C-280/10 - Polski Trawertyn / Kopalnia

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62010CJ0280

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Primeira Secção)

1 de março de 2012 ( * )

«IVA — Diretiva 2006/112/CE — Artigos 9.°, 168.°, 169.° e 178.° — Dedução do imposto pago a montante relativo a operações efetuadas com vista à realização de um projeto de atividade económica — Aquisição de um terreno pelos sócios de uma sociedade — Faturas emitidas antes do registo da sociedade que pede a dedução»

No processo C-280/10,

que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial nos termos do artigo 267.o TFUE, apresentado pelo Naczelny Sąd Administracyjny (Polónia), por decisão de 31 de março de 2010, entrado no Tribunal de Justiça em 4 de junho de 2010, no processo

Kopalnia Odkrywkowa Polski Trawertyn P. Granatowicz, M. Wąsiewicz spółka jawna

contra

Dyrektor Izby Skarbowej w Poznaniu,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Primeira Secção),

composto por: A. Tizzano, presidente de secção, A. Borg Barthet, M. Ilešič, J.-J. Kasel (relator) e M. Berger, juízes,

advogado-geral: P. Cruz Villalón,

secretário: K. Malacek, administrador,

vistos os autos e após a audiência de 22 de junho de 2011,

vistas as observações apresentadas:

em representação da Kopalnia Odkrywkowa Polski Trawertyn P. Granatowicz, M. Wąsiewicz spółka jawna, por M. Pawlik, consultor fiscal,

em representação do Governo polaco, por M. Szpunar, K. Robickia, A. Gawłowska e A. Kramarczyk, na qualidade de agentes,

em representação do Governo alemão, por C. Blaschke, na qualidade de agente,

em representação do Governo helénico, por K. Paraskevopoulou, Z. Chatzipavlou e M. Michelogiannaki, na qualidade de agentes,

em representação do Governo francês, por J.-S. Pilczer, na qualidade de agente,

em representação da Comissão Europeia, por D. Triantafyllou e K. Herrmann, na qualidade de agentes,

ouvidas as conclusões do advogado-geral na audiência de 15 de setembro de 2011,

profere o presente

Acórdão

1

O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação dos artigos 9.°, 168.° e 169.° da Diretiva 2006/112/CE do Conselho, de 28 de novembro de 2006, relativa ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado (JO L 347, p. 1).

2

Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe a Kopalnia Odkrywkowa Polski Trawertyn P. Granatowicz, M. Wąsiewicz spółka jawna (a seguir «Polski Trawertyn»), sociedade em nome coletivo, bem como os seus sócios P. Granatowicz e M. Wąsiewiczci (a seguir «sócios»), ao Dyrektor Izby Skarbowej w Poznaniu (diretor do Serviço de Finanças de Poznań) a respeito da dedução do imposto sobre o valor acrescentado (a seguir «IVA») pago a montante sobre certas operações efetuadas antes do registo da sociedade no registo comercial.

Quadro jurídico

Diretiva 2006/112

3

O artigo 9.o, n.o 1, da Diretiva 2006/112 enuncia:

«Entende-se por ‘sujeito passivo’ qualquer pessoa que exerça, de modo independente e em qualquer lugar, uma atividade económica, seja qual for o fim ou o resultado dessa atividade.

Entende-se por ‘atividade económica’ qualquer atividade de produção, de comercialização ou de prestação de serviços, incluindo as atividades extrativas, agrícolas e as das profissões liberais ou equiparadas. É em especial considerada atividade económica a exploração de um bem corpóreo ou incorpóreo com o fim de auferir receitas com caráter de permanência.»

4

O artigo 168.o da Diretiva 2006/112 prevê, nomeadamente:

«Quando os bens e os serviços sejam utilizados para os fins das suas operações tributadas, o sujeito passivo tem direito, no Estado-Membro em que efetua essas operações, a deduzir do montante do imposto de que é devedor os montantes seguintes:

a)

O IVA devido ou pago nesse Estado-Membro em relação aos bens que lhe tenham sido ou venham a ser entregues e em relação aos serviços que lhe tenham sido ou venham a ser prestados por outro sujeito passivo;

[…]»

5

O artigo 169.o da Diretiva 2006/112 dispõe:

«Para além da dedução referida no artigo 168.o, o sujeito passivo tem direito a deduzir o IVA aí referido, desde que os bens e os serviços sejam utilizados para os fins das seguintes operações:

a)

Operações relacionadas com as atividades referidas no segundo parágrafo do n.o 1 do artigo 9.o, efetuadas fora do Estado-Membro em que esse imposto é devido ou pago, que teriam conferido direito a dedução se tivessem sido efetuadas nesse Estado-Membro;

b)

Operações isentas em conformidade com os artigos 138.°, 142.°, 144.°, 146.° a 149.°, 151.°, 152.°, 153.° e 156.°, a alínea b) do n.o 1 do artigo 157.o, e os artigos 158.° a 161.° e 164.°;

c)

Operações isentas em conformidade com as alíneas a) a f) do n.o 1 do artigo 135.o, quando o destinatário se encontre estabelecido fora da Comunidade ou quando tais operações estejam diretamente ligadas a bens que se destinem a ser exportados para fora da Comunidade.»

6

O artigo 178.o, alínea a), da Diretiva 2006/112 enuncia:

«Para poder exercer o direito à dedução, o sujeito passivo deve satisfazer as seguintes condições:

a)

Relativamente à dedução referida na alínea a) do artigo 168.o, no que respeita às entregas de bens e às prestações de serviços, possuir uma fatura emitida em conformidade com os artigos 220.° a 236.°, 238.°, 239.° e 240.°».

7

Nos termos do artigo 213.o, n.o 1, da Diretiva 2006/112:

«Os sujeitos passivos devem declarar o início, a alteração e a cessação da sua atividade na qualidade de sujeitos passivos.

Os Estados-Membros devem autorizar e podem exigir que a declaração seja efetuada, segundo regras por eles determinadas, por via eletrónica.»

8

O artigo 220.o da Diretiva 2006/112 dispõe:

«Os sujeitos passivos devem assegurar que seja emitida uma fatura, por eles próprios, pelos adquirentes ou destinatários ou, em seu nome e por sua conta, por terceiros, nos seguintes casos:

1)

Relativamente às entregas de bens ou às prestações de serviços que efetuem a outros sujeitos passivos ou a pessoas coletivas que não sejam sujeitos passivos;

2)

Relativamente às entregas de bens referidas no artigo 33.o;

3)

Relativamente às entregas de bens efetuadas nas condições previstas no artigo 138.o;

4)

Relativamente aos pagamentos por conta que lhes sejam efetuados antes de se realizar uma das entregas de bens referidas nos pontos 1), 2) e 3);

5)

Relativamente aos pagamentos por conta que lhes sejam efetuados por outros sujeitos passivos, ou por pessoas coletivas que não sejam sujeitos passivos, antes de se concluir a prestação de serviços.»

9

O artigo 226.o da Diretiva 2006/112 prevê, nomeadamente:

«Sem prejuízo das disposições específicas previstas na presente diretiva, as únicas menções que devem obrigatoriamente figurar, para efeitos do IVA, nas faturas emitidas em aplicação do disposto nos artigos 220.° e 221.° são as seguintes:

1)

A data de emissão da fatura;

[…]

4)

O número de identificação para efeitos do IVA do adquirente ou destinatário, referido no artigo 214.o, ao abrigo do qual foi efetuada uma entrega de bens ou uma prestação de serviços pela qual aquele seja devedor do imposto ou uma entrega de bens referida no artigo 138.o;

5)

O nome e o endereço completo do sujeito passivo e do adquirente ou destinatário;

[…]»

10

Nos termos do artigo 273.o da Diretiva 2006/112:

«Os Estados-Membros podem prever outras obrigações que considerem necessárias para garantir a cobrança exata do IVA e para evitar a fraude, sob reserva da observância da igualdade de tratamento das operações internas e das operações efetuadas entre Estados-Membros por sujeitos passivos, e na condição de essas obrigações não darem origem, nas trocas comerciais entre Estados-Membros, a formalidades relacionadas com a passagem de uma fronteira.

A faculdade prevista no primeiro parágrafo não pode ser utilizada para impor obrigações de faturação suplementares às fixadas no [c]apítulo 3.»

Legislação nacional

11

O artigo 15.o, n.os 1 e 2, da Lei de 11 de março de 2004 relativa ao imposto sobre o valor acrescentado (Ustawa z dnia 11 marca 2004 r. o podatku od towarów i usług, Dz. U. n.o 54, posição 535), na sua versão aplicável à data dos factos do processo principal (a seguir «lei relativa ao IVA»), dispõe:

«1.   São considerados sujeitos passivos as pessoas coletivas, os estabelecimentos sem personalidade jurídica e as pessoas singulares que exerçam, de forma independente, uma das atividades económicas referidas no n.o 2, sejam quais forem os fins e os resultados dessa atividade.

2.   É considerada atividade económica qualquer atividade de produtor, de comerciante ou de prestador de serviços, incluindo a atividade das pessoas que explorem recursos naturais, dos agricultores e dos profissionais liberais, mesmo quando a atividade tenha sido exercida uma única vez, em circunstâncias que indiquem a intenção de a realizar repetidamente. É igualmente considerada atividade económica a exploração de um bem corpóreo ou incorpóreo com caráter de permanência e com o intuito de obtenção de lucro.»

12

Nos termos do artigo 86.o, n.o 1, da lei relativa ao IVA:

«Na medida em que sejam utilizados bens e serviços para a prática de operações sujeitas a tributação, o sujeito passivo referido no artigo 15.o tem o direito de deduzir do valor do imposto devido o valor do imposto pago a montante, sob reserva do disposto nos artigos 114.°, 119.°, n.o 4, 120.°, n.os 17 e 19, e 124.°»

13

O artigo 86.o, n.o 2, da lei relativa ao IVA:

«Sob reserva do estabelecido nos n.os 3 a 7, o imposto pago a montante é igual:

1)

à soma dos montantes de IVA indicados nas faturas recebidas pelo sujeito passivo

a)

pela aquisição de bens e serviços;

b)

que confirmem pagamentos antecipados (adiantamentos, pagamentos por conta, prestações) quando estejam relacionados com um facto gerador de imposto;

c)

provenientes de um comitente pela entrega de bens objeto de um contrato de comissão;

[…]»

14

Em conformidade com o artigo 86.o, n.o 10, ponto 1, da lei relativa ao IVA, o direito a dedução é aplicado na contabilização efetuada relativamente ao período em que o sujeito passivo recebeu a fatura ou o documento aduaneiro.

15

O artigo 106.o, n.o 1, da lei relativa ao IVA dispõe:

«Os sujeitos passivos referidos no artigo 15.o são obrigados a emitir faturas que indiquem, nomeadamente, a venda, a data de venda, o preço unitário sem IVA, a base tributável, a taxa e o montante do imposto, o preço a pagar e os dados relativos ao sujeito passivo e ao adquirente, sem prejuízo dos n.os 2, 4 e 5, do artigo 119.o, n.o 10, e do artigo 120.o, n.o 16.»

16

Em conformidade com o artigo 9.o, n.o 1, pontos 1 e 2, do Regulamento do Ministro das Finanças, de 25 de maio de 2005, relativo ao reembolso do imposto a certos sujeitos passivos, ao reembolso antecipado do imposto, à emissão de faturas, às modalidades da sua conservação e à lista de mercadorias e serviços a que as isenções IVA não são aplicáveis (Dz. U. n.o 95, posição 798), em vigor até 1 de dezembro de 2008, a fatura na qual conste a venda deve pelo menos conter indicações a respeito do nome, apelido ou denominação, eventualmente resumida, do vendedor e do adquirente, bem como o seu endereço, o número de identificação de IVA do vendedor e do adquirente.

