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Processo C-152/03

Hans-Jürgen Ritter-Coulais

e

Monique Ritter-Coulais

contra

Finanzamt Germersheim

(pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Bundesfinanzhof)

«Legislação fiscal – Impostos sobre o rendimento – Artigo 48.° do Tratado CEE (que passou a artigo 48.° do Tratado CE, que, por sua vez, passou, após alteração, a artigo 39.° CE) – Legislação nacional que limita a tomada em consideração das perdas de rendimento do arrendamento de bens imóveis situados no território de outro Estado-Membro»

Conclusões do advogado-geral P. Léger apresentadas em 1 de Março de 2005 

Acórdão do Tribunal de Justiça (Grande Secção) de 21 de Fevereiro de 2006 

Sumário do acórdão

Livre circulação de pessoas – Trabalhadores – Igualdade de tratamento

[Tratado CEE, artigo 48.° (que passou a artigo 48.° do Tratado CE, que, por sua vez, passou, após alteração, a artigo 39.° CE)]

O artigo 48.° do Tratado CEE (que passou a artigo 48.° do Tratado CE, que, por sua vez, passou, após alteração, a artigo 39.° CE), deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma legislação nacional que não permite que as pessoas singulares que auferem rendimentos provenientes de uma actividade profissional dependente num Estado-Membro e que aí são tributadas pelo rendimento global solicitem, para efeitos da determinação da taxa de imposto sobre os referidos rendimentos neste Estado, a tomada em consideração das perdas de rendimento do arrendamento resultantes da utilização de uma casa de habitação que ocupam pessoalmente para esse fim e que se situa noutro Estado-Membro, quando, pelo contrário, os rendimentos positivos do arrendamento dessa casa são tomados em consideração.

(cf. n.° 41, disp.)




ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Grande Secção)

21 de Fevereiro de 2006 (*)

«Legislação fiscal – Impostos sobre o rendimento – Artigo 48.° do Tratado CEE (que passou a artigo 48.° do Tratado CE, que, por sua vez, passou, após alteração, a artigo 39.° CE) – Legislação nacional que limita a tomada em consideração das perdas de rendimento do arrendamento de bens imóveis situados no território de outro Estado-Membro»

No processo C-152/03,

que tem por objecto um pedido de decisão prejudicial nos termos do artigo 234.° CE, apresentado pelo Bundesfinanzhof (Alemanha), por decisão de 13 de Novembro de 2002, entrado no Tribunal de Justiça em 2 de Abril de 2003, no processo

Hans-Jürgen Ritter-Coulais,

Monique Ritter-Coulais

contra

Finanzamt Germersheim,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Grande Secção),

composto por: V. Skouris, presidente, P. Jann, C. W. A. Timmermans e A. Rosas, presidentes de secção, N. Colneric, S. von Bahr (relator), J. N. Cunha Rodrigues, R. Silva de Lapuerta, P. Kūris, E. Juhász, G. Arestis, A. Borg Barthet e M. Ilešič, juízes,

advogado-geral: P. Léger,

secretário: M.-F. Contet, administradora principal,

vistos os autos e após a audiência de 12 de Outubro de 2004,

vistas as observações apresentadas:

–       em representação de H.-J. Ritter-Coulais e M. Ritter-Coulais, por M. Ross, Rechtsanwalt,

–       em representação do Governo alemão, por A. Tiemann e K.-D. Müller, na qualidade de agentes,

–       em representação do Governo do Reino Unido, por C. Jackson, na qualidade de agente, assistida por R. Plender, QC,

–       em representação da Comissão das Comunidades Europeias, por J. Grunwald e R. Lyal, na qualidade de agentes,

ouvidas as conclusões do advogado-geral na audiência de 1 de Março de 2005,

profere o presente

Acórdão

1       O pedido de decisão prejudicial tem por objecto a interpretação dos artigos 52.° do Tratado CEE (que passou a artigo 52.° do Tratado CE, que, por sua vez, passou, após alteração, a artigo 43.° CE) e 73.°-B do Tratado CE (actual artigo 56.° CE).

