C-572/07 - RLRE Tellmer Property

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Processo C‑572/07

RLRE Tellmer Property sro

contra

Finanční ředitelství v Ústí nad Labem

(pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Krajský soud v Ústí nad Labem)

«Reenvio prejudicial – IVA – Isenção da locação de imóveis – Limpeza dos espaços comuns conexos à locação – Prestações acessórias»

Sumário do acórdão

Disposições fiscais – Harmonização das legislações – Impostos sobre o volume de negócios – Sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado – Isenções previstas na Sexta Directiva – Isenção da locação de bens imóveis

[Directiva do Conselho 77/388, artigo 13.°, B, alínea b)]

As prestações de limpeza das partes comuns de um imóvel, embora estejam associadas à utilização do bem locado, não integram necessariamente o conceito de locação na acepção do artigo 13.°, B, alínea b), da Sexta Directiva 77/388, relativa à harmonização das legislações dos Estados‑Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios.

Por conseguinte, no caso em que a locação dos apartamentos e a limpeza das partes comuns de um imóvel podem, ser dissociadas uma da outra, designadamente quando o proprietário do bem imóvel factura as prestações de limpeza aos locatários separadamente da renda, a referida locação e o referido serviço de limpeza devem, para efeitos da aplicação do artigo 13.°, B, alínea b), da Sexta Directiva, ser considerados operações autónomas, dissociáveis uma da outra, não integrando o referido serviço o âmbito dessa disposição.

(cf. n.os 21, 23‑25 e disp.)







ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Segunda Secção)

11 de Junho de 2009 (*)

«Reenvio prejudicial – IVA – Isenção da locação de imóveis – Limpeza dos espaços comuns conexos à locação – Prestações acessórias»

No processo C‑572/07,

que tem por objecto um pedido de decisão prejudicial nos termos do artigo 234.° CE, apresentado pelo Krajský soud v Ústi nad Labem (República Checa), por decisão de 20 de Novembro de 2007, entrado no Tribunal de Justiça em 24 de Dezembro de 2007, no processo

RLRE Tellmer Property sro

contra

Finanční ředitelství v Ústí nad Labem,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Segunda Secção),

composto por: C. W. A. Timmermans, presidente de secção, J.‑C. Bonichot, J. Makarczyk (relator), P. Kūris e L. Bay Larsen, juízes,

advogada-geral: V. Trstenjak,

secretário: K. Sztranc-Sławiczek, administradora,

vistos os autos e após a audiência de 6 de Novembro de 2008,

vistas as observações apresentadas:

–        em representação da Finanční ředitelství v Ústí nad Labem, por J. Janoušková,

–        em representação da RLRE Tellmer Property sro, por R. Lančík e J. Rambousek,

–        em representação do Governo checo, por M. Smolek, na qualidade de agente,

–        em representação do Governo grego, por K. Georgiadis, S. Alexandriou e V. Karra, na qualidade de agentes,

–        em representação da Comissão das Comunidades Europeias, por D. Triantafyllou e M. Thomannová-Körnerová, na qualidade de agentes,

ouvidas as conclusões da advogada-geral na audiência de 9 de Dezembro de 2008,

profere o presente

Acórdão

1        O pedido de decisão prejudicial tem por objecto a interpretação do artigo 13.°, B, alínea b, da Sexta Directiva 77/388/CEE do Conselho, de 17 de Maio de 1977, relativa à harmonização das legislações dos Estados‑Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios – Sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado: matéria colectável uniforme (JO L 145, p. 1; EE 09 F1 p. 54, a seguir «Sexta Directiva»).

2        Este pedido foi apresentado no quadro de um pedido que opõe a RLRE Tellmer Property sro (a seguir «RLRE Tellmer Property») à Finanční ředitelství v Ústí nad Labem (direcção de finanças de Ústí nad Labem) a propósito da questão de saber se as despesas com a limpeza dos espaços comuns de um imóvel para arrendamento estão, à semelhança da locação, isentos do imposto sobre o valor acrescentado (a seguir «IVA»).