17

Em direito polaco, os ativos imobilizados objeto de entrada nas sociedades comerciais e civis estão isentos de IVA. Por outro lado, uma sociedade em nome coletivo só tem existência a partir da sua inscrição no registo comercial.

Litígio no processo principal e questões prejudiciais

18

Em 22 de dezembro de 2006, um oficial de justiça emitiu uma fatura em nome dos sócios pela aquisição de um bem imóvel do qual faz parte uma pedreira a céu aberto.

19

Em 26 de abril de 2007, os sócios fundaram a Polski Trawertyn. No mesmo dia, um notário emitiu, em nome dessa sociedade, uma fatura para a outorga do ato notarial relativo à constituição desta e as respetivas cópias.

20

As inspeções efetuadas pelas autoridades competentes junto da Polski Trawertyn para o período de junho a setembro de 2007 conduziram as mesmas autoridades a constatar irregularidades a respeito dos valores de IVA declarados a montante. Com efeito, foi constatado que, ao longo do mês de junho de 2007, essa sociedade declarou um valor de IVA a montante demasiado elevado em razão do registo, na sua contabilidade de IVA, das duas faturas acima referidas.

21

No que respeita à primeira fatura, as autoridades constataram que a Polski Trawertyn não estava autorizada a deduzir o IVA a montante, uma vez que o adquirente do bem imóvel não era a própria sociedade, mas pessoas singulares que, após a constituição da referida sociedade em 26 de abril de 2007, fizeram uma entrada para o capital da sociedade com este bem, a título de entrada em espécie. No que respeita à segunda fatura, as referidas autoridades fiscais consideraram que esta já não dava direito a dedução, dado que tinha sido emitida antes da inscrição da Polski Trawertyn no registo comercial. Tendo esta inscrição sido efetuada em 5 de junho de 2007, a fatura foi emitida em nome de uma sociedade ainda não existente.

22

Tendo o Dyrektor Izby Skarbowej w Poznaniu, na sequência de uma reclamação apresentada pela Polski Trawertyn, confirmado a posição da Administração Fiscal, esta sociedade recorreu para o Wojewódzki Sąd Administracyjny w Poznaniu (Tribunal Administrativo de voïvodie de Poznań). Uma vez que esse órgão jurisdicional negou provimento ao recurso, a referida sociedade interpôs recurso de cassação.

23

Em apoio do recurso de cassação, alegou, nomeadamente, que, uma vez que certos bens patrimoniais – no processo principal, mais precisamente, uma pedreira a céu aberto – tinham sido adquiridos para serem afetados a uma atividade económica, intenção em seguida confirmada por factos objetivos, isto é, a criação de uma empresa e o registo desta enquanto sujeito passivo, poderia razoavelmente concluir-se que os adquirentes agiram enquanto sujeitos passivos na aceção do artigo 9.o da Diretiva 2006/112. Ora, em virtude dos artigos 168.° e 169.° desta diretiva, um sujeito passivo tem o direito de deduzir o IVA pago a montante relativamente a despesas de investimento efetuadas para os fins de atividades que tem a intenção de exercer.

24

O Naczelny Sąd Administracyjny considera que a resolução do litígio que lhe foi submetido depende da questão de saber se, à luz dos artigos 9.°, 168.°, 169.°, 178.°, alínea a), e 226.° da Diretiva 2006/112 e tendo em conta os elementos factuais que caracterizam o processo principal, a Polski Trawertyn tem o direito de deduzir o IVA pago a título de aquisições efetuadas pelos seus sócios antes de a referida sociedade existir enquanto pessoa jurídica.

25

Nestas condições, o Naczelny Sąd Administracyjny decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)

[Uma sociedade que], na pessoa dos [seus] futuros sócios, […] efetua despesas de investimento antes do [seu] registo formal como [sociedade] comercial e [antes] do [seu] registo para efeitos de [IVA pode] […], após [a sua inscrição e o seu] registo […] para efeitos de [IVA, invocar um direito a] dedução [do IVA pago a montante], nos termos do artigo 9.o e dos artigos 168.° e 169.° da Diretiva 2006/112[…], relativo a despesas de investimento, em atividades tributadas […]?

2)

A fatura [relativa a] despesas de investimento […], emitida em nome dos sócios e não da sociedade, impede o exercício do direito [a] dedução do [IVA] relativo às despesas de investimento, a que se refere a primeira questão?»

Quanto às questões prejudiciais

Quanto à primeira questão

26

A título preliminar, há que salientar que, como resultou dos debates no Tribunal de Justiça por ocasião da audiência de alegações, é pacífico que os sócios não podem, em aplicação da regulamentação nacional aplicável no processo principal, invocar um direito a dedução do IVA pago sobre as despesas de investimento efetuadas antes do registo e da identificação da Polski Trawertyn para efeitos de IVA, para os fins das operações e tendo em vista a atividade económica desta, devido ao facto de a entrada do bem de investimento em causa ser uma operação isenta. Há que reconhecer que, numa situação como a que está em causa no processo principal, a referida regulamentação nacional não só não permite à dita sociedade invocar um direito a dedução do IVA pago sobre o bem de investimento em questão como impede igualmente os sócios que efetuaram as despesas de investimento de invocarem tal direito.

27

Nestas condições, deve considerar-se que a primeira questão tem por objeto, no essencial, saber se os artigos 9.°, 168.° e 169.° da Diretiva 2006/112 devem ser interpretados no sentido de que se opõem a uma regulamentação nacional que não permite aos sócios de uma sociedade nem a esta última invocar um direito a dedução do IVA pago a montante sobre despesas de investimento efetuadas, por estes sócios, antes do registo e da identificação da referida sociedade, para os fins das operações e tendo em vista a atividade económica desta última.

28

A fim de responder a esta questão, importa, em primeiro lugar, recordar que, segundo a jurisprudência do Tribunal de Justiça, as atividades económicas referidas pelo artigo 4.o, n.o 1, da Sexta Diretiva 77/388/CEE do Conselho, de 17 de maio de 1977, relativa à harmonização das legislações dos Estados-Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios – Sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado: matéria coletável uniforme (JO L 145, p. 1; EE 09 F1 p. 54; a seguir «Sexta Diretiva»), que é, no essencial, idêntico ao artigo 9.o, n.o 1, primeiro parágrafo, da Diretiva 2006/112, podem consistir em vários atos consecutivos e que as atividades preparatórias, como a aquisição dos meios de exploração e, portanto, a aquisição de um bem imóvel, já devem estar imputadas às atividades económicas (v., designadamente, acórdãos de 14 de fevereiro de 1985, Rompelman, 268/83, Recueil, p. 655, n.o 22, e de 29 de fevereiro de 1996, INZO, C-110/94, Colet., p. I-857, n.o 15).

29

O Tribunal de Justiça declarou igualmente que o princípio da neutralidade do IVA relativamente à carga fiscal da empresa exige que as primeiras despesas de investimento efetuadas para os fins das operações de uma empresa e a esta destinadas sejam consideradas atividades económicas, e que seria contrário a esse princípio que as referidas atividades só tivessem início no momento em que um bem imóvel é efetivamente explorado, ou seja, no momento em que nasce o rendimento tributável. Qualquer outra interpretação oneraria o operador económico com o custo do IVA no âmbito da sua atividade económica sem lhe dar a possibilidade de o deduzir e faria uma distinção arbitrária entre despesas de investimento efetuadas antes e durante a exploração efetiva de um bem imóvel (v., designadamente, acórdãos, já referidos, Rompelman, n.o 23, e INZO, n.o 16).

30

O Tribunal de Justiça concluiu que quem efetua tais atos de investimento estreitamente ligados e necessários à exploração futura de um bem imóvel deve ser considerado sujeito passivo (v. acórdão Rompelman, já referido, n.o 23).