2       Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe H.-J. Ritter-Coulais e M. Ritter-Coulais (a seguir «casal Ritter-Coulais») ao Finanzamt Germersheim, a respeito do imposto sobre o rendimento a que foram sujeitos na Alemanha no ano de 1987.

 Quadro jurídico, litígio no processo principal e questões prejudiciais

3       O casal Ritter-Coulais foi tributado na Alemanha, relativamente ao exercício fiscal de 1987, em imposto sobre o rendimento das pessoas singulares, sobre a totalidade dos seus rendimentos, nos termos do § 1, n.° 3, da lei relativa ao imposto sobre o rendimento das pessoas singulares (Einkommensteuergesetz, a seguir «EStG 1987»), na sua versão aplicável em 1987. Recebiam, no referido Estado-Membro, rendimentos do trabalho como professores de liceu, mas residiam numa casa unifamiliar situada em França, de que eram proprietários. Resulta dos autos que, nessa época, H.-J. Ritter-Coulais tinha nacionalidade alemã e M. Ritter-Coulais tinha dupla nacionalidade, francesa e alemã.

4       Nos termos do § 32b, n.° 2, ponto 2, da EStG 1987, o casal Ritter-Coulais pediu que fossem tidos em conta os «rendimentos negativos» (perdas de rendimento) resultantes da utilização em proveito próprio da sua casa de habitação, para o cálculo da taxa dos impostos que deviam pagar relativamente ao referido exercício fiscal.

5       Os referidos «rendimentos negativos» são rendimentos provenientes da exploração de bens imobiliários que apenas são tributados no Estado em que estão situados, a saber, no processo principal, em França, nos termos do artigo 3.° n.° 1, da convenção entre a República Francesa e a República Federal da Alemanha para evitar a dupla tributação e que estabelece regras de assistência administrativa e jurídica recíproca em matéria de imposto sobre o rendimento e sobre o património assim como em matéria de imposto sobre patentes e de impostos sobre rendimentos de imóveis, assinada em Paris, em 21 de Julho de 1959, com as alterações constantes de uma adenda de 9 de Junho de 1969 (a seguir «convenção fiscal franco-alemã»).

6       No entanto, o artigo 20.°, n.° 1, alínea a), da convenção fiscal franco-alemã dispõe que essa circunstância não limita o direito de a República Federal da Alemanha tomar em consideração esses rendimentos no momento da determinação da taxa dos impostos devidos nesse Estado-Membro.

7       Assim, nos termos do § 32b, n.os 1 e 2, da EStG 1987, a Administração Fiscal alemã toma em consideração, para o cálculo da taxa dos impostos, os rendimentos com origem no estrangeiro. O § 2a, n.° 1, primeiro período, ponto 4, da mesma lei dispõe no entanto que, caso não haja rendimentos positivos provenientes do arrendamento de um imóvel situado noutro Estado-Membro, não há que ter em consideração as perdas de rendimento da mesma natureza provenientes do mesmo Estado, na determinação da matéria colectável nem no cálculo da taxa dos impostos.

8       O casal Ritter-Coulais apresentou uma reclamação no Finanzamt Germersheim, com vista a que a taxa dos seus impostos relativos ao exercício fiscal de 1987 fosse calculada tendo em consideração os rendimentos negativos referentes a esse exercício. Tendo esta reclamação sido indeferida e tendo o órgão jurisdicional de primeira instância confirmado a posição da Administração Fiscal, o referido casal interpôs recurso de revista para o Bundesfinanzhof.

9       Este último órgão jurisdicional coloca a questão de saber se, no que respeita a contribuintes sujeitos ao pagamento de impostos na Alemanha, o diferente tratamento dos rendimentos negativos provenientes da exploração de imóveis, consoante estes se situem na Alemanha ou no território de outro Estado-Membro, é compatível com o direito comunitário e, designadamente, com a liberdade de estabelecimento e a livre circulação de capitais.

