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ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Segunda Secção)

19 de julho de 2012 (*)

«Diretiva 2006/112/CE — Artigo 56.°, n.° 1, alínea e) — Artigo 135.°, n.° 1, alíneas f) e g) — Isenção das operações de gestão do património constituído por valores mobiliários (gestão de carteiras de títulos)»

No processo C-44/11,

que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial nos termos do artigo 267.° TFUE, apresentado pelo Bundesfinanzhof (Alemanha), por decisão de 28 de outubro de 2010, entrado no Tribunal de Justiça em 31 de janeiro de 2011, no processo

Finanzamt Frankfurt am Main V-Höchst

contra

Deutsche Bank AG,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Segunda Secção),

composto por: J. N. Cunha Rodrigues, presidente de secção, U. Lõhmus, A. Rosas (relator), A. Ó Caoimh e A. Arabadjiev, juízes,

advogado-geral: E. Sharpston,

secretário: R. Şereş, administradora,

vistos os autos e após a audiência de 1 de março de 2012,

vistas as observações apresentadas:

¾        em representação do Finanzamt Frankfurt am Main V-Höchst, por M. Baueregger, na qualidade de agente,

¾        em representação da Deutsche Bank AG, por P. Farmer e P. Freund, barristers,

¾        em representação do Governo alemão, por T. Henze, na qualidade de agente,

¾        em representação do Governo neerlandês, por C. M. Wissels e M. K. Bulterman, na qualidade de agentes,

¾        em representação do Governo do Reino Unido, por C. Murrell, na qualidade de agente, assistida por R. Hill, solicitor,

¾        em representação da Comissão Europeia, por C. Soulay, L. Lozano Palacios e B.-R. Killmann, na qualidade de agentes,

ouvidas as conclusões da advogada-geral na audiência de 8 de maio de 2012,

profere o presente

Acórdão

1        O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação dos artigos 56.°, n.° 1, alínea e), e 135.°, n.° 1, alíneas f) e g), da Diretiva 2006/112/CE do Conselho, de 28 de novembro de 2006, relativa ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado (JO L 347, p. 1, a seguir «Diretiva 2006/112»).

2        Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe o Finanzamt Frankfurt am Main V-Höchst (a seguir «Finanzamt») à Deutsche Bank AG (a seguir «Deutsche Bank»), a propósito, nomeadamente, da qualificação, para efeitos da isenção do imposto sobre o valor acrescentado (a seguir «IVA»), da gestão de património constituído por valores mobiliários (a seguir «gestão de carteiras de títulos») efetuada pela Deutsche Bank.

 Quadro jurídico

 Regulamentação da União

3        O artigo 56.° da Diretiva 2006/112 dispunha no momento dos factos no processo principal:

«1.       O lugar das prestações de serviços adiante enumeradas, efetuadas a destinatários estabelecidos fora da Comunidade ou a sujeitos passivos estabelecidos na Comunidade, mas fora do país do prestador, é o lugar onde o destinatário tem a sede da sua atividade económica ou dispõe de um estabelecimento estável para o qual foi prestado o serviço ou, na falta de sede ou de estabelecimento estável, o lugar onde tem domicílio ou residência habitual:

[…]

e)       Operações bancárias, financeiras e de seguros, incluindo as de resseguro, com exceção do aluguer de cofres-fortes;

[…]»

4        Nos termos do artigo 135.° da mesma diretiva:

«1.       Os Estados-Membros isentam as seguintes operações:

a)      As operações de seguro e de resseguro, incluindo as prestações de serviços relacionadas com essas operações efetuadas por corretores e intermediários de seguros;

[…]

f)      As operações, incluindo a negociação mas excluindo a guarda e gestão, relativas às ações, participações em sociedades ou em associações, obrigações e demais títulos, com exclusão dos títulos representativos de mercadorias e dos direitos ou títulos referidos no n.° 2 do artigo 15.°;

g)      A gestão de fundos comuns de investimento, tal como definidos pelos Estados-Membros;