31

Daqui resulta que, numa situação como a que está em causa no processo principal, que se caracteriza pelo facto de os sócios de uma sociedade terem efetuado, antes do registo e da identificação da referida sociedade para efeitos de IVA, investimentos necessários para a exploração futura do bem imóvel pela sua sociedade, tais sócios podem ser considerados sujeitos passivos para efeitos de IVA e estão portanto, em princípio, habilitados a invocar um direito a dedução do IVA pago a montante.

32

Por conseguinte, a circunstância de a entrada de um bem imóvel numa sociedade, efetuada pelos sócios desta, ser uma operação isenta de IVA e o facto de os referidos sócios não cobrarem IVA por ocasião desta operação não podem ter como consequência onerar estes com o custo do IVA no âmbito da sua atividade económica sem lhes dar a possibilidade de o deduzir ou de obter o respetivo reembolso (v., neste sentido, acórdão Rompelman, já referido, n.o 23).

33

Importa, em segundo lugar, salientar que o Tribunal de Justiça declarou que, em aplicação do princípio da neutralidade do IVA, um sujeito passivo, cujo único objeto social seja preparar a atividade económica de outro sujeito passivo e que não efetuou nenhuma operação tributável, pode invocar um direito a dedução em relação a operações tributáveis realizadas pelo segundo sujeito passivo (v., neste sentido, acórdão de 29 de abril de 2004, Faxworld, C-137/02, Colet., p. I-5547, n.os 41 e 42). Esta interpretação da Sexta Diretiva era relativa à situação em que o IVA que o primeiro sujeito passivo desejava deduzir se reportava às prestações adquiridas por este para efeitos da realização de operações tributáveis previstas pelo segundo sujeito passivo.

34

É certo que, como salientou o advogado-geral nos n.os 46 a 49 das suas conclusões, o âmbito factual e regulamentar do litígio que esteve na origem do reenvio prejudicial que deu origem ao acórdão Faxworld, já referido, era diferente do do processo que está na base do presente reenvio prejudicial. Todavia, os fundamentos subjacentes à interpretação adotada pelo Tribunal de Justiça naquele acórdão permanecem válidos em circunstâncias como as que caracterizam o litígio no processo principal.

35

Importa portanto concluir que, na medida em que, em aplicação da legislação nacional, os sócios, mesmo quando sejam considerados sujeitos passivos para efeitos de IVA, não possam utilizar operações tributáveis efetuadas pela Polski Trawertyn a fim de se desonerarem do custo do IVA ligado às operações de investimento efetuadas para os fins das operações e tendo em vista a atividade da referida sociedade, esta deve, de modo a garantir a neutralidade da carga fiscal, ter a possibilidade de tomar em consideração estas operações de investimento no momento da dedução do IVA (v., neste sentido, acórdão Faxworld, já referido, n.o 42).

36

Esta conclusão não é posta em causa pelo argumento segundo o qual o facto de, numa situação como a que está em causa no processo principal, permitir aos sócios recuperar o IVA que pagaram a montante ou de autorizar a Polski Trawertyn a deduzir este IVA é suscetível de aumentar o risco de fraudes ou de abusos do IVA.

37

Com efeito, decorre da jurisprudência do Tribunal de Justiça que a qualidade de sujeito passivo apenas é adquirida e o direito a dedução só pode ser exercido quando aquele que pede a dedução do IVA demonstrou que as condições para beneficiar daquela estão preenchidas e que a sua intenção de começar atividades económicas que darão lugar a operações tributáveis é confirmada por elementos objetivos. Se viesse a constatar que o direito a dedução foi exercido de forma fraudulenta ou abusiva, a Administração Fiscal poderia reclamar, com efeitos retroativos, a restituição das quantias deduzidas (v., designadamente, acórdãos Rompelman, já referido, n.o 24; INZO, já referido, n.o 24; e de 3 de março de 2005, Fini H, C-32/03, Colet., p. I-1599, n.o 33).

38

Tendo em conta estas considerações, há que responder à primeira questão prejudicial que os artigos 9.°, 168.° e 169.° da Diretiva 2006/112 devem ser interpretados no sentido de que se opõem a uma regulamentação nacional que não permite aos sócios de uma sociedade nem a esta última invocar um direito a dedução do IVA pago a montante sobre despesas de investimento efetuadas, por estes sócios, antes da constituição e do registo da referida sociedade, para os fins das operações e tendo em vista a atividade económica desta última.

Quanto à segunda questão

39

Com a sua segunda questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, no essencial, se os artigos 168.° e 178.°, alínea a), da Diretiva 2006/112 devem ser interpretados no sentido de que se opõem a uma regulamentação nacional em aplicação da qual, em circunstâncias como as que estão em causa no processo principal, o IVA pago a montante não pode ser deduzido por uma sociedade pelo facto de a fatura, emitida antes do registo e da identificação da referida sociedade para efeitos de IVA, ter sido emitida em nome dos futuros sócios da mesma sociedade.

40

A este respeito, importa recordar que o direito a dedução previsto nos artigos 167.° e seguintes da Diretiva 2006/112 faz parte integrante do mecanismo do IVA e não pode, em princípio, ser limitado. Esse direito exerce-se imediatamente em relação à totalidade dos impostos que incidiram sobre as operações efetuadas a montante (acórdão de 15 de julho de 2010, Pannon Gép Centrum, C-368/09, Colet., p. I-7467, n.o 37 e jurisprudência referida).

41

No que respeita aos requisitos formais do referido direito, resulta do artigo 178.o, alínea a), da Diretiva 2006/112 que o exercício deste está subordinado à posse de uma fatura. O artigo 226.o da Diretiva 2006/112 precisa que, sem prejuízo das disposições específicas previstas nesta diretiva, apenas as menções referidas neste artigo devem figurar obrigatoriamente, para efeitos de IVA, nas faturas emitidas em aplicação do artigo 220.o da referida diretiva. Em conformidade com o artigo 226.o, n.os 1 e 5, da mesma diretiva, a data de emissão da fatura, bem como o nome completo e o endereço do sujeito passivo e do adquirente ou do destinatário, devem também figurar nesta.

42

Resulta destas disposições que os Estados-Membros não podem fazer depender o exercício do direito a dedução do IVA da observância de requisitos relativos ao conteúdo das faturas, os quais não estão expressamente previstos nas disposições da Diretiva 2006/112. Esta interpretação é igualmente corroborada pelo artigo 273.o desta diretiva, que prevê que os Estados-Membros podem impor obrigações que considerem necessárias para garantir a cobrança exata do IVA e para evitar a fraude, mas que esta faculdade não pode ser utilizada para impor obrigações suplementares às fixadas pela referida diretiva (v. acórdão Pannon Gép Centrum, já referido, n.o 41).

43

Por outro lado, o Tribunal de Justiça declarou que o princípio fundamental da neutralidade do IVA exige que a dedução do imposto pago a montante seja concedida se os requisitos substanciais estiverem cumpridos, mesmo que os sujeitos passivos tenham negligenciado certos requisitos formais. Uma vez que a Administração Fiscal dispõe dos dados necessários para determinar que o sujeito passivo, enquanto destinatário das transações em causa, é devedor do IVA, não pode impor, no que diz respeito ao seu direito a dedução, requisitos adicionais que possam ter por efeito a inviabilização absoluta do exercício desse direito (v., no que respeita ao regime de autoliquidação, acórdão de 21 de outubro de 2010, Nidera Handelscompagnie, C-385/09, Colet., p. I-10385, n.o 42).

44

No que toca ao processo principal, deve reconhecer-se que, como decorre da fundamentação relativa à primeira questão prejudicial, os requisitos materiais previstos no artigo 168.o, alínea a), da Diretiva 2006/112 se afiguram estar reunidos para que, designadamente, a Polski Trawertyn possa beneficiar do direito a dedução do IVA relativo à aquisição do bem imóvel, uma vez que esta operação foi com efeito realizada para os fins das operações tributadas efetuadas pela referida sociedade.

