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61998J0023

Acórdão do Tribunal (Sexta Secção) de 27 de Janeiro de 2000. - Staatssecretaris van Financiën contra J. Heerma. - Pedido de decisão prejudicial: Hoge Raad - Países Baixos. - Sexta Directiva IVA - Transacções entre um sócio e a sociedade. - Processo C-23/98.

Colectânea da Jurisprudência 2000 página I-00419


Sumário
Partes
Fundamentação jurídica do acórdão
Decisão sobre as despesas
Parte decisória

Palavras-chave


Disposições fiscais - Harmonização das legislações - Impostos sobre o volume de negócios - Sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado - Actividades económicas na acepção do artigo 4._ da Sexta Directiva - Actividades realizadas de modo independente - Conceito - Locação de um bem corpóreo numa sociedade por um arrendatário sócio da mesma sociedade - Inclusão - Actividade económica do arrendatário limitada a esta locação - Irrelevância

(Directiva 77/388 do Conselho, artigo 4._, n.os 1 e 4)

Sumário


$$O artigo 4._, n._ 1, da Sexta Directiva 77/388, relativa à harmonização das legislações dos Estados-Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios, deve ser interpretado no sentido de que, quando uma pessoa tem como única actividade económica, na acepção desta disposição, a locação de um bem corpóreo a uma sociedade da qual essa pessoa é sócia, essa locação deve ser considerada realizada de modo independente para efeitos desta mesma disposição.

Com efeito, não existem, no que diz respeito a essa actividade, entre a sociedade e o sócio laços de subordinação análogos aos referidos no artigo 4._, n._ 4, primeiro parágrafo, da directiva que privem o sócio de independência. Pelo contrário, este, ao dar em locação um bem corpóreo à sociedade, age em nome próprio, por conta própria e sob a sua própria responsabilidade, ainda que seja ao mesmo tempo gerente da sociedade arrendatária. Com efeito, essa locação não é um acto de gestão ou de representação da sociedade. Neste contexto, pouco importa que o sócio limite a sua actividade à locação de um bem corpóreo à sociedade na qual detém uma participação. Com efeito, este facto não tem incidência na apreciação da independência do sócio na realização da actividade económica em causa, para efeitos do n._ 1 do artigo 4._ da directiva, podendo, quando muito, influir na própria qualificação como actividade económica para efeitos deste artigo.

(cf. n.os 18-19, 22 e disp.)

Partes


No processo C-23/98,

que tem por objecto um pedido dirigido ao Tribunal de Justiça, nos termos do artigo 177._ do Tratado CE (actual artigo 234._ CE), pelo Hoge Raad der Nederlanden (Países Baixos), destinado a obter, no litígio pendente neste órgão jurisdicional entre

Staatssecretaris van Financiën

e

J. Heerma,

uma decisão a título prejudicial sobre a interpretação do artigo 4._, n._ 1, da Sexta Directiva 77/388/CEE do Conselho, de 17 de Maio de 1977, relativa à harmonização das legislações dos Estados-Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios - sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado: matéria colectável uniforme (JO L 145, p. 1; EE 09 F1 p. 54),

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA

(Sexta Secção),

composto por: P. J. G. Kapteyn, exercendo funções de presidente da Sexta Secção, G. Hirsch (relator) e H. Ragnemalm, juízes,

advogado-geral: G. Cosmas

secretário: H. A. Rühl, administrador principal

vistas as observações escritas apresentadas:

- em representação do Governo neerlandês, por A. Bos, consultor jurídico no Ministério dos Negócios Estrangeiros, na qualidade de agente,

- em representação do Governo alemão, por E. Röder, Ministerialrat no Ministério Federal da Economia, na qualidade de agente,

- em representação da Comissão das Comunidades Europeias, por H. van Vliet, membro do Serviço Jurídico, na qualidade de agente, assistido por L. van den Berghe, advogado no foro de Bruxelas,

visto o relatório para audiência,

ouvidas as alegações de J. Heerma, representado por J. Boele, consultor fiscal no Accountants en bedrijfsadviseurs ALFA BEAG, do Governo neerlandês, representado por J. S. van den Oosterkamp, consultor jurídico adjunto no Ministério dos Negócios Estrangeiros, na qualidade de agente, e da Comissão, representada por H. van Vliet, na audiência de 18 de Março de 1999,

ouvidas as conclusões do advogado-geral apresentadas na audiência de 20 de Maio de 1999,

profere o presente

Acórdão

Fundamentação jurídica do acórdão


1 Por acórdão de 12 de Novembro de 1997, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 28 de Janeiro de 1998, o Hoge Raad der Nederlanden submeteu, nos termos do artigo 177._ do Tratado CE (actual artigo 234._ CE), uma questão prejudicial sobre a interpretação do artigo 4._, n._ 1, da Sexta Directiva 77/388/CEE do Conselho, de 17 de Maio de 1977, relativa à harmonização das legislações dos Estados-Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios - sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado: matéria colectável uniforme (JO L 145, p. 1; EE 09 F1 p. 54, a seguir «Sexta Directiva»),

2 A questão foi suscitada no quadro de um litígio entre J. Heerma e a administração fiscal neerlandesa a propósito da tributação em imposto sobre o valor acrescentado (a seguir «IVA») de um arrendamento de um imóvel pertencente a J. Heerma a uma sociedade civil de direito neerlandês na qual detém uma participação social.

O enquadramento jurídico

3 O artigo 2._, n._ 1, da Sexta Directiva sujeita a IVA as entregas de bens e as prestações de serviços, efectuadas a título oneroso, no território do país, por um sujeito passivo agindo nessa qualidade.

4 Segundo dispõe o artigo 4._ da mesma Sexta Directiva:

«1. Por `sujeito passivo' entende-se qualquer pessoa que exerça, de modo independente, em qualquer lugar, uma das actividades económicas referidas no n._ 2, independentemente do fim ou do resultado dessa actividade.

2. As actividades económicas referidas no n._ 1 são todas as actividades de produção, de comercialização ou de prestação de serviços, incluindo as actividades extractivas, agrícolas e as das profissões liberais ou equiparadas. A exploração de um bem corpóreo ou incorpóreo com o fim de auferir receitas com carácter de permanência é igualmente considerada uma actividade económica.

3. ...

4. A expressão `de modo independente', utilizada no n._ 1, exclui da tributação os assalariados e outras pessoas, na medida em que se encontrem vinculados à entidade patronal por um contrato de trabalho ou por qualquer outra relação jurídica que estabeleça vínculos de subordinação no que diz respeito às condições de trabalho e de remuneração e à responsabilidade da entidade patronal.

Sem prejuízo da consulta prevista no artigo 29._, os Estados-Membros podem considerar como um único sujeito passivo as pessoas estabelecidas no território do país que, embora juridicamente independentes, se encontrem estreitamente vinculadas entre si nos planos financeiro, económico e de organização.

5. ...»

5 O artigo 13._, parte B, alínea b), da Sexta Directiva prevê que os Estados-Membros isentem, em princípio, de IVA os arrendamentos. Porém, o artigo 13._, parte C, primeiro parágrafo, alínea a), da mesma directiva autoriza os Estados-Membros a concederem aos seus sujeitos passivos, em relação a este tipo de transacções, o direito de optarem pela tributação.

6 Em conformidade com estas disposições, a legislação neerlandesa prevê a possibilidade de opção pela tributação em caso de arrendamento.

O litígio no processo principal

7 J. Heerma, que era proprietário de uma exploração agrícola, constituiu em 1 de Janeiro de 1994 com o seu cônjuge uma sociedade civil (a seguir «sociedade Heerma»), para a qual transferiu bens móveis consistentes em meios de produção da exploração agrícola.

