. Disposições fiscais – Harmonização das legislações – Impostos sobre o volume de negócios – Sistema comum do imposto sobre
o valor acrescentado – Isenções previstas pela Sexta Directiva – Isenção da locação de bens imóveis – Conceito – Locação de
lugares para embarcações na água e em terra
[Directiva 77/388 do Conselho, artigo 13.°, B, alínea b)]
2. Disposições fiscais – Harmonização das legislações – Impostos sobre o volume de negócios – Sistema comum do imposto sobre
o valor acrescentado – Isenções previstas pela Sexta Directiva – Isenção da locação de bens imóveis – Excepção referente à
locação de lugares destinados ao estacionamento de veículos – Conceito de veículos – Todos os meios de transporte, incluindo
as embarcações
[Directiva 77/388 do Conselho, artigo 13.°, B, alínea b, ponto 2)]
1. O artigo 13.°, B, alínea b), da Sexta Directiva 77/388, relativa à harmonização das legislações dos Estados‑Membros respeitantes
aos impostos sobre o volume de negócios, alterada pela Directiva 92/111, deve ser interpretado no sentido de que o conceito
de locação de bens imóveis engloba a locação de lugares destinados à amarração de embarcações na água, bem como de lugares
para a recolha dessas embarcações em terra, na área portuária.
No que se refere especialmente aos primeiros, um lugar numa doca obedece à definição de bem imóvel na acepção da disposição
em causa, na medida em que a locação não incide sobre uma área de água qualquer, mas sobre uma porção determinada da referida
doca, que está delimitada de forma permanente e não pode ser deslocada.
(cf. n.os 34‑36, disp. 1)
2. O artigo 13.°, B, alínea b), ponto 2, da Sexta Directiva 77/388, relativa à harmonização das legislações dos Estados‑Membros
respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios, alterada pela Directiva 92/111, que exclui da excepção à sujeição ao
imposto sobre o valor acrescentado a locação de lugares para o estacionamento de veículos, deve ser interpretado no sentido
de que o conceito de «veículos», utilizado nessa disposição, engloba todos os meios de transporte, incluindo as embarcações.
(cf. n.os 44, 46, 47, disp. 2)
ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Terceira Secção) 3 de Março de 2005(1)
«Sexta Directiva IVA – Artigo 13.°, B, alínea b) – Isenções – Locação de bens imóveis – Locação de áreas destinadas ao estacionamento de veículos – Lugares para embarcações na água – Recolha de embarcações em terra»
No processo C‑428/02,
que tem por objecto um pedido dirigido ao Tribunal de Justiça nos termos do artigo 234.° CE, apresentado pelo Vestre Landsret
(Dinamarca), por decisão de 15 de Novembro de 2002, entrado no Tribunal de Justiça em 26 de Novembro de 2002, no processo
Fonden Marselisborg Lystbådehavn contra Skatteministeriet ,
e
Skatteministeriet contra Fonden Marselisborg Lystbådehavn,
O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Terceira Secção),,
composto por: A. Rosas, presidente de secção, A. Borg Barthet, J.‑P. Puissochet, J. Malenovský e U. Lõhmus (relator), juízes,
advogada‑geral: J. Kokott, secretário: H. von Holstein, secretário adjunto,
vistos os autos e após a audiência de 23 de Setembro de 2004, vistas as observações escritas apresentadas:
–
em representação do Fonden Marselisborg Lystbådehavn, por L. Henriksen e M. Andersen, advokaterne,
–
em representação do Skatteministeriet e do Governo dinamarquês, por J. Molde, na qualidade de agente, assistido por P. Biering,
advokat,
–
em representação do Governo grego, por M. Apessos e K. Georgiadis, na qualidade de agentes,
–
em representação da Comissão das Comunidades Europeias, por E. Traversa e T. Fich, na qualidade de agentes,
ouvidas as conclusões da advogada‑geral apresentadas na audiência de 14 de Outubro de 2004,
profere o presente
Acórdão
1
O pedido de decisão prejudicial incide sobre a interpretação do artigo 13.°, B, alínea b), da Sexta Directiva 77/388/CEE do
Conselho, de 17 de Maio de 1977, relativa à harmonização das legislações dos Estados‑Membros respeitantes aos impostos sobre
o volume de negócios – Sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado: matéria colectável uniforme (JO L 145, p. 1; EE 09 F1 p. 54),
alterada pela Directiva 92/111/CEE do Conselho, de 14 de Dezembro de 1992 (JO L 384, p. 47, a seguir «Sexta Directiva»).
2
Este pedido foi apresentado no âmbito de dois litígios que opõem, respectivamente, o Fonden Marselisborg Lystbådehavn [Fundo
do porto de recreio de Marselisborg (Dinamarca), a seguir «FML»] ao Skatteministeriet (Ministério dos Impostos dinamarquês)
e este último ao FML, relativamente à sujeição ao imposto sobre o valor acrescentado (a seguir «IVA») das operações de locação,
num porto de recreio, de lugares na água, bem como de lugares para recolha em terra, no Inverno, destinados a embarcações
de recreio.
Quadro jurídico
Regulamentação comunitária
3
De acordo com o seu décimo primeiro considerando, a Sexta Directiva procura, designadamente, estabelecer uma lista comum de
isenções de IVA, a fim de que os recursos próprios sejam cobrados de modo uniforme em todos os Estados‑Membros.
4
O artigo 2.°, n.° 1, da Sexta Directiva sujeita a IVA «[a]s entregas de bens e as prestações de serviços, efectuadas a título
oneroso, no território do país, por um sujeito passivo agindo nessa qualidade;».
5
O artigo 4.°, n. os 1 e 2, da Sexta Directiva prevê:
«1. Por ‘sujeito passivo’ entende‑se qualquer pessoa que exerça, de modo independente, em qualquer lugar, uma das actividades
económicas referidas no n.° 2, independentemente do fim ou do resultado dessa actividade.
2. As actividades económicas referidas no n.° 1 são todas as actividades de produção, de comercialização ou de prestação de serviços,
incluindo as actividades extractivas, agrícolas e as das profissões liberais ou equiparadas. A exploração de um bem corpóreo
ou incorpóreo com o fim de auferir receitas com carácter de permanência é igualmente considerada uma actividade económica.»
6
O artigo 13.°, B, alínea b), da Sexta Directiva, que figura no título X da mesma, sob a epígrafe «Isenções», dispõe:
«Sem prejuízo de outras disposições comunitárias, os Estados‑Membros isentarão, nas condições por eles fixadas com o fim de
assegurar a aplicação correcta e simples das isenções a seguir enunciadas e de evitar qualquer possível fraude, evasão e abuso:
[…]
b)
A locação de bens imóveis, com excepção:
1.
Das operações de alojamento, tal como são definidas na legislação dos Estados‑Membros, realizadas no âmbito do sector hoteleiro
ou de sectores com funções análogas, incluindo as locações de campos de férias ou de terrenos para campismo;
2.
Da locação de áreas destinadas ao estacionamento de veículos;
3.
Da locação de equipamento e maquinaria de instalação fixa;
4.
Da locação de cofres‑fortes.
Os Estados‑Membros podem prever outras excepções ao âmbito de aplicação desta isenção;
[…]»
Legislação nacional
7
O artigo 13.°, n.° 1, ponto 8, da momsloven (lei do IVA) dispõe:
«Estão isentas de IVA as seguintes mercadorias e prestações de serviços:
[…]
8)
A gestão e a locação de bens imóveis, incluindo o fornecimento de gás, água, electricidade e aquecimento no âmbito da locação.
Contudo, a isenção não abrange a locação de apartamentos em hotéis ou estabelecimentos equiparados, a locação de apartamentos
em empresas que os arrendem por períodos de tempo inferiores a um mês, a locação de lugares em parques de campismo, em parques
de estacionamento e para fins publicitários e a locação de cofres fortes.»
Litígio no processo principal e questões prejudiciais
8
A gestão do porto de recreio de Marselisborg está confiada ao FML. Essa instituição autónoma exerce, designadamente, a actividade
de locação de lugares para embarcações na água e de lugares em terra para recolha das mesmas no Inverno.
9
Um lugar para embarcações na água pode ser locado por um ano ou numa base mensal, ou ainda por um período mais curto, ou seja,
por um ou vários dias.
10
Em caso de locação anual, o locatário adquire o direito de utilizar um lugar fixo e delimitado, bem como o de utilizar as
instalações comuns do porto, como as casas de banho e os chuveiros. Os lugares são adaptados às embarcações, em função do
seu tamanho. Cada um deles tem um número individual e está identificado por um cabeço de amarração ou por uma prancha flutuante,
ou por uma ponte flutuante com pranchas flutuantes. Se o locatário de um desses lugares não pretender utilizá‑lo por um período
de tempo superior a 24 horas, o lugar é colocado gratuitamente à disposição dos visitantes.
11
Os locatários de longa duração de lugares para embarcações com direito a lugar em terra devem pagar uma taxa de locação anual
e prestar uma caução que é calculada em função, designadamente, da dimensão da embarcação. Em contrapartida, não é exigida
qualquer caução no momento da locação de um lugar na água sem direito a um lugar em terra. No entanto, a renda anual é mais
elevada nesta última situação.
12
No caso de locação mensal, por cada mês, é cobrada uma renda, mas não se exige qualquer caução. Ao locatário é assegurado,
em princípio, um lugar numerado, delimitado e adaptado à sua embarcação.
13
A locação de curta duração está prevista para os visitantes, a quem só são atribuídos lugares no porto por um ou dois dias.
Não se exige qualquer caução para este tipo de locação.
14
Quanto à locação de lugares em terra, a mesma permite ao utilizador adquirir o direito de utilizar um determinado lugar destinado
à recolha da sua embarcação no Inverno. Esse lugar consiste num suporte, ou seja, uma estrutura sobre a qual é colocada a
embarcação, que é numerado, podendo o locador aí aceder livremente para vigiar e preparar a sua embarcação.
15
O litígio no processo principal resulta do facto de, em resposta a um pedido dirigido pelo FML à autoridade fiscal regional
de Åhrus (Dinamarca) em 1999, esta última ter considerado que os proventos retirados da actividade de locação de lugares para
embarcações estão sujeitos a IVA. O FML contestou essa decisão junto do Landsskatteret (Dinamarca).
16
Na sua decisão de 6 de Dezembro de 2000, este órgão jurisdicional entendeu que a locação de lugares para embarcações na água
não pode beneficiar da isenção de IVA prevista no artigo 13.°, n.° 1, ponto 8, da momsloven, por esta actividade não poder
ser considerada locação de bens imóveis. O Landsskatteret considerou que o proprietário da embarcação não arrenda uma superfície
delimitada e identificável, ou uma parte de um imóvel, mas adquire unicamente um direito de utilização que consiste em dispor
de um lugar na água para a sua embarcação no porto.
17
Em contrapartida, no que diz respeito à recolha da embarcação no Inverno, o Landsskatteret julgou que esta actividade não
está sujeita a IVA, pois pode ser qualificada de «locação de bens imóveis» na acepção do artigo 13.°, n.° 1, ponto 8, da momsloven.
Considerou, com efeito, que o proprietário de uma embarcação arrenda, por um preço determinado na proporção da superfície
ocupada, uma área delimitada e identificável, aonde pode livremente vir durante a época de Inverno. De acordo com este órgão
jurisdicional, uma locação deste tipo não está abrangida pela disposição derrogatória respeitante à «locação de áreas destinadas
ao estacionamento de veículos», pois as embarcações não estão englobadas no conceito de «veículos» na acepção do artigo 13.°,
B, alínea b), ponto 2, da Sexta Directiva.
18
Tanto o FML como o Skatteministeriet interpuseram recurso da referida decisão do Landsskatteret para o Vestre Landsret. Este,
considerando que a solução do litígio que lhe foi submetido carece da interpretação do artigo 13.°, B, alínea b), da Sexta
Directiva, decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:
«1)
O artigo 13.°, B, alínea b), da Sexta Directiva IVA […] deve ser interpretado no sentido de que o conceito de ‘locação de
bens imóveis’ abrange a locação de um lugar para uma embarcação, que consiste numa parte da área portuária em terra e numa
área delimitada e identificável na água?
2)
O artigo 13.°, B, alínea b), ponto 2, da Sexta Directiva IVA deve ser interpretado no sentido de que o conceito de ‘veículos’
abrange as embarcações?»
Quanto à primeira questão
19
Com a sua primeira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pretende saber se o artigo 13.°, B, alínea b), da Sexta Directiva
deve ser interpretado no sentido de que o conceito de locação de bens imóveis abrange a locação de lugares destinados à amarração
de embarcações na água, bem como de lugares para a recolha destas embarcações em terra, na área portuária.
Observações apresentadas ao Tribunal de Justiça
20
O FML sustenta que a sua actividade de locação de lugares para embarcações bem como de lugares em terra para recolha destas
no Inverno corresponde às condições fixadas pela jurisprudência do Tribunal de Justiça para constituir uma locação de bens
imóveis na acepção da Sexta Directiva. Com efeito, segundo afirma, a sua actividade implica o pagamento de uma renda, o lugar
é locado por um período contratual concreto e esta locação implica a transferência para o locatário dos direitos de utilizar
a propriedade bem como de excluir dela terceiros.
21
Relativamente à natureza do objecto locado, alega que as instalações portuárias constituem construções fixas que não podem
ser facilmente desmontadas ou deslocadas.
22
O Governo dinamarquês considera que a locação de lugares para embarcações não pode ser considerada uma locação de bens imóveis,
na acepção do artigo 13.°, B, alínea b), da Sexta Directiva, pois as derrogações previstas neste artigo devem ser interpretadas
de forma estrita.
23
De acordo com este governo, mesmo que as instalações portuárias possam ser qualificadas «de imóveis», expressão que constitui
o elemento essencial para analisar o conceito de «bens imóveis» na acepção da Sexta Directiva, a utilização dessas instalações
quando da amarração constitui apenas uma prestação acessória que, no plano fiscal, deve ser tratada da mesma forma que a prestação
principal, ou seja, a atribuição aos proprietários de embarcações de um lugar na água, no porto. Ora, esta última não preenche
as condições para ser incluída no conceito de bens imóveis.
24
Em contrapartida, a locação de um lugar claramente delimitado em terra pelo proprietário de uma embarcação, para a recolher
durante o Inverno, deve ser qualificada de locação de um bem imóvel na acepção da Sexta Directiva.
25
O Governo grego, à semelhança do Governo dinamarquês, considera que o conceito de «locação de bens imóveis» não visa um lugar
delimitado e identificável na água, mas cobre a locação de lugares em terra para a recolha de embarcações no Inverno.
26
A Comissão das Comunidades Europeias alega que resulta da interpretação muito ampla dos termos «locação de bens imóveis»,
feita pelo Tribunal de Justiça, que a locação de uma parte seca de uma área portuária, destinada a recolha de embarcações
no Inverno, constitui incontestavelmente uma locação de um bem imóvel no sentido da Sexta Directiva. Por outro lado, a locação
de um lugar na água não pode ser tratada de forma diferente em função da existência de particularidades técnicas, como a amarração
da embarcação a uma bóia ou a uma ponte flutuantes, em vez da ancoragem ao fundo marinho ou da amarração a um duque de alba
(pilar de amarração) enterrado no solo.
Resposta do Tribunal de Justiça
27
Segundo jurisprudência assente, as isenções previstas no artigo 13.° da Sexta Directiva constituem conceitos autónomos de
direito comunitário, devendo, portanto, ser objecto de uma definição comunitária (v. acórdãos de 12 de Setembro de 2000, Comissão/Irlanda,
C‑358/97, Colect., p. I‑6301, n.° 51; de 16 de Janeiro de 2003, Maierhofer, C‑315/00, Colect., p. I‑563, n.° 25; de 12 de
Junho de 2003, Sinclair Collis, C‑275/01, Colect., p. I‑5965, n.° 22; e de 18 de Novembro de 2004, Temco Europe, C‑284/03,
ainda não publicado na Colectânea, n.° 16).
28
Na falta de uma definição do conceito de «locação de bens imóveis» constante do artigo 13.°, B, alínea b), da Sexta Directiva,
há que interpretar esta disposição à luz do contexto em que se inscreve, das finalidades e da economia desta directiva, tendo
especialmente em conta a ratio legis da isenção que prevê (v., neste sentido, acórdão Temco Europe, já referido, n.° 18).
29
Relativamente a este aspecto, dado que as isenções visadas no artigo 13.° da Sexta Directiva constituem derrogações ao princípio
geral de acordo com o qual o IVA é cobrado sobre qualquer prestação de serviços efectuada a título oneroso por um sujeito
passivo, as mesmas são de interpretação estrita (v., designadamente, acórdãos Comissão/Irlanda, já referido, n.° 52; de 12
de Setembro de 2000, Comissão/Reino Unido, C‑359/97, Colect., p. I‑6355, n.° 64; e Sinclair Collis, já referido, n.° 23).
30
Em numerosos acórdãos, o Tribunal de Justiça definiu a locação de bens imóveis, na acepção do artigo 13.°, B, alínea b), da
Sexta Directiva, como o direito, conferido pelo proprietário de um imóvel ao locatário, de ocupar esse imóvel e de excluir
qualquer outra pessoa do benefício desse direito, por um período acordado e mediante remuneração (v., nesse sentido, acórdãos
Comissão/Irlanda, já referido, n. os 52 a 57; de 9 de Outubro de 2001, Mirror Group, C‑409/98, Colect., p. I‑7175, n.° 31; de 4 de Outubro de 2001, «Goed Wonen»,
C‑326/99, Colect., p. I‑6831, n.° 55; e Temco Europe, já referido, n.° 19).
31
No processo principal, é pacífico que as relações entre o FML e os utilizadores dos lugares em terra, que têm o uso exclusivo,
por uma duração determinada, dos lugares que lhes são atribuídos, estão englobadas no conceito de locação na acepção da referida
disposição. O mesmo sucede quando se trata das relações entre o FML e os utilizadores de lugares na água, mesmo que, a título
ocasional, um lugar possa ser provisoriamente ocupado por uma embarcação diferente da do titular desse lugar, quando este
último não o utiliza para a sua própria embarcação. Uma vez que a utilização ocasional deste não acarreta qualquer prejuízo
para o titular, não se pode considerar que a mesma desvirtua a relação deste com o gerente do porto.
32
Assim, para responder à primeira questão, resta averiguar se, respectivamente, os lugares para embarcações em terra e os lugares
para embarcações na água devem ser considerados bens imóveis.
33
No que respeita aos lugares em terra, há que constatar que o solo utilizado para a recolha das embarcações é um bem imóvel.
34
Quanto aos lugares na água, resulta da decisão de reenvio que o FML é proprietário do terreno e da doca portuários. O facto
de este terreno estar total ou parcialmente submerso não se opõe à sua qualificação de bem imóvel que pode ser objecto de
locação ou arrendamento. Enquanto proprietário, o FML pode concessionar esse terreno na sua totalidade, incluindo as partes
delimitadas deste. Contudo, a locação não incide sobre uma quantidade de água qualquer, mas sobre uma porção determinada da
referida doca. Esta superfície coberta de água está delimitada de forma permanente e não pode ser deslocada.
35
Consequentemente, como observa igualmente a advogada geral no n.° 32 das suas conclusões, mesmo com base numa interpretação
estrita do artigo 13.°, B, alínea b), da Sexta Directiva, um lugar numa doca obedece à definição de bem imóvel na acepção
desta disposição.
36
Deve, assim, responder‑se à primeira questão que o artigo 13.°, B, alínea b), da Sexta Directiva deve ser interpretado no
sentido de que o conceito de locação de bens imóveis engloba a locação de lugares destinados à amarração de embarcações na
água, bem como de lugares para a recolha dessas embarcações em terra, na área portuária.
Quanto à segunda questão
37
Na sua segunda questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta se o conceito de «veículos», constante do artigo 13.°, B,
alínea b), ponto 2, da Sexta Directiva, inclui as embarcações.
Observações apresentadas ao Tribunal de Justiça
38
O FML alega que resulta dos artigos 15.°, n.° 2, 28.°‑A, n.° 2, alínea a), e 28.°‑N, n.° 4, alíneas b) e c), da Sexta Directiva
que o legislador comunitário faz uma distinção entre os termos «meios de transporte» e «veículos». Quando uma disposição abrange
todos os tipos de meios de transporte, ou seja, aeronaves, veículos a motor, embarcações, etc., é utilizada a expressão «meios
de transporte». Em contrapartida, o conceito de veículos é unicamente utilizado para englobar os meios de transporte terrestres
aptos a circular. O conceito de «veículos» referido no artigo 13.°, B, alínea b), da Sexta Directiva só cobre, por isso, os
meios de transporte terrestres e, portanto, deve responder‑se de forma negativa à segunda questão.
39
Os Governos dinamarquês e grego consideram que o conceito de «veículos» não deve ser interpretado de forma estrita. Este conceito
deve englobar tudo aquilo que possa transportar uma pessoa de um lugar para outro, incluindo embarcações.
40
A Comissão sustenta igualmente que, não obstante as divergências terminológicas entre as diferentes versões linguísticas do
artigo 13.°, B, alínea b), ponto 2, da Sexta Directiva, o termo «veículos» é, com efeito, utilizado de forma coerente na totalidade
da mesma e engloba os meios de transporte em sentido amplo, incluindo embarcações. Uma interpretação contrária teria consequências
incoerentes, incompatíveis com o princípio da neutralidade fiscal.
Resposta do Tribunal de Justiça
41
Os termos utilizados nas diferentes versões linguísticas do referido artigo 13.°, B, alínea b), ponto 2, para designar o conceito
de «veículos», não são coerentes. Como a Comissão observa com razão, certas versões linguísticas, entre as quais as versões
francesa, inglesa, italiana, espanhola, portuguesa, alemã e finlandesa, englobam nesse conceito os meios de transporte em
geral, incluindo as aeronaves e as embarcações. Em contrapartida, outras versões, como a dinamarquesa, a sueca, a neerlandesa
e a grega, escolheram um termo mais preciso e que tem um significado mais restrito, que serve para designar principalmente
os «meios de transporte terrestres». Mais particularmente, o termo dinamarquês «kjøretøjer» refere‑se a meios de transporte
terrestres rodoviários.
42
A esse respeito, importa recordar que, de acordo com jurisprudência assente, em caso de divergência entre as diferentes versões
linguísticas de uma disposição comunitária, esta deve ser interpretada em função da economia geral e da finalidade da regulamentação
de que faz parte (v., designadamente, acórdãos de 27 de Março de 1990, Cricket St Thomas, C‑372/88, Colect., p. I‑1345, n.° 19,
e de 14 de Setembro de 2000, D., C‑384/98, Colect., p. I‑6795, n.° 16).
43
Ora, tratando‑se da locação de lugares para o estacionamento de veículos, o artigo 13.°, B, alínea b), ponto 2, da Sexta Directiva
introduz uma excepção à isenção prevista nesse artigo para a locação de bens imóveis. Coloca, portanto, as operações que refere
sob o regime geral desta directiva, que tende a submeter ao IVA todas as operações tributáveis, ressalvadas as derrogações
expressamente previstas. Esta cláusula não pode, portanto, ser objecto de uma interpretação estrita (v. acórdão de 12 de Fevereiro
de 1998, Blasi, C‑346/95, Colect., p. I‑481, n.° 19).
44
Assim, o termo «veículos», empregue na referida disposição, deve ser interpretado como visando todos os meios de transporte,
incluindo as embarcações.
45
Com efeito, a locação de lugares para embarcações não está limitada ao único direito de ocupar privativamente a superfície
de água, mas implica igualmente a colocação à disposição de diversos equipamentos portuários que permitem, designadamente,
a amarração da embarcação, facilidades de desembarque e embarque para a tripulação, a utilização eventual por esta de diversas
instalações sanitárias e outras. Ora, como observa a advogada geral no n.° 51 das suas conclusões, nenhuma das considerações,
designadamente de carácter social, que foram tidas em conta para justificar a isenção de IVA instituída a favor da locação
de bens imóveis pode ser aplicada à locação de lugares para embarcações nas circunstâncias do processo principal.
46
Nestas condições, tendo em conta os objectivos do artigo 13.°, B, alínea b), da Sexta Directiva, o ponto 2 desta disposição,
que exclui da excepção à sujeição ao IVA a locação de lugares para o estacionamento de veículos, deve ser interpretado no
sentido de que o mesmo se aplica, de forma geral, à locação de lugares para o estacionamento de todos os meios de transporte,
incluindo as embarcações.
47
Pelo acima exposto, deve responder‑se à segunda questão que o artigo 13.°, B, alínea b), ponto 2, da Sexta Directiva deve
ser interpretado no sentido de que o conceito de «veículos» engloba as embarcações.
Quanto às despesas
48
Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional
nacional, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efectuadas com a apresentação de observações ao Tribunal
de Justiça, diferentes das das partes referidas, não são reembolsáveis.
Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Terceira Secção) declara:
1)
O artigo 13.°, B, alínea b), da Sexta Directiva 77/388/CEE do Conselho, de 17 de Maio de 1977, relativa à harmonização das
legislações dos Estados‑Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios – Sistema comum do imposto sobre o valor
acrescentado: matéria colectável uniforme, alterada pela Directiva 92/111/CEE do Conselho, de 14 de Dezembro de 1992, deve
ser interpretado no sentido de que o conceito de locação de bens imóveis engloba a locação de lugares destinados à amarração
de embarcações na água, bem como de lugares para a recolha dessas embarcações em terra, na área portuária.
2)
O artigo 13.°, B, alínea b), ponto 2, da Sexta Directiva 77/388, alterada pela Directiva 92/111, deve ser interpretado no
sentido de que o conceito de «veículos» engloba as embarcações.