 Quadro jurídico

 Regulamentação comunitária

3        O artigo 2.°, n.° 1, da Sexta Directiva sujeita a IVA «[a]s entregas de bens e as prestações de serviços, efectuadas a título oneroso, no território do país, por um sujeito passivo agindo nessa qualidade».

4        O artigo 6.°, n.° 1, da Sexta Directiva dispõe:

«Por ‘prestação de serviços’ entende‑se qualquer prestação que não constitua uma entrega de bens na acepção do artigo 5.°

Essa prestação pode, designadamente, consistir:

–        na cessão de um bem incorpóreo representado ou não por um título;

–        na obrigação de não fazer ou de tolerar um acto ou uma situação;

–        na execução de um serviço prestado em consequência de acto de Administração Pública ou em seu nome ou por força de lei.»

5        O artigo 13.°, B, alínea b), da Sexta Directiva, que figura no seu título X, intitulado «Isenções», dispõe:

«Sem prejuízo de outras disposições comunitárias, os Estados‑Membros isentarão, nas condições por eles fixadas com o fim de assegurar a aplicação correcta e simples das isenções a seguir enunciadas e de evitar qualquer possível fraude, evasão e abuso:

[…]

b)      A locação de bens imóveis, com excepção:

1.      Das operações de alojamento, tal como são definidas na legislação dos Estados‑Membros, realizadas no âmbito do sector hoteleiro ou de sectores com funções análogas, incluindo as locações de campos de férias ou de terrenos para campismo;

2.       Da locação de áreas destinadas ao estacionamento de veículos;

3.       Da locação de equipamento [e] maquinaria de instalação fixa;

4.       Da locação de cofres‑fortes.

Os Estados‑Membros podem prever outras excepções ao âmbito de aplicação desta isenção».

 Legislação nacional

6        A aplicação do IVA na República Checa rege‑se pela Lei n.° 235/2004, relativa ao imposto sobre o valor acrescentado. O § 56, n.° 4, desta lei, intitulado «Transmissão e locação de parcelas de terreno, edifícios, apartamentos e instalações para fins não habitacionais, locação de outros equipamentos», determina o seguinte no que respeita à isenção de IVA aplicável à locação de bens:

«A locação de parcelas de terreno, edifícios, apartamentos e instalações para fins não habitacionais está isenta de imposto. A isenção não se aplica à locação de edifícios a curto prazo, à locação de instalações e espaços para o estacionamento de veículos, à locação de cofres‑fortes ou de equipamentos ou máquinas de instalação fixa. Entende‑se por locação a curto prazo a locação que inclui o equipamento mobiliário interno e o eventual fornecimento de electricidade, aquecimento, climatização, gás ou água, por um período contínuo não superior a 48 horas.»

 Litígio no processo principal e questões prejudiciais

7        Resulta da decisão de reenvio que a RLRE Tellmer Property é proprietária de imóveis que incluem apartamentos dados de arrendamento. Para além da renda, exige aos seus locatários quantias, facturadas à parte, pela limpeza das partes comuns, efectuada pelos vigilantes.

8        Após terem considerado que a RLRE Tellmer Property procedera a uma dedução excessiva do IVA relativo às despesas de limpeza, as autoridades fiscais decidiram aumentar o IVA, devido por essa sociedade, relativo ao mês de Maio de 2006 em 155 911 CZK a título das receitas obtidas com as actividades de limpeza.

9        Tendo a decisão da repartição de finanças de Litvínov de 20 de Setembro de 2006 sido confirmada por uma decisão da Finanční ředitelství v Ústí nad Labem de 5 de Fevereiro de 2007, a RLRE Tellmer Property interpôs recurso para o órgão jurisdicional de reenvio.