10     Nestas condições, o Bundesfinanzhof decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)      O facto de uma pessoa singular, sujeita a tributação global na Alemanha e que aí aufere rendimentos como trabalhador por conta de outrem, não poder deduzir do cálculo dos rendimentos tributáveis na Alemanha as perdas decorrentes do arrendamento de imóveis com origem noutro Estado-Membro contraria o disposto nos artigos 43.° CE e 56.° CE?

2)      Caso seja dada resposta negativa a esta questão, o facto de as referidas perdas também não poderem ser consideradas por via da chamada regra da progressividade negativa contraria o disposto nos artigos 43.° CE e 56.° CE?»

 Quanto à primeira questão

11     Através da sua primeira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta se as disposições do Tratado relativas à liberdade de estabelecimento e à livre circulação de capitais se opõem a uma legislação nacional como a que está em causa no processo principal. Este órgão jurisdicional observa que a referida legislação não permite que as pessoas singulares que se encontrem na situação do casal Ritter-Coulais, que auferem rendimentos provenientes de uma actividade profissional dependente num Estado-Membro e que aí são tributadas pelo rendimento global, deduzam da base de cálculo dos seus impostos devidos nesse Estado-Membro as perdas de rendimento resultantes da utilização de uma casa de habitação que ocupam pessoalmente para esse fim e que se situa noutro Estado-Membro.

12     Ora, resulta da decisão de reenvio que o casal Ritter-Coulais requereu ao Finanzamt Germersheim, no âmbito do litígio no processo principal, que tivesse em consideração as perdas de rendimento do arrendamento relativas ao exercício fiscal de 1987, não para a determinação da matéria colectável deste exercício mas apenas para o cálculo da taxa de imposto aplicável, situação objecto da segunda questão submetida no pedido de decisão prejudicial.

13     A este respeito, resulta de jurisprudência assente que o processo instituído pelo artigo 234.° CE é um instrumento de cooperação entre o Tribunal de Justiça e os órgãos jurisdicionais nacionais (v., designadamente, acórdãos de 16 de Julho de 1992, Lourenço Dias, C-343/90, Colect., p. I-4673, n.° 14; de 12 de Junho de 2003, Schmidberger C-112/00, Colect., p. I-5659, n.° 30 e jurisprudência referida; e de 18 de Março de 2004, Siemens e ARGE Telekom, C-314/01, Colect., p. I-2549, n.° 33).

14     No âmbito desta cooperação, o órgão jurisdicional nacional a quem foi submetido o litígio, que é o único a ter um conhecimento directo dos factos do processo principal e que deve assumir a responsabilidade pela decisão jurisdicional a tomar, é, à luz das especificidades do processo, o mais bem colocado para apreciar tanto a necessidade de uma decisão prejudicial para poder proferir a sua decisão como a pertinência das questões que coloca ao Tribunal de Justiça (v., designadamente, acórdão Lourenço Dias, já referido, n.° 15; acórdão de 22 de Janeiro de 2002, Canal Satélite Digital, C-390/99, Colect., p. I-607, n.° 18; e acórdãos, já referidos, Schmidberger, n.° 31, e Siemens e ARGE Telekom, n.° 34).

15     Também é verdade que compete ao Tribunal de Justiça, em caso de necessidade, analisar as condições em que é solicitado a intervir pelo órgão jurisdicional nacional, tendo em vista verificar a sua própria competência e, em especial, determinar se a interpretação do direito comunitário que é solicitada tem alguma relação com a realidade e com o objecto do litígio no processo principal, de modo que o Tribunal de Justiça não seja levado a emitir opiniões consultivas sobre questões gerais ou hipotéticas. Se concluir que a questão submetida não é manifestamente pertinente para a resolução do litígio, o Tribunal de Justiça não pode pronunciar-se sobre as questões prejudiciais (acórdão de 16 de Dezembro de 1981, Foglia, 244/80, Recueil, p. 3045, n.° 21; acórdãos, já referidos, Lourenço Dias, n.° 20, e Canal Satélite Digital, n.° 19; acórdão de 30 de Setembro de 2003, Inspire Art, C-167/01, Colect., p. I-10155, n.os 44 e 45; e acórdão Siemens e ARGE Telekom, já referido, n.° 35).

16     Uma vez que o litígio que o órgão jurisdicional de reenvio tem de decidir diz respeito não à situação objecto da primeira questão, a saber, a determinação da matéria colectável, mas apenas à situação objecto da segunda questão, a saber, o cálculo da taxa do imposto aplicável, a resposta à primeira questão não é relevante para a solução do referido litígio.

17     Tendo em consideração o exposto, não há que responder à primeira questão e há que limitar a resposta do Tribunal de Justiça à segunda questão.

 Quanto à segunda questão

18     Através da sua segunda questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta se as disposições do Tratado relativas à liberdade de estabelecimento e à livre circulação de capitais se opõem a uma legislação nacional, como a que está em causa no processo principal, que não permite que as pessoas singulares que auferem rendimentos provenientes de uma actividade profissional dependente num Estado-Membro e que aí são tributadas pelo rendimento global solicitem, para efeitos da determinação da taxa do imposto dos referidos rendimentos neste Estado, a tomada em consideração das perdas de rendimento do arrendamento resultantes da utilização de uma casa de habitação que ocupam pessoalmente para esse fim e que se situa noutro Estado-Membro.

19     A este respeito, no que toca, em primeiro lugar, à liberdade de estabelecimento, há que recordar que, por força de jurisprudência assente, esta liberdade compreende o acesso às actividades não assalariadas e o seu exercício (acórdão de 11 de Março de 2004, De Lasteyrie du Saillant, C-9/02, Colect., p. I-2409, n.° 40 e jurisprudência referida).

20     Ora, o litígio submetido ao órgão jurisdicional de reenvio diz respeito a pessoas singulares, que exercem uma actividade assalariada como professores num liceu público alemão, que pedem que sejam tomadas em consideração, para efeitos da tributação dos seus rendimentos na Alemanha, as perdas de rendimento do arrendamento relativas à utilização da sua casa de habitação situada em França.

21     Daí resulta que a interpretação das disposições do Tratado relativas à liberdade de estabelecimento não tem qualquer utilidade para a solução do litígio no processo principal.

22     Em segundo lugar, no que respeita à livre circulação de capitais, há que indicar que a não tomada em consideração, para efeitos da tributação de rendimentos auferidos na Alemanha, das perdas de rendimento do arrendamento referentes a uma casa situada em França é uma situação que, a priori e no estado actual do direito comunitário, se pode incluir no âmbito de aplicação da liberdade de circulação de capitais, por força do artigo 56.° CE.

23     Ora, o processo principal diz respeito ao exercício fiscal de 1987, ou seja, a uma situação de facto e de direito anterior tanto à introdução pelo Tratado UE do artigo 73.°-B no Tratado CE como à adopção e à entrada em vigor da Directiva 88/361/CEE do Conselho, de 24 de Junho de 1988, para a execução do artigo 67.° do Tratado (JO L 178, p. 5), que procedeu à liberalização completa dos movimentos de capitais.

24     Há que recordar que o artigo 67.°, n.° 1, do Tratado CEE (que passou a artigo 67.°, n.° 1, do Tratado CE, que, por sua vez, foi revogado pelo Tratado de Amesterdão) não implicou, a partir do fim do período de transição, a supressão das restrições aos movimentos de capitais. Esta supressão resultou, com efeito, das directivas do Conselho adoptadas com base no artigo 69.° do Tratado CEE (que passou a artigo 69.° do Tratado CE, que, por sua vez, foi revogado pelo Tratado de Amesterdão) (v. acórdãos de 11 de Novembro de 1981, Casati, 203/80, Recueil, p. 2595, n.os 8 a 13, e de 14 de Novembro de 1995, Svensson e Gustavsson, C-484/93, Colect., p. I-3955, n.° 5).

25     No que respeita ao exercício fiscal de 1987, a directiva relevante era a Primeira Directiva do Conselho, de 11 de Maio de 1960, para execução do artigo 67.° do Tratado (JO 1960, 43, p. 921; EE 10 F1 p. 6), na redacção dada, por último, pela Directiva 86/566/CEE do Conselho, de 17 de Novembro de 1986 (JO L 332, p. 22).

26     Esta Primeira Directiva para execução do artigo 67.° do Tratado limitava-se a dispor, no seu artigo 1.°, n.° 1, que os Estados-Membros concederão todas as autorizações de câmbio necessárias para a conclusão ou a execução de transacções e para as transferências entre residentes dos Estados-Membros, relativas aos movimentos de capitais enumerados nos anexos da referida directiva.

27     Por conseguinte, daí resulta que as disposições relativas à livre circulação de capitais, aplicáveis à data dos factos do litígio no processo principal, a saber, em 1987, não se opunham à proibição da tomada em consideração, para o cálculo da taxa de imposto dos rendimentos tributáveis num Estado-Membro, das perdas de rendimento do arrendamento relativas a uma casa situada noutro Estado-Membro.

28     A Comissão considera que a situação do casal Ritter-Coulais deveria ser analisada à luz do princípio da livre circulação dos trabalhadores previsto no artigo 48.° do Tratado CEE (que passou a artigo 48.° do Tratado CE, que, por sua vez, passou, após alteração, a artigo 39.° CE).

29     A este respeito, há que indicar que mesmo se, no plano formal, o órgão jurisdicional de reenvio limitou o seu pedido de decisão prejudicial à interpretação da liberdade de estabelecimento e da livre circulação de capitais, essa circunstância não obsta a que o Tribunal de Justiça forneça ao órgão jurisdicional nacional todos os elementos de interpretação do direito comunitário que possam ser úteis para a apreciação do litígio que lhe foi submetido, quer esse órgão jurisdicional nacional lhes tenha ou não feito referência no enunciado das suas questões (v., neste sentido, acórdãos de 12 de Dezembro de 1990, SARPP, C-241/89, Colect., p. I-4695, n.° 8; de 2 de Fevereiro de 1994, Verband Sozialer Wettbewerb, dito «Clinique», C-315/92, Colect., p. I-317, n.° 7; de 4 de Março de 1999, Consorzio per la tutela del formaggio Gorgonzola, C-87/97, Colect., p. I-1301, n.° 16; e de 29 de Abril de 2004, Weigel, C-387/01, Colect., p. I-4981, n.° 44).

30     Por conseguinte, há que analisar a legislação nacional à luz do artigo 48.° do Tratado.

31     A este respeito, há que recordar que qualquer nacional comunitário, independentemente do seu lugar de residência e da sua nacionalidade, que tenha usado do direito de livre circulação dos trabalhadores e que tenha exercido uma actividade profissional noutro Estado-Membro diferente do de residência, é abrangido pelo âmbito de aplicação do artigo 48.° do Tratado (v. acórdãos de 12 de Dezembro de 2002, De Groot, C-385/00, Colect., p. I-11819, n.° 76; de 13 de Novembro de 2003, Schilling e Fleck-Schilling, C-209/01, Colect., p. I-13389, n.° 23; e de 7 de Julho de 2005, Van Pommeren-Bourgondïen, C-227/03, ainda não publicado na Colectânea, n.os 19, 44 e 45).

32     Daí resulta que a situação do casal Ritter-Coulais, cujos membros trabalham num Estado-Membro diferente daquele em que se situa a sua residência efectiva, se inclui no âmbito de aplicação do artigo 48.° do Tratado.

33     Além disso, resulta de jurisprudência assente que o conjunto das disposições do Tratado relativas à livre circulação de pessoas visam facilitar aos nacionais comunitários o exercício de actividades profissionais de qualquer natureza em todo o território da Comunidade e opõem-se às medidas que possam desfavorecer esses nacionais quando desejem exercer uma actividade económica no território de outro Estado-Membro (acórdãos de 7 de Julho de 1992, Singh, C-370/90, Colect., p. I-4265, n.° 16; de 26 de Janeiro de 1999, Terhoeve, C-18/95, Colect., p. I-345, n.° 37; de 27 de Janeiro de 2000, Graf, C-190/98, Colect., p. I-493, n.° 21; de 15 de Junho de 2000, Sehrer, C-302/98, Colect., p. I-4585, n.° 32; e Schilling e Fleck-Schilling, já referido, n.° 24).

