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Processo C-451/05

Européenne et Luxembourgeoise d’investissements SA (ELISA)

contra

Directeur général des impôts,

Ministère public

[pedido de decisão prejudicial apresentado pela Cour de cassation (França)]

«Fiscalidade directa – Imposto sobre o valor venal dos imóveis situados em França que pertencem a pessoas colectivas – Sociedades holding de direito luxemburguês – Recusa de isenção – Directiva 77/799/CEE – Enumeração não exaustiva dos impostos referidos – Imposto de natureza análoga – Limites da troca de informações – Convenção bilateral – Artigo 73.°-B do Tratado CE (actual artigo 56.° CE) – Livre circulação de capitais – Luta contra a fraude fiscal»

Conclusões do advogado-geral J. Mazák apresentadas em 26 de Abril de 2007 

Acórdão do Tribunal de Justiça (Quarta Secção) de 11 de Outubro de 2007 

Sumário do acórdão

1.     Aproximação das legislações – Assistência mútua das autoridades dos Estados-Membros no domínio dos impostos directos e indirectos – Directiva 77/799

(Directiva 77/799 do Conselho, artigo 1.º, n.os 2 e 3)

2.     Aproximação das legislações – Assistência mútua das autoridades dos Estados-Membros no domínio dos impostos directos e indirectos – Directiva 77/799

(Directiva 77/799 do Conselho, artigo 8.º, n.º 1)

3.     Livre circulação de capitais – Restrições – Imposto sobre o valor venal dos imóveis que pertencem a pessoas colectivas

[Tratado CE, artigo 73.º-B (que passou, após alteração, a artigo 56.º CE)]

1.     Constitui um imposto de natureza análoga à dos impostos enumerados no artigo 1.°, n.° 3, da Directiva 77/799, relativa à assistência mútua das autoridades competentes dos Estados-Membros no domínio dos impostos directos ou indirectos, que é cobrado sobre elementos do património, na acepção do artigo 1.°, n.° 2, desta directiva, o imposto estabelecido por um Estado-Membro sobre o valor venal dos imóveis nesse Estado-Membro que pertencem a pessoas colectivas.

(cf. n.o 37, disp. 1)

2.     A Directiva 77/799, relativa à assistência mútua das autoridades competentes dos Estados-Membros no domínio dos impostos directos ou indirectos, e, em especial, o seu artigo 8.°, n.° 1, não se opõem a que dois Estados-Membros estejam ligados por uma convenção internacional, para prevenir as duplas tributações e definir regras para a assistência administrativa mútua em matéria de impostos sobre o rendimento e sobre o património, que exclui do seu âmbito de aplicação, relativamente a um Estado-Membro, uma categoria de contribuintes sujeitos a um imposto abrangido pela referida directiva, desde que a legislação ou a prática administrativa do Estado-Membro que deve fornecer as informações não autorizem a autoridade competente a obter ou utilizar tais informações no próprio interesse do referido Estado-Membro, o que cabe ao órgão jurisdicional nacional verificar.

(cf. n.o 55, disp. 2)

3.     O artigo 73.°-B do Tratado (actual artigo 56.° CE) deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma legislação nacional que isenta do imposto sobre o valor venal dos imóveis situados nesse Estado-Membro que pertençam a pessoas colectivas as sociedades sediadas neste, quando condiciona esta isenção, para as sociedades sediadas noutro Estado-Membro, à existência de uma convenção de assistência administrativa celebrada entre o Estado-Membro em causa e esse outro Estado para lutar contra a fraude e a evasão fiscais ou à circunstância de, através da aplicação de um tratado que contenha uma cláusula de não discriminação em razão da nacionalidade, essas sociedades não deverem ser sujeitas a uma tributação mais onerosa do que aquela a que estão sujeitas as sociedades sediadas no primeiro Estado-Membro e não permite que a sociedade sediada noutro Estado-Membro apresente elementos de prova que permitam determinar a identidade dos seus accionistas que sejam pessoas singulares.

(cf. n.o 102, disp. 3)







ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quarta Secção)

11 de Outubro de 2007 (*)

«Fiscalidade directa – Imposto sobre o valor venal dos imóveis situados em França que pertencem a pessoas colectivas – Sociedades holding de direito luxemburguês – Recusa de isenção – Directiva 77/799/CEE – Enumeração não exaustiva dos impostos referidos – Imposto de natureza análoga – Limites da troca de informações – Convenção bilateral – Artigo 73.°-B do Tratado CE (actual artigo 56.° CE) – Livre circulação de capitais – Luta contra a fraude fiscal»

No processo C-451/05,

que tem por objecto um pedido de decisão prejudicial nos termos do artigo 234.° CE, apresentado pela Cour de cassation (França), por decisão de 13 de Dezembro de 2005, entrado no Tribunal de Justiça em 19 de Dezembro de 2005, no processo

Européenne et Luxembourgeoise d’investissements SA (ELISA)

contra

Directeur général des impôts,

Ministère public,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quarta Secção),

composto por: K. Lenaerts, presidente de secção, G. Arestis (relator), E. Juhász, J. Malenovský e T. von Danwitz, juízes,

advogado-geral: J. Mazák,

secretário: J. Swedenborg, administrador,

vistos os autos e após a audiência de 24 de Janeiro de 2007,

vistas as observações apresentadas:

–       em representação da Européenne et Luxembourgeoise d’investissements SA, por J.-J. Gatineau, avocat,

–       em representação do Governo francês, por G. de Bergues e J.-C. Gracia, na qualidade de agentes,

–       em representação do Governo helénico, por S. Spyropoulos, Z. Chatzipavlou e K. Boskovits, na qualidade de agentes,

–       em representação do Governo italiano, por I. M. Braguglia, na qualidade de agente, assistido por G. De Bellis, avvocato dello Stato,

–       em representação do Governo neerlandês, por H. G. Sevenster e M. de Grave, na qualidade de agentes,

–       em representação do Governo do Reino Unido, por V. Jackson, na qualidade de agente, assistida por T. Ward, barrister,

–       em representação da Comissão das Comunidades Europeias, por R. Lyal e J.-P. Keppenne, na qualidade de agentes,

ouvidas as conclusões do advogado-geral na audiência de 26 de Abril de 2007,

profere o presente

Acórdão

1       O pedido de decisão prejudicial tem por objecto a interpretação dos artigos 52.° do Tratado CE (que passou, após alteração, a artigo 43.° CE) e 73.°-B do Tratado CE (actual artigo 56.° CE), bem como do artigo 1.° da Directiva 77/799/CEE do Conselho, de 19 de Dezembro de 1977, relativa à assistência mútua das autoridades competentes dos Estados-Membros no domínio dos impostos directos e indirectos (JO L 336, p. 15; EE 09 F1 p. 94), alterada pela Directiva 92/12/CEE do Conselho, de 25 de Fevereiro de 1992 (JO L 76, p. 1, a seguir «Directiva 77/799»).

