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ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quinta Secção)

11 de abril de 2013 (*)

«Fiscalidade — IVA — Diretiva 2006/112/CE — Artigo 203.° — Princípio da neutralidade fiscal — Reembolso ao fornecedor do imposto pago, no caso de recusa do direito a dedução oposta ao destinatário de uma operação isenta»

No processo C-138/12,

que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial nos termos do artigo 267.° TFUE, apresentado pelo Administrativen sad Varna (Bulgária), por decisão de 6 de março de 2012, entrado no Tribunal de Justiça em 15 de março de 2012, no processo

Rusedespred OOD

contra

Direktor na Direktsia «Obzhalvane i upravlenie na izpalnenieto» — Varna pri Tsentralno upravlenie na Natsionalnata agentsia za prihodite,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quinta Secção),

composto por: T. von Danwitz (relator), presidente de secção, A. Rosas, E. Juhász, D. Šváby e C. Vajda, juízes,

advogado-geral: P. Cruz Villalón,

secretário: A. Calot Escobar,

vistos os autos,

vistas as observações apresentadas:

¾        em representação do Direktor na Direktsia «Obzhalvane i upravlenie na izpalnenieto» — Varna pri Tsentralno upravlenie na Natsionalnata agentsia za prihodite, por S. Zlateva, na qualidade de agente,

¾        em representação do Governo búlgaro, por T. Ivanov e D. Drambozova, na qualidade de agentes,

¾        em representação da Comissão Europeia, por L. Lozano Palacios e D. Roussanov, na qualidade de agentes,

vista a decisão tomada, ouvido o advogado-geral, de julgar a causa sem apresentação de conclusões,

profere o presente

Acórdão

1        O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação da Diretiva 2006/112/CE do Conselho, de 28 de novembro de 2006, relativa ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado (JO L 347, p. 1).

2        Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe a Rusedespred OOD (a seguir «Rusedespred») ao Direktor na Direktsia «Obzhalvane i upravlenie na izpalnenieto» — Varna pri Tsentralno upravlenie na Natsionalnata agentsia za prihodite (diretor da Direção «Impugnação e Gestão de Execuções», da cidade de Varna, da Administração Central da Agência das Receitas Públicas, a seguir «Direktor»), a propósito da recusa deste último em reembolsar à Rusedespred o imposto sobre o valor acrescentado (a seguir «IVA») por ela faturado ao seu cliente, após a Administração Fiscal ter negado a este último o direito de deduzir o referido IVA, com o fundamento de que a prestação em causa não era tributável.

 Quadro jurídico

 Direito da União

3        Nos termos do artigo 2.°, n.° 1, da Diretiva 2006/112:

«Estão sujeitas ao IVA as seguintes operações:

a)      As entregas de bens efetuadas a título oneroso no território de um Estado-Membro por um sujeito passivo agindo nessa qualidade;

[...]

c)      As prestações de serviços efetuadas a título oneroso no território de um Estado-Membro por um sujeito passivo agindo nessa qualidade;

[...]»

4        O artigo 203.° da referida diretiva dispõe:

«O IVA é devido por todas as pessoas que mencionem esse imposto numa fatura.»

 Direito búlgaro

5        O artigo 12.°, n.° 1, da Lei do imposto sobre o valor acrescentado (Zakon za danak varhu dobavenata stoynost, a seguir «ZDDS») prevê:

«Constitui uma operação tributável qualquer entrega de bens ou prestação de serviços na aceção dos artigos 6.° e 9.°, quando seja efetuada por um sujeito passivo nos termos da presente lei e o seu local de execução se encontre em território nacional, bem como qualquer operação sujeita a taxa zero efetuada por um sujeito passivo, com exceção dos casos em que a presente lei disponha em sentido diferente.»

6        Nos termos do artigo 45.°, n.° 3, da ZDDS:

«Constituem [...] operações isentas a entrega de edifícios ou frações de edifícios que não sejam novos, a entrega do respetivo solo, bem como a constituição ou a transmissão de outros direitos reais sobre eles.»

7        De acordo com o artigo 70.°, n.° 5, da ZDDS, não há lugar a dedução do IVA pago a montante, se o mesmo tiver sido faturado indevidamente.

8        Segundo o artigo 85.° desta lei, o imposto é devido por qualquer pessoa que o indique numa fatura e/ou numa nota de débito ou de crédito, na aceção do artigo 112.° da referida lei.

9        O artigo 116.° da mesma lei dispõe:

«(1)      Não são admitidas retificações nem aditamentos às faturas e às respetivas notas de débito ou de crédito. Os documentos emitidos erradamente ou retificados devem ser anulados e devem ser emitidos novos documentos.

[...]

(3)      São igualmente considerados documentos emitidos erradamente as faturas emitidas e as respetivas notas nas quais esteja mencionado o IVA, quando não deveria estar.

(4)      Para efeitos da anulação de documentos emitidos erradamente ou retificados, que tenham sido inscritos nos registos contabilísticos do fornecedor ou do adquirente, deve ser emitido, para cada uma das partes, um documento de anulação contendo as seguintes informações:

1.      o motivo da anulação;

2.      o número e a data do documento anulado;

3.      o número e a data do novo documento emitido;

4.      a assinatura das pessoas que elaboraram o documento de anulação para cada uma das partes.

(5)      Todos os exemplares dos documentos anulados devem ser conservados pelo emitente e tomados em conta pelo fornecedor e pelo adquirente, de acordo com as modalidades previstas nas disposições de execução da presente lei.»

10      O reembolso dos montantes indevidamente pagos a título de impostos rege-se pelo disposto nos artigos 128.° e 129.° do Código do Processo Fiscal e do Processo da Segurança Social (danachno osiguritelen protsesualen kodeks).

 Litígio no processo principal e questões prejudiciais

11      Em 15 de agosto de 2009, a Rusedespred remeteu à Esi Treyd EOOD (a seguir «Esi Trade») uma fatura relativa à venda de um edifício e à sua renovação. Esta fatura indicava os preços desse edifício e da sua renovação, os montantes do imposto de aquisição e das taxas de registo, bem como o montante do IVA.

12      Uma vez que a venda do referido edifício era considerada isenta de IVA, o imposto foi calculado com base nos restantes três elementos da referida fatura, a saber, o custo da renovação, o imposto de aquisição e as taxas de registo.

13      Posteriormente, a Rusedespred incluiu a mesma fatura na sua declaração fiscal relativa ao período em causa, enquanto a Esi Trade exerceu o seu direito a dedução do IVA faturado.

14      Durante o ano de 2010, a Esi Trade foi objeto de um controlo da Administração Fiscal, a qual, através de um aviso retificativo de liquidação de 18 de junho de 2010, recusou a esta sociedade o direito de deduzir o IVA indicado na fatura em causa. Segundo a referida Administração, todas as operações faturadas estavam isentas, pelo que não se justificava a indicação do IVA nessa fatura. O referido aviso tornou-se definitivo em 4 de abril de 2011.

15      Em 9 de maio de 2011, a Rusedespred apresentou um pedido de reembolso do montante indevidamente faturado junto da Administração Fiscal, a qual ordenou um controlo dessa sociedade e, através de um aviso retificativo de liquidação de 2 de junho de 2011, recusou o reembolso requerido, com o fundamento de que não existiam pagamentos indevidos de IVA. Com efeito, de acordo com o artigo 85.° da ZDDS, o IVA indicado na fatura emitida em 15 de agosto de 2009 era exigível à Rusedespred, na sua qualidade de pessoa que mencionou o referido imposto nessa fatura.

16      Uma vez que o Direktor confirmou o referido aviso retificativo de liquidação de 2 de junho de 2011 por decisão de 25 de agosto de 2011, a Rusedespred interpôs recurso para a Administrativen sad Varna, alegando que a Administração Fiscal tinha recusado erradamente o reembolso do IVA indevidamente pago no âmbito da entrega isenta, dado que, anteriormente, tinha negado ao destinatário da fatura o direito de deduzir o referido imposto, através de um aviso de liquidação definitivo.

17      No decorrer do processo principal, o Direktor sustentou que o imposto indicado na fatura controvertida era devido por força do artigo 85.° da ZDDS. No seu entender, caso considerasse ter cometido um erro na emissão da referida fatura, o sujeito passivo poderia corrigir esse erro, em conformidade com o disposto no artigo 116.° da ZDDS.

18      O órgão jurisdicional de reenvio assinala que, no caso vertente, o direito de deduzir o IVA faturado foi negado à Esi Trade através de um aviso de liquidação definitivo. Entende que se deve considerar que o risco de perda de IVA resultante do direito a dedução está «completa e indiscutivelmente» eliminado. Assim, no seu entender, é contrário ao princípio da neutralidade fiscal pedir ao fornecedor em causa que pague o referido imposto com base no artigo 85.° da ZDDS.

19      No que se refere à possibilidade de a Rusedespred corrigir a fatura errada, o órgão jurisdicional de reenvio explica que, contrariamente ao que afirma a Administração Fiscal, não há essa possibilidade no caso vertente. O procedimento de retificação dos documentos erradamente elaborados, regulado no artigo 116.° da ZDDS, requer a anulação do documento fiscal assim elaborado. Ora, tal anulação da fatura não é permitida, dado que a entrega já foi objeto de um controlo fiscal e que a dedução do IVA faturado foi recusada ao destinatário da entrega, através de um aviso retificativo definitivo.

20      Nestas circunstâncias, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta se o sujeito passivo pode basear o seu direito ao reembolso do IVA faturado por erro nos princípios do direito da União que regem o sistema comum do IVA. Por entender que a resolução do litígio no processo principal depende da interpretação do direito da União, o Administrativen sad Varna decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)      Pode um sujeito passivo [exigir], de acordo com o princípio da neutralidade fiscal, […] dentro do prazo de caducidade fixado, o reembolso do IVA erradamente indicado na fatura e não devido, caso, segundo o direito nacional, a operação em relação à qual foi cobrado o imposto esteja isenta, tenha sido eliminado o risco de perda de receitas fiscais e não seja aplicável a regra da retificação de faturas prevista no direito nacional?

2)      [O] sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado e os princípios da neutralidade, da efetividade e da igualdade de tratamento [opõem-se] à recusa de uma autoridade competente para a cobrança de receitas fiscais, baseada numa disposição nacional de transposição do artigo 203.° da Diretiva 2006/112 do Conselho, de 28 de novembro de 2006, relativa ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado, de reembolsar a um sujeito passivo o IVA por si indicado numa fatura, se esse imposto não for devido por se tratar de uma operação isenta de imposto, mas [tenha] sido [faturado por erro], cobrado e pago, caso [já] tenha […] sido recusado ao adquirente ou destinatário dos serviços, através de um aviso [retificativo] de liquidação definitivo, o direito à dedução do imposto pago a montante em relação à mesma operação, com a justificação de que o fornecedor ou prestador de serviços cobrou indevidamente o imposto?

3)      Pode o sujeito passivo invocar diretamente os princípios que regem o sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado, em particular os princípios da neutralidade fiscal e da efetividade, para se opor a uma legislação nacional, ou à sua aplicação pelas autoridades fiscais ou pelos órgãos jurisdicionais, […] que viola os referidos princípios, ou à [falta, contrária aos mesmos princípios,] de uma disposição nacional […]?»

 Quanto às questões prejudiciais

 Quanto à primeira e segunda questões

21      Com a sua primeira e a sua segunda questão, que importa apreciar em conjunto, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, no essencial, se o princípio da neutralidade do IVA, conforme concretizado pela jurisprudência relativa ao artigo 203.° da Diretiva 2006/112, deve ser interpretado no sentido de que se opõe a que, com base numa disposição nacional destinada a transpor o referido artigo, a Administração Fiscal recuse ao fornecedor de uma prestação isenta o reembolso do IVA faturado por erro ao seu cliente, com o fundamento de que esse fornecedor não retificou a fatura errada, quando a mesma Administração recusou, a título definitivo, a esse cliente o direito de deduzir o referido IVA, resultando dessa recusa definitiva a não aplicabilidade do regime de retificação previsto na lei nacional.

22      Para responder a estas questões, importa, em primeiro lugar, assinalar que o artigo 203.° da Diretiva 2006/112 prevê que toda a pessoa que mencione o IVA numa fatura é devedora do imposto mencionado nessa fatura.

23      A este respeito, decorre da jurisprudência do Tribunal de Justiça que essas pessoas são devedoras do IVA mencionado numa fatura, independentemente de qualquer obrigação de o pagar por uma operação sujeita ao IVA (v. acórdãos de 18 de junho de 2009, Stadeco, C-566/07, Colet., p. I-5295, n.° 26 e jurisprudência referida, e de 31 de janeiro de 2013, Stroy trans, C-642/11, n.° 29).

24      Ao estabelecer que o IVA mencionado numa fatura é devido, o artigo 203.° da Diretiva 2006/112 visa eliminar o risco de perda de receitas fiscais que pode decorrer do direito a dedução previsto nos artigos 167.° e seguintes da referida diretiva (v., neste sentido, acórdãos, já referidos, Stadeco, n.° 28, e Stroy trans, n.° 32). A este respeito, resulta da decisão de reenvio que esse risco não se verifica no processo principal, já que a Administração Fiscal negou, a título definitivo, ao destinatário da fatura controvertida o direito a dedução.

25      Em segundo lugar, no que se refere ao reembolso do IVA faturado por erro, importa recordar que a Diretiva 2006/112 não contém nenhuma disposição sobre a regularização, pelo emitente da fatura, do IVA indevidamente faturado e que, nestas condições, cabe em princípio aos Estados-Membros determinar as condições em que o IVA indevidamente faturado pode ser regularizado (v., neste sentido, acórdão de 19 de setembro de 2000, Schmeink & Cofreth e Strobel, C-454/98, Colet., p. I-6973, n.os 48 e 49, e acórdão Stadeco, já referido, n.° 35).

26      O Tribunal de Justiça declarou que, para assegurar a neutralidade do IVA, compete aos Estados-Membros prever, na sua ordem jurídica interna, a possibilidade de regularização de qualquer imposto indevidamente faturado, desde que o emitente da fatura demonstre a sua boa-fé (v. acórdão de 13 de dezembro de 1989, Genius, C-342/87, Colet., p. 4227, n.° 18, e acórdão Stadeco, já referido, n.° 36).

27      No entanto, quando o emitente da fatura tiver eliminado por completo, em tempo útil, o risco de perda de receitas fiscais, o princípio da neutralidade do IVA exige que este imposto indevidamente faturado possa ser corrigido, sem que esta regularização possa ser subordinada pelos Estados-Membros à boa-fé do emitente da referida fatura. Esta regularização não pode depender do poder de apreciação discricionário da Administração Fiscal (v. acórdãos, já referidos, Schmeink & Cofreth e Strobel, n.os 58 e 68, e Stadeco, n.os 37 e 38).

28      Em terceiro lugar, importa recordar que os Estados-Membros têm, é certo, a faculdade de adotar medidas para garantir a cobrança exata do imposto e evitar a fraude (v. acórdão Stadeco, já referido, n.° 39). Em concreto, a condição por força da qual uma fatura errada deve ser retificada antes de se poder obter o reembolso do IVA faturado por erro é, em princípio, suscetível de assegurar a eliminação do risco de perda de receitas fiscais (v. acórdão Stadeco, já referido, n.° 42).

