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Edição provisória

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Segunda Secção)

7 de abril de 2022 (*)

«Reenvio prejudicial – Sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado (IVA) – Diretiva 2006/112/CE – Artigo 132.º, n.º 1, alínea b) – Isenção a favor de certas atividades de interesse geral – Isenção da hospitalização e dos cuidados médicos – Estabelecimento hospitalar privado – Estabelecimento devidamente reconhecido – Condições sociais análogas»

No processo C-228/20,

que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial apresentado, nos termos do artigo 267.° TFUE, pelo Niedersächsisches Finanzgericht (Tribunal das Finanças do Land da Baixa Saxónia, Alemanha), por Decisão de 2 de março de 2020, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 2 de junho de 2020, no processo

I GmbH

contra

Finanzamt H,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Segunda Secção),

composto por: A. Arabadjiev, presidente da Primeira Secção, exercendo funções de presidente da Segunda Secção, I. Ziemele (relatora), T. von Danwitz, P. G. Xuereb e A. Kumin, juízes,

advogado-geral: G. Hogan,

secretário: A. Calot Escobar,

vistos os autos,

vistas as observações apresentadas:

–        em representação de I GmbH, por W. Franz, Rechtsanwalt,

–        em representação de Finanzamt H, por K. Hintzelmann, na qualidade de agente,

–        em representação do Governo alemão, por J. Möller e S. Heimerl, na qualidade de agentes,

–        em representação da Comissão Europeia, por J. Jokubauskaitė e L. Mantl, na qualidade de agentes,

ouvidas as conclusões do advogado-geral na audiência de 23 de setembro de 2021,

profere o presente

Acórdão

1        O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação do artigo 132.o, n.o 1, alínea g), da Diretiva 2006/112/CE do Conselho, de 28 de novembro de 2006, relativa ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado (JO 2006, L 347, p. 1, a seguir «Diretiva IVA»).

2        Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe I GmbH auf Finanzamt H (Repartição de Finanças de H, Alemanha) a respeito da isenção do imposto sobre o valor acrescentado (IVA) das prestações hospitalares fornecidas por I durante os exercícios fiscais de 2009 a 2012.

 Quadro jurídico

 Direito da União

3        O artigo 131.° da Diretiva IVA constitui o artigo único que figura no capítulo 1 do título IX desta diretiva, intitulados respetivamente «Disposições gerais» e «Isenções». Este artigo tem a seguinte redação:

«As isenções previstas nos Capítulos 2 a 9 aplicam-se sem prejuízo de outras disposições comunitárias e nas condições que os Estados-Membros fixam a fim de assegurar a aplicação correta e simples das referidas isenções e de evitar qualquer fraude, evasão ou abuso eventuais.»

4        O artigo 132.º, n.º 1, da Diretiva IVA, que figura no capítulo 2, intitulado «Isenções em benefício de certas atividades de interesse geral» do referido título IX desta diretiva, prevê:

«Os Estados-Membros isentam as operações seguintes:

[...]

b)      A hospitalização e a assistência médica, e bem assim as operações com elas estreitamente relacionadas, asseguradas por organismos de direito público ou, em condições sociais análogas às que vigoram para estes últimos, por estabelecimentos hospitalares, centros de assistência médica e de diagnóstico e outros estabelecimentos da mesma natureza devidamente reconhecidos;

[...]»

5        O artigo 133.° da referida diretiva prevê:

«Os Estados-Membros podem fazer depender, caso a caso, a concessão de qualquer das isenções previstas nas alíneas b), g), h), i), l), m) e n) do n.° 1 do artigo 132.° a organismos que não sejam de direito público da observância de uma ou mais das seguintes condições:

a)      Os organismos em causa não devem ter como objetivo a obtenção sistemática de lucro, não devendo os eventuais lucros ser em caso algum distribuídos, mas sim afetados à manutenção ou à melhoria das prestações fornecidas;

b)       Esses organismos devem ser geridos e administrados essencialmente a título gratuito por pessoas que não tenham, por si mesmas ou por interposta pessoa, qualquer interesse direto ou indireto nos resultados da exploração;

c)      Esses organismos devem praticar preços homologados pelas autoridades públicas ou que não excedam tais preços ou, no que diz respeito às atividades não suscetíveis de homologação de preços, inferiores aos exigidos para atividades análogas por empresas comerciais sujeitas ao IVA;

d)      As isenções não podem ser suscetíveis de provocar distorções de concorrência em detrimento de empresas comerciais sujeitas ao IVA.

[...]»

6        O artigo 134.o da Diretiva IVA prevê:

«As entregas de bens e as prestações de serviços ficam excluídas do benefício da isenção prevista nas alíneas b), g), h), i), l), m) e n) do n.o 1 do artigo 132.o, nos casos seguintes:

a)      Quando não forem indispensáveis à realização de operações isentas;

b)      Quando forem, no essencial, destinadas a proporcionar ao organismo receitas suplementares mediante a realização de operações efetuadas em concorrência direta com as empresas comerciais sujeitas ao IVA.»

 Direito alemão

7        Nos termos do § 4, n.º 14, da Umsatzsteuergesetz (Lei sobre o imposto sobre o volume de negócios), de 21 de fevereiro de 2005 (BGBl. 2005 I, p. 386), na sua versão aplicável ao litígio no processo principal (a seguir «UStG»), estão isentas do IVA:

«[...]

b)      a hospitalização e os cuidados médicos, incluindo diagnóstico, exames médicos, a prevenção, a reeducação, os cuidados obstétricos e os cuidados paliativos, bem como as operações com estes estreitamente relacionadas, assegurados por organismos de direito público. As prestações referidas na primeira frase estão igualmente isentas quando são fornecidas por

aa)      estabelecimentos hospitalares autorizados na aceção do § 108 do [livro V do Sozialgesetzbuch (Código Social)]

[...]

cc)      organismos que estejam associados aos cuidados pelos organismos do regime de seguro de acidentes legal, em conformidade com o § 34 do [livro VII do Código Social].»

8        O §108, intitulado «Estabelecimentos hospitalares autorizados», do livro V do Código da Segurança Social (a seguir «SGB V»), enuncia:

«As caixas de seguro de doença podem autorizar a prestação de cuidados hospitalares apenas pelos seguintes estabelecimentos hospitalares (estabelecimentos hospitalares autorizados):

1.      [Hospitais universitários]

2.      Estabelecimentos hospitalares integrados no plano hospitalar de um Land (hospitais do plano), ou

3.      Estabelecimentos hospitalares que celebraram que tenham celebrado uma convenção de prestação de cuidados com as Landesverbände der Krankenkassen (associações das caixas de seguro de doença ao nível do Land) e com as Verbände der Ersatzkassen (associações das caixas de seguro de doença de substituição).»

9        O § 109, epigrafado «Celebração de convenções de prestação de cuidados com estabelecimentos hospitalares», do SGB V, prevê, nos seus n.os 2 e 3:

«[...]

(2)      Não existe direito à celebração de uma convenção de prestação de cuidados tal como visada no § 108, n.° 3, do SGB V. [...]

(3)      Uma convenção de prestação de cuidados como a visada no § 108, n.° 3, do SGB V não pode ser celebrada quando o estabelecimento hospitalar

1.      não oferecer a garantia de uma hospitalização eficaz e económica.

2.      [...] [não cumprir certos critérios de qualidade] ou

3.      não for necessária para uma hospitalização adaptada às necessidades dos segurados.

[…]»

10      O § 1, epigrafado «Princípio», da Gesetz zur wirtschaftlichen Sicherung der Krankenhäuser und zur Regelung der Krankenhauspflegesätze (Krankenhausfinanzierungsgesetz) (Lei sobre o Financiamento dos Estabelecimentos Hospitalares), de 10 de abril de 1991 (BGBl. 1991 I, p. 886) (a seguir «KHG»), prevê:

«(1) O objetivo da presente lei é garantir a segurança económica dos estabelecimentos hospitalares a fim de assegurar à população cuidados de elevada qualidade, centrados no paciente e nas necessidades, graças a estabelecimentos hospitalares de elevada qualidade, independentes no plano económico, e contribuir para uma tarifação dos cuidados, razoável no plano social.»

11      O artigo § 6 do KHG, epigrafado «Plano hospitalar e programas de investimento», dispõe, no seu n.º 1:

«A fim de alcançar os objetivos visados no § 1, os Länder elaboram planos hospitalares e programas de investimento; os custos subsequentes, em especial, os efeitos na tarificação dos cuidados, devem ser tidos em conta.»

 Litígio no processo principal e questões prejudiciais

12      A recorrente no processo principal é uma sociedade cujo objeto é a planificação, a criação e a exploração de um estabelecimento hospitalar no qual todos os domínios da neurologia estão representados.

13      A recorrente no processo principal fornece prestações hospitalares na aceção do direito alemão e a sua exploração é autorizada pelo Estado. No entanto, não está integrada no plano das necessidades hospitalares do Land da Baixa Saxónia e não é, portanto, um estabelecimento abrangido pelo plano hospitalar na aceção do §108, n.º 2, do SGB V. A recorrente no processo principal não é um estabelecimento de cuidados convencionado que não celebrou convenções de prestação de cuidados com as caixas de seguro de doença ou de substituição legais na aceção do § 108, n.º 3, do SGB V.

14      Os pacientes da recorrente no processo principal são constituídos por pacientes privados, que pagam os tratamentos eles próprios e que lhes têm acesso mediante o pagamento de um adiantamento, por pacientes inscritos num regime de seguro de doença privado e/ou que têm direito à Beihilfe (ajuda paga aos funcionários em caso de doença), por pacientes ditos «consulares», para os quais a embaixada de um Estado estrangeiro emite uma confirmação de tomada a cargo das despesas, por pacientes membros das Forças Armadas alemãs, por pacientes tomados a cargo por um organismo de previdência profissional e por pacientes inscritos no regime de seguro de doença legal. Os pacientes inscritos em regimes de seguro de doença privados ou legais eram tratados caso a caso após confirmação da tomada a cargo das despesas pelos serviços da ajuda paga aos funcionários em caso de doença, das caixas de seguro de doença, das caixas de substituição ou dos seguros privados. Quanto aos pacientes consulares, os custos eram tomados a cargo por organismos sociais estrangeiros por intermédio das embaixadas em questão.

15      Inicialmente, a recorrente no processo principal faturava as prestações hospitalares, os cuidados médicos, bem como as operações a estes estreitamente ligadas, com base em pacotes diários de cuidados, como é de hábito para os estabelecimentos hospitalares referidos no § 108 do SGB V, aos quais se juntavam os eventuais suplementos, quando os pacientes estavam hospitalizados em quartos individuais ou duplos. As prestações médicas opcionais eram faturadas separadamente. Posteriormente, a recorrente no processo principal faturou progressivamente as suas diversas prestações com base em pacotes por grupos de casos, segundo um sistema denominado «Diagnosis Related Group» (grupo homogéneo de diagnóstico). Em 2011, 15 a 20 % dos dias de hospitalização foram faturados segundo este sistema.

16      Em 28 de junho de 2012, a demandante no processo principal celebrou uma convenção-quadro na aceção do § 4, n.° 14, alínea b), cc), da UStG, com uma caixa de seguros por acidente, agindo enquanto organismo do regime legal de seguros de acidentes, com efeitos a 1 de julho de 2012,

17      Nas suas declarações fiscais do imposto sobre o volume de negócios relativas aos exercícios de 2009 a 2012, a recorrente no processo principal tratou as prestações hospitalares faturadas com base nos  pacotes fixos de cuidados, bem como as taxas faturadas aos médicos que dispõem de camas num serviço hospitalar como operações isentas do imposto sobre o volume de negócios.

18      No âmbito de um controlo fiscal efetuado pelo Finanzamt für Grossbetriebsprüfung H (Repartição de Finanças encarregada do controlo das grandes empresas de H) a inspetora considerou que a maior parte das prestações da recorrente no processo principal, efetuadas antes de 1 de julho de 2012, não deviam estar isentas de IVA, uma vez que, antes dessa data, esta não era um estabelecimento hospitalar autorizado. Esta posição foi confirmada Repartição de Finanças através de uma Decisão de 6 de setembro de 2017.

19      A recorrente no processo principal considera que estas prestações estão isentas de IVA por força do artigo 132.º, n.º 1, alínea b), da Diretiva IVA. Afirma que explora um estabelecimento hospitalar autorizado e que fornece prestações hospitalares e terapias de uma maneira comparável a um organismo de direito público. A sua atividade reveste um caráter de interesse geral. Com efeito, por um lado, propõe uma gama de prestações comparável à dos estabelecimentos hospitalares públicos ou integrados no plano hospitalar. Por outro lado, fornece as suas prestações a qualquer pessoa, quer esta esteja inscrita num regime de seguro legal ou privado quer não esteja segurada. As despesas relativas às terapias são em grande parte tomadas a cargo por organismos de segurança social, os quais incluem não apenas as caixas de seguro de doença legais, mas igualmente as Forças Armadas, os organismos de previdência profissional, os serviços de concessão da ajuda paga aos funcionários em caso de doença e as embaixadas. Assim, os doentes cujas despesas são tomadas a cargo deste modo por organismos de segurança social representariam respetivamente 33,08 % (2009), 34,31 % (2010), 38,15 % (2011) e 40,30 % (2012) dos dias de hospitalização.

20      O órgão jurisdicional de reenvio indica que a recorrente no processo principal não preenche as condições de isenção previstas no § 4, ponto 14, alínea b), aa), da UStG e que só pode invocar a isenção prevista no § 4, n.º 14, alínea b), cc), da UStG a partir de 1 de julho de 2012, data da entrada em vigor da convenção-quadro celebrada com a caixa de seguro de acidentes.

21      Este órgão jurisdicional salienta que, no que respeita aos estabelecimentos hospitalares que não são organismos de direito público, o § 4, n.º 14, alínea b), aa), da UStG reserva a isenção de IVA a estabelecimentos hospitalares que tenham sido os primeiros a ter sido integrados no plano hospitalar e cujos serviços correspondam a necessidades definidas à luz do direito da segurança social. Em conformidade com o § 108 e com o § 109, n.º 3, ponto 3, do SGB V, as caixas de seguro de doença ou de substituição legais só podem celebrar uma convenção de prestação de cuidados com um estabelecimento hospitalar na condição de que isso seja necessário a uma hospitalização adaptada às necessidades dos segurados. Mesmo quando um estabelecimento hospitalar está integrado num plano hospitalar, os aspetos económicos continuam a ser pertinentes, uma vez que, por força do § 1 KHG, o objetivo desta última lei é contribuir para uma tarifação razoável dos cuidados. Por conseguinte, segundo o órgão jurisdicional de reenvio, nenhum estabelecimento hospitalar suplementar pode ser integrado no plano hospitalar do seu Land nem, consequentemente, celebrar convenções de prestação de cuidados com as caixas do regime legal de seguro de doença quando, nesse Land, existam, para uma dada disciplina médica, camas de hospital disponíveis em número suficiente.

22      Por conseguinte, o órgão jurisdicional de reenvio considera que o regime do imposto sobre o volume de negócios levaria a tratar de maneira diferente prestações análogas. A vantagem concedida a determinados estabelecimentos hospitalares em relação a outros assenta unicamente no facto de esses estabelecimentos hospitalares serem mais antigos e poderem ser os primeiros a ser integrados no plano hospitalar ou a celebrar convenções de prestação de cuidados.

23      Além disso, esse órgão jurisdicional precisa que, na jurisprudência do Bundesfinanzhof (Tribunal Tributário Federal, Alemanha) apereceu uma tendência jurisprudencial que consiste em considerar que o § 4, n.º 14, da UStG não cumpre as exigências fixadas no artigo 132.º, n.º 1, alínea b), da Diretiva IVA pelo facto de a isenção fiscal das prestações oferecidas nos estabelecimentos hospitalares que não são organismos de direito público só ser possível desde que essas prestações respondam a necessidades definidas à luz do direito da segurança social.

24      Para determinar se as prestações de hospitalização oferecidas pela recorrente no processo principal e as operações a elas estreitamente ligadas foram fornecidas em condições sociais análogas às dos organismos de direito público na aceção do artigo 132.º, n.º 1, alínea b), da Diretiva IVA, o órgão jurisdicional de reenvio duvida da pertinência de critérios relativos à gestão, às estruturas de custos e ao desempenho económico do estabelecimento em questão, como estabelecidos pelo Bundesfinanzhof (Tribunal das Finanças Federal). Considera que seria preferível colocar-se do ponto de vista do paciente.

25      Em especial, as condições sociais seriam análogas quando as despesas da maioria dos pacientes são tomadas a cargo por organismos de segurança social. O montante dos preços de custo de um hospital privado não é um critério adequado para determinar se um estabelecimento hospitalar privado propõe as suas prestações em condições sociais análogas às de um estabelecimento hospitalar público, dado que as tarifas propostas por um estabelecimento hospitalar privado especializado são necessariamente mais elevadas do que as de um estabelecimento hospitalar público que dispensa igualmente numerosos tratamentos médicos simples que não necessitam de equipamentos dispendiosos.

26      Nestas condições, o Niedersächsisches Finanzgericht (Tribunal das Finanças do Land da Baixa Saxónia, Alemanha) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as questões prejudiciais seguintes:

«1)      O § 4, n.° 14, alínea b), da [UStG] é compatível com o artigo 132.°, n.° 1, alínea b), da [Diretiva IVA], na medida em que, relativamente aos hospitais que não sejam organismos de direito público, prevê que a isenção do imposto depende da condição de terem sido reconhecidos ao abrigo do § 108 do [SGB V]?

2)      Em caso de resposta negativa à primeira questão: em que circunstâncias a hospitalização assegurada por hospitais de direito privado se realiza “em condições sociais análogas” à hospitalização realizada por organismos de direito público, na aceção do artigo 132.°, n.° 1, alínea b), da Diretiva IVA?»

 Quanto às questões prejudiciais

 Quanto à primeira questão

27      Resulta das indicações fornecidas pelo órgão jurisdicional de reenvio que as disposições de direito alemão pertinentes para a resolução do litígio no processo principal preveem que um estabelecimento hospitalar que não seja um organismo de direito público pode beneficiar da isenção de IVA em conformidade com o § 4, n.º 14, alínea b), aa) da UStG, se este estabelecimento dispuser de uma autorização na aceção do § 108 do SGB V, em razão quer da sua integração no plano hospitalar de um Land quer da celebração de convenções de prestação de cuidados com as caixas de seguro de doença ou de substituição legais.

28      O Governo alemão menciona, porém, um elemento complementar relativo ao direito nacional. Precisa que resulta de uma circular administrativa, aplicável desde 1 de janeiro de 2009, que mesmo os estabelecimentos hospitalares privados não autorizados nos termos do § 108 do SGB V podem beneficiar da isenção de IVA quando as suas prestações correspondam às realizadas por estabelecimentos hospitalares geridos por organismos públicos ou por estabelecimentos hospitalares aprovados na aceção do § 108 do SGB V e os custos dessas prestações sejam assumidos, em grande parte, pelas caixas de seguro de doença ou por outros organismos de segurança social.

29      A este respeito, há que recordar que, no âmbito do processo previsto no artigo 267.º TFUE, o Tribunal de Justiça apenas tem competência para se pronunciar sobre a interpretação ou a validade do direito da União tendo em conta a situação de facto e de direito conforme descrita pelo órgão jurisdicional de reenvio, a fim de fornecer a este último os elementos úteis para a solução do litígio submetido à sua apreciação (Acórdão de 17 de dezembro de 2020, Onofrei,C-218/19, EU:C:2020:1034, n.º 18 e jurisprudência referida).

30      Assim, incumbe ao Tribunal de Justiça responder às questões do órgão jurisdicional nacional tal como foram submetidas e dentro dos limites definidos por este último.

31      Importa, por conseguinte, examinar a primeira questão tendo em conta os elementos de direito descritos pelo órgão jurisdicional de reenvio, que este submete tendo em conta as condições previstas no § 108 do SGB V. Ora, a circular administrativa invocada pelo Governo alemão não pode pôr em causa a pertinência desta questão, tanto mais que este governo não contesta a aplicabilidade das condições assim indicadas pelo órgão jurisdicional de reenvio, mas refere, quando muito, condições alternativas suplementares que não foram mencionadas por esse órgão jurisdicional.

32      Nestas condições, há que considerar que, com a sua primeira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 132.º, n.º 1, alínea b), da Diretiva IVA deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma legislação nacional que prevê que as prestações de cuidados fornecidas por um estabelecimento hospitalar privado estão isentas de IVA se esse estabelecimento estiver autorizado em conformidade com as disposições nacionais relativas ao regime geral de seguro de doença, na sequência da sua integração no plano hospitalar de um Land ou da celebração de convenções de prestação de cuidados com as caixas de seguro de doença ou de substituição legais.

33      Segundo jurisprudência constante, para a interpretação de uma disposição do direito da União, há que ter em conta não só os seus termos mas também o seu contexto e os objetivos prosseguidos pela regulamentação de que esta faz parte [Acórdão de 28 de outubro de 2021, Magistrat der Stadt Wien (Grand Hamster - II) C-477/20, EU:C:2021:881, n.o 20].

34      A este respeito, importa recordar que os termos usados para designar as isenções previstas no artigo 132.° da Diretiva IVA são de interpretação estrita, dado que constituem derrogações ao princípio geral segundo o qual o IVA é cobrado sobre cada prestação de serviços efetuada a título oneroso por um sujeito passivo. Todavia, a interpretação desses termos deve respeitar as exigências do princípio da neutralidade fiscal inerente ao sistema comum de IVA e deve ser conforme com os objetivos prosseguidos pelas referidas isenções. Assim, esta regra da interpretação estrita não significa que os termos utilizados para definir as isenções previstas no referido artigo 132.° devam ser interpretados de maneira a privá-los dos seus efeitos (Acórdão de 15 de abril de 2021, Administration de l’Enregistrement, des Domaines et de la TVA , C-846/19, EU:C:2021:277, n.º 57).

35      Estas regras de interpretação aplicam-se às condições específicas que são exigidas para beneficiar das isenções previstas no artigo 132.º da Diretiva IVA, em especial às que dizem respeito à qualidade ou à identidade do operador económico que efetua prestações abrangidas por uma isenção (Acórdão de 10 de junho de 2010, CopyGene, C-262/08, EU:C:2010:328, n.º 57).

36      Resulta da redação do artigo 132.°, n.° 1, alínea b), da Diretiva IVA prevê que os Estados-Membros isentam a hospitalização e a assistência médica, bem como as operações com elas estreitamente relacionadas, asseguradas por organismos de direito público ou «em condições sociais análogas» às que vigoram para estes últimos, por «estabelecimentos hospitalares, centros de assistência médica e de diagnóstico e outros estabelecimentos da mesma natureza devidamente reconhecidos».

37      Em conformidade com a redação desta disposição, duas condições cumulativas são exigidas para que as prestações de hospitalização, de assistência médica e as operações com elas estreitamente relacionadas, propostas por uma entidade que não seja um organismo de direito público, possam ser isentas de IVA. A primeira condição diz respeito às prestações fornecidas e exige que estas sejam asseguradas em condições sociais análogas às que vigoram para os organismos de direito público (v., neste sentido, Acórdão de 5 de março de 2020, Idealmed III, C-211/18, EU:C:2020:168, n.os 20 e 21).

38      A segunda condição diz respeito à qualidade do estabelecimento que efetua essas prestações e exige que o operador seja um estabelecimento hospitalar, um centro de cuidados médicos e de diagnóstico ou outro estabelecimento da mesma natureza devidamente reconhecido.

39      No caso em apreço, o órgão jurisdicional de reenvio interroga-se sobre a compatibilidade com esta segunda condição das disposições do direito alemão que reservam a isenção de IVA para os estabelecimentos hospitalares autorizados com fundamento nas disposições nacionais relativas ao regime geral de seguro de doença.

40      A este respeito, o Tribunal de Justiça já declarou que cabe, em princípio, ao direito nacional de cada Estado-Membro estabelecer as regras segundo as quais o reconhecimento de um estabelecimento para efeitos da concessão da isenção prevista no artigo 132.º, n.º 1, alínea b), da Diretiva IVA pode ser concedido aos estabelecimentos que a solicitem. Os Estados-Membros dispõem de poder de apreciação a este respeito (v., neste sentido, Acórdão de 10 de junho de 2010, CopyGene, C-262/08, EU:C:2010:328, n.º 63 e jurisprudência referida).

41      Tal reconhecimento não pressupõe um procedimento formal e não deve necessariamente decorrer de disposições nacionais com caráter fiscal (v., neste sentido, Acórdão de 10 de junho de 2010, CopyGene, C-262/08, EU:C:2010:328, n.º 61).

42      Quando um sujeito passivo pede para beneficiar da qualidade de estabelecimento devidamente reconhecido na aceção do artigo 13.°, A, n.° 1, alínea b), da Diretiva IVA, incumbe às autoridades competentes respeitar os limites do poder de apreciação que lhes é atribuído por esta última disposição ao aplicar os princípios de direito da União, em especial, o princípio da igualdade de tratamento, o qual se traduz, em matéria de IVA, no princípio da neutralidade fiscal (v., neste sentido, Acórdão de 10 de junho de 2010, CopyGene, C-262/08, EU:C:2010:328, n.º 64 e jurisprudência referida).

43      É à luz destes princípios que há que determinar os limites do poder de apreciação conferido pela Diretiva IVA a um Estado-Membro e examinar se o artigo 132.º, n.º 1, alínea b), desta diretiva deve ser interpretado no sentido de que o facto de sujeitar um estabelecimento hospitalar privado à condição de ser autorizado em conformidade com as disposições nacionais relativas ao regime geral de seguro de doença, o que implica que o referido estabelecimento hospitalar esteja integrado no plano hospitalar local ou tenha celebrado convenções de prestação de cuidados com as caixas de seguro de doença ou de substituição legais, é abrangido por esses limites.

44      Assim, importa verificar, em primeiro lugar, se a exigência de ser «devidamente reconhecido» se refere a todas as entidades referidas no artigo 132.º, n.º 1, alínea b), da Diretiva IVA, ou apenas aos «outros estabelecimentos da mesma natureza» na aceção desta disposição.

45      A este respeito, importa desde já constatar que, nas versões em língua espanhola, francesa, italiana, portuguesa e romena do artigo 132.º, n.º 1, alínea b), da Diretiva IVA, a expressão «devidamente reconhecidos» é colocada depois da referência aos «outros estabelecimentos da mesma natureza», ao passo que noutras versões linguísticas, designadamente as versões em línguas alemã, inglesa e letã, a expressão «devidamente reconhecidos» está colocada entre os termos «outros» e «estabelecimentos da mesma natureza». Por conseguinte, certas versões linguísticas do artigo 132.º, n.º 1, alínea b), da Diretiva IVA sugerem que só os «outros estabelecimentos da mesma natureza» estão sujeitos à exigência de serem «devidamente reconhecidos», ao passo que outras versões admitem que esta exigência se aplica a todas as categorias de estabelecimentos privados visados por esta disposição.

46      Ora, segundo jurisprudência constante, as disposições do direito da União devem ser interpretadas e aplicadas de modo uniforme à luz das versões redigidas em todas as línguas da União Europeia (Acórdão de 26 de julho de 2017, Mengesteab, C-280/16, EU:C:2017:587, n.° 82 e jurisprudência referida).

47      É igualmente jurisprudência constante que a formulação utilizada numa das versões linguísticas de uma disposição do direito da União não pode servir de base única à interpretação dessa disposição e não lhe pode ser atribuído caráter prioritário em relação às outras versões linguísticas (v., neste sentido, Acórdão de 28 de outubro de 2021, KAHL e Roeper, C-197/20 e C-216/20, EU:C:2021:892, n.º 33 e jurisprudência referida).

48      No caso em apreço, na medida em que, para poderem beneficiar da isenção, os «outros estabelecimentos» devem ter a «mesma natureza» que «os estabelecimentos hospitalares e dos centros de assistência médica e de diagnóstico», a condição do reconhecimento de um estabelecimento deve ser entendida no sentido de que visa todos os estabelecimentos mencionados no artigo 132.º, n.º 1, alínea b), da Diretiva IVA.

49      Tal interpretação é corroborada pelo contexto e o objetivo do artigo 132.º, n.º 1, alínea b), da Diretiva IVA.

50      A este respeito, há que salientar, antes de mais, quanto ao contexto no qual se inscreve a referida disposição, que esta figura no capítulo 2, intitulado «Isenções em benefício de certas atividades de interesse geral», do título IX desta diretiva. Esta isenção visa, assim, os estabelecimentos que prosseguem finalidades de interesse geral.

51      Em seguida, resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça que as prestações médicas efetuadas com o objetivo de proteger, incluindo manter ou restabelecer, a saúde das pessoas podem beneficiar da isenção prevista no artigo 132.º, n.° 1, alíneas b) e c), da Diretiva IVA (v. Acórdão de 21 de março de 2013, PCF Clinic, C-91/12, EU:C:2013:198, n.º 27 e jurisprudência referida).

52      Daqui resulta que, no contexto da isenção enunciada no artigo 132.º, n.º 1, alínea b), da Diretiva IVA, o objetivo das prestações é pertinente para apreciar se essas prestações estão isentas de IVA e se o estabelecimento em questão é abrangido pelo artigo 132.º, n.º 1, alínea b), da Diretiva IVA. Com efeito, esta isenção destina-se a ser aplicada às prestações que tenham por objetivo diagnosticar, tratar ou curar as doenças ou as anomalias de saúde ou proteger, manter ou restabelecer a saúde das pessoas, mas não inclui as prestações que correspondem aos fins puramente cosméticos (Acórdão de 21 de março de 2013, PFC Clinic, C-91/12, EU:C:2013:198, n.os 28 e 29).

53      Por último, importa recordar que o artigo 133.º, primeiro parágrafo, da Diretiva IVA permite aos Estados-Membros subordinar a concessão da isenção prevista no artigo 132.º, n.º 1, alínea b), desta diretiva ao respeito de uma ou de mais das condições que aí são mencionadas. Essas condições referem-se aos objetivos dos referidos organismos, à sua gestão e aos preços praticados por estes, e dizem respeito a todos os organismos privados visados por esta última disposição.

54      Tendo em conta o poder de apreciação de que os Estados-Membros dispõem neste contexto, como este é recordado no n.º 40 do presente acórdão, o Tribunal de Justiça declarou que a existência da faculdade prevista no artigo 133.º, primeiro parágrafo, da Diretiva IVA corrobora a interpretação segundo a qual cabe ao direito nacional de cada Estado-Membro fixar as regras segundo as quais esse reconhecimento pode ser concedido aos estabelecimentos que o solicitem, mesmo que a circunstância de um Estado-Membro não ter exercido essa faculdade não afete a possibilidade de reconhecer um estabelecimento para efeitos da concessão da isenção visada no artigo 132.º, n.º 1, alínea b), da Diretiva IVA (v., neste sentido, Acórdão de 6 de novembro de 2003, Dornier, C-45/01, EU:C:2003:595, n.os 64 a 66).

55      Todavia, sob pena de privar as autoridades nacionais do poder de apreciação que esta disposição lhes confere, o reconhecimento de um estabelecimento na aceção do artigo 132.º, n.º 1, alínea b), da Diretiva IVA não pode ser equiparado à autorização de efetuar certas operações em conformidade com a legislação nacional (v., neste sentido, Acórdão de 10 de junho de 2010, CopyGene, C-262/08, EU:C:2010:328, n.º 75).

56      Daqui resulta que o reconhecimento de um estabelecimento que pode ser isento de IVA ao abrigo do artigo 132.º, n.º 1, alínea b), da Diretiva IVA permite aos Estados-Membros, por um lado, assegurar que só os estabelecimentos que prosseguem as atividades que correspondem às finalidades desta disposição beneficiam de tal isenção e, por outro, sujeitar o benefício da referida isenção ao respeito das condições previstas no artigo 133.º da Diretiva IVA e não pode, por conseguinte, ser limitado apenas aos «outros estabelecimentos» visados pela primeira disposição.

57      Quanto ao objetivo prosseguido pelo artigo 132.º, n.º 1, alínea b), da Diretiva IVA, importa recordar que esta disposição visa, em especial, reduzir o custo dos cuidados de saúde e tornar esses cuidados mais acessíveis aos particulares (Acórdão de 6 de novembro de 2003, Dornier, C-45/01, EU:C:2003:595, n.º 43), o que implica igualmente a acessibilidade aos cuidados de boa qualidade.

58      O objetivo de interesse geral prosseguido por esta disposição confirma a interpretação segundo a qual o poder de apreciação de que os Estados-Membros dispõem, em conformidade com a jurisprudência recordada no n.º 40 do presente acórdão, diz respeito a todos os estabelecimentos mencionados nessa disposição.

59      Tal interpretação é, além disso, conforme com o princípio da neutralidade fiscal, que se opõe nomeadamente, como este é evocado no n.º 42 do presente acórdão, a que operadores que efetuem as mesmas operações sejam tratados de maneira diferente em matéria de cobrança do IVA (Acórdão de 6 de novembro de 2003, Dornier, C-45/01, EU:C:2003:595, n.º 44).

60      Daqui resulta que um Estado-Membro pode, no exercício do seu poder de apreciação, sujeitar um estabelecimento hospitalar privado à condição de ser «devidamente reconhecido» para que as prestações de cuidados fornecidas por este em condições sociais análogas às que vigoram para os organismos de direito público possam ser isentas em conformidade com o artigo 132.º, n.º 1, alínea b), da Diretiva IVA.

61      No que diz respeito, em segundo lugar, aos elementos a ter em conta para efeito de reconhecimento dos estabelecimentos que podem beneficiar da isenção de IVA, na aceção do artigo 132.º, n.º 1, alínea b), da Diretiva IVA, cabe às autoridades nacionais, em conformidade com o direito da União e sob a fiscalização dos órgãos jurisdicionais nacionais, tomar em consideração vários elementos, entre os quais figuram o caráter de interesse geral das atividades do sujeito passivo em questão, o facto de outros sujeitos passivos que tenham as mesmas atividades já beneficiarem de um reconhecimento semelhante, bem como o facto de os custos das prestações em questão serem eventualmente assumidos em grande parte por caixas de doença ou por outros organismos de segurança social (Acórdão de 10 de junho de 2020, CopyGene, C-262/08, EU:C:2010:328, n.º 65 e jurisprudência referida).

62      Além disso, como foi salientado no n.º 42 do presente acórdão, o poder de apreciação admitido pelo artigo 132.º, n.º 1, alínea b), da Diretiva IVA está limitado pelas exigências que resultam do princípio da neutralidade fiscal.

63      Com efeito, no âmbito da aplicação da isenção enunciada no artigo 132.º, n.º 1, alínea b), da Diretiva IVA, o respeito da neutralidade fiscal exige, nomeadamente, que todos os organismos que não sejam de direito público sejam postos em pé de igualdade para efeitos do seu reconhecimento com vista ao fornecimento de prestações semelhantes (v., neste sentido, Acórdão de 8 de junho de 2006, L.u.P., C-106/05, EU:C:2006:380, n.º 50).

64      No caso em apreço, resulta das indicações fornecidas pelo órgão jurisdicional de reenvio que, em direito alemão, a autorização de um estabelecimento hospitalar privado, em conformidade com as disposições nacionais relativas ao regime geral de seguro de doença, implica que esse estabelecimento tenha sido integrado no plano hospitalar de um Land ou celebrou convenções de prestação de cuidados com as caixas de seguro de doença ou de substituição legais.

65      Em especial, em conformidade com as explicações do Governo alemão, os Länder elaboram planos hospitalares a fim de alcançar os objetivos referidos no § 1 da KHG, que consistem em garantir a segurança económica dos estabelecimentos hospitalares a fim de assegurar à população cuidados de elevada qualidade, centrados no paciente e nas suas necessidades, graças a estabelecimentos hospitalares eficazes e de elevada qualidade, independentes no plano económico, e contribuindo para uma tarifação dos cuidados razoáveis no plano social.

66      Esse governo expõe, em substância, que, para celebrar convenções de prestação de cuidados com as caixas de seguro de doença ou de substituição legais, um estabelecimento hospitalar privado deve oferecer a garantia de uma hospitalização eficaz e económica, preencher as exigências de qualidade mais precisamente descritas na lei, e ser necessário para efeitos de uma hospitalização adaptada às necessidades do segurado. Quando vários estabelecimentos hospitalares adequados se candidatam com vista à celebração de um contrato de prestação de cuidados e é necessário fazer uma escolha, a decisão é tomada tendo em conta o interesse público e a diversidade das instituições gestoras dos estabelecimentos hospitalares, depois de ter devidamente avaliado qual dos estabelecimentos hospitalares responde melhor às exigências de uma hospitalização de elevada qualidade, centrada nos pacientes e nas necessidades, com bom desempenho e eficaz.

67      O órgão jurisdicional de reenvio precisa, a este respeito, conforme é mencionado no n.º 21 do presente acórdão, que a aplicação da legislação nacional em causa tem como consequência que a isenção prevista no artigo 132.º, n.º 1, alínea b), da Diretiva IVA só é possível se os serviços fornecidos pelo estabelecimento hospitalar privado em questão satisfizerem necessidades definidas à luz do direito da segurança social. Assim, na prática, um estabelecimento hospitalar privado não teria nenhuma possibilidade de ser integrado no plano hospitalar do Land nem de celebrar convenções de prestação de cuidados com as caixas do regime legal de seguro de doença, uma vez que, nesse Land, suficientemente que já estão disponíveis camas de hospital suficientes para uma disciplina específica.

68      Como salientou o advogado-geral nos n.os 111 e 112 das suas conclusões, decorre dessas indicações fornecidas pelo órgão jurisdicional de reenvio que os organismos do regime de seguro de acidentes legal, as associações de caixas de seguro de doença a nível do Land e as associações de caixas de substituição dispõem de um certo poder de apreciação no que respeita à celebração de uma convenção com um estabelecimento hospitalar e que os Länder não são obrigados a integrar no seu plano hospitalar os estabelecimentos hospitalares não universitários de direito privado que realizam operações em condições sociais análogas às que vigoram para os organismos de direito público.

69      O exercício de tal poder de apreciação em função das necessidades definidas à luz do direito da segurança social pode ter por consequência, em violação do princípio da neutralidade fiscal, que estabelecimentos hospitalares privados análogas sejam tratados de maneira diferente quanto à isenção prevista no artigo 132.º, n.º 1, alínea b), da Diretiva IVA no que respeita às prestações similares, fornecidas em condições sociais análogas às que vigoram para os organismos de direito público.

70      Por conseguinte, há que responder à primeira questão que o artigo 132.º, n.º 1, alínea b), da Diretiva IVA deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma legislação nacional que, ao prever que as prestações de cuidados fornecidas por um estabelecimento hospitalar privado estão isentas de IVA se esse estabelecimento estiver autorizado em conformidade com as disposições nacionais relativas ao regime geral de seguro de doença, na sequência da integração no plano hospitalar de um Land ou da celebração de convenções de prestação de cuidados com as caixas de seguro de doença ou de substituição legais, leva a que os estabelecimentos hospitalares privados análogas que fornecem prestações semelhantes em condições sociais análogas às que vigoram para os organismos de direito público sejam tratados de maneira diferente no que respeita à isenção prevista nessa disposição.

 Quanto à segunda questão

71      Com a sua segunda questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, quais são os elementos que as autoridades competentes de um Estado-Membro podem tomar em consideração para determinar se as prestações de cuidados fornecidas por um estabelecimento hospitalar privado são asseguradas em condições sociais análogas às que vigoram para os organismos de direito público, na aceção do artigo 132.º, n.º 1, alínea b), da Diretiva IVA.

72      O órgão jurisdicional de reenvio procura, em particular, saber se o desempenho do hospital em matéria de pessoal, de instalações e de equipamentos, bem como a eficácia económica da sua gestão, podem ser tidos em conta para esse fim, ou se há que se colocar do ponto de vista do paciente e considerar que as condições sociais são análogas quando as despesas da maioria dos pacientes são assumidas por organismos de segurança social.

73      A este respeito, importa recordar que o artigo 132.º, n.º 1, alínea b), da Diretiva IVA não define precisamente os aspetos das prestações dos cuidados em questão em causa que devem ser comparadas para efeitos de apreciar se estas são asseguradas em condições sociais análogas e, por conseguinte, se a referida disposição é aplicável (v., neste sentido, Acórdão de 5 de março de 2020, Idealmed III, C-211/18, EU:C:2020:168, n.º 24).

74      Nestas condições, o Tribunal considerou que podem ser tidos em conta elementos como o caráter de interesse geral das prestações, o facto de as prestações serem tomadas a cargo pelo regime de segurança social ou fornecidas no quadro de convenções celebradas com autoridades públicas de um Estado-Membro, a preços fixados por essas convenções e cujos custos são assumidos em parte por instituições de segurança social do referido Estado-Membro (v., neste sentido, Acórdãos de 10 de junho de 2010, CopyGene, C-262/08, EU:C:2010:328, n.os 69 e 70, e de 5 de março de 2020, Idealmed III, C-211/18, EU:C:2020:168, n.º 32).

75      No que respeita, em primeiro lugar, ao alcance do conceito de «condições sociais análogas», há que precisar, como salientou o advogado-geral no n.º 89 das suas conclusões, que resulta da própria redação do artigo 132.º, n.º 1, alínea b), da Diretiva IVA que a referida condição se refere às prestações fornecidas pelo estabelecimento em questão.

76      Decorre igualmente da redação desta disposição que, por um lado, as condições em que as prestações são fornecidas num estabelecimento hospitalar devem ser não  idênticas mas análogas àquelas em que as prestações são fornecidas num estabelecimento de direito público e, por outro, essas condições devem revestir caráter social.

77      Em segundo lugar, como salientou o advogado-geral no n.º 86 das suas conclusões, o requisito relativo às «condições sociais análogas» visa evitar que as prestações oferecidas pelos estabelecimentos privados estejam isentas quando os referidos estabelecimentos não estão sujeitos a obrigações que respondem a uma finalidade social análogas às que incumbem aos estabelecimentos de direito público.

78      Em terceiro lugar, como foi recordado no n.º 57 do presente acórdão, o artigo 132.º, n.º 1, alínea b), da Diretiva IVA visa, nomeadamente, reduzir o custo dos cuidados de saúde e tornar esses cuidados mais acessíveis aos particulares, o que implica igualmente a acessibilidade aos cuidados de boa qualidade.

79      Assim, para apreciar se as prestações dos estabelecimentos hospitalares privados são asseguradas em condições sociais análogas às dos estabelecimentos de direito público, caberá, antes de mais, ao órgão jurisdicional de reenvio tomar em consideração as condições, previstas pela legislação aplicável, a que estão sujeitos os estabelecimentos hospitalares de direito público, no que respeita às prestações fornecidas, e que visam alcançar o objetivo de reduzir os custos dos cuidados de saúde e tornar os cuidados de boa qualidade mais acessíveis aos particulares, e são aptos e necessários para esse fim.

80      Em seguida, decorre do objetivo da isenção prevista no artigo 132.º, n.º 1, alínea b), da Diretiva IVA, como é recordado no n.º 78 do presente acórdão, que há que ter em conta os custos das prestações fornecidas pelos estabelecimentos hospitalares privados que ficam a cargo dos pacientes.

81      A este respeito, como salienta a Comissão Europeia, a questão de saber se os pacotes fixos diários são calculados de maneira comparável num estabelecimento hospitalar privado e num estabelecimento hospitalar de direito público pode revelar-se pertinente. Do mesmo modo, caberá ao órgão jurisdicional de reenvio examinar se as prestações fornecidas pelos estabelecimentos hospitalares privados são tomadas a cargo pelo regime de segurança social ou ao abrigo de convenções celebradas com autoridades públicas de um Estado-Membro, de modo a que os custos que ficam a cargo dos pacientes sejam de nível comparável aos suportados pelos pacientes de estabelecimentos públicos.

82      Por último, o desempenho do estabelecimento hospitalar privado, em matéria de pessoal, de instalações e de equipamentos, bem como a eficácia económica da sua gestão, podem ser tomados em consideração, uma vez que os estabelecimentos hospitalares de direito público estão sujeitos a indicadores de gestão comparáveis e que estes últimos contribuem para alcançar o objetivo de reduzir os custos dos cuidados de saúde e de tornar cuidados de boa qualidade mais acessíveis aos particulares, o que cabe ao órgão jurisdicional de reenvio verificar.

83      Tendo em conta o que precede, há que responder à segunda questão que o artigo 132.º, n.º 1, alínea b), da Diretiva IVA deve ser interpretado no sentido de que, para determinar se prestações de cuidados fornecidas por um estabelecimento hospitalar privado são asseguradas em condições sociais análogas às que vigoram para os organismos de direito público, as autoridades competentes de um Estado-Membro podem tomar em consideração, quando visam alcançar o objetivo de reduzir os custos dos cuidados de saúde e de tornar cuidados de boa qualidade mais acessíveis aos particulares, as condições regulamentares aplicáveis às prestações de saúde fornecidas por estabelecimentos hospitalares de direito público, bem como indicadores do desempenho desse estabelecimento hospitalar privado em matéria de pessoal, de instalações e de equipamento bem como da eficácia económica da sua gestão, uma vez que esses indicadores são igualmente aplicáveis aos estabelecimentos hospitalares de direito público. Podem igualmente ser tidas em conta as modalidades de cálculo dos pacotes fixos diários, bem como a tomada a cargo, ao abrigo do regime de segurança social ou de convenções celebradas com autoridades públicas, prestações fornecidas pelo referido estabelecimento hospitalar de direito privado, de modo a que o custo suportado pelo paciente se aproxime do que é suportado, para prestações semelhantes, pelo paciente de um estabelecimento hospitalar de direito público.

 Quanto às despesas

84      Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Segunda Secção) declara:

1)      O artigo 132.º, n.º 1, alínea b), da Diretiva 2006/112/CE do Conselho, de 28 de novembro de 2006, relativa ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado, deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma legislação nacional que, ao prever que as prestações de cuidados fornecidas por um estabelecimento hospitalar privado estão isentas do imposto sobre o valor acrescentado se esse estabelecimento estiver autorizado em conformidade com as disposições nacionais relativas ao regime geral de seguro de doença, na sequência da integração no plano hospitalar de um Land ou da celebração de convenções de prestação de cuidados com as caixas de seguro de doença ou de substituição legais, leva a que os estabelecimentos hospitalares privados análogas que fornecem prestações semelhantes em condições sociais análogas às que vigoram para os organismos de direito público sejam tratados de maneira diferente no que respeita à isenção prevista nessa disposição.

2)      O artigo 132.º, n.º 1, alínea b), da Diretiva 2006/112 deve ser interpretado no sentido de que, para determinar se prestações de cuidados fornecidas por um estabelecimento hospitalar privado são asseguradas em condições sociais análogas às que vigoram para os organismos de direito público, as autoridades competentes de um Estado-Membro podem tomar em consideração, quando visam alcançar o objetivo de reduzir os custos dos cuidados de saúde e de tornar cuidados de boa qualidade mais acessíveis aos particulares, as condições regulamentares aplicáveis às prestações de saúde fornecidas por estabelecimentos hospitalares de direito público, bem como indicadores do desempenho desse estabelecimento hospitalar privado em matéria de pessoal, de instalações e de equipamentos, bem como da eficácia económica da sua gestão, uma vez que esses indicadores são igualmente aplicáveis aos estabelecimentos hospitalares de direito público. Podem igualmente ser tidas em conta as modalidades de cálculo dos pacotes fixos diários, bem como a tomada a cargo, ao abrigo do regime de segurança social ou de convenções celebradas com autoridades públicas, prestações fornecidas pelo referido estabelecimento hospitalar de direito privado, de modo a que o custo suportado pelo paciente se aproxime do que é suportado, para prestações semelhantes, pelo paciente de um estabelecimento hospitalar de direito público.

Assinaturas


*      Língua do processo: alemão.