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Advertência jurídica importante

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61995C0258

Conclusões do advogado-geral Léger apresentadas em 16 de Janeiro de 1997. - Julius Fillibeck Söhne GmbH & Co. KG contra Finanzamt Neustadt. - Pedido de decisão prejudicial: Bundesfinanzhof - Alemanha. - Sexta Directiva IVA - Prestação de serviços efectuada a título oneroso - Noção - Transporte de trabalhadores efectuado pela entidade patronal. - Processo C-258/95.

Colectânea da Jurisprudência 1997 página I-05577


Conclusões do Advogado-Geral


1 O Bundesfinanzhof submeteu à apreciação do Tribunal de Justiça três questões relativas à interpretação de certas disposições da Sexta Directiva IVA (1) (a seguir «directiva»). Trata-se essencialmente de apreciar o tratamento a dar, no que respeita à sujeição a imposto sobre o valor acrescentado, ao transporte colectivo gratuito fornecido por uma entidade patronal aos seus assalariados, desde o seu domicílio até ao seu local de trabalho.

Matéria de facto e tramitação processual

2 Os factos da causa principal tal como são expostos no despacho de reenvio são os que seguem.

3 Julius Fillibeck Söhne GmbH & Co. KG (demandante e recorrente, a seguir «demandante») explora uma empresa de construção civil. No decurso dos anos de 1980 a 1985 a que se referem os factos da causa, garantiu gratuitamente o transporte de alguns dos seus assalariados desde o seu domicílio até aos diversos locais das obras a que os mesmos estavam afectados. Estes transportes efectuavam-se essencialmente em veículos pertencentes à entidade patronal, mas alguns eram confiados por esta última a um dos seus assalariados, que os efectuava com o seu veículo privado. Em ambos os casos, não eram imputadas aos assalariados que usassem esta possibilidade nenhumas despesas especiais nem dedução de salários.

4 Estas prestações de transporte eram oferecidas, nos termos das disposições da «Bundesrahmentarifvertrag für das Baugewerbe» (convenção colectiva de trabalho para o sector da construção civil), sempre que se atingisse uma distancia mínima entre o domicílio e os locais das obras (seis quilómetros).

5 O Finanzamt (demandado e recorrido, a seguir «demandado») considerou a este propósito que se tratava de operações tributáveis na acepção da legislação alemã relativa ao imposto sobre o volume de negócios (2).

6 No seu recurso, a demandante contesta a tese da sujeição a imposto destas prestações de transporte. Argumenta a esse respeito que a jurisprudência do Bundesfinanzhof de 11 de Março de 1988 (3) não é aplicável às circunstâncias do caso vertente e que o transporte controvertido não pode, por isso, ser considerado como uma prestação tributável na acepção das disposições já referidas da UStG 1980. (4)

O demandado e o Finazgericht, no qual o seu recurso não obteve provimento, ignoraram que o transporte controvertido não era uma prestação oferecida aos salariados para as suas necessidades privadas, mas uma prestação que a entidade patronal fornecia essencialmente no interesse da sua empresa e a que estava obrigada, na qualidade de empresa de construção civil, pela convenção colectiva de trabalho para o sector da construção civil.

7 O órgão jurisdicional de reenvio considera que é necessária para o julgamento da causa uma decisão sobre «... questões de tributação das denominadas prestações materiais da entidade patronal aos trabalhadores, caso estes não tenham que efectuar qualquer contraprestação concretamente acordada e determinada» (5). Em consequência, decidiu submeter ao Tribunal de Justiça as questões prejudiciais seguintes:

«1) Preenche o conceito de prestação de serviços `a título oneroso', na acepção do n._ 1 do artigo 2._ da Directiva 77/388/CEE, o transporte efectuado por uma entidade patronal - entendendo-se como contrapartida uma parte a determinar da prestação laboral do trabalhador - quando a entidade patronal, com base numa convenção colectiva de trabalho (e sem contrapartida acordada e calculada em separado), transporta trabalhadores da sua residência para os locais de trabalho, a partir de uma certa distância mínima, e a prestação laboral deva ser efectuada exclusivamente como contrapartida do salário acordado, tal como acontece com os restantes trabalhadores - sem ligação concreta com aquela prestação de transporte?

2) O n._ 2 do artigo 6._ da Directiva 77/388/CEE abrange a utilização de bens afectos à empresa ou a prestação a título não oneroso de serviços, ainda que (como acontece com o transporte a título não oneroso de trabalhadores da habitação para os locais de trabalho e regresso, em veículo da empresa) do ponto de vista da entidade patronal, não sejam prosseguidos fins estranhos à própria empresa, mesmo que se sirva também o uso privado dos trabalhadores, sem que a estes seja exigido o imposto sobre o volume de negócios (que seria devido por receberem uma prestação de transporte a título não oneroso)?

3) Caso a resposta à questão 2. seja afirmativa:

É ainda aplicável o n._ 2 do artigo 6._ da Directiva 77/388/CEE quando a entidade patronal não transporta os trabalhadores em veículos próprios, mas, em vez disso, encarrega um terceiro (no caso vertente, um dos seus trabalhadores) da realização do transporte?»

Quanto à primeira questão

8 O Bundesfinazhof interroga-se antes de mais quanto à questão de saber se e em que medida as prestações de transporte fornecidas neste caso pela entidade patronal aos seus assalariados constituem prestações «a título oneroso» (sendo a contrapartida constituída por uma fracção, que eventualmente restaria avaliar, da prestação de trabalho) na acepção do artigo 2._, n._ 1, da directiva.

9 Nos termos desta disposição:

«Estão sujeitas ao imposto sobre o valor acrescentado:

1. ... as prestações de serviços, efectuadas a título oneroso, no território do país, por um sujeito passivo agindo nessa qualidade» (6).

10 Não se contesta que neste caso a prestação de transporte constitui uma prestação de serviços efectuada por um sujeito passivo na acepção da directiva; só o seu carácter oneroso é que é objecto das interrogações do órgão jurisdicional de reenvio.

11 A questão da determinação do carácter oneroso de uma prestação de serviços é objecto de jurisprudência abundante e a partir de agora assente.

12 Segundo o Tribunal de Justiça, para que a uma prestação de serviços se reconheça este carácter, e seja, por conseguinte, tributável, é necessário que exista um nexo directo entre o serviço prestado e a contrapartida recebida.

13 Este princípio foi elaborado pela primeira vez no acórdão de 5 de Fevereiro de 1981, Coöperatieve Aardappelenbewaarplaats, (7) que dizia então respeito às disposições da denominada «segunda directiva». (8)

14 No acórdão que proferiu em 8 de Março de 1988, Apple and Pear Development Council (9), este Tribunal confirmou essa jurisprudência, desta vez no âmbito da Sexta Directiva IVA, considerando que o organismo em questão, na sua missão de defesa dos interesses comuns dos produtores de maçãs e de peras, ao realizar operações de publicidade colectiva financiadas por uma taxa anual obrigatória, não realizