C-479/13 - Comissão/França

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ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quarta Secção)

5 de março de 2015 (*)

«Incumprimento de Estado — Fiscalidade — IVA — Aplicação de uma taxa reduzida — Fornecimento de livros digitais ou eletrónicos»

No processo C‑479/13,

que tem por objeto uma ação por incumprimento nos termos do artigo 258.° TFUE, que deu entrada em 6 de setembro de 2013,

Comissão Europeia, representada por C. Soulay e F. Dintilhac, na qualidade de agentes, com domicílio escolhido no Luxemburgo,

demandante,

contra

República Francesa, representada por D. Colas e J.‑S. Pilczer, na qualidade de agentes,

demandada,

apoiada por:

Reino da Bélgica, representado por M. Jacobs e J.‑C. Halleux, na qualidade de agentes,

interveniente,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quarta Secção),

composto por: L. Bay Larsen, presidente de secção, K. Jürimäe, J. Malenovský, M. Safjan e A. Prechal (relatora), juízes,

advogado‑geral: P. Mengozzi,

secretário: A. Calot Escobar,

vistos os autos,

vista a decisão tomada, ouvido o advogado‑geral, de julgar a causa sem apresentação de conclusões,

profere o presente

Acórdão

1        Na sua petição, a Comissão Europeia pede ao Tribunal de Justiça que declare que, ao aplicar uma taxa reduzida de imposto sobre o valor acrescentado (a seguir «IVA») ao fornecimento de livros digitais (ou eletrónicos), a República Francesa não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força dos artigos 96.° e 98.° da Diretiva 2006/112/CE do Conselho, de 28 de novembro de 2006, relativa ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado (JO L 347, p. 1), conforme alterada pela Diretiva 2010/88/UE do Conselho, de 7 de dezembro de 2010 (JO L 326, p. 1, a seguir «diretiva IVA»), lidos em conjugação com os anexos II e III da referida diretiva e o Regulamento de Execução (UE) n.° 282/2011 do Conselho, de 15 de março de 2011, que estabelece medidas de aplicação da Diretiva 2006/112 (JO L 77, p. 1).

 Quadro jurídico

 Direito da União

2        O artigo 14.° da diretiva IVA prevê, no seu n.° 1:

«Entende‑se por ‘entrega de bens’ a transferência do poder de dispor de um bem corpóreo como proprietário.»

3        Nos termos do artigo 24.°, n.° 1, desta diretiva:

«Entende‑se por ‘prestação de serviços’ qualquer operação que não constitua uma entrega de bens.»

4        O artigo 96.° da referida diretiva dispõe:

«Os Estados‑Membros aplicam uma taxa normal de IVA fixada por cada Estado‑Membro numa percentagem do valor tributável que é idêntica para a entrega de bens e para a prestação de serviços.»

5        O artigo 98.°, n.os 1 e 2, da mesma diretiva prevê:

«1.      Os Estados‑Membros podem aplicar uma ou duas taxas reduzidas.

2.      As taxas reduzidas aplicam‑se apenas às entregas de bens e às prestações de serviços das categorias constantes do anexo III.

As taxas reduzidas não se aplicam aos serviços prestados por via eletrónica.»

6        O anexo II da diretiva IVA, que contém uma «[l]ista indicativa dos serviços prestados por via eletrónica a que se refere o artigo 58.° e a alínea k) do primeiro parágrafo do artigo 59.°», sendo que estes dois artigos regulam a determinação do lugar das prestações dos serviços efetuadas a pessoas que não sejam sujeitos passivos, menciona, no ponto 3:

«Fornecimento de imagens, textos e informações, e disponibilização de bases de dados».

7        Na versão inicial da Diretiva 2006/112, o seu anexo III, que incluía a lista das entregas de bens e das prestações de serviços a que se podem aplicar as taxas reduzidas previstas no artigo 98.° desta diretiva, mencionava no seu ponto 6:

«Fornecimento de livros, mesmo os emprestados por bibliotecas (e incluindo as brochuras, desdobráveis e outros impressos do mesmo tipo, álbuns ou livros de ilustrações e álbuns para desenhar ou colorir para crianças, pautas de música impressas ou manuscritas, mapas e cartas hidrográficas ou outras do mesmo tipo), jornais e publicações periódicas, com exceção dos materiais total ou predominantemente destinados a publicidade».

8        A Diretiva 2009/47/CE do Conselho, de 5 de maio de 2009 (JO L 116, p. 18), alterou a Diretiva 2006/112. O considerando 4 da Diretiva 2009/47 enuncia:

«Por conseguinte, a Diretiva 2006/112/CE deverá ser alterada de modo a permitir a aplicação de taxas reduzidas ou uma isenção, respetivamente, num número limitado de situações específicas, por razões sociais ou de saúde, e de modo a clarificar e adaptar ao progresso técnico a referência aos livros no seu anexo III.»

9        Desde 1 de junho de 2009, data da entrada em vigor da Diretiva 2009/47, o anexo III, ponto 6, da diretiva IVA tem a seguinte redação:

«Fornecimento de livros em todos os suportes físicos, mesmo os emprestados por bibliotecas (e incluindo as brochuras, desdobráveis e outros impressos do mesmo tipo, álbuns ou livros de ilustrações e álbuns para desenhar ou colorir para crianças, pautas de música impressas ou manuscritas, mapas e cartas hidrográficas ou outras do mesmo tipo), jornais e publicações periódicas, com exceção dos materiais total ou predominantemente destinados a publicidade».

10      O Regulamento de execução n.° 282/2011 prevê, no seu artigo 7.°, n.os 1 e 2:

«1.      Entende‑se por ‘serviços prestados por via eletrónica’ a que se refere a [diretiva IVA] os serviços que são prestados através da Internet ou de uma rede eletrónica e cuja natureza torna a sua prestação essencialmente automatizada, requerendo uma intervenção humana mínima, e que são impossíveis de assegurar na ausência de tecnologias da informação.

2.      O n.° 1 abrange, em especial, o seguinte:

[...]

f)      Serviços enumerados no Anexo I.»

11      O Anexo I do Regulamento de execução n.° 282/2011, sob a epígrafe «Artigo 7.° do presente regulamento», dispõe, no seu ponto 3:

«Ponto 3 do anexo II da [diretiva IVA]:

[...]

c)      Conteúdo digitalizado de livros e outras publicações eletrónicas;

[...]»

 Direito francês

12      O artigo 278‑0 bis do Código Geral dos Impostos (code général des impôts, a seguir «CGI»), na sua versão em vigor no termo do prazo fixado no parecer fundamentado enviado em 25 de outubro de 2012 à República Francesa, prevê:

«Aplica‑se a taxa reduzida do [IVA] de 5,5% às seguintes prestações:

A. — As operações de compra, de aquisição intracomunitária, de venda, de entrega, de comissão, de corretagem ou relativas a:

[...]

3°      Os livros, incluindo o seu empréstimo. O presente ponto 3° é aplicável a todos os livros em todos os suportes físicos, incluindo os fornecidos por descarregamento.

[...]»

 Procedimento pré‑contencioso e tramitação no Tribunal de Justiça

13      A Comissão considerou que o alargamento do benefício da taxa reduzida de IVA às operações relacionadas com livros fornecidos por descarregamento, a partir de 1 de janeiro de 2012, era contrário à diretiva IVA. Consequentemente, enviou à República Francesa, em 4 de julho de 2012, uma notificação para cumprir. Esse Estado‑Membro respondeu por carta de 3 de agosto de 2012.

14      Em 25 de outubro de 2012, a Comissão emitiu um parecer fundamentado, convidando a República Francesa a tomar as medidas necessárias para o cumprir no prazo de um mês a contar da sua notificação. Esse Estado‑Membro respondeu por carta de 23 de novembro de 2012.

15      Não tendo ficado satisfeita com as explicações dadas pela República Francesa, a Comissão decidiu intentar a presente ação.

16      Por decisão do presidente do Tribunal de Justiça de 6 de fevereiro de 2014, foi admitida a intervenção do Reino da Bélgica em apoio dos pedidos da República Francesa.

 Quanto à ação

 Observações preliminares

17      A Comissão precisa que, por fornecimento de livros digitais ou eletrónicos, se deve entender o fornecimento, a título oneroso, por meio de descarregamento ou de difusão em fluxo («streaming») a partir de um sítio na Internet, de livros em formato eletrónico que podem ser consultados num computador, num smartphone, num leitor de livros eletrónicos ou em qualquer outro sistema de leitura (a seguir «fornecimento de livros eletrónicos»).

18      A República Francesa alega que a definição de livros digitais ou eletrónicos aos quais poderá ser aplicada uma taxa reduzida de IVA em aplicação do artigo 278‑0 bis do CGI é mais estrita do que aquela que é acolhida pela Comissão. Segundo esse Estado‑Membro, a taxa reduzida de IVA apenas se aplica, nos termos desta disposição, aos livros designados de «homotéticos», isto é, os livros análogos aos livros impressos ou aos livres fornecidos noutro suporte físico e que apenas deles se distinguem por alguns elementos inerentes ao seu formato.

19      A este respeito, verifica‑se que a hipótese segundo a qual o artigo 278‑0 bis do CGI, no que diz respeito aos livros digitais ou eletrónicos, apenas se aplica aos livros homotéticos não permite, por si só, considerar que a Comissão se refere necessariamente, na sua ação, a uma categoria de livros digitais ou eletrónicos mais ampla do que aquela a que se aplica a taxa reduzida de IVA por força desta disposição. Com efeito, os livros digitais ou eletrónicos referidos pela Comissão na sua ação definem‑se pelo modo como são fornecidos. Ora, a República Francesa não contesta que, quanto a este critério, os livros homotéticos são livros iguais aos referidos pela Comissão na sua ação.

20      Por outro lado, apesar de o artigo 278‑0 bis do CGI utilizar o termo de «descarregamento», esse Estado‑Membro não afirma que o fornecimento de livros por meio de difusão em fluxo está excluído do âmbito de aplicação desta disposição.

21      Nestas circunstâncias, não há que restringir a apreciação da ação a uma categoria de livros digitais ou eletrónicos mais estrita do que aquela que é referida pela Comissão na sua petição.

 Quanto ao mérito

22      A Comissão alega que a aplicação, pela República Francesa, de uma taxa reduzida de IVA ao fornecimento de livros eletrónicos é incompatível com os artigos 96.° e 98.° da diretiva IVA, lidos em conjugação com os anexos II e III desta diretiva e o Regulamento de execução n.° 282/2011.

23      Essa instituição salienta que, nos termos do artigo 98.°, n.° 2, primeiro parágrafo, da diretiva IVA, as taxas reduzidas de IVA apenas se aplicam às entregas de bens e às prestações de serviços previstas no anexo III desta diretiva. Ora, o fornecimento de livros eletrónicos não está abrangido pelo âmbito de aplicação do referido anexo e não pode, assim, beneficiar de uma taxa reduzida de IVA. Segundo a Comissão, esta interpretação é confirmada pelo artigo 98.°, n.° 2, segundo parágrafo, da diretiva IVA, que exclui a aplicação de uma taxa reduzida aos serviços prestados por via eletrónica.

24      A República Francesa, apoiada pelo Reino da Bélgica, contesta a interpretação que a Comissão faz das disposições em causa da diretiva IVA. Segundo esses Estados‑Membros, o fornecimento de livros eletrónicos está incluído no ponto 6 do anexo III da diretiva IVA e pode, consequentemente, beneficiar de uma taxa reduzida de IVA.

25      A este respeito, recorde‑se que o artigo 96.° da diretiva IVA prevê que a mesma taxa de IVA, isto é, a taxa normal, é aplicável às entregas de bens e às prestações de serviços. Em derrogação a este princípio, o artigo 98.°, n.° 1, desta diretiva reconhece aos Estados‑Membros a faculdade de aplicarem uma ou duas taxas reduzidas de IVA. Nos termos do n.° 2, primeiro parágrafo, desse artigo, as taxas reduzidas de IVA aplicam‑se apenas às entregas de bens e às prestações de serviços das categorias constantes do anexo III da diretiva IVA (acórdão K, C‑219/13, EU:C:2014:2207, n.os 21 e 22).

26      No que diz respeito ao argumento, invocado pela República Francesa e pelo Reino da Bélgica, segundo o qual o fornecimento de livros eletrónicos é abrangido pelo ponto 6 do anexo III da diretiva IVA, deve recordar‑se que, para determinar o alcance de uma disposição de direito da União, há que ter simultaneamente em conta os seus termos, o seu contexto e os seus objetivos (v., designadamente, acórdão NCC Construction Danmark, C‑174/08, EU:C:2009:669, n.° 23 e jurisprudência aí referida).

27      Importa referir que esse anexo III menciona expressamente, no seu ponto 6, na categoria das prestações de serviços a que se podem aplicar as taxas reduzidas de IVA, o «fornecimento de livros em todos os suportes físicos». Resulta, assim, da redação desse ponto que a taxa reduzida de IVA se aplica à operação que consiste em fornecer um livro em suporte físico. Como observa a Comissão, com razão, uma interpretação em sentido diverso esvaziaria de sentido a expressão «em todos os suportes físicos» constante daquele ponto.