[…]»

 Legislação alemã

5        O § 3a, n.° 3, da Lei relativa ao imposto sobre o valor acrescentado de 2005 (Umsatzsteuergesetz 2005), na sua redação em vigor no momento dos factos no processo principal (a seguir «UStG»), previa:

«Se o destinatário de uma das outras prestações referidas no n.° 4 é uma empresa, em derrogação do n.° 1, entende-se que a prestação é realizada onde o destinatário exerce a sua atividade. Se a referida prestação é realizada no estabelecimento estável de uma empresa, é determinante o lugar onde ele se situa. Se o destinatário de uma das outras prestações referidas no n.° 4 não é uma empresa e se tem o seu domicílio ou sede no território de um país terceiro, entende-se que a prestação é realizada no seu domicílio ou sede.»

6        O § 3a, n.° 4, ponto 6, alínea a), desta lei dispunha:

«Para efeitos do n.° 3, entende-se por ‘outras prestações’: […]

a)       as outras prestações do tipo referido no § 4, ponto 8, alíneas a) a h), e ponto 10, bem como a gestão de créditos e de garantias de créditos, […]»

7        Nos termos do § 4, ponto 8, alíneas e) e h), da UStG:

«Entre as operações referidas no § 1, n.° 1, ponto 1, são isentas:

[…]

e)       as operações sobre títulos e a negociação dessas operações, excetuando a guarda e a gestão de títulos,

[…]

h)       a gestão de fundos de investimento, nos termos da Lei relativa aos investimentos [Investmentgesetz] e a gestão de instituições de previdência, em conformidade com a Lei relativa ao controlo das operações e das companhias de seguros [Versicherungsaufsichtsgesetz];

[…]»

8        Nos termos de uma comunicação do Ministério das Finanças, que constitui uma circular interpretativa que não vincula os tribunais:

«O § 3a, n.os 3 e 4, ponto 6, alínea a), da UStG não é aplicável à determinação do lugar das operações de gestão do património. Também não é possível aplicar diretamente o artigo 56.°, n.° 1, alínea e), da Diretiva 2006/112/CE, nos termos do qual o lugar da prestação no caso de certas ‘operações bancárias, financeiras e de seguros’, se determina em função da sede ou do estabelecimento estável do destinatário da prestação. As ‘operações bancárias, financeiras e de seguros’ são conceitos de direito comunitário e devem ser interpretados como tal. A Diretiva 2006/112/CE — e, até 31 de dezembro de 2006, também a [Sexta Diretiva 77/388/CEE do Conselho, de 17 de maio de 1977, relativa à harmonização das legislações dos Estados-Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios — Sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado: matéria coletável uniforme (JO L 145, p. 1; EE 09 F1 p. 54)], não define precisamente o que abrangem esses conceitos. Contudo, a Diretiva 2006/112/CE contém, no artigo 135.°, n.° 1, alíneas a) a f), […] indicações claras sobre a interpretação desses conceitos. A gestão do património não é mencionada nas referidas disposições. Também não resulta do artigo 56.°, n.° 1, alínea e), da Diretiva 2006/112/CE […] que esta disposição deva abranger outras operações bancárias, financeiras e de seguros.

A ‘gestão do património’, que é uma prestação única, é tributável. A isenção prevista no § 4, ponto 8, alínea e), da UStG não é aplicável, porque a gestão do património (gestão de carteiras de títulos) não se encontra entre as operações favorecidas em virtude das disposições mencionadas supra. […].»

 Matéria de facto na origem do litígio no processo principal e questões prejudiciais

9        Durante 2008, a Deutsche Bank, quer diretamente quer através de sociedades filiais, prestou serviços de gestão de carteiras de títulos a clientes investidores. Estes últimos encarregaram a Deutsche Bank de gerir de modo autónomo valores mobiliários tendo em consideração as estratégias de investimento escolhidas por esses clientes investidores, sem recolher previamente as suas instruções, bem como de tomar todas as medidas pertinentes para esse fim. A Deutsche Bank estava habilitada a dispor desses ativos (valores mobiliários) em nome e por conta dos clientes investidores.

10      Os clientes investidores pagavam uma comissão anual que representava 1,8% do valor do património gerido. Esta comissão incluía uma parte referente à gestão do património, de 1,2% do valor do património gerido, e uma parte relativa à compra e venda de valores mobiliários, correspondente a 0,6% do ativo. A comissão englobava também a administração das contas-correntes e das contas de títulos assim como as comissões de subscrição para a aquisição de participações, incluídas as participações em fundos geridos por empresas da Deutsche Bank.

11      No fim de cada trimestre, bem como no final do ano, cada cliente investidor recebia um relatório sobre a evolução da gestão do seu património e tinha direito, em qualquer altura, a pôr termo, sem pré-aviso, ao mandato de gestão.

12      Ao enviar a sua declaração prévia de IVA relativa ao período contabilístico do mês de maio de 2008, a Deutsche Bank precisou ao Finanzamt que considerava que as prestações efetuadas no âmbito da gestão de carteiras de títulos estavam isentas por força do § 4, ponto 8, da UStG, quando eram prestadas a clientes investidores no território alemão e no resto do território da União Europeia. A Deutsche Bank também indicou que considerava, nos termos do § 3a, n.° 4, ponto 6, alínea a), da UStG, que essas prestações não eram tributáveis quando fossem prestadas a clientes investidores estabelecidos em Estados terceiros.

13      O Finanzamt rejeitou esta argumentação e, em 29 de abril de 2009, emitiu um aviso de pagamento antecipado do IVA correspondente ao período contabilístico do mês de maio do ano de 2008, no qual considerou como tributáveis e não isentas as operações de gestão de carteiras de títulos para os clientes investidores em causa.

14      A reclamação apresentada pela Deutsche Bank contra esse aviso de pagamento foi rejeitada. Pelo contrário, o Finanzgericht (tribunal em matéria tributária) deu provimento ao recurso que a Deutsche Bank aí interpôs. Em seguida o Finanzamt interpôs um recurso de «Revision» no Bundesfinanzhof (Tribunal Fiscal Federal) da sentença proferida pelo Finanzgericht.

15      Tendo dúvidas, especialmente, quanto à qualificação da gestão de carteiras de títulos em relação às isenções do IVA, o Bundesfinanzhof decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)      A atividade de gestão [de carteiras de títulos], exercida a título oneroso por um sujeito passivo, que toma decisões autónomas sobre a compra e venda de títulos e executa essas decisões através da compra e venda dos títulos, está isenta

—      só como gestão de fundos comuns de investimento para vários investidores em conjunto, nos termos do artigo 135.°, n.° 1, alínea g), da Diretiva 2006/112[…], ou também

—      como gestão individual de carteiras [de títulos] para investidores concretos, nos termos do artigo 135.°, n.° 1, alínea f), da Diretiva 2006/112[…] (operação sobre títulos, ou como negociação dessa operação)?

2)      Para determinar a prestação principal e a prestação acessória, qual a importância que deve ser atribuída ao critério segundo o qual a prestação acessória não constitui para a clientela um fim em si, mas um meio de beneficiar nas melhores condições do serviço principal do prestador, em relação ao cálculo separado da prestação acessória e à possibilidade de a prestação acessória ser realizada por terceiros?

3)      O artigo 56.°, n.° 1, alínea e), da Diretiva 2006/112[…] abrange apenas as prestações referidas no artigo 135.°, n.° 1, alíneas a) a g), da Diretiva 2006/112[…] ou também a gestão [de carteiras de títulos], mesmo quando esta operação não é abrangida pela referida norma?»

 Quanto às questões prejudiciais

 Quanto à segunda questão

16      Com a segunda questão, que há que examinar em primeiro lugar, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, no âmbito da determinação, por um lado, da prestação principal e, por outro, da prestação acessória de uma prestação de gestão de carteiras de títulos, como a que está em causa no litígio no processo principal, ou seja, uma atividade remunerada que consiste, para um sujeito passivo, em tomar decisões autónomas de compra e de venda de valores mobiliários e executar essas decisões através da compra e da venda de valores mobiliários, que importância deve ser atribuída ao critério segundo o qual uma prestação acessória não constitui para a clientela um fim em si, mas um meio de beneficiar nas melhores condições do serviço principal do prestador, em relação ao cálculo separado de uma prestação acessória e à possibilidade de a prestação acessória ser realizada por terceiros.

17      A título preliminar, há que observar que uma atividade de gestão de carteiras de títulos como a efetuada pela Deutsche Bank no litígio no processo principal inclui vários elementos.

18      Em conformidade com a jurisprudência do Tribunal de Justiça, quando uma operação é constituída por um conjunto de elementos, há que tomar em consideração todas as circunstâncias em que se desenvolve a operação em questão, para determinar, nomeadamente, se se está em presença de duas ou mais prestações distintas ou de uma prestação única (v., neste sentido, designadamente, acórdãos de 27 de outubro de 2005, Levob Verzekeringen e OV Bank, C-41/04, Colet., p. I-9433, n.° 19, e de 10 de março de 2011, Bog e o., C-497/09, C-499/09, C-501/09 e C-502/09, Colet., p. I-1457, n.° 52).

19      A este respeito, o Tribunal de Justiça já declarou que existe uma prestação única nomeadamente quando um elemento deva ser considerado a prestação principal, enquanto o outro elemento deva ser considerado prestação acessória, sujeita ao mesmo regime fiscal da prestação principal (v. acórdão de 15 de maio de 2001, Primback, C-34/99, Colet., p. I-3833, n.° 45 e jurisprudência referida).

20      No entanto, há que recordar que, para efeitos do IVA, pode existir também uma prestação única noutras circunstâncias.

21      Assim, o Tribunal de Justiça declarou que também se está em presença de uma prestação única quando dois ou vários elementos ou atos fornecidos pelo sujeito passivo ao consumidor, considerado como consumidor médio, estão tão estreitamente ligados que formam, objetivamente, uma única prestação económica indissociável cuja decomposição teria natureza artificial (acórdão Levob Verzekeringen e OV Bank, já referido, n.° 22).

22      À luz destas considerações e a fim de dar uma resposta útil ao órgão jurisdicional de reenvio, há que considerar que, através da segunda questão, o referido órgão jurisdicional pretende, no essencial, que se qualifique para efeitos do IVA, a prestação de gestão de carteiras de títulos em causa no processo principal, atividade remunerada que consiste, para um sujeito passivo, em tomar decisões autónomas de compra e de venda de valores mobiliários e em executar essas decisões pela compra e pela venda de valores mobiliários, e, em especial, que se determine se essa atividade deve ser considerada uma única prestação económica.

23      Ao tomar em consideração, em conformidade com a jurisprudência referida no n.° 18 do presente acórdão, todas as circunstâncias em que decorre essa prestação de gestão de carteiras de títulos, afigura-se que esta constitui uma combinação, essencialmente, de uma prestação de análise e de supervisão do património do cliente investidor, por um lado, e de uma prestação de compra e de venda de títulos propriamente dita, por outro.

24      Na verdade, esses dois elementos da prestação de gestão de carteiras de títulos são suscetíveis de ser efetuados separadamente. Com efeito, um cliente investidor pode apenas desejar um serviço de consultadoria e preferir decidir e executar ele próprio as operações de investimento. Ao invés, um cliente investidor que prefira tomar ele próprio as decisões de investimento de títulos e, de maneira mais geral, estruturar e supervisionar o seu património, sem efetuar atos de venda ou de compra, pode recorrer a um intermediário para este último tipo de operações.