29      Contudo, estas medidas não devem exceder o necessário para alcançar os objetivos assim prosseguidos e, por isso, não podem ser utilizadas de uma forma que ponha em causa a neutralidade do IVA, que constitui um princípio fundamental do sistema comum do IVA instituído pelo direito da União nesta matéria (v. acórdão Stadeco, já referido, n.° 39 e jurisprudência referida).

30      Por consequência, se o reembolso do IVA se tornar impossível ou excessivamente difícil devido às condições em que os pedidos de restituição de impostos podem ser apresentados, o princípio da neutralidade e o princípio da efetividade podem exigir que os Estados-Membros prevejam os instrumentos e as vias processuais necessárias para permitir ao sujeito passivo recuperar o imposto indevidamente faturado (v. acórdão Stadeco, já referido, n.° 40 e jurisprudência referida).

31      No que se refere ao processo principal, decorre da decisão de reenvio que o direito búlgaro prevê, em princípio, a possibilidade de se obter o reembolso do IVA faturado por erro, mas subordina o exercício deste direito à condição da prévia retificação da fatura errada. Como salientado no n.° 28 do presente acórdão, esta exigência é suscetível de assegurar a eliminação do risco de perda de receitas fiscais.

32      Ora, decorre igualmente da decisão de reenvio que, de acordo com o direito nacional aplicável, a Rusedespred já não dispõe da possibilidade de corrigir a fatura controvertida após a Administração Fiscal ter definitivamente recusado ao destinatário da fatura o direito de deduzir o montante de IVA nela mencionado.

33      Além disso, como salienta o órgão jurisdicional de reenvio, uma vez que a Administração Fiscal recusou definitivamente ao destinatário da fatura controvertida o direito a dedução, o risco de prejuízos fiscais associado ao exercício desse direito fica completamente eliminado.

34      Nestas circunstâncias, há que considerar que o facto de subordinar a regularização do IVA mencionado por erro numa fatura à condição de esta ter sido retificada, condição que se tornou impossível de satisfazer, excede o que é necessário para alcançar o objetivo prosseguido pelo artigo 203.° da Diretiva 2006/12, que é eliminar o risco de perda de receitas fiscais.

35      Atendendo ao conjunto das considerações precedentes, há que responder à primeira e segunda questões que o princípio da neutralidade do IVA, conforme concretizado pela jurisprudência relativa ao artigo 203.° da Diretiva 2006/112, deve ser interpretado no sentido de que se opõe a que, com base numa disposição nacional destinada a transpor o referido artigo, a Administração Fiscal recuse ao fornecedor de uma prestação isenta o reembolso do IVA faturado por erro ao seu cliente, com o fundamento de que esse fornecedor não retificou a fatura errada, quando a mesma Administração recusou, a título definitivo, a esse cliente o direito de deduzir o referido IVA, resultando dessa recusa definitiva a não aplicabilidade do regime de retificação previsto na lei nacional.

 Quanto à terceira questão

36      Na sua terceira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, no essencial, se o princípio da neutralidade do IVA, conforme concretizado pela jurisprudência relativa ao artigo 203.° da Diretiva 2006/112, pode ser invocado por um sujeito passivo, a fim de se opor a uma disposição do direito nacional que subordina o reembolso do IVA faturado por erro à retificação da fatura errada, quando o direito de deduzir o referido IVA foi definitivamente recusado, resultando dessa recusa definitiva a não aplicabilidade do regime de retificação previsto na lei nacional.

37      A título preliminar, importa recordar que é jurisprudência assente que, ao aplicarem o direito interno, os órgãos jurisdicionais nacionais estão obrigados a interpretá-lo, na medida do possível, à luz do texto e da finalidade da diretiva em causa, a fim de alcançarem o resultado por ela prosseguido e cumprirem, assim, o disposto no artigo 288.°, terceiro parágrafo, TFUE. Esta obrigação de interpretação conforme do direito nacional é, de facto, inerente ao sistema do Tratado FUE, na medida em que permite aos órgãos jurisdicionais nacionais assegurarem, no âmbito das suas competências, a plena eficácia do direito da União, quando decidem dos litígios que lhes são submetidos (v., nomeadamente, acórdão de 24 de janeiro de 2012, Dominguez, C-282/10, n.° 24 e jurisprudência referida).

38      No que se refere à possibilidade de invocar o princípio da neutralidade do IVA contra um Estado-Membro, importa salientar, desde logo, que este é um princípio fundamental do regime comum do IVA, conforme consagrado, nomeadamente, na Diretiva 2006/112 (v., neste sentido, nomeadamente, acórdão Stadeco, já referido, n.° 39 e jurisprudência referida).

39      Em seguida, como resulta do n.° 35 do presente acórdão, o princípio da neutralidade do IVA, conforme concretizado pela jurisprudência relativa ao artigo 203.° da Diretiva 2006/112, deve ser interpretado no sentido de que se opõe a que a Administração Fiscal recuse ao fornecedor de uma prestação isenta o reembolso do IVA faturado por erro ao seu cliente, com o fundamento de que esse fornecedor não retificou a fatura errada, quando a mesma Administração recusou, a título definitivo, a esse cliente o direito de deduzir o referido IVA, resultando dessa recusa definitiva a não aplicabilidade do regime de retificação previsto na lei nacional.

40      Segundo a jurisprudência, o princípio da neutralidade do IVA pode, sendo caso disso, ser invocado por um sujeito passivo contra uma disposição nacional, ou a aplicação da mesma, que viole este princípio (v., neste sentido, acórdão de 10 de abril de 2008, Marks & Spencer, C-309/06, Colet., p. I-2283, n.° 34). Em circunstâncias como as que decorrem do n.° 35 do presente acórdão, o princípio da neutralidade do IVA, conforme concretizado pela jurisprudência relativa ao artigo 203.° da Diretiva 2006/112, que impõe ao Estado-Membro em causa uma obrigação incondicional e suficientemente precisa, pode ser invocado contra uma disposição nacional que o viole.

41      Atendendo ao que precede, importa responder à terceira questão que o princípio da neutralidade do IVA, conforme concretizado pela jurisprudência relativa ao artigo 203.° da Diretiva 2006/112, pode ser invocado por um sujeito passivo, a fim de se opor a uma disposição do direito nacional que subordina o reembolso do IVA faturado por erro à retificação da fatura errada, quando o direito de deduzir o referido IVA foi definitivamente recusado, resultando dessa recusa definitiva a não aplicabilidade do regime de retificação previsto na lei nacional.

 Quanto às despesas

42      Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Quinta Secção) declara:

1)      O princípio da neutralidade do imposto sobre o valor acrescentado, conforme concretizado pela jurisprudência relativa ao artigo 203.° da Diretiva 2006/112/CE do Conselho, de 28 de novembro de 2006, relativa ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado, deve ser interpretado no sentido de que se opõe a que, com base numa disposição nacional destinada a transpor o referido artigo, a Administração Fiscal recuse ao fornecedor de uma prestação isenta o reembolso do imposto sobre o valor acrescentado faturado por erro ao seu cliente, com o fundamento de que esse fornecedor não retificou a fatura errada, quando a mesma Administração recusou, a título definitivo, a esse cliente o direito de deduzir o referido imposto sobre o valor acrescentado, resultando dessa recusa definitiva a não aplicabilidade do regime de retificação previsto na lei nacional.

2)      O princípio da neutralidade do imposto sobre o valor acrescentado, conforme concretizado pela jurisprudência relativa ao artigo 203.° da Diretiva 2006/112, pode ser invocado por um sujeito passivo, a fim de se opor a uma disposição do direito nacional que subordina o reembolso do imposto sobre o valor acrescentado faturado por erro à retificação da fatura errada, quando o direito de deduzir o referido imposto sobre o valor acrescentado foi definitivamente recusado, resultando dessa recusa definitiva a não aplicabilidade do regime de retificação previsto na lei nacional.

Assinaturas


* Língua do processo: búlgaro.