28      Apesar de um livro eletrónico, para poder ser lido, implicar um suporte físico, como um computador, esse suporte não está incluído no fornecimento de livros eletrónicos.

29      Daqui resulta que, atendendo à redação desse ponto 6, essa disposição não inclui no seu âmbito de aplicação o fornecimento de livros eletrónicos.

30      Esta interpretação é corroborada pelo contexto da referida disposição. Com efeito, esta constitui uma exceção ao princípio segundo o qual os Estados‑Membros aplicam uma taxa normal de IVA às operações sujeitas a este imposto e deve, portanto, ser interpretada de forma estrita (v., designadamente, acórdão Comissão/Espanha, C‑360/11, EU:C:2013:17, n.° 18 e jurisprudência aí referida).

31      É certo que, como referem com razão a República Francesa e o Reino da Bélgica, com o alargamento — na sequência da alteração introduzida pela Diretiva 2009/47 — do âmbito de aplicação do ponto 6 do anexo III da diretiva IVA ao «fornecimento de livros em todos os suportes físicos», o objetivo do legislador da União Europeia, como resulta do considerando 4 da Diretiva 2009/47, foi o de clarificar e adaptar ao progresso técnico a referência ao conceito de «livros» que figura nesse ponto.

32      Por outro lado, como alegou acertadamente a República Francesa, ao elaborar o anexo III da Diretiva 2006/112, aquele legislador pretendeu que os bens essenciais e os bens e serviços que correspondam a objetivos sociais ou culturais, desde que não apresentem ou apresentem poucos riscos de distorção da concorrência, pudessem ser objeto de uma taxa reduzida de IVA (v., neste sentido, acórdão Comissão/Países Baixos, C‑41/09, EU:C:2011:108, n.° 52).

33      Todavia, não deixa de ser verdade que, como resulta do artigo 98.°, n.° 2, segundo parágrafo, da diretiva IVA, o legislador também decidiu excluir qualquer possibilidade de aplicar uma taxa reduzida de IVA aos «serviços prestados por via eletrónica».

34      Ora, o fornecimento de livros eletrónicos constitui um «serviço prestado por via eletrónica», na aceção desse artigo 98.°, n.° 2, segundo parágrafo.

35      Com efeito, por um lado, nos termos do artigo 24.°, n.° 1, da diretiva IVA, entende‑se por «prestação de serviços» qualquer operação que não constitua uma entrega de bens, ao passo que, nos termos do artigo 14.°, n.° 1, desta diretiva, se entende por uma «entrega de bens» a transferência do poder de dispor de um bem corpóreo como proprietário. Ora, contrariamente ao que alega a República Francesa, o fornecimento de livros eletrónicos não pode ser considerado uma «entrega de bens», na aceção desta última disposição, pelo facto de o livro eletrónico não poder ser qualificado de bem corpóreo. Com efeito, como resulta do n.° 28 do presente acórdão, o suporte físico que permite a leitura desse livro e que poderá ser qualificado de «bem corpóreo» não está incluído no fornecimento. Por conseguinte, em aplicação desse artigo 24.°, n.° 1, o fornecimento de livros eletrónicos deve ser qualificado de prestação de serviços.

36      Por outro lado, em conformidade com o artigo 7.°, n.° 1, do Regulamento de execução n.° 282/2011, constituem serviços prestados por via eletrónica, na aceção da diretiva IVA, «os serviços que são prestados através da Internet ou de uma rede eletrónica e cuja natureza torna a sua prestação essencialmente automatizada, requerendo uma intervenção humana mínima, e que são impossíveis de assegurar na ausência de tecnologias da informação». Há que reconhecer que o fornecimento de livros eletrónicos corresponde a esta definição.

37      Esta interpretação é confirmada pelo ponto 3 do anexo II da diretiva IVA, lido em conjugação com o artigo 7.°, n.os 1 e 2, do referido regulamento de execução e o ponto 3 do seu Anexo I, de onde resulta que o fornecimento do conteúdo digitalizado de livros constitui um serviço dessa natureza.

38      A tal não se opõe o facto de o anexo II da diretiva IVA conter uma lista indicativa dos serviços prestados por via eletrónica a que se referem o artigo 58.° e o artigo 59.°, primeiro parágrafo, alínea k), da diretiva IVA. Com efeito, o facto de este anexo apenas elencar os serviços prestados por via eletrónica que sejam pertinentes para a aplicação destas últimas duas disposições não tem qualquer efeito sobre a própria natureza desses serviços.

39      Além disso, como resulta da letra do artigo 7.°, n.° 1, do Regulamento de execução n.° 282/2011, a referência feita, no contexto desta disposição, aos serviços elencados no ponto 3 do anexo II da diretiva IVA serve para determinar os serviços prestados por via eletrónica abrangidos pela diretiva IVA em geral e não apenas por determinadas disposições desta diretiva.

40      Por conseguinte, uma vez que o fornecimento de livros eletrónicos é um serviço prestado por via eletrónica, na aceção do artigo 98.°, n.° 2, segundo parágrafo, da diretiva IVA, e que esta disposição exclui qualquer possibilidade de aplicar uma taxa reduzida de IVA aos serviços dessa natureza, o ponto 6 do anexo III da diretiva IVA não pode ser interpretado no sentido de incluir no seu âmbito de aplicação o fornecimento de livros eletrónicos, sem violar a intenção do legislador da União de não permitir que esses serviços beneficiem de uma taxa reduzida de IVA.

41      Daqui resulta que, atendendo quer à letra do ponto 6 do anexo III da diretiva IVA quer ao seu contexto e aos objetivos da regulamentação em que se insere esta disposição, este ponto não poderá ser interpretado no sentido de incluir no seu âmbito de aplicação o fornecimento de livros eletrónicos.

42      Contrariamente ao que alegam a República Francesa e o Reino da Bélgica, esta interpretação não é posta em causa pelo princípio da neutralidade fiscal, que constitui a tradução, pelo legislador da União, em matéria de IVA, do princípio geral da igualdade de tratamento (acórdão NCC Construction Danmark, EU:C:2009:669, n.° 41 e jurisprudência aí referida).

43      Com efeito, o princípio da neutralidade fiscal não permite alargar o âmbito de aplicação dessa isenção quando não exista uma disposição inequívoca (v., neste sentido, acórdão Zimmermann, C‑174/11, EU:C:2012:716, n.° 50 e jurisprudência aí referida). Ora, o ponto 6 do anexo III da diretiva IVA não é uma disposição que, de modo inequívoco, alargue o âmbito de aplicação das taxas reduzidas de IVA ao fornecimento de livros eletrónicos. Pelo contrário, como resulta do n.° 41 do presente acórdão, esse fornecimento não é abrangido por esta disposição.

44      Uma vez que é igualmente pacífico que o fornecimento de livros eletrónicos não está incluído em nenhuma outra categoria de prestações de serviços, mencionada no anexo III da diretiva IVA, a aplicação de uma taxa reduzida de IVA a esse fornecimento não está em conformidade com o artigo 98.°, n.° 2, da diretiva IVA.

45      Daqui resulta que a ação da Comissão é procedente.

46      Por conseguinte, há que concluir que, ao aplicar uma taxa reduzida de IVA ao fornecimento de livros eletrónicos, a República Francesa não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força dos artigos 96.° e 98.° da diretiva IVA, lidos em conjugação com os anexos II e III da referida diretiva e o Regulamento de execução n.° 282/2011.

 Quanto às despesas

47      Por força do disposto no artigo 138.°, n.° 1, do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo a Comissão pedido a condenação da República Francesa e tendo esta sido vencida, há que condená‑la a suportar as suas próprias despesas e as efetuadas pela Comissão.

48      Nos termos do disposto no artigo 140.°, n.° 1, deste mesmo regulamento, os Estados‑Membros que intervenham no processo devem suportar as suas próprias despesas. O Reino da Bélgica suportará, por conseguinte, as suas próprias despesas.

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Quarta Secção) decide:

1)      Ao aplicar uma taxa reduzida de imposto sobre o valor acrescentado ao fornecimento de livros digitais ou eletrónicos, a República Francesa não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força dos artigos 96.° e 98.° da Diretiva 2006/112/CE do Conselho, de 28 de novembro de 2006, relativa ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado, conforme alterada pela Diretiva 2010/88/UE do Conselho, de 7 de dezembro de 2010, lidos em conjugação com os anexos II e III da referida diretiva e o Regulamento de Execução (UE) n.° 282/2011 do Conselho, de 15 de março de 2011, que estabelece medidas de aplicação da Diretiva 2006/112.

2)      A República Francesa suporta as suas próprias despesas e as efetuadas pela Comissão Europeia.

3)      O Reino da Bélgica suporta as suas próprias despesas.

Assinaturas


* Língua do processo: francês.