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Processo C-210/04

Ministero dell'Economia e delle Finanze e Agenzia delle Entrate

contra

FCE Bank plc

(pedido de decisão prejudicial apresentado pela Corte suprema di cassazione)

«Sexta Directiva IVA – Artigos 2.° e 9.° – Estabelecimento estável – Sociedade não residente – Relação jurídica – Acordo sobre a repartição dos custos – Convenção OCDE contra a dupla tributação – Conceito de ‘sujeito passivo’ – Prestação de serviços de carácter oneroso – Prática administrativa»

Conclusões do advogado-geral P. Léger apresentadas em 29 de Setembro de 2005 

Acórdão do Tribunal de Justiça (Segunda Secção) de 23 de Março de 2006 

Sumário do acórdão

Disposições fiscais – Harmonização das legislações – Impostos sobre o volume de negócios – Sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado – Sujeitos passivos

(Directiva 77/388 do Conselho, artigos 2.°, n.° 1, e 9.°, n.° 1)

Os artigos 2.°, n.° 1 e 9.°, n.° 1, da Sexta Directiva 77/388/CEE do Conselho, de 17 de Maio de 1977, relativa à harmonização das legislações dos Estados-Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios, devem ser interpretados no sentido de que um estabelecimento estável, que não é uma entidade jurídica distinta da sociedade em que se integra, situado noutro Estado-Membro e ao qual a sociedade fornece prestações de serviços, não deve ser considerado sujeito passivo em razão dos custos que lhe são imputados pelas referidas prestações.

(cf. n.° 41, disp.)




ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Segunda Secção)

23 de Março de 2006 (*)

«Sexta Directiva IVA – Artigos 2.° e 9.° – Estabelecimento estável – Sociedade não residente – Relação jurídica – Acordo sobre a repartição dos custos – Convenção OCDE contra a dupla tributação – Conceito de ‘sujeito passivo’ – Prestação de serviços de carácter oneroso – Prática administrativa»

No processo C-210/04,

que tem por objecto um pedido de decisão prejudicial nos termos do artigo 234.° CE, apresentado pela Corte suprema di cassazione (Itália), por decisão de 18 de Fevereiro de 2004, entrado no Tribunal de Justiça em 12 de Maio de 2004, no processo

Ministero dell’Economia e delle Finanze,

Agenzia delle Entrate

contra

FCE Bank plc,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Segunda Secção),

composto por: C. W. A. Timmermans, presidente de secção, J. Makarczyk, R. Silva de Lapuerta, P. Kūris (relator) e G. Arestis, juízes,

advogado-geral: P. Léger,

secretário: H. von Holstein, secretário adjunto,

vistos os autos e após a audiência de 9 de Junho de 2005,

vistas as observações apresentadas:

–       em representação do FCE Bank plc, por B. Gangemi, avvocato,

–       em representação do Governo italiano, por I. M. Braguglia, na qualidade de agente, assistido por G. De Bellis, avvocato dello Stato,

–       em representação do Governo português, por L. Fernandes, Â. Seiça Neves e R. Laires, na qualidade de agentes,

–       em representação do Governo do Reino Unido, por R. Hill, barrister,

–       em representação da Comissão das Comunidades Europeias, por D. Triantafyllou e M. Velardo, na qualidade de agentes,

ouvidas as conclusões do advogado-geral na audiência de 29 de Setembro de 2005,

profere o presente

Acórdão

1       O pedido de decisão prejudicial tem por objecto a interpretação dos artigos 2.°, n.° 1, e 9.°, n.° 1, da Sexta Directiva 77/388/CEE do Conselho, de 17 de Maio de 1977, relativa à harmonização das legislações dos Estados-Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios – Sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado: matéria colectável uniforme (JO L 145, p. 1; EE 09 F1 p. 45, a seguir «Sexta Directiva»).

2       Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio entre o Ministero dell’Economia e delle Finanze e a Agenzia delle Entrate (Roma) (a seguir «agência») e o FCE Bank plc, sociedade bancária estabelecida no Reino Unido (a seguir «FCE Bank»), a propósito do reembolso dos montantes pagos a título do imposto sobre o valor acrescentado (a seguir «IVA») pelo seu estabelecimento secundário situado em Itália (a seguir «FCE IT»).

 Quadro jurídico

 Regulamentação comunitária

 Sexta Directiva

3       O artigo 2.° da Sexta Directiva dispõe:

«Estão sujeitas ao imposto sobre o valor acrescentado:

1.      As entregas de bens e as prestações de serviços, efectuadas a título oneroso, no território do país, por um sujeito passivo agindo nessa qualidade.

[…]»

4       O artigo 4.°, n.° 1, desta directiva estabelece:

«Por sujeito passivo entende-se qualquer pessoa que exerça, de modo independente, em qualquer lugar, uma das actividades económicas referidas no n.° 2, independentemente do fim ou do resultado dessa actividade.»

5       O artigo 9.°, n.° 1, da mesma directiva estatui:

«Por lugar de prestação de serviços entende-se o lugar onde o prestador dos mesmos tenha a sede da sua actividade económica ou um estabelecimento estável a partir do qual os serviços são prestados ou, na falta de sede ou de estabelecimento estável, o lugar do seu domicílio ou da sua residência habitual.»

 Oitava Directiva 79/1072/CEE

6       O artigo 1.° da Oitava Directiva 79/1072/CEE do Conselho, de 6 de Dezembro de 1979, relativa à harmonização das legislações dos Estados-Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios – Regras sobre o reembolso do imposto sobre o valor acrescentado aos sujeitos passivos não estabelecidos no território do país (JO L 331, p. 11; EE 09 F1 p. 116, a seguir «Oitava Directiva») dispõe:

«Para efeitos do disposto na presente directiva, entende-se por sujeito passivo não estabelecido no território do país o sujeito passivo referido no n.° 1 do artigo 4.° da Directiva 77/388/CEE que, durante o período referido no n.° 1, primeiro parágrafo, primeira e segunda frases, do artigo 7.°, não tinha nesse país nem a sede da sua actividade económica nem um estabelecimento estável a partir do qual fossem efectuadas as operações, nem, na falta de sede ou de estabelecimento estável, o seu domicílio ou a sua residência habitual e que, durante esse mesmo período, não tenha efectuado qualquer entrega de bens ou prestações de serviços que se considere ter sido realizada nesse país [...].»

 Directiva 2000/12/CE

7       O artigo 13.° da Directiva 2000/12/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 20 de Março de 2000, relativa ao acesso à actividade das instituições de crédito e ao seu exercício (JO L 126, p. 1) relativo às sucursais de instituições de crédito autorizadas noutro Estado-Membro dispõe:

«A autorização e o capital de dotação não podem ser exigidos pelos Estados-Membros de acolhimento no que respeita às sucursais de instituições de crédito autorizadas noutros Estados-Membros. […]»

 Convenção OCDE

8       O artigo 7.°, n.° 2, do modelo de convenção fiscal sobre o rendimento e o património, adoptado pela Organização de Cooperação e de Desenvolvimento Económico (a seguir «Convenção OCDE»), prevê:

«[…] [Q]uando uma empresa de um Estado contratante exerce a sua actividade noutro Estado contratante por intermédio de um estabelecimento estável neste situado, são imputados, em cada Estado contratante, a esse estabelecimento estável, os lucros que teria podido realizar se tivesse constituído uma empresa distinta e separada, exercendo actividades idênticas ou análogas em condições idênticas ou análogas e negociando com total independência com a empresa de que constitui um estabelecimento estável […]»

9       O artigo 7.°, n.° 3, desta convenção prevê:

«Para determinar os lucros de um estabelecimento estável aceita-se que sejam deduzidas as despesas suportadas com a prossecução dos objectivos desse estabelecimento estável, incluindo as despesas de gestão e as despesas gerais de administração, quer no Estado-Membro em que está situado esse estabelecimento estável, quer noutro lugar.»

 Legislação nacional

10     A Lei n.° 329, de 5 de Novembro de 1990, relativa à ratificação e execução da Convenção entre o Governo da República Italiana e o Reino Unido da Grã-Bretanha e da Irlanda do Norte, a fim de evitar a dupla tributação e a prevenção da evasão fiscal em matéria de impostos sobre o rendimento, com troca de informações, assinada em Pallanza, em 21 de Outubro de 1988 (suplemento ordinário à GURI, n.° 267, de 15 de Novembro de 1990, p. 107), retoma, no seu artigo 7.°, n.os 2 e 3, as disposições correspondentes da Convenção OCDE.

11     O artigo 1.° da lei fundamental sobre o IVA, ou seja, o Decreto del Presidente della Repubblica n.° 633/72, de 26 de Outubro de 1972 (suplemento ordinário à GURI, n.° 292, de 11 de Novembro de 1972, p. 2), dispõe:

«O imposto sobre o valor acrescentado aplica-se às entregas de bens e às prestações de serviços efectuadas no território do Estado no exercício da actividade da empresa, de um ofício ou de uma profissão, bem como às importações feitas por qualquer pessoa […]»

12     O artigo 3.° desta lei especifica:

«Constituem prestações de serviços as prestações efectuadas contra pagamento em cumprimento de contratos diversos, contratos públicos, de transporte, de mandato, de expedição, de agência, de corretagem, de depósito e, em geral, de obrigações de fazer, de não fazer e de permitir, independentemente da fonte.»

13     O artigo 7.°, n.° 3, da mesma lei dispõe que as prestações de serviços «[se consideram] efectuadas no território do Estado quando o sejam por pessoas que possuam o seu domicílio nesse mesmo território ou por pessoas aí residentes que não tenham fixado o seu domicílio no estrangeiro mesmo quando efectuadas por estabelecimentos estáveis em Itália de pessoas domiciliadas ou residentes no estrangeiro.»

 Litígio no processo principal e questões prejudiciais

14     O FCE IT é um estabelecimento secundário, situado em Itália, da sociedade FCE Bank, estabelecida no Reino Unido, que tem por objecto social o exercício de actividades financeiras isentas de IVA.

15     O FCE IT beneficiou de prestações de serviços em matéria de consultadoria, de gestão, de formação de pessoal, de tratamento de dados e de fornecimento e gestão de serviços informáticos efectuadas pelo FCE Bank. Pediu o reembolso do IVA referente a estas prestações relativamente aos anos de 1996 a 1999, com base em facturas que ele próprio elaborou (a chamada operação de «auto-facturação»).

16     Na sequência da recusa tácita da administração de deferir este pedido, o FCE IT recorreu para a Commissione tributaria provinciale di Roma, que deu provimento ao pedido. A agência recorreu desta decisão, invocando, por um lado, prescrição do pedido em relação aos anos de 1996 e 1997 e, por outro, falta de procedência do pedido de reembolso relativamente aos anos de 1998 e 1999.

17     Por decisão de 29 de Março/25 de Maio de 2002, a Commissione tributaria regionale del Lazio negou provimento ao recurso com fundamento, por um lado, em que a prescrição é inaplicável a um pagamento efectuado em violação do direito comunitário e, por outro, em que a qualificação de «prestação de serviços» não podia ser acolhida no que toca a operações realizadas sem contrapartida pela sociedade-mãe a favor do seu estabelecimento, porque não se verificava a condição objectiva da aplicação do IVA. A imputação dos custos dos serviços do FCE Bank à FCE IT representa uma afectação de custos no interior de uma sociedade.

18     O Ministero dell’Economia e delle Finanze interpôs recurso desta decisão para a Corte suprema di cassazione. O fundamento do recurso refere-se a sujeição a IVA das prestações efectuadas pelo FCE Bank em razão da autonomia fiscal subjectiva do FCE IT. Assim, os pagamentos feitos à sociedade-mãe devem ser considerados uma contrapartida e constituem, por esse facto, matéria colectável.

19     Pelo contrário, segundo o FCE Bank, o FCE IT não tem personalidade jurídica, constituindo, portanto, apenas um ponto de ligação para efeitos de sujeição ao IVA referente a actividades relativas ao objecto social. Além disso, nenhum IVA é exigível relativamente a prestações que sejam efectuadas entre duas entidades que constituem um único sujeito passivo.

20     Foi nestas condições que a Corte suprema di cassazione decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)      Os artigos 2.°, n.° 1, e 9.°, n.° 1, da Sexta Directiva devem ser interpretados no sentido de que a filial de uma sociedade com sede noutro Estado (pertencente ou não à União Europeia), que possui as características de uma unidade de produção, pode ser considerada um sujeito autónomo e de que se pode, portanto, considerar que existe uma relação jurídica entre as duas entidades, com a consequente sujeição a IVA das prestações efectuadas pela sociedade-mãe? Pode-se, para responder a essa questão, utilizar o critério do ‘arm’s length’ a que se refere o artigo 7.°, n.os 2 e 3, do modelo de convenção OCDE contra a dupla tributação e da Convenção de 21 de Outubro de 1988 celebrada entre a Itália e o Reino Unido [da Grã-Bretanha] e [d]a Irlanda do Norte? Pode considerar-se que existe uma relação jurídica numa situação de ‘cost sharing agreement’ relativo à prestação de serviços ao estabelecimento secundário? Em caso de resposta afirmativa, quais as condições que devem ser satisfeitas para que se possa considerar que essa relação jurídica existe? O conceito de relação jurídica deve ser o que resulta do direito nacional ou do direito comunitário?

2)      A imputação dos custos desses serviços à filial pode, e em que medida, ser considerada a contrapartida pelos serviços prestados, na acepção do artigo 2.°, da Sexta Directiva, independentemente do montante da imputação e da obtenção de um benefício pela empresa?

3)      Caso se considere que as prestações de serviços entre a sociedade-mãe e a filial estão, em princípio, isentas de IVA devido à falta de autonomia do destinatário e à consequente inexistência de uma relação jurídica entre as duas entidades, na hipótese de a sociedade-mãe ter sede noutro Estado-Membro da União Europeia, uma prática administrativa nacional segundo a qual, nesse caso, a prestação está sujeita a imposto é contrária ao direito de estabelecimento previsto no artigo 43.° CE?»

 Quanto às questões prejudiciais

 Quanto à primeira questão

21     Segundo jurisprudência assente, compete ao Tribunal de Justiça, no âmbito do processo de cooperação com os órgãos jurisdicionais nacionais instituído pelo artigo 234° CE, dar ao órgão jurisdicional de reenvio uma resposta útil que lhe permita decidir o litígio que lhe foi submetido (v. acórdãos de 17 de Julho de 1997, Krüger, C-334/95, Colect., p. I-4517, n.° 22, e de 28 de Novembro de 2000, Roquette Frères, C-88/99, Colect., p. I-10465, n.° 18). Nesta óptica, compete, eventualmente, ao Tribunal de Justiça reformular a questão que lhe foi submetida (v. acórdãos Krüger, já referido, n.° 23, e de 11 de Julho de 2002, Marks & Spencer, C-62/00, Colect., p. I-6325, n.° 32).

22     A este propósito, há que referir que o órgão jurisdicional de reenvio pretende saber em que medida prestações de serviços efectuadas por uma sociedade estabelecida no Reino Unido ao seu estabelecimento em Itália são abrangidas pela Sexta Directiva. Daí que não seja útil proferir decisão para a hipótese de a sede da sociedade se encontrar num Estado que não faz parte da União Europeia.

23     Em seguida, importa observar que é pacífico que o FCE IT, estabelecimento secundário do FCE Bank, não tem personalidade jurídica própria e constitui, portanto, uma sucursal deste.

24     Na sua primeira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, no essencial, se os artigos 2.°, n.° 1, e 9.°, n.° 1, da Sexta Directiva devem ser interpretados no sentido de que um estabelecimento estável, que não é uma entidade jurídica distinta da sociedade em que se integra, situado noutro Estado-Membro e ao qual a sociedade fornece prestações de serviços, deve ser considerado sujeito passivo em razão dos custos que lhe são imputados pelas referidas prestações.

 Observações das partes

25     O FCE Bank, o Governo do Reino Unido e a Comissão das Comunidades Europeias consideram que os serviços fornecidos no âmbito da mesma entidade jurídica não constituem prestações de serviços sujeitas a IVA.

26     Segundo o FCE Bank, nenhuma relação jurídica pode existir entre si próprio e o FCE IT, uma vez que formam um único sujeito passivo. Não podem, portanto, existir prestações de serviços a título oneroso entre os dois estabelecimentos, que estão situados em dois Estados-Membros distintos. Com efeito, o FCE Bank não é remunerado pela execução de actividades internas que são realizadas no interesse próprio da sociedade, com o objectivo de um tratamento uniforme de dados contabilísticos, de marketing e outros.

27     De acordo com a Comissão, as prestações de serviços entre uma sociedade-mãe estabelecida num Estado-Membro e uma pessoa não matriculada como entidade jurídica autónoma e constituindo um estabelecimento estável noutro Estado-Membro não devem ser consideradas operações tributáveis em IVA.

28     De acordo com o Governo italiano, muito embora, no plano civil, a sociedade-mãe e a sucursal constituam a mesma pessoa colectiva e que esse facto possa criar obstáculos a uma execução coerciva das obrigações que são objecto de operação tributável, isso não impede que constituam sujeitos passivos distintos no plano fiscal, em geral, e para efeitos de IVA, em particular.

29     Face aos termos do artigo 2.°, n.° 1, da Sexta Directiva, que exigem o carácter oneroso das prestações para as submeter ao IVA, apenas a eventual gratuitidade dos serviços permitiria excluir estas operações do âmbito da aplicação deste imposto. Daí que as condições para que exista uma relação jurídica passível de dar lugar a uma operação tributável sejam as que resultam dos princípios consagrados na Sexta Directiva.

30     Por outro lado, nos termos dos artigos 9.°, n.° 1, da Sexta Directiva e 1.° da Oitava Directiva, um estabelecimento estável situado num Estado-Membro de acolhimento deve ser considerado um sujeito passivo autónomo, o que tem como efeito excluir a possibilidade de o reembolso do IVA poder ser efectuado à sociedade-mãe.

31     De acordo com o Governo português, o IVA, apesar do seu elevado grau de harmonização, apresenta-se como um imposto nacional dos Estados-Membros que são, portanto, livres de atribuir a qualidade de sujeito passivo aos estabelecimentos situados no seu território. Além disso, um estabelecimento estável que reúna as condições humanas e técnicas para realização de operações tributáveis constitui uma realidade patrimonial e um centro de interesses suficientemente autónomo para ser objecto, por si só, da imputação de relações e de direitos e obrigações em matéria de IVA.

 Apreciação do Tribunal de Justiça

32     Por um lado, cabe recordar que o artigo 2.°, n.° 1, da Sexta Directiva dispõe que estão designadamente sujeitas a IVA as prestações de serviços efectuadas, a título oneroso, no território do país, por um sujeito passivo agindo nessa qualidade.

33     Por outro lado, o artigo 4.° da Sexta Directiva define «sujeitos passivos». Têm esta qualidade as pessoas que exerçam «de modo independente» uma actividade económica. O n.° 4 de mesmo artigo precisa que a expressão «de modo independente» exclui da tributação as pessoas vinculadas à sua entidade patronal por um contrato de trabalho ou por qualquer outra relação jurídica que crie vínculos de subordinação no que diz respeito, designadamente, às condições de trabalho e de remuneração e à responsabilidade da entidade patronal (v. acórdão de 6 de Novembro de 2003, Karageorgou e o., C-78/02 a C-80/02, Colect., p. I-13295, n.° 35).

34     A este propósito, resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça que uma prestação de serviços só é tributável se existir entre o prestador e o beneficiário uma relação jurídica em cuja vigência são trocadas prestações recíprocas (v. acórdãos de 3 de Março de 1994, Tolsma, C-16/93, Colect., p. I-743, n.° 14, e de 21 de Março de 2002, Kennemer Golf, C-174/00, Colect., p. I-3293, n.° 39).

35     Para determinar se existe uma tal relação jurídica entre uma sociedade não residente e uma das suas sucursais a fim de sujeitar a IVA as prestações fornecidas, há que verificar se o FCE IT realiza uma actividade económica independente. A este propósito, há que determinar se uma sucursal como o FCE IT pode ser considerada autónoma enquanto banco, designadamente por suportar o risco económico que decorre da sua actividade.

36     Ora, como realçou o advogado-geral no n.° 46 das suas conclusões, a sucursal não suporta ela mesma os riscos inerentes ao exercício da actividade da instituição de crédito, como, por exemplo, a falta de reembolso de um empréstimo por um cliente. É o banco, na qualidade de pessoa colectiva, que suporta esse risco e é por isso que a sua solidez financeira e a sua solvabilidade são objecto de controlo no seu Estado-Membro de origem.

37     Com efeito, enquanto sucursal, o FCE IT não dispõe de capital próprio. Por conseguinte, o risco ligado à actividade económica recai integralmente no FCE Bank. Consequentemente, o FCE IT depende deste último com o qual constitui um sujeito passivo único.

38     Esta consideração não é posta em causa pelo artigo 9.°, n.° 1, da Sexta Directiva. Esta disposição destina-se a determinar o sujeito passivo no que toca às transacções entre uma sucursal e terceiros. Não se aplica num caso como este, que se refere a transacções entre uma sociedade residente num Estado-Membro e uma das suas sucursais estabelecidas noutro Estado-Membro.

39     Relativamente à Convenção OCDE, deve dizer-se que a mesma é irrelevante, uma vez que incide sobre a fiscalidade directa enquanto o IVA se insere na tributação indirecta.

40     Por último, no que se refere à existência de um acordo relativo à repartição dos custos, trata-se também de um elemento que carece de pertinência no presente processo, uma vez que esse acordo não foi negociado entre partes independentes.

41     Em face do que antecede, cabe responder à primeira questão que os artigos 2.°, n.° 1, e 9.°, n.° 1, da Sexta Directiva devem ser interpretados no sentido de que um estabelecimento estável, que não é uma entidade jurídica distinta da sociedade em que se integra, situado noutro Estado-Membro e ao qual a sociedade fornece prestações de serviços, não deve ser considerado sujeito passivo em razão dos custos que lhe são imputados pelas referidas prestações.

 Quanto à segunda questão

42     Na sua segunda questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta se o artigo 2.° da Sexta Directiva deve ser interpretado no sentido de que a imputação dos custos dos serviços prestados ao estabelecimento secundário pela sociedade não residente constitui uma contrapartida, independentemente do montante imputado e da procura de um lucro comercial.

43     Nos termos do n.° 37 do presente acórdão, a referida sucursal não é independente da sociedade. Assim, não há que responder à segunda questão.

 Quanto à terceira questão

44     Na terceira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta se uma prática administrativa nacional que sujeita a IVA uma prestação de serviços fornecida pela sociedade-mãe a um estabelecimento secundário, situado noutro Estado-Membro, é contrária ao princípio da liberdade de estabelecimento consagrado no artigo 43.° CE.

 Observações das partes

45     Segundo o FCE Bank, o Governo do Reino Unido e a Comissão, a prática administrativa italiana viola a liberdade de estabelecimento garantida pelo artigo 43.° CE.

46     O FCE Bank considera que a prática nacional em causa tem por efeito consolidar o IVA que deixa de ser dedutível. Isto representa um custo suplementar e definitivo que não é suportado por um banco italiano que preste os mesmos serviços aos seus estabelecimentos secundários estabelecidos no território italiano e que não pode ser considerada uma medida adequada para garantir a eficácia dos controlos fiscais.

47     O Governo do Reino Unido compartilha da posição da Comissão segundo a qual a prática administrativa italiana viola o princípio da não discriminação inerente ao direito de estabelecimento quando o tratamento fiscal em matéria de IVA seja mais oneroso para a filial de um banco estrangeiro do que para a de um banco nacional – sem que existam, de resto, outras diferenças objectivas entre estes dois tipos de filiais. Do mesmo modo, sujeitar a IVA prestações entre uma sociedade-mãe e uma filial, nacional ou estrangeira, constitui um obstáculo à liberdade de estabelecimento sob a forma de sucursal, o que não pode ser justificado por qualquer interesse «geral» na acepção da jurisprudência do Tribunal de Justiça (v., neste sentido, acórdãos de 31 de Março de 1993, Kraus, C-19/92, Colect., p. I-1663, n.° 32, e de 30 de Novembro de 1995, Gebhard, C-55/94, Colect., p. I-4165, n.° 37).

48     O Governo italiano não apresentou qualquer observação sobre este ponto, considerando que o estabelecimento estável é uma pessoa autónoma sujeita a IVA.

49     Segundo o Governo português, decorre dos objectivos e das regras constitutivas do sistema comum do IVA que não se trata de uma matéria dependente exclusivamente das práticas administrativas nacionais. Não é, portanto, necessário responder à terceira questão relativa ao direito de estabelecimento consagrado nos artigos 43.° CE a 48.° CE.

 Apreciação do Tribunal de Justiça

50     Como salientou o advogado-geral no n.° 74 das suas conclusões, a constatação da incompatibilidade de uma legislação ou de uma prática nacional com a Sexta Directiva elimina a necessidade de examinar se as liberdades fundamentais previstas no Tratado, tal como a liberdade de estabelecimento, foram violadas.

51     Com efeito, foi declarado no n.° 37 do presente acórdão que a sucursal de uma sociedade não residente não tem autonomia e que, por conseguinte, não existe nenhuma relação jurídica entre elas. Devem ser consideradas um único e mesmo sujeito passivo na acepção do artigo 4.°, n.° 1, da Sexta Directiva. O FCE IT é apenas um elemento do FCE Bank.

52     Resulta do que precede que a prática administrativa italiana é incompatível com a Sexta Directiva, sem que seja necessário tomar posição sobre a violação do artigo 43.° CE.

 Quanto às despesas

53     Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efectuadas pelas outras partes com a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Segunda Secção) declara:

Os artigos 2.°, n.° 1, e 9.°, n.° 1, da Sexta Directiva 77/388/CEE do Conselho, de 17 de Maio de 1977, relativa à harmonização das legislações dos Estados-Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios – Sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado: matéria colectável uniforme, devem ser interpretados no sentido de que um estabelecimento estável, que não é uma entidade jurídica distinta da sociedade em que se integra, situado noutro Estado-Membro e ao qual a sociedade fornece prestações de serviços, não deve ser considerado sujeito passivo em razão dos custos que lhe são imputados pelas referidas prestações.

Assinaturas


* Língua do processo: italiano.