10      A RLRE Tellmer Property alega que a locação e os serviços conexos com a locação dos apartamentos, como a limpeza das partes comuns, constituem prestações indissociáveis a que se aplica um único regime de IVA.

11      O órgão jurisdicional de reenvio interroga‑se sobre como deve ser interpretado tanto o direito nacional como o direito comunitário aplicável ao presente caso. Considera existirem três respostas possíveis para as questões suscitadas no quadro do processo principal.

12      Em primeiro lugar, como os locatários têm a possibilidade de celebrar um contrato independente com um terceiro para a limpeza dos espaços comuns, esse serviço não se integra na locação e não havia qualquer razão para estar isento. Em segundo lugar, como a isenção das despesas de limpeza dos referidos espaços implica uma diminuição dos encargos devidos pelos apartamentos, existem razões de ordem social que podem justificar a isenção dessas despesas. Em terceiro lugar, o órgão jurisdicional de reenvio não afasta a possibilidade de essa questão dever ser deixada à apreciação dos Estados‑Membros.

13      Nestas condições, o Krajský soud v Ústí nad Labem decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)      As normas do artigo 6.° […] e do artigo 13.° […] da Sexta Directiva […] podem ser interpretadas no sentido de que a locação de um apartamento (e possivelmente de instalações para fins não habitacionais), por um lado, e a limpeza das partes comuns conexa com a locação, por outro, podem ser vistas como transacções tributáveis independentes, distintas entre si?

2)      Se […] a resposta à primeira questão for negativa, […] as normas do artigo [13.°, B, alínea b), da Sexta Directiva]: (1) exigem; (2) excluem, ou (3) deixam ao critério do Estado‑Membro a aplicação de IVA ao pagamento da limpeza das partes comuns de um edifício de apartamentos locados?»

 Quanto às questões prejudiciais

 Quanto à primeira questão

14      Na sua primeira questão, o órgão jurisdicional de reenvio interroga‑se, para efeitos da aplicação do artigo 13.°, B, alínea b), da Sexta Directiva, sobre a relação que existe entre a locação de um imóvel e o serviço de limpeza das partes comuns de um imóvel arrendado. Em especial, pergunta se as despesas relativas a esse serviço de limpeza integram o conceito de locação na acepção do referido artigo e compartilham, assim, do destino fiscal da locação de um imóvel, que, por força do disposto no artigo 13.°, B, alínea b), da Sexta Directiva, está isenta de IVA.

15      A este respeito, cabe recordar, em primeiro lugar, que, segundo jurisprudência assente, as isenções previstas no artigo 13.° da Sexta Directiva constituem conceitos autónomos de direito comunitário, devendo, portanto, ser objecto de uma definição comunitária (v. acórdão de 25 de Outubro de 2007, CO.GE.P., C‑174/06, Colect., p. I‑9359, n.° 26 e jurisprudência aí indicada).

16      Os termos utilizados para designar as isenções visadas no artigo 13.° da Sexta Directiva são de interpretação estrita, dado que essas isenções constituem derrogações ao princípio geral de que o IVA é cobrado por todas as prestações de serviços efectuadas a título oneroso por um sujeito passivo (v., designadamente, acórdãos de 18 de Janeiro de 2001, Stockholm Lindöpark, C‑150/99, Colect., p. I‑493, n.° 25, e de 8 de Dezembro de 2005, Jyske Finans, C‑280/04, Colect., p. I‑10683, n.° 21 e jurisprudência aí indicada).

17      Em segundo lugar, decorre do artigo 2.° da Sexta Directiva que cada operação deve normalmente ser considerada distinta e independente (v. acórdão de 21 de Fevereiro de 2008, Part Service, C‑425/06, Colect., p. I‑897, n.° 50 e jurisprudência aí indicada).

18      Por outro lado, em determinadas circunstâncias, várias prestações formalmente distintas, susceptíveis de serem realizadas separadamente e de dar assim lugar, em cada caso, a tributação ou a isenção, devem ser consideradas como uma operação única quando não sejam independentes. Tal sucede, por exemplo, quando se verifica que uma ou várias prestações constituem uma prestação principal e que a ou as outras prestações constituem uma ou várias prestações acessórias que partilham do destino fiscal da prestação principal. Em particular, uma prestação deve ser considerada acessória em relação a uma prestação principal quando não constitua para a clientela um fim em si, mas um meio de beneficiar nas melhores condições do serviço principal do prestador (acórdão Part Service, já referido, n.° 51 e jurisprudência aí indicada).

19      Além disso, pode igualmente considerar‑se que se está em presença de uma prestação única quando dois ou vários elementos ou actos fornecidos pelo sujeito passivo estão tão estreitamente ligados que formam, objectivamente, uma única prestação económica indissociável cuja decomposição teria natureza artificial (acórdão Part Service, já referido, n.° 53).

20      De imediato, importa recordar que a locação de bens imóveis, na acepção do artigo 13.°, B, alínea b), da Sexta Directiva, consiste, substancialmente, no facto de um locador conferir a um locatário, por um período acordado e em contrapartida de remuneração, o direito de ocupar um imóvel como se fosse o seu proprietário, excluindo qualquer outra pessoa do benefício desse direito (v., neste sentido, acórdãos de 4 de Outubro de 2001, «Goed Wonen», C‑326/99, Colect., p. I‑6831, n.° 55; de 9 de Outubro de 2001, Mirror Group, C‑409/98, Colect., p. I‑7175, n.° 31; de 8 de Maio de 2003, Seeling, C‑269/00, Colect., p. I‑4101, n.° 49, e de 18 de Novembro de 2004, Temco Europe, C‑284/03, Colect., p. I‑11237, n.° 19).

21      Por conseguinte, as prestações de limpeza das partes comuns de um imóvel, embora estejam associadas à utilização do bem locado, não integram necessariamente o conceito de locação na acepção do artigo 13.°, B, alínea b), da Sexta Directiva.

22      Além disso, é certo que o serviço de limpeza das partes comuns de um imóvel pode ser fornecido segundo modalidades diversas, ou seja, por exemplo, por um terceiro que factura o custo desse serviço directamente aos locatários ou pelo locador que utiliza, para o efeito, o seu próprio pessoal ou recorre a uma empresa de limpezas.

23      Há que sublinhar que, no caso em apreço, a RLRE Tellmer Property factura as prestações de limpeza aos locatários separadamente da renda.

24      Assim, uma vez que a locação dos apartamentos e a limpeza das partes comuns de um imóvel podem, em circunstâncias como as do processo principal, ser dissociadas uma da outra, não se pode considerar que essa locação e a referida limpeza constituem uma prestação única na acepção da jurisprudência do Tribunal de Justiça.

25      Atento o conjunto das considerações que precedem, há que responder à primeira questão que, para efeitos da aplicação do artigo 13.°, B, alínea b), da Sexta Directiva, a locação de um imóvel e o serviço de limpeza das partes comuns desse imóvel devem, em circunstâncias como as do processo principal, ser consideradas operações autónomas, dissociáveis uma da outra, não integrando o referido serviço o âmbito dessa disposição.

 Quanto à segunda questão

26      Tendo em consideração a resposta dada à primeira questão, não há que responder à segunda questão.

 Quanto às despesas

27      Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efectuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Segunda Secção) declara:

Para efeitos da aplicação do artigo 13.°, B, alínea b), da Sexta Directiva 77/388/CEE do Conselho, de 17 de Maio de 1977, relativa à harmonização das legislações dos Estados‑Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios – Sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado: matéria colectável uniforme, a locação de um imóvel e o serviço de limpeza das partes comuns desse imóvel devem, em circunstâncias como as do processo principal, ser consideradas operações autónomas, dissociáveis uma da outra, não integrando o referido serviço o âmbito dessa disposição.

Assinaturas


* Língua do processo: checo.