25      Todavia, o cliente investidor médio, no quadro de uma prestação de gestão de carteiras de títulos como a efetuada pela Deutsche Bank no litígio no processo principal, procura justamente a combinação destes dois elementos.

26      Como salientou a advogada-geral no n.° 30 das suas conclusões, de nada serviria aos investidores, no quadro da prestação de gestão de carteiras de títulos, decidir a melhor opção de compra, de venda ou de conservação de títulos se essa opção não fosse executada. Do mesmo modo, efetuar, ou não efetuar, consoante o caso, vendas e compras sem conhecimentos especializados e sem análise prévia do mercado também não teria sentido.

27      No âmbito da prestação de gestão de carteiras de títulos em causa no processo principal, esses dois elementos não só são inseparáveis mas, além disso, devem ser colocados no mesmo plano. Com efeito, ambos são indispensáveis para a realização da prestação global, de modo que não é possível considerar que um constitui a prestação principal e o outro a prestação acessória.

28      Por conseguinte, há que considerar que os referidos elementos estão tão estreitamente ligados que formam, objetivamente, uma única prestação económica cuja decomposição teria natureza artificial.

29      Tendo em conta o exposto, há que responder à segunda questão que uma prestação de gestão de carteiras de títulos, como a que está em causa no processo principal, concretamente, uma atividade remunerada que consiste, para um sujeito passivo, em tomar decisões autónomas de compra e de venda de valores mobiliários e em executar essas decisões através da compra e da venda de valores mobiliários, é composta por dois elementos que estão tão estreitamente ligados que formam, objetivamente, uma única prestação económica.

 Quanto à primeira questão

30      Com a primeira questão, que há que examinar em segundo lugar, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, no essencial, se o artigo 135.°, n.° 1, alíneas f) ou g), da Diretiva 2006/112 deve ser interpretado no sentido de que a gestão de carteiras de títulos, como a que está em causa no processo principal, está isenta de IVA ao abrigo dessa disposição.

31      No que diz respeito à isenção prevista no artigo 135.°, n.° 1, alínea g), da Diretiva 2006/112, há que declarar que o conceito de gestão de fundos comuns de investimento não é definido na Diretiva 2006/112. O Tribunal de Justiça, contudo, precisou que as operações a que esta isenção se refere são as que são específicas da atividade dos organismos de investimento coletivo (acórdão de 4 de maio de 2006, Abbey National, C-169/04, Colet., p. I-4027, n.° 63).

32      A este respeito, decorre do artigo 1.°, n.° 2, da Diretiva 85/611/CEE do Conselho, de 20 de dezembro de 1985, que coordena as disposições legislativas, regulamentares e administrativas respeitantes a alguns organismos de investimento coletivo em valores mobiliários (OICVM) (JO L 375, p. 3; EE 06 F3 p. 38), conforme alterada pela Diretiva 2001/108/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 21 de janeiro de 2002 (JO L 41, p. 35), que se trata de organismos cujo objetivo exclusivo é o investimento coletivo, em valores mobiliários e/ou noutros ativos financeiros líquidos, dos capitais obtidos junto do público, cujo funcionamento está sujeito ao princípio da repartição dos riscos, e cujas participações são, a pedido dos portadores, compradas ou reembolsadas direta ou indiretamente, a cargo dos ativos desse organismo.

33      Concretamente, como salientou a advogada-geral nos n.os 14 e 15 das suas conclusões, trata-se de fundos comuns em que numerosos investimentos são agrupados e repartidos numa série de valores mobiliários que podem ser eficazmente geridos a fim de otimizar os resultados, e em que os investimentos individuais podem ser relativamente modestos. Estes fundos gerem os seus investimentos em nome próprio e por própria conta, enquanto cada cliente investidor detém uma participação no fundo, mas não os investimentos do fundo em si mesmos.

34      Pelo contrário, as prestações como as efetuadas pela Deutsche Bank no processo principal dizem geralmente respeito a ativos de uma só pessoa, cujo valor total deve ser relativamente elevado para que a sua gestão seja rentável. O gerente da carteira de títulos compra e vende produtos de investimento em nome e por conta do cliente investidor, que mantém a propriedade dos diferentes valores mobiliários individuais durante toda a vigência do contrato e depois de este chegar ao seu termo.

35      Por conseguinte, a atividade de gestão de carteiras de títulos efetuada pela Deutsche Bank, em causa no processo principal, não corresponde ao conceito de «gestão de fundos comuns de investimento» na aceção do artigo 135.°, n.° 1, alínea g), da Diretiva 2006/112.

36      Quanto ao alcance do artigo 135.°, n.° 1, alínea f), desta diretiva, o Tribunal de Justiça declarou que as operações que envolvem ações e outros títulos são operações realizadas no mercado dos valores mobiliários e que o comércio de títulos inclui atos que alteram a situação jurídica e financeira entre as partes (v., neste sentido, acórdãos de 5 de junho de 1997, SDC, C-2/95, Colet., p. I-3017, n.os 72 e 73, e de 5 de julho de 2012, DTZ Zadelhoff, C-259/11, n.° 22).

37      A expressão «operações relativas a títulos» na aceção desta mesma disposição visa, assim, operações suscetíveis de criar, modificar ou extinguir os direitos e as obrigações das partes sobre os títulos (v., designadamente, acórdãos de 13 de dezembro de 2001, CSC Financial Services, C-235/00, Colet., p. I-10237, n.° 33, e DTZ Zadelhoff, já referido, n.° 23).

38      Como referido no n.° 23 do presente acórdão, a prestação de gestão de carteiras de títulos em causa no processo principal é composta essencialmente por dois elementos, concretamente, por um lado, uma prestação de análise e de supervisão do património do cliente investidor e, por outro, uma prestação de compra e de venda de títulos propriamente dita.

39      Embora as prestações de compra e de venda de títulos sejam suscetíveis de estar abrangidas pelo âmbito de aplicação do artigo 135.°, n.° 1, alínea f), da Diretiva 2006/112, em contrapartida, o mesmo não sucede com as prestações de análise e de supervisão do património, já que estas últimas prestações não pressupõem necessariamente a realização de operações suscetíveis de criar, de modificar ou de extinguir os direitos e as obrigações das partes sobre títulos.

40      A Deutsche Bank e a Comissão Europeia consideram que a essência da prestação de gestão de carteiras de títulos em causa no processo principal reside na operação ativa de compra e de venda de valores mobiliários, e, por essa razão, a referida prestação deve ser isenta de IVA em conformidade com o artigo 135.°, n.° 1, alínea f), da Diretiva 2006/112. Por seu turno, o Finanzamt, bem como os Governos alemão, neerlandês e do Reino Unido, consideram que se trata sobretudo de uma prestação de análise e de controlo, que não é suscetível de beneficiar da isenção prevista nesta disposição.

41      No entanto, decorre do n.° 27 do presente acórdão que não é possível considerar que os elementos que integram essa prestação constituem, um, uma prestação principal e, outro, uma prestação acessória. Com efeito, esses elementos devem ser colocados no mesmo plano.

42      A este respeito, é jurisprudência assente que os termos utilizados para designar as isenções previstas no artigo 135.°, n.° 1, da Diretiva 2006/112 devem ser interpretados estritamente, uma vez que essas isenções constituem derrogações ao princípio geral de que o IVA é cobrado sobre cada prestação de serviços efetuada a título oneroso por um sujeito passivo (v., designadamente, acórdãos de 20 de novembro de 2003, Taksatorringen, C-8/01, Colet., p. I-13711, n.° 36, e DTZ Zadelhoff, já referido, n.° 20).