2       Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe a Européenne et Luxembourgeoise d’investissements SA (a seguir «ELISA») ao directeur général des impôts relativamente à sujeição desta sociedade ao imposto sobre o valor venal dos imóveis situados em França que pertencem a pessoas colectivas (a seguir «imposto controvertido»).

 Quadro jurídico

 Direito comunitário

3       O artigo 1.° da Directiva 77/799, intitulado «Disposições gerais», prevê:

«1.      As autoridades competentes dos Estados-Membros trocarão entre si, nos termos da presente directiva, todas as informações susceptíveis de lhes permitir determinar correctamente os impostos sobre o rendimento e o património […]

2.      São considerados impostos sobre o rendimento e o património, independentemente do sistema de cobrança, os impostos que incidem sobre o rendimento global, sobre o património total ou sobre elementos do rendimento ou do património, incluindo os impostos sobre os lucros provenientes da alienação de bens móveis ou imóveis, os impostos sobre o montante dos salários pagos pelas empresas, bem como os impostos sobre as mais-valias.

3.      Os impostos actuais a que se refere o artigo 2.° são, designadamente, os seguintes:

[…]

em França:

impôt sur le revenu,

impôt sur les sociétés,

taxe professionnelle,

taxe foncière sur les propriétés bâties,

taxe foncière sur les propriétés non bâties;

[…]

4.      O disposto no n.° 1 é igualmente aplicável aos impostos de natureza idêntica ou análoga que venham a acrescer aos impostos referidos no n.° 3 ou a substituí-los […]

[…]»

4       Os artigos 2.°, 3.° e 4.° da Directiva 77/799 contêm, respectivamente, disposições relativas à troca mediante pedido, à troca automática e à troca espontânea das informações referidas no artigo 1.°, n.° 1, desta directiva.

5       O artigo 8.° da referida directiva, intitulado «Limites da troca de informações», dispõe:

«1.      A presente directiva não impõe a obrigação de promover investigações ou de transmitir informações, quando a legislação ou a prática administrativa do Estado-Membro que deve fornecer as informações não autorizem a autoridade competente a efectuar essas investigações, nem a obter ou utilizar tais informações no próprio interesse desse Estado.

2.      A transmissão de informações pode ser recusada quando conduza à divulgação de um segredo comercial, industrial ou profissional ou de um processo comercial, ou de uma informação cuja divulgação seja contrária à ordem pública.

3.      A autoridade competente de um Estado-Membro pode recusar a transmissão de informações quando o Estado interessado não se encontre em situação de fornecer informações correspondentes, por razões de facto ou de direito.»

6       O artigo 11.° da Directiva 77/799, intitulado «Aplicabilidade de disposições mais amplas em matéria de assistência», prevê que «[a]s disposições anteriores não prejudicam a execução de obrigações mais amplas no que respeita à troca de informações que resultem de outros actos jurídicos».

 Direito nacional

7       Os artigos 990 D e 990 E do Código Geral dos Impostos francês (code général des impôts) (a seguir «CGI»), na sua versão resultante da Lei n.° 92-1376, de 30 de Dezembro de 1992, lei de execução orçamental para 1993 (JORF n.° 304, de 31 de Dezembro de 1992), prevêem:

«Artigo 990 D

As pessoas colectivas que, directamente ou por pessoa interposta, sejam proprietárias de um ou mais imóveis situados em França ou sejam titulares de direitos reais sobre esses bens estão sujeitas a um imposto anual de 3% do valor venal desses imóveis ou direitos.

Presume-se que possuem bens ou direitos imobiliários em França por pessoa interposta todas as pessoas colectivas que detenham uma participação, independentemente da sua forma e do montante da quota parte, numa pessoa colectiva que seja proprietária desses bens ou detentora de uma participação numa terceira pessoa colectiva, que seja ela própria proprietária de bens ou direitos ou interposta na cadeia das participações. Esta disposição aplica-se independentemente do número de pessoas colectivas interpostas.

Artigo 990 E

O imposto previsto no artigo 990 D não é aplicável:

1°      Às pessoas colectivas cujos activos imobiliários, na acepção do artigo 990 D, situados em França, representem menos de 50% dos activos franceses. Para a aplicação desta disposição, não se incluem nos activos imobiliários os activos que as pessoas colectivas referidas no artigo 990 D ou as pessoas interpostas afectem à sua própria actividade profissional que não a actividade imobiliária;

2°      Às pessoas colectivas que, tendo a sua sede num país ou território que tenha celebrado com a França uma convenção de assistência administrativa para lutar contra a fraude e a evasão fiscais, declarem todos os anos, até 15 de Maio, o mais tardar, no local previsto pelo despacho referido no artigo 990 F, a localização, descrição e valor dos imóveis de que sejam proprietárias em 1 de Janeiro, a identidade e o endereço dos seus associados naquela data e o número de acções detidas por cada um;

3°      Às pessoas colectivas que tenham a sua direcção efectiva em França ou a outras pessoas colectivas que, por força de um tratado, não devam ser sujeitas a uma tributação mais onerosa, quando comuniquem, todos os anos, ou assumam e respeitem a obrigação de comunicar à Administração Fiscal, a pedido desta, a localização e descrição dos imóveis de que sejam proprietárias a 1 de Janeiro, a identidade e endereço dos seus accionistas, associados ou outros membros, o número de acções ou outros direitos detidos por cada um e a prova do seu domicílio fiscal […]»

 Direito internacional

8       O artigo 21.°, n.° 1, da Convenção celebrada entre a República Francesa e o Grão-Ducado do Luxemburgo para prevenir as duplas tributações e definir regras para a assistência administrativa mútua em matéria de impostos sobre o rendimento e sobre o património, assinada em Paris, em 1 de Abril de 1958, conforme alterada pelo aditamento assinado em Paris, em 8 de Setembro de 1970 (a seguir «Convenção de 1 de Abril de 1958»), estipula:

«Os nacionais e as sociedades ou grupos de um dos Estados contratantes não ficarão sujeitos, no outro Estado, a outros impostos ou a impostos mais elevados do que aqueles a que estão sujeitos os nacionais e as sociedades ou grupos desse Estado.»

9       O artigo 22.°, n.° 1, da Convenção de 1 de Abril de 1958 prevê:

«As autoridades competentes dos dois Estados podem, oficiosamente ou na sequência da formulação de um pedido, trocar, sob condição de reciprocidade, as informações que as legislações fiscais dos dois Estados permitem que sejam obtidas, no âmbito de práticas administrativas normais, que sejam necessárias para uma aplicação correcta da presente convenção […]»

10     Segundo uma troca de cartas, de 8 de Setembro de 1970, relativa à Convenção de 1 de Abril de 1958, os Governos francês e luxemburguês consideraram que, «desde a entrada em vigor desta convenção, esta não é aplicável às sociedades holding, na acepção da legislação específica luxemburguesa (actualmente a loi de 31 de Julho de 1929 e o arrêté-loi de 27 de Dezembro de 1937) nem aos rendimentos que uma pessoa que tenha o seu domicílio fiscal em França receba dessas sociedades nem às participações que tenha em tais sociedades».

11     A Convenção de estabelecimento celebrada entre a República Francesa e o Grão-Ducado do Luxemburgo, assinada em Paris, em 31 de Março de 1930, prevê a cláusula da nação mais favorecida.

12     Nos termos do artigo 9.° desta última convenção, «as duas Altas Partes Contratantes comprometem-se a celebrar, no mais curto espaço de tempo, uma convenção especial relativa aos direitos, impostos e contribuições a que os nacionais e as sociedades estão sujeitos e para regular as questões de dupla tributação».

 Litígio no processo principal e questões prejudiciais

13     A ELISA é uma sociedade holding de direito luxemburguês, criada nos termos das disposições da Lei de 31 de Julho de 1929 sobre o regime fiscal das sociedades de participações financeiras (loi du 31 juillet 1929 sur le régime fiscal des sociétés de participations financières) (Holding companies) (Mém. 1929, p. 685), conforme alterada pelo règlement grand-ducal de 24 de Março de 1989 (Mém. A 1989, p. 181).

14     Por força do artigo 1.°, segundo parágrafo, desta lei, a sociedade holding está isenta do imposto sobre o rendimento (impôt sur le revenu), do adicional sobre o imposto (surtaxe), do imposto complementar (impôt complémentaire), do imposto cobrado na fonte sobre certos tipos de rendimentos de capitais (impôt sur le coupon) e está igualmente isenta dos impostos adicionais das comunas (centimes additionnels des communes). Nos termos do artigo 1.°, sexto parágrafo, da referida lei, o direito de fiscalização e de investigação cabe à administração do registo e limita-se à pesquisa e ao exame dos factos e dados relativos ao estatuto fiscal da sociedade e aos elementos reunidos para assegurar e verificar a justeza e a exacta cobrança dos impostos e direitos devidos pela sociedade.

15     Segundo a decisão de reenvio, a ELISA possui diversos bens imobiliários no território francês e, por esse facto, está sujeita às disposições dos artigos 990 D e seguintes do CGI que instituem o imposto controvertido.

16     Resulta também da decisão de reenvio que a ELISA preencheu as declarações previstas na lei sem no entanto pagar os respectivos impostos. Depois de ter notificado esta sociedade, em 18 de Dezembro de 1997, das liquidações destes impostos, a administration des impôts procedeu à sua cobrança. Tendo sido indeferida a sua reclamação, a ELISA moveu uma acção contra o directeur général des impôts no tribunal de grande instance de Paris para que fosse declarada a isenção dos referidos impostos.

17     No seguimento de duas decisões que lhe foram desfavoráveis, proferidas, respectivamente, pelo tribunal de grande instance de Paris, em 28 de Outubro de 1999, e pela cour d’appel de Paris, em 5 de Julho de 2001, a ELISA interpôs recurso para a Cour de cassation.

18     A Cour de cassation decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)      Os artigos 52.° e seguintes e 73.°-B e seguintes do Tratado CE opõem-se a uma legislação como a prevista pelos artigos 990 D e seguintes do [CGI] que concede às pessoas colectivas que tenham a sua sede efectiva em França a faculdade de beneficiarem da isenção do imposto [controvertido] e que subordina esta faculdade, no que diz respeito às pessoas colectivas que tenham a sua direcção efectiva no território de outro país, ainda que se trate de um Estado-Membro da União Europeia, à existência de uma convenção de assistência administrativa celebrada entre a França e esse Estado para lutar contra a fraude e a evasão fiscais ou à circunstância de, em aplicação de um tratado que inclua uma cláusula de não discriminação em razão da nacionalidade, essas pessoas colectivas não deverem ser sujeitas a uma tributação mais onerosa do que aquela a que estão sujeitas as pessoas colectivas que têm a sua direcção efectiva em França?

2)      Um imposto como o controvertido constitui um imposto sobre o património, na acepção do artigo 1.° da Directiva [77/799]?

3)      Em caso afirmativo, as obrigações impostas aos Estados-Membros em matéria de assistência mútua em matéria fiscal pela Directiva [77/799] opõem-se à aplicação pelos Estados-Membros, por força de uma convenção bilateral de assistência administrativa fiscal, de obrigações da mesma natureza que excluem uma categoria de contribuintes como as sociedades holding luxemburguesas?

4)      Os artigos 52.° e seguintes e 73.°-B e seguintes do Tratado CE impõem a um Estado-Membro que tenha celebrado com outro país, membro ou não da União Europeia, uma convenção que contenha uma cláusula de não discriminação em matéria fiscal a obrigação de conceder a uma pessoa colectiva que tenha a sua direcção efectiva no território de outro Estado-Membro os mesmos benefícios que os previstos por essa cláusula, quando essa pessoa colectiva seja proprietária de um ou mais imóveis no território do primeiro Estado-Membro e o segundo Estado-Membro não esteja ligado ao primeiro por uma cláusula equivalente?»

 Quanto às questões prejudiciais

19     A título liminar, há que referir que o litígio no processo principal diz respeito a factos que envolvem Estados-Membros, com exclusão de qualquer Estado terceiro. Consequentemente, as respostas às questões prejudiciais referem-se apenas às relações entre Estados-Membros.

 Quanto à segunda questão

20     Com a segunda questão, que há que analisar em primeiro lugar, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta se o imposto controvertido constitui um imposto sobre o património, na acepção do artigo 1.° da Directiva 77/799.

21     A este respeito, há que recordar, em primeiro lugar, que resulta do artigo 1.°, n.° 2, da Directiva 77/799 que são considerados impostos sobre o rendimento e o património, independentemente do sistema de cobrança, os impostos que incidem sobre o rendimento global, sobre o património total ou sobre elementos do rendimento ou do património, incluindo os impostos sobre os lucros provenientes da alienação de bens móveis ou imóveis, os impostos sobre o montante dos salários pagos pelas empresas, bem como os impostos sobre as mais valias.

22     Resulta claramente desta disposição que, para além dos impostos sobre o rendimento total e o património total, a Directiva 77/799 se refere também aos impostos cobrados sobre elementos do rendimento ou do património. Daqui resulta que esses impostos, independentemente da sua denominação, fazem também parte dos impostos em relação aos quais as autoridades competentes trocam, nos termos da Directiva 77/799, todas as informações susceptíveis de lhes permitir determinar correctamente os referidos impostos.

23     Em segundo lugar, nos termos do artigo 1.°, n.° 3, da Directiva 77/799, no que respeita a França, os impostos referidos no n.° 2 deste artigo são, designadamente, o impôt sur le revenu, o impôt sur les sociétés, a taxe professionnelle, a taxe foncière sur les propriétés bâties e a taxe foncière sur les propriétés non bâties.

24     Resulta sem qualquer equívoco das disposições do artigo 1.°, n.° 3, da Directiva 77/799 que a enumeração dos impostos referidos neste artigo não é exaustiva.

25     Nestas condições, há que afastar desde já o argumento de que, por o imposto controvertido não constar da lista dos impostos referidos no artigo 1.°, n.° 3, da Directiva 77/799, esta última não é aplicável ao litígio no processo principal.

26     A natureza não exaustiva da enumeração dos impostos constantes do artigo 1.°, n.° 3, da Directiva 77/799 é corroborada pelo n.° 4 deste artigo que prevê que as autoridades competentes dos Estados-Membros trocam igualmente todas as informações susceptíveis de lhes permitir determinar correctamente os impostos de natureza idêntica ou análoga que venham a acrescer aos impostos referidos no n.° 3 ou a substituí-los.

27     Embora reconhecendo que a enumeração dos impostos referidos no artigo 1.°, n.° 3, da Directiva 77/799 não é exaustiva, o Governo francês sustenta, no entanto, que as características do imposto controvertido não permitem que este seja equiparado a um imposto sobre o património, na acepção do artigo 1.°, n.os 1 a 3, da Directiva 77/799, e que, consequentemente, esta última não é aplicável ao litígio no processo principal.

28     A este respeito, o referido governo alega, por um lado, que o imposto controvertido incide não sobre as pessoas singulares, mas sobre as pessoas colectivas, e, por outro, que o objectivo prosseguido por este imposto consiste em lutar contra a evasão fiscal.

29     No que se refere ao primeiro argumento invocado, há que referir desde já que resulta do artigo 1.°, n.° 3, da Directiva 77/799 que fazem parte dos impostos relativamente aos quais as autoridades competentes dos Estados-Membros trocam todas as informações susceptíveis de lhes permitir determinar correctamente esses impostos aqueles que incidem também sobre as pessoas colectivas, tais como a taxe professionnelle, à qual se refere expressamente o artigo 1.°, n.° 3, da Directiva 77/799.

30     Daqui resulta que a argumentação segundo a qual os impostos enumerados na Directiva 77/799 não se referem às pessoas colectivas deve ser afastada.

31     No que respeita ao segundo argumento apresentado pelo Governo francês, admitindo que o objectivo prosseguido pelo imposto controvertido consiste em lutar contra a evasão fiscal, há que referir que este entendimento não pode, de forma alguma, conduzir, por si só, a pôr em causa a aplicabilidade da Directiva 77/799 ao litígio no processo principal.

32     Por outro lado, há que recordar que foi precisamente para lutar contra as práticas de fraude e de evasão fiscais e para permitir igualmente a determinação correcta dos impostos sobre o rendimento e sobre o património que a Directiva 77/799 previu mecanismos destinados a reforçar a colaboração entre as administrações fiscais dentro da Comunidade (v., neste sentido, designadamente, acórdãos de 13 de Abril de 2000, W. N., C-420/98, Colect., p. I-2847, n.° 22, e de 26 de Janeiro de 2006, Comissão/Conselho, C-533/03, Colect., p. I-1025, n.os 70 e 71).

33     Parece no entanto que, através deste argumento, o Governo francês tenta demonstrar que o imposto controvertido não pode ser considerado um imposto sobre o património, na acepção da Directiva 77/799. Na sua opinião, esta alegação é corroborada pelo facto de o imposto controvertido incidir sobre as pessoas colectivas.

34     Esta argumentação não pode deixar de ser afastada.

35     Com efeito, para além de a Directiva 77/799 não excluir de forma alguma do seu âmbito de aplicação os impostos que incidem sobre as pessoas colectivas, como já foi referido no n.° 29 do presente acórdão, há que recordar que o imposto controvertido é devido pelas pessoas colectivas que sejam proprietárias de imóveis situados em França e que é calculado em função do valor desses bens.

36     É forçoso reconhecer que o referido imposto incide sobre uma parte do património da pessoa colectiva em causa. Faz portanto parte dos impostos que, independentemente da sua denominação, são cobrados sobre elementos do rendimento ou do património, na acepção do artigo 1.°, n.° 2, da Directiva 77/799.

37     Resulta de todas as considerações expostas que se deve responder à segunda questão que o imposto controvertido constitui um imposto de natureza análoga à dos impostos enumerados no artigo 1.°, n.° 3, da Directiva 77/799, que é cobrado sobre elementos do património, na acepção do artigo 1.°, n.° 2, desta directiva.

 Quanto à terceira questão

38     Para responder a esta questão, importa recordar, por um lado, as obrigações impostas aos Estados-Membros resultantes das disposições relevantes da Directiva 77/799 e, por outro, as que incumbem aos dois Estados-Membros abrangidos pelo presente processo por força da Convenção de 1 de Abril de 1958.

39     Relativamente às obrigações impostas pela Directiva 77/799, há que precisar, em primeiro lugar, que, por força das disposições conjugadas dos n.os 1, 3 e 4 do artigo 1.° desta última, as autoridades competentes dos Estados-Membros trocam todas as informações susceptíveis de lhes permitir determinar correctamente os impostos sobre o rendimento e sobre o património assim como os impostos de natureza análoga, como o imposto controvertido.

40     Em seguida, nos termos do artigo 2.° da Directiva 77/799, essa troca de informações é feita mediante pedido da autoridade competente do Estado-Membro em causa. Como resulta do artigo 3.° desta directiva, as autoridades competentes dos Estados-Membros trocam também informações sem necessidade de pedido prévio, de forma automática, para determinadas categorias de situações visadas na referida directiva ou ainda, segundo o artigo 4.° desta, de forma espontânea.

41     A este respeito, o artigo 8.°, n.° 1, da Directiva 77/799 prevê que esta última não impõe a obrigação de promover investigações ou de transmitir informações quando a legislação ou a prática administrativa do Estado-Membro que deve fornecer as informações não autorizem a autoridade competente a efectuar essas investigações nem a obter ou utilizar tais informações no próprio interesse desse Estado.

42     Por último, segundo o artigo 11.° da Directiva 77/799, as disposições desta última não prejudicam a execução de obrigações mais amplas no que respeita à troca de informações que resultem de outros actos jurídicos.

43     Quanto às obrigações resultantes da Convenção de 1 de Abril de 1958, o artigo 22.°, n.° 1, desta última estipula que as autoridades administrativas dos dois Estados em causa – a República Francesa e o Grão-Ducado do Luxemburgo, no presente caso – podem, oficiosamente ou na sequência da formulação de um pedido, trocar, sob condição de reciprocidade, as informações que as legislações fiscais nacionais permitam obter no âmbito de práticas administrativas normais para uma aplicação correcta desta convenção. Esta troca de informações não se aplica, no entanto, às sociedades holding de direito luxemburguês.

44     Resulta claramente das estipulações da referida convenção que esta última prevê obrigações de natureza idêntica às que resultam da Directiva 77/799.

45     É nestas condições que o órgão jurisdicional de reenvio se questiona sobre se as obrigações de assistência mútua que a Directiva 77/799 impõe aos Estados-Membros em matéria fiscal se opõem à aplicação, pelos Estados-Membros, das obrigações que resultam da Convenção de 1 de Abril de 1958.

46     A este respeito, alega-se, em primeiro lugar, que as obrigações resultantes da referida convenção não afectam de modo algum a aplicabilidade da Directiva 77/799. Segundo o Governo helénico, estas obrigações estão de qualquer modo abrangidas pelo artigo 11.° da directiva, que prevê que as suas disposições não prejudicam a execução de obrigações mais amplas no que respeita à troca de informações que resultem de outros actos jurídicos.

47     Este argumento deve ser afastado desde já. Com efeito, não há dúvida de que, no que se refere às sociedades holding de direito luxemburguês, as obrigações resultantes da Convenção de 1 de Abril de 1958 não têm um âmbito mais amplo no que respeita à troca de informações. Pelo contrário, visam restringir, ou mesmo excluir, a referida troca quando esta tenha por objecto informações relativas às referidas sociedades holding.

48     Daqui resulta que o artigo 11.° da Directiva 77/799 não pode ser validamente invocado no âmbito do litígio no processo principal.

49     Em segundo lugar, o Governo francês sustenta que resulta das disposições do artigo 8.°, n.° 1, da Directiva 77/799 que esta não se opõe à aplicação ao presente caso da Convenção de 1 de Abril de 1958, que exclui do sistema de troca de informações entre as Administrações nacionais em causa as sociedades holding de direito luxemburguês.

50     A este respeito, resulta do artigo 8.°, n.° 1, da Directiva 77/799 que esta não impõe aos Estados-Membros a obrigação de promover investigações ou de transmitir informações quando a legislação ou a prática administrativa do Estado-Membro que deve fornecer as informações não autorizem a autoridade competente a efectuar essas investigações nem a obter ou utilizar tais informações no próprio interesse desse Estado.

51     Segundo o Governo francês, a legislação luxemburguesa relevante limita-se a exigir que as sociedades holding de direito luxemburguês forneçam informações sobre o seu estatuto jurídico e prevê que nenhuma informação lhes pode ser pedida para efeitos de tributação.

52     Consequentemente, se esta situação se confirmar na legislação luxemburguesa relevante, o que cabe ao órgão jurisdicional de reenvio verificar, a situação das sociedades holding de direito luxemburguês, no que se refere à assistência mútua dos Estados-Membros no domínio dos impostos directos e indirectos, é abrangida pelo artigo 8.°, n.° 1, da Directiva 77/799.

53     Sucede o mesmo com a Convenção de 1 de Abril de 1958, da qual resulta que as partes contratantes excluíram do sistema de informações nela previsto as referidas sociedades holding.

54     Com efeito, a Convenção de 1 de Abril de 1958 limita-se a reflectir o estado da legislação luxemburguesa na matéria, de modo que esta convenção também é abrangida, no que diz respeito ao seu âmbito de aplicação restrito, pelo artigo 8.°, n.° 1, da Directiva 77/799.

55     Nestas condições, há que responder à terceira questão que a Directiva 77/799 e, em especial, o seu artigo 8.°, n.° 1, não se opõem a que dois Estados-Membros estejam ligados por uma convenção internacional, para prevenir as duplas tributações e definir regras para a assistência administrativa mútua em matéria de impostos sobre o rendimento e sobre o património, que exclui do seu âmbito de aplicação, relativamente a um Estado-Membro, uma categoria de contribuintes sujeitos a um imposto abrangido pela referida directiva, desde que a legislação ou a prática administrativa do Estado-Membro que deve fornecer as informações não autorizem a autoridade competente a obter ou utilizar tais informações no próprio interesse do referido Estado-Membro, o que cabe ao órgão jurisdicional verificar.

 Quanto à primeira questão

56     Com a primeira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se as disposições do Tratado relativas à liberdade de estabelecimento e à livre circulação de capitais se opõem a uma legislação nacional, como a que está em causa no processo principal, que isenta as sociedades sediadas em França do imposto controvertido, ao mesmo tempo que sujeita a referida isenção, para as sociedades sediadas noutro Estado-Membro, à existência de uma convenção de assistência administrativa celebrada entre a República Francesa e esse Estado para lutar contra a fraude e a evasão fiscais ou à circunstância de, em aplicação de um tratado que contenha uma cláusula de não discriminação em razão da nacionalidade, essas sociedades não deverem ser sujeitas a uma tributação mais onerosa do que aquela a que estão sujeitas as sociedades sediadas em França.

57     Uma vez que o órgão jurisdicional de reenvio pede ao Tribunal de Justiça que interprete tanto o artigo 52.° do Tratado relativo à liberdade de estabelecimento como o artigo 73.°-B do Tratado relativo à livre circulação de capitais, há que determinar se uma legislação nacional como a que está em causa no processo principal é susceptível de ser abrangida por estas liberdades.

58     Relativamente ao artigo 73.°-B do Tratado, há que recordar que o direito de adquirir, explorar e alienar bens imóveis no território de outro Estado-Membro, que constitui o complemento necessário da liberdade de estabelecimento, como resulta do artigo 54.°, n.° 3, alínea e), do Tratado CE [que passou, após alteração, a artigo 44.°, n.° 2, alínea e), CE], gera, quando é exercido, movimentos de capitais (acórdão de 25 de Janeiro de 2007, Festersen, C-370/05, ainda não publicado na Colectânea, n.° 22 e jurisprudência referida).

59     Segundo jurisprudência assente, os movimentos de capitais compreendem as operações através das quais os não residentes efectuam investimentos imobiliários no território de um Estado-Membro, como resulta da nomenclatura dos movimentos de capitais que consta do anexo I da Directiva 88/361/CEE do Conselho, de 24 de Junho de 1988, para a execução do artigo 67.° do Tratado [artigo revogado pelo Tratado de Amesterdão] (JO L 178, p. 5), conservando essa nomenclatura o valor indicativo que já tinha para definir o conceito de movimentos de capitais (v. acórdão Festersen, já referido, n.° 23 e jurisprudência referida).

60     É facto assente que a recorrente no processo principal, enquanto sociedade holding de direito luxemburguês, adquiriu bens imóveis em França. Não há dúvida de que esse investimento transfronteiriço constitui um movimento de capitais, na acepção da referida nomenclatura (v. acórdão de 5 de Julho de 2005, D., C-376/03, Colect., p. I-5821, n.° 24).

61     Daqui resulta que uma legislação nacional como a que está em causa no processo principal é abrangida pela livre circulação de capitais.

62     Relativamente ao artigo 52.° do Tratado, resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça que a liberdade de estabelecimento, que este artigo reconhece aos nacionais de um Estado-Membro da Comunidade e que lhes confere o direito de acesso às actividades não assalariadas e ao seu exercício, bem como a constituição e a gestão de empresas, nas mesmas condições que as definidas na legislação do Estado-Membro de estabelecimento para os seus próprios nacionais, compreende, para as sociedades constituídas em conformidade com a legislação de um Estado-Membro e que tenham a sua sede social, a sua administração central ou o seu estabelecimento principal no interior da Comunidade, o direito de exercer a sua actividade no Estado-Membro em causa, por intermédio de uma filial, de uma sucursal ou de uma agência (acórdãos de 23 de Fevereiro de 2006, Keller Holding, C-471/04, Colect., p. I-2107, n.° 29, e de 14 de Setembro de 2006, Centro di Musicologia Walter Stauffer, C-386/04, Colect., p. I-8203, n.° 17 e jurisprudência referida).

63     Além disso, o conceito de estabelecimento, na acepção do Tratado, é um conceito muito amplo, que implica a possibilidade de um nacional de um Estado-Membro da Comunidade participar, de modo estável e contínuo, na vida económica de um Estado-Membro que não o seu Estado de origem e de dela tirar benefício, favorecendo assim a interpenetração económica e social no interior da Comunidade no domínio das actividades não assalariadas (v., designadamente, acórdão Centro di Musicologia Walter Stauffer, já referido, n.° 18 e jurisprudência referida).

64     No entanto, para que as disposições relativas ao direito de estabelecimento se possam aplicar, é, em princípio, necessário que seja assegurada uma presença permanente no Estado-Membro de acolhimento e, em caso de aquisição e posse de bens imobiliários, que a gestão desses bens seja activa (acórdão Centro di Musicologia Walter Stauffer, já referido, n.° 19).

65     No presente processo, ainda que a recorrente no processo principal possua bens imóveis em França, não resulta da descrição dos factos apresentada pelo órgão jurisdicional de reenvio nem das observações apresentadas a este Tribunal que possui esses bens no âmbito do exercício das suas actividades ou ainda que o seu património imobiliário é gerido por si própria.

66     Consequentemente, há que concluir que as disposições que regem a liberdade de estabelecimento não são em princípio aplicáveis a circunstâncias como as que foram expostas na decisão de reenvio.

67     Resulta das considerações anteriores que há que examinar se uma legislação nacional como a que está em causa no processo principal constitui uma restrição aos movimentos de capitais.

68     A esta respeito, importa, a título liminar, recordar que, de acordo com jurisprudência assente, embora a fiscalidade directa seja da competência dos Estados-Membros, estes devem, todavia, exercer essa competência no respeito do direito comunitário (v., designadamente, acórdãos de 7 de Setembro de 2004, Manninen, C-319/02, Colect., p. I-7477, n.° 19; de 6 de Março de 2007, Meilicke e o., C-292/04, ainda não publicado na Colectânea, n.° 19; e de 24 de Maio de 2007, Holböck, C-157/05, ainda não publicado na Colectânea, n.° 21).

69     Resulta também da jurisprudência do Tribunal de Justiça que as medidas proibidas pelo artigo 73.°-B, n.° 1, do Tratado, enquanto restrições aos movimentos de capitais, compreendem as que são susceptíveis de dissuadir os não residentes de fazerem investimentos num Estado-Membro ou dissuadir os residentes do referido Estado-Membro de os fazerem noutros Estados (acórdão Festersen, já referido, n.° 24 e jurisprudência referida).

70     Relativamente às pessoas colectivas que tenham a sua direcção efectiva em França, estas, ao abrigo do artigo 990 E, ponto 3, do CGI, ficam isentas do imposto controvertido, quando comuniquem todos os anos, ou assumam e respeitem a obrigação de comunicar à Administração Fiscal, a pedido desta, a localização e descrição dos imóveis de que sejam proprietárias a 1 de Janeiro, a identidade e endereço dos seus accionistas, associados ou outros membros, o número de acções ou outros direitos detidos por cada um e a prova do seu domicílio fiscal.

71     No que respeita às pessoas colectivas que tenham a sua sede noutro Estado que não em França, o artigo 990 E, ponto 2, do CGI prevê que ficam isentas do imposto controvertido – tal como as pessoas colectivas que tenham a sua direcção efectiva em França – quando declarem todos os anos a localização, descrição e valor dos imóveis que estejam na sua posse a 1 de Janeiro, a identidade e o endereço dos seus associados naquela data e o número de acções detidas por cada um.

72     No entanto, segundo esta mesma disposição do CGI, é ainda necessário que tenha sido celebrada uma convenção de assistência administrativa para lutar contra a fraude e a evasão fiscais ou, segundo o artigo 990 E, ponto 3, do CGI, um tratado nos termos do qual as pessoas colectivas não devam ser sujeitas a uma tributação mais onerosa do que a das pessoas colectivas que tenham a sua direcção efectiva em França.

73     No que respeita à isenção referida no artigo 990 E, ponto 2, do CGI, a convenção a que este artigo alude foi celebrada, mas as sociedades holding de direito luxemburguês, como a recorrente no processo principal, estão excluídas do seu âmbito de aplicação e, consequentemente, não podem beneficiar da isenção do imposto controvertido.

74     Relativamente a pessoas colectivas que não tenham a sua direcção em França e que possam beneficiar da isenção prevista no artigo 990 E, ponto 3, do CGI, há que referir que, até à presente data, nenhuma convenção especial para regular as questões de dupla tributação foi celebrada entre a República Francesa e o Grão-Ducado do Luxemburgo. Foi nestas condições, como foi claramente indicado na decisão de reenvio, que, no processo principal, a Administração Fiscal, em aplicação das disposições do artigo 990 E, ponto 3, do CGI, indeferiu o pedido de isenção do imposto controvertido apresentado pela recorrente.

75     Resulta das considerações que precedem que, para que possam beneficiar da isenção do imposto controvertido nos termos dos artigos 990 D e 990 E, pontos 2 e 3, do CGI, as pessoas colectivas que não tenham a sua direcção em França, contrariamente aos outros sujeitos passivos, estão sujeitas a uma condição suplementar, a saber, a da existência de uma convenção celebrada entre a República Francesa e o Estado em causa.

76     A este respeito, há que referir que, não tendo sido celebrada essa convenção, uma pessoa colectiva que não tenha a sua direcção em França fica privada da possibilidade de pedir utilmente a isenção do imposto controvertido nos termos dos artigos 990 D e 990 E, pontos 2 e 3, do CGI. Ora, uma vez que cabe apenas aos Estados em causa decidir vincular-se através de uma convenção, a condição da existência de uma convenção de assistência administrativa ou de um tratado é susceptível de criar de facto, para esta categoria de pessoas colectivas, um regime permanente de não isenção do imposto controvertido.

77     Daqui resulta que as exigências previstas na legislação nacional em causa no processo principal para beneficiar da isenção do imposto controvertido tornam o investimento imobiliário em França menos atractivo para sociedades não residentes, como as sociedades holding de direito luxemburguês.

78     Assim, a referida legislação constitui para as pessoas colectivas em causa uma restrição ao princípio da livre circulação de capitais, que é, em princípio, proibida pelo artigo 73.°-B do Tratado.

79     Nestas condições, há que examinar, em terceiro e último lugar, se a restrição resultante do imposto controvertido se justifica por uma razão imperiosa de interesse geral.

80     A este título, o Governo francês sustenta que o imposto controvertido faz parte do dispositivo de luta contra a fraude fiscal, que tem por finalidade incitar as pessoas colectivas que detêm directa ou indirectamente um imóvel em França a revelar a identidade das pessoas singulares ou colectivas suas accionistas.

81     É certo que resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça que a luta contra a fraude fiscal constitui uma razão imperiosa de interesse geral que pode justificar uma restrição à liberdade de circulação (v. acórdão Centro di Musicologia Walter Stauffer, já referido, n.° 32, e acórdão de 30 de Janeiro de 2007, Comissão/Dinamarca, C-150/04, ainda não publicado na Colectânea, n.° 51 e jurisprudência referida).

82     No entanto, a restrição em causa deve ser adequada ao objectivo prosseguido e não ultrapassar o que é necessário para alcançar esse objectivo (v., neste sentido, acórdãos, já referidos, Manninen, n.° 29; Centro di Musicologia Walter Stauffer, n.° 32; Comissão/Dinamarca, n.° 46; e acórdão de 5 de Julho de 2007, Comissão/Bélgica, C-522/04, ainda não publicado na Colectânea, n.° 47).

83     Há, portanto, que examinar se o imposto controvertido é adequado para lutar contra a fraude fiscal e se não ultrapassa o que é necessário para realizar esse objectivo.

84     Segundo o Governo francês, o imposto controvertido visa dissuadir os contribuintes sujeitos ao imposto sobre o património em França de escapar a essa tributação através da criação de sociedades, que se tornam proprietárias de imóveis situados em França, em Estados que não celebraram com a República Francesa uma convenção de assistência administrativa ou um tratado que contenha uma cláusula de não discriminação em razão da nacionalidade segundo a qual essas sociedades não devem ser sujeitas a uma tributação mais onerosa do que aquela a que estão sujeitas as sociedades sediadas em França.

85     O imposto controvertido visa, em especial, combater as práticas que consistem na criação, por pessoas singulares que tenham o seu domicílio fiscal em França e cujos imóveis estariam em princípio sujeitos ao imposto sobre o património, de sociedades que tenham o seu domicílio fiscal noutro Estado, do qual a República Francesa não pode obter as informações adequadas sobre as pessoas singulares que detêm participações nessas sociedades.

86     É assim evidente que o critério essencial da isenção é, com efeito, constituído pela garantia de a Administração Fiscal francesa poder solicitar directamente a autoridades fiscais estrangeiras todas as informações necessárias para analisar as declarações feitas por sociedades que detenham direitos de propriedade ou outros direitos reais sobre imóveis situados em França nos termos do artigo 990 E do CGI, bem como as declarações subscritas por pessoas singulares que tenham o seu domicílio fiscal em França relativas aos seus imóveis sujeitos ao imposto sobre o património.

87     Ao tributar todas as sociedades que não cumprem este requisito, a legislação francesa em causa no processo principal acaba por tributar os imóveis detidos por sociedades utilizadas como «filtros» por pessoas singulares que, em caso de inexistência dessas sociedades, estariam sujeitas ao imposto sobre o património.

88     O imposto controvertido permite, consequentemente, lutar contra práticas que têm como único objectivo fazer escapar pessoas singulares ao pagamento do imposto sobre o património em França ou, pelo menos, tornar essas práticas menos atractivas. O imposto é, assim, adequado ao objectivo que consiste em lutar contra a fraude fiscal.

89     Há, no entanto, que determinar se o imposto controvertido não ultrapassa o necessário para atingir esse objectivo.

90     A este propósito, o Governo francês afirma que é necessária uma abordagem restritiva da isenção do imposto controvertido devido à dificuldade que as autoridades francesas têm de provar a fraude fiscal nos casos de inexistência de informações fiáveis que permitam analisar as informações fornecidas pelos contribuintes nas suas declarações.

91     Há que referir a este respeito que, segundo jurisprudência assente, uma justificação baseada na luta contra a fraude fiscal só pode ser aceite se visar esquemas puramente artificiais cujo objectivo consista em contornar a legislação fiscal, o que exclui qualquer presunção geral de fraude. Consequentemente, uma presunção geral de evasão ou fraude fiscal não basta para justificar uma medida fiscal que afecte os objectivos do Tratado (v., neste sentido, acórdãos de 26 de Setembro de 2000, Comissão/Bélgica, C-478/98, Colect., p. I-7587, n.° 45; de 4 de Março de 2004, Comissão/França, C-334/02, Colect., p. I-2229, n.° 27; e de 12 de Setembro de 2006, Cadbury Schweppes e Cadbury Schweppes Overseas, C-196/04, Colect., p. I-7995, n.° 50 e jurisprudência referida).

92     Segundo jurisprudência igualmente assente do Tribunal de Justiça, a Directiva 77/799 pode ser invocada por um Estado-Membro para obter das autoridades competentes de outro Estado-Membro todas as informações necessárias para lhe permitir estabelecer correctamente o montante dos impostos abrangidos pela referida directiva (v. acórdãos Cadbury Schweppes e Cadbury Schweppes Overseas, já referido, n.° 71, e Comissão/Dinamarca, já referido, n.° 52). Além disso, resulta da resposta dada à segunda questão prejudicial que o imposto controvertido está abrangido pela Directiva 77/799.

93     É certo que resulta da resposta dada à terceira questão que, no contexto do processo principal, o âmbito de aplicação restrito da Convenção de 1 de Abril de 1958 resulta do limite da troca de informações previsto no artigo 8.°, n.° 1, da Directiva 77/799, pelo que as autoridades fiscais francesas podem ficar impedidas de lutar eficazmente contra a fraude fiscal nos casos das sociedades holding de direito luxemburguês.

94     No entanto, resulta também da jurisprudência que, apesar de o artigo 8.°, n.° 1, da Directiva 77/799 não obrigar as autoridades fiscais dos Estados-Membros a colaborar quando as leis ou as práticas administrativas destes últimos não autorizem as autoridades competentes a investigar nem a obter ou utilizar informações no próprio interesse desse Estado, a impossibilidade de solicitar esta colaboração não pode justificar a recusa de atribuir um benefício fiscal.

95     Com efeito, nada impede as autoridades fiscais em causa de exigirem do contribuinte as provas que julguem necessárias para a determinação correcta dos impostos em causa e, sendo caso disso, de recusarem a isenção se essas provas não forem apresentadas (v. acórdão Comissão/Dinamarca, já referido, n.° 54 e jurisprudência referida).

96     Deste modo, não se pode excluir a priori que o sujeito passivo esteja em condições de apresentar as provas pertinentes que permitam às autoridades fiscais do Estado-Membro de tributação verificar, de forma clara e precisa, que não tenta evitar ou iludir o pagamento de impostos (v., neste sentido, acórdãos de 8 de Julho de 1999, Baxter e o., C-254/97, Colect., p. I-4809, n.os 19 e 20, e de 10 de Março de 2005, Laboratoires Fournier, C-39/04, Colect., p. I-2057, n.° 25).

97     Além disso, há que referir que, nas circunstâncias do processo principal, a eventual impossibilidade de solicitar directamente a cooperação das autoridades fiscais do Grão-Ducado do Luxemburgo pode tornar a verificação das informações mais difícil.

98     No entanto, esta dificuldade não pode justificar uma recusa categórica de conceder um benefício fiscal a título dos investimentos efectuados pelos investidores provenientes desse Estado-Membro. Com efeito, quando sociedades holding de direito luxemburguês solicitem a isenção do imposto controvertido, as autoridades fiscais francesas podem pedir a essas mesmas sociedades que forneçam elementos de prova que considerem necessários para que seja plenamente assegurada a transparência dos direitos de propriedade e da estrutura accionista destas últimas, independentemente da existência de uma convenção de assistência administrativa ou de um tratado que preveja uma cláusula de não discriminação em matéria fiscal.

99     A legislação francesa em causa no processo principal não permite que sociedades que estão excluídas do âmbito de aplicação de uma convenção de assistência administrativa e que não estão abrangidas por um tratado que contenha uma cláusula de não discriminação em matéria fiscal, mas que investem em imóveis situados em França, apresentem provas que permitam determinar a identidade dos seus accionistas e qualquer outra informação que as autoridades francesas considerem necessárias. Consequentemente, esta legislação impede, em todas as situações, que estas sociedades provem que não prosseguem um objectivo fraudulento.

100   Daqui resulta que o Governo francês podia ter adoptado medidas menos restritivas para atingir o objectivo de lutar contra a fraude fiscal.

101   Consequentemente, o imposto controvertido não pode ser justificado pela luta contra esta fraude.

102   Há, consequentemente, que responder à primeira questão que o artigo 73.°-B do Tratado deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma legislação nacional, como a que está em causa no processo principal, que isenta as sociedades sediadas em França do imposto controvertido, quando condiciona esta isenção, para as sociedades sediadas noutro Estado-Membro, à existência de uma convenção de assistência administrativa celebrada entre a República Francesa e esse Estado para lutar contra a fraude e a evasão fiscais ou à circunstância de, através da aplicação de um tratado que contenha uma cláusula de não discriminação em razão da nacionalidade, essas sociedades não deverem ser sujeitas a uma tributação mais onerosa do que aquela a que estão sujeitas as sociedades sediadas em França e não permite que a sociedade sediada noutro Estado-Membro apresente elementos de prova que permitam determinar a identidade dos seus accionistas que sejam pessoas singulares.

 Quanto à quarta questão

103   Atendendo às respostas dadas pelo Tribunal às três primeiras questões, não há que responder à quarta questão colocada pelo órgão jurisdicional de reenvio.

 Quanto às despesas

104   Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional nacional, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efectuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Quarta Secção) declara:

1)      O imposto sobre o valor venal dos imóveis situados em França que pertencem a pessoas colectivas constitui um imposto de natureza análoga à dos impostos enumerados no artigo 1.°, n.° 3, da Directiva 77/799/CEE do Conselho, de 19 de Dezembro de 1977, relativa à assistência mútua das autoridades competentes dos Estados-Membros no domínio dos impostos directos e indirectos, alterada pela Directiva 92/12/CEE do Conselho, de 25 de Fevereiro de 1992, que é cobrado sobre elementos do património, na acepção do artigo 1.°, n.° 2, desta directiva.

2)      A Directiva 77/799, alterada pela Directiva 92/12, e, em especial, o seu artigo 8.°, n.° 1, não se opõem a que dois Estados-Membros estejam ligados por uma convenção internacional, para prevenir as duplas tributações e definir regras para a assistência administrativa mútua em matéria de impostos sobre o rendimento e sobre o património, que exclui do seu âmbito de aplicação, relativamente a um Estado-Membro, uma categoria de contribuintes sujeitos a um imposto abrangido pela referida directiva, desde que a legislação ou a prática administrativa do Estado-Membro que deve fornecer as informações não autorizem a autoridade competente a obter ou utilizar tais informações no próprio interesse do referido Estado-Membro, o que cabe ao órgão jurisdicional verificar.

3)      O artigo 73.°-B do Tratado CE (actual artigo 56.° CE) deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma legislação nacional, como a que está em causa no processo principal, que isenta as sociedades sediadas em França do imposto sobre o valor venal dos imóveis situados em França que pertençam a pessoas colectivas, quando condiciona esta isenção, para as sociedades sediadas noutro Estado-Membro, à existência de uma convenção de assistência administrativa celebrada entre a França e esse Estado para lutar contra a fraude e a evasão fiscais ou à circunstância de, através da aplicação de um tratado que contenha uma cláusula de não discriminação em razão da nacionalidade, essas sociedades não deverem ser sujeitas a uma tributação mais onerosa do que aquela a que estão sujeitas as sociedades sediadas em França e não permite que a sociedade sediada noutro Estado-Membro apresente elementos de prova que permitam determinar a identidade dos seus accionistas que sejam pessoas singulares.

Assinaturas


* Língua do processo: francês.