45

Dado que a impossibilidade de a Polski Trawertyn exercer o seu direito a dedução do IVA pago a montante se deve ao facto de, à data da emissão da fatura relativa à referida aquisição, esta sociedade ainda não estar registada nem identificada para efeitos de IVA e de a fatura ter, portanto, sido emitida em nome dos sócios, e que existe, como o órgão jurisdicional de reenvio constatou, identidade entre as pessoas que pagaram o IVA a montante e as que constituem a Polski Trawertyn, tal impossibilidade deve ser considerada resultante de uma obrigação puramente formal.

46

Como precisou o advogado-geral no n.o 72 das suas conclusões, o respeito por tal obrigação não pode ser exigido quando, numa situação como a que está em causa no processo principal, essa exigência pudesse ter por efeito a inviabilização absoluta do exercício do direito a dedução e, portanto, pôr em causa a neutralidade do IVA.

47

Com efeito, decorre da jurisprudência que, por um lado, embora seja verdade que os sujeitos passivos, por força do artigo 213.o da Diretiva 2006/112, têm a obrigação de declarar o início, a alteração e a cessação das suas atividades, os Estados-Membros não estão de forma alguma autorizados, em caso de não apresentação dessa declaração, a privar o sujeito passivo do exercício desse direito (v. acórdão Nidera Handelscompagnie, já referido, n.o 48).

48

O Tribunal de Justiça declarou, por outro lado, que, embora uma fatura tenha efetivamente uma função documental importante pelo facto de poder conter dados controláveis, existem circunstâncias nas quais os dados podem ser validamente comprovados através de outros meios que não sejam uma fatura e em que a exigência de dispor de uma fatura em todos os pontos conforme com as disposições da Diretiva 2006/112 teria como consequência pôr em causa o direito a dedução de um sujeito passivo (v., neste sentido, acórdão de 1 de abril de 2004, Bockemühl, C-90/02, Colet., p. I-3303, n.os 51 e 52).

49

Ora, impõe-se salientar que, como decorre da decisão de reenvio, numa situação como a que está em causa no processo principal, os dados necessários para assegurar uma cobrança fiável e eficaz do IVA estão demonstrados.

50

Tendo em conta estas considerações, há que responder à segunda questão prejudicial que os artigos 168.° e 178.°, alínea a), da Diretiva 2006/112 devem ser interpretados no sentido de que se opõem a uma regulamentação nacional em aplicação da qual, em circunstâncias como as que estão em causa no processo principal, o IVA pago a montante não pode ser deduzido por uma sociedade quando a fatura, emitida antes do registo e da identificação da referida sociedade para efeitos de IVA, tiver sido emitida em nome dos sócios desta última.

Quanto às despesas

51

Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

 

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Primeira Secção) declara:

 

1)

Os artigos 9.°, 168.° e 169.° da Diretiva 2006/112/CE do Conselho, de 28 de novembro de 2006, relativa ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado, devem ser interpretados no sentido de que se opõem a uma regulamentação nacional que não permite aos sócios de uma sociedade nem a esta última invocar um direito a dedução do imposto sobre o valor acrescentado pago a montante sobre despesas de investimento efetuadas, por estes sócios, antes da constituição e do registo da referida sociedade, para os fins das operações e tendo em vista a atividade económica desta última.

 

2)

Os artigos 168.° e 178.°, alínea a), da Diretiva 2006/112 devem ser interpretados no sentido de que se opõem a uma regulamentação nacional em aplicação da qual, em circunstâncias como as que estão em causa no processo principal, o imposto sobre o valor acrescentado pago a montante não pode ser deduzido por uma sociedade quando a fatura, emitida antes do registo e da identificação da referida sociedade para efeitos de imposto sobre o valor acrescentado, tiver sido emitida em nome dos sócios desta última.

 

Assinaturas


( * )   Língua do processo: polaco.