43      Assim, devido ao facto de que a referida prestação só pode ser tomada em conta, para efeitos do IVA, no seu conjunto, a mesma não é suscetível de ser abrangida pelo artigo 135.°, n.° 1, alínea f), da Diretiva 2006/112.

44      Esta interpretação é corroborada pela economia da Diretiva 2006/112. Com efeito, como alegam os Governos alemão e neerlandês, a gestão de «fundos comuns de investimento» pelas sociedades de gestão especiais, isenta por força do artigo 135.°, n.° 1, alínea g), da Diretiva 2006/112, refere-se a uma forma de gestão de património de valores mobiliários. Se essa forma de gestão de património constituído por valores mobiliários estivesse abrangida pela isenção das operações relativas aos títulos, prevista no artigo 135.°, n.° 1, alínea f), desta mesma diretiva, não teria sido necessário estabelecer uma isenção a esse respeito no artigo 135.°, n.° 1, alínea g), da referida diretiva.

45      Por último, importa referir que o princípio da neutralidade fiscal não põe em causa esta conclusão. Como assinalou a advogada-geral no n.° 60 das suas conclusões, este princípio não permite alargar o âmbito de aplicação de uma isenção não existindo uma disposição inequívoca. Com efeito, o referido princípio não é uma norma de direito primário que possa determinar a validade de uma isenção, mas um princípio de interpretação que deve ser aplicado paralelamente com o princípio segundo o qual as isenções devem ser interpretadas de forma estrita.

46      Tendo em conta o exposto, há que responder à primeira questão que o artigo 135.°, n.° 1, alíneas f) ou g), da Diretiva 2006/112 deve ser interpretado no sentido de que a gestão de carteiras de títulos, como a que está em causa no processo principal, não está isenta de IVA em conformidade com esta disposição.

 Quanto à terceira questão

47      Com a terceira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta se o artigo 56.°, n.° 1, alínea e), da Diretiva 2006/112 deve ser interpretado no sentido de que só se aplica às prestações enumeradas no artigo 135.°, n.° 1, alíneas a) a g), da referida diretiva ou se abrange também a prestação de gestão de carteiras de títulos, mesmo que essa operação não figure nesta última disposição.

48      O artigo 56.°, n.° 1, alínea e), da Diretiva 2006/112 dispunha que, no que diz respeito às operações bancárias, financeiras e de seguros, incluindo as de resseguro, com exceção do aluguer de cofres-fortes, o lugar das prestações desses serviços, efetuadas a destinatários estabelecidos fora da Comunidade ou a sujeitos passivos estabelecidos na Comunidade, mas fora do país do prestador, é o lugar onde o destinatário tem a sede da sua atividade económica ou dispõe de um estabelecimento estável para o qual foi prestado o serviço ou, na falta de sede ou de estabelecimento estável, o lugar onde tem domicílio ou residência habitual.

49      Em conformidade com a sua letra, esta disposição tinha por objetivo determinar o lugar de realização, para efeitos do IVA, de operações bancárias, financeiras e de seguros, incluindo as de resseguro. A este respeito, a referida disposição não continha nenhuma referência às prestações enumeradas no artigo 135.°, n.° 1, alíneas a) a g). Em contrapartida, previa uma única exceção, a saber, a do aluguer de cofres-fortes.

50      A Deutsche Bank, o Finanzamt, os Governos neerlandês e do Reino Unido assim como a Comissão consideram que o âmbito de aplicação do artigo 56.°, n.° 1, alínea e), da Diretiva 2006/112 não se pode limitar ao do artigo 135.°, n.° 1, alíneas a) a g), desta mesma diretiva.

51      O Governo alemão, remetendo para os n.os 31 e 32 do acórdão de 22 de outubro de 2009, Swiss Re Germany Holding (C-242/08, Colet., p. I-10099), sustenta a tese inversa. Segundo esse governo, o Tribunal de Justiça considerou, no referido acórdão, que o bom funcionamento e a interpretação uniforme do sistema comum do IVA implicam que os conceitos de «operações de seguros» e de «resseguro», que figuram nas disposições da Sexta Diretiva 77/388 que correspondem aos artigos 56.°, n.° 1, alínea e), e 135.°, n.° 1, alínea a), da Diretiva 2006/112, não sejam definidos de modo diferente consoante sejam utilizados numa ou noutra dessas disposições. Este raciocínio deve ser aplicado por analogia às «operações financeiras».

52      No entanto, como salientou a advogada-geral no n.° 69 das suas conclusões, a fundamentação do acórdão Swiss Re Germany Holding, já referido, está ligada ao facto de os artigos 56.°, n.° 1, alínea e), e 135.°, n.° 1, alínea a), da Diretiva 2006/112 utilizarem termos substancialmente idênticos no que diz respeito aos seguros, concretamente, um, «as operações de seguros e incluindo as de resseguro» e, outro, «as operações de seguros e de resseguro».

53      Em contrapartida, não existe um vínculo semelhante entre as operações «bancárias» e as operações «financeiras» mencionadas no artigo 56.°, n.° 1, alínea e), desta diretiva e qualquer das operações de entre as enumeradas no artigo 135.°, n.° 1, alíneas b) a g), da mesma. Nenhuma destas últimas disposições utilizava os termos «bancárias» ou «financeiras». As operações que aí estavam enumeradas eram de natureza financeira e muitas delas podiam ser efetuadas pelos bancos, mas não exclusivamente. Além disso, estavam longe de representar uma lista exaustiva das operações suscetíveis de ser efetuadas por um banco ou ser qualificadas de «financeiras».

54      Na medida em que a gestão de carteiras de títulos efetuada pela Deutsche Bank no litígio no processo principal é uma prestação de natureza financeira e na medida em que o artigo 56.°, n.° 1, alínea e), da Diretiva 2006/112 não pode ser interpretado estritamente (v., neste sentido, acórdãos de 26 de setembro de 1996, Dudda, C-327/94, Colet., p. I-4595, n.° 21, e Levob Verzekering e OV Bank, já referido, n.° 34 e jurisprudência referida), há que considerar que esta atividade, como operação financeira, é abrangida pelo âmbito de aplicação do artigo 56.°, n.° 1, alínea e), da Diretiva 2006/112.

55      Atendendo ao exposto, há que responder à terceira questão que o artigo 56.°, n.° 1, alínea e), da Diretiva 2006/112 deve ser interpretado no sentido de que não só é aplicável às prestações enumeradas no artigo 135.°, n.° 1, alíneas a) a g), da referida diretiva mas também às prestações de gestão de carteiras de títulos.

 Quanto às despesas

56      Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Segunda Secção) declara:

1)      Uma prestação de gestão de património constituído por valores mobiliários, como a que está em causa no processo principal, concretamente, uma atividade remunerada que consiste, para um sujeito passivo, em tomar decisões autónomas de compra e de venda de valores mobiliários e em executar essas decisões através da compra e da venda de valores mobiliários, é composta por dois elementos que estão tão estreitamente ligados que formam, objetivamente, uma única prestação económica.

2)      O artigo 135.°, n.° 1, alíneas f) ou g), da Diretiva 2006/112/CE do Conselho, de 28 de novembro de 2006, relativa ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado, deve ser interpretado no sentido de que a gestão de património constituído por valores mobiliários, como a que está em causa no processo principal, não está isenta de imposto sobre o valor acrescentado em conformidade com esta disposição.

3)      O artigo 56.°, n.° 1, alínea e), da Diretiva 2006/112 deve ser interpretado no sentido de que não só é aplicável às prestações enumeradas no artigo 135.°, n.° 1, alíneas a) a g), da referida diretiva mas também às prestações de gestão de património constituído por valores mobiliários.

Assinaturas


* Língua do processo: alemão.