34     A este respeito, há que recordar que, embora a legislação nacional aplicável, ou seja, os §§ 32b, n.os 1 e 2, e 2a, n.° 1, primeiro período, ponto 4, da EStG 1987, tenha em consideração os rendimentos positivos relacionados com a exploração das casas situadas no estrangeiro, para o cálculo da taxa de imposto, não toma em consideração, quando não há rendimentos positivos, as perdas de rendimento da mesma natureza.

35     Daí resulta que as pessoas, como o casal Ritter-Coulais, que trabalham na Alemanha mas que residem em casa própria situada noutro Estado-Membro, não têm o direito de pedir, quando não há rendimentos positivos, que se considerem as perdas de rendimentos relacionadas com a exploração da sua casa, para a determinação da taxa do imposto sobre os seus rendimentos, ao contrário das pessoas que trabalham e residem em casa própria na Alemanha.

36     Mesmo que a legislação nacional em questão não vise directamente os não residentes, é mais frequente estes serem proprietários de uma casa fora do território alemão do que os residentes.

37     Daqui resulta que o tratamento reservado aos trabalhadores não residentes pela legislação nacional é menos favorável do que aquele de que beneficiam os trabalhadores que residem na Alemanha em casa própria.

38     Por conseguinte, uma legislação como a que está em causa no processo principal é, em princípio, proibida pelo artigo 48.° do Tratado.

39     No entanto, há que referir que o Governo alemão alega que o tratamento desfavorável dos contribuintes não residentes é justificado pela necessidade de garantir a coerência fiscal do regime nacional em que se insere a referida legislação.

40     A este respeito, basta referir que, uma vez que o regime fiscal alemão tem em consideração, para efeitos da determinação da taxa do imposto, os rendimentos positivos relativos à exploração de uma casa destinada à habitação situada noutro Estado-Membro, não pode ser invocada nenhuma consideração de coerência fiscal para justificar a recusa de tomar em consideração, para os mesmos fins, as perdas de rendimento da mesma natureza e provenientes do mesmo Estado.

41     Tendo em conta o exposto, há que responder à segunda questão submetida que o artigo 48.° do Tratado deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma legislação nacional, como a que está em causa no processo principal, que não permite que as pessoas singulares que auferem rendimentos provenientes de uma actividade profissional dependente num Estado-Membro e que aí são tributadas pelo rendimento global solicitem, para efeitos da determinação da taxa de imposto sobre os referidos rendimentos neste Estado, a tomada em consideração das perdas de rendimento do arrendamento resultantes da utilização de uma casa de habitação que ocupam pessoalmente para esse fim e que se situa noutro Estado-Membro, quando, pelo contrário, os rendimentos positivos do arrendamento dessa casa são tomados em consideração.

 Quanto às despesas

42     Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional nacional, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efectuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Grande Secção) declara:

O artigo 48.° do Tratado CEE (que passou a artigo 48.° do Tratado CE, que, por sua vez, passou, após alteração, a artigo 39.° CE), deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma legislação nacional, como a que está em causa no processo principal, que não permite que as pessoas singulares que auferem rendimentos provenientes de uma actividade profissional dependente num Estado-Membro e que aí são tributadas pelo rendimento global solicitem, para efeitos da determinação da taxa de imposto sobre os referidos rendimentos neste Estado, a tomada em consideração das perdas de rendimento do arrendamento resultantes da utilização de uma casa de habitação que ocupam pessoalmente para esse fim e que se situa noutro Estado-Membro, quando, pelo contrário, os rendimentos positivos do arrendamento dessa casa são tomados em consideração.

Assinaturas


* Língua do processo: alemão.