8 As sociedades civis de direito neerlandês não têm personalidade jurídica. Porém, gozam da independência de facto de uma sociedade que dela seja provida e realizam actividades económicas de forma independente, de modo que é a sociedade civil e não o ou os sócios que gerem a empresa que deve ser considerada sujeito passivo na acepção do artigo 4._ da Sexta Directiva.

9 Durante o ano de 1994, J. Heerma iniciou a construção de um estábulo que arrendou depois à sociedade civil Heerma pelo prazo de seis anos a partir de 1 de Novembro de 1994, por uma renda anual de 12 000 NLG.

10 J. Heerma e a sociedade civil Heerma requereram a dispensa de isenção de IVA para este arrendamento. A administração das finanças neerlandesa indeferiu esse pedido bem como a reclamação apresentada contra esse indeferimento. J. Heerma interpôs então recurso para o Gerechtshof te Leeuwarden, que anulou as decisões da administração de indeferimento do pedido e da reclamação e declarou que o arrendamento do estábulo efectuado por J. Heerma não estava isento de IVA.

11 A administração fiscal interpôs no Hoge Raad der Nederlanden um recurso contra esta decisão. Este órgão jurisdicional faz notar que não foi contestado que o arrendamento foi efectuado por J. Heerma com o objectivo de obter receitas com carácter de permanência, de modo que deve ser havido como uma actividade económica na acepção do artigo 4._, n._ 2, da Sexta Directiva. Tendo em conta o laço existente entre o locador e a arrendatária, levanta-se, em contrapartida, a questão de saber se o artigo 4._, n._ 1, da Sexta Directiva deve ser interpretado no sentido de que o arrendamento deve ser havido como uma actividade económica realizada a título independente ou se se deve considerar que o requisito de independência previsto por esta disposição não se encontra satisfeito. A verificar-se esta última hipótese, segundo o órgão jurisdicional de reenvio, tal poderia implicar a assimilação do sócio locador à sociedade civil arrendatária e, consequentemente, a consideração de um único sujeito passivo do imposto na acepção da disposição em causa.

12 Nestas condições, o Hoge Raad der Nederlanden decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça a seguinte questão prejudicial:

«O artigo 4._, n._ 1, da Sexta Directiva deve ser interpretado no sentido de que, se uma pessoa tiver como única actividade económica a locação de um bem corpóreo à sociedade de que faz parte, essa locação, embora constituindo uma actividade económica, deve ser vista como realizada de modo não independente, porque o sócio deve ser considerado conjuntamente com a sociedade como um único sujeito passivo de imposto, na acepção do artigo 4._, n._ 1?»

Quanto à questão prejudicial

13 Há que salientar, liminarmente, por um lado, que J. Heerma, que não colocou o estábulo à disposição da sociedade civil Heerma sob a forma de uma entrada no capital da sociedade em contrapartida de uma participação nos lucros e perdas dessa sociedade, mas sob a forma de um arrendamento que implica o pagamento de uma renda, efectuou essa prestação a título oneroso, na acepção do artigo 2._ da Sexta Directiva.

14 Por outro lado, baseando-se no acórdão de 26 de Setembro de 1996, Enkler (C-230/94, Colect., p. I-4517), o órgão jurisdicional de reenvio deu por assente que J. Heerma realizava uma actividade económica na acepção do n._ 2 do artigo 4._ da Sexta Directiva, dado que o arrendamento do estábulo tinha sido feito com o objectivo de obter receitas com carácter de permanência.

15 O Governo neerlandês alega que não há independência económica na acepção do artigo 4._, n._ 1, da Sexta Directiva quando a locação de um bem corpóreo se limita a uma operação em circuito fechado, como o é a actividade de um sócio de uma sociedade civil de direito neerlandês consistente em dar em locação um bem a essa mesma sociedade. Com efeito, o locador que é simultaneamente sócio seria co-responsável do cumprimento das obrigações da sociedade locatária decorrentes do arrendamento.

16 Ao invés, o Governo alemão e a Comissão sustentam que um sócio que dá um bem em locação à sociedade na qual detém uma participação, o faz de modo independente nas condições do presente caso. A Comissão sublinha a este propósito que o facto de as partes contratantes, isto é, o sócio e a sociedade, não terem interesses opostos, mas, ao contrário, interesses convergentes não basta para os considerar como um único sujeito de imposto.

17 Há que declarar que um sócio que, como J. Heerma no processo principal, dá de arrendamento um imóvel à sociedade que tem a qualidade de sujeito passivo do imposto na qual ele detém uma participação age de modo independente na acepção do artigo 4._, n._ 1, da Sexta Directiva.

18 Com efeito, não existem, no que diz respeito a essa actividade, entre a sociedade e o sócio, laços de subordinação análogos aos referidos no artigo 4._, n._ 4, primeiro parágrafo, da Sexta Directiva que privem o sócio de independência. Pelo contrário, este, ao dar em locação um bem corpóreo à sociedade age em nome próprio, por conta própria e sob a sua própria responsabilidade, ainda que seja ao mesmo tempo gerente da sociedade arrendatária. Com efeito, essa locação não é um acto de gestão ou de representação da sociedade.

19 Neste contexto, pouco importa, ao contrário do que sustenta o Governo neerlandês, que o sócio limite a sua actividade à locação de um bem corpóreo à sociedade na qual detém uma participação. Com efeito, este facto não tem incidência na apreciação da independência do sócio na realização da actividade económica em causa, para efeitos do n._ 1 do artigo 4._ da Sexta Directiva, podendo, quando muito, influir na própria qualificação como actividade económica para efeitos deste artigo. Quanto a este aspecto, porém, como salientou o órgão jurisdicional de reenvio, resulta do n._ 22 do acórdão Enkler, já referido, que a locação de bens corpóreos constitui uma forma de exploração desses bens, que deve ser qualificada como actividade económica, na acepção do artigo 4._, n._ 2, da Sexta Directiva, se for exercida com o fim de auferir receitas com carácter de permanência.

20 É verdade que, segundo o artigo 4._, n._ 4, segundo parágrafo, da Sexta Directiva, os Estados-Membros podem, ressalvada a consulta prévia prevista no artigo 29._, considerar como um único sujeito passivo as pessoas estabelecidas no território do país que sejam juridicamente independentes mas que estejam estreitamente ligadas entre si no plano financeiro, económico e de organização.

21 No entanto, como sublinhou o advogado-geral no n._ 22 das suas conclusões, não há que examinar esta disposição porque a administração neerlandesa não invocou, no processo principal, a existência de uma unidade fiscal na acepção deste artigo.

22 Há assim que responder à questão submetida que o artigo 4._, n._ 1, da Sexta Directiva deve ser interpretado no sentido de que, quando uma pessoa tem como única actividade económica, na acepção deste artigo, a locação de um bem corpóreo a uma sociedade, como uma sociedade de direito civil neerlandês, da qual essa pessoa é sócia, essa locação deve ser considerada realizada de modo independente para efeitos deste mesmo artigo.

Decisão sobre as despesas


Quanto às despesas

23 As despesas efectuadas pelos Governos neerlandês e alemão, bem como pela Comissão, que apresentaram observações no Tribunal de Justiça, não são reembolsáveis. Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional nacional, compete a este decidir quanto às despesas.

Parte decisória


Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA

(Sexta Secção),

pronunciando-se sobre a questão submetida pelo Hoge Raad der Nederlanden, através do seu acórdão de 12 de Novembro de 1997, declara:

O artigo 4._, n._ 1, da Sexta Directiva 77/388/CEE do Conselho, de 17 de Maio de 1977, relativa à harmonização das legislações dos Estados-Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios - sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado: matéria colectável uniforme deve ser interpretado no sentido de que, quando uma pessoa tem como única actividade económica, na acepção deste artigo, a locação de um bem corpóreo a uma sociedade, como uma sociedade de direito civil neerlandês, da qual essa pessoa é sócia, essa locação deve ser considerada realizada de modo independente para efeitos deste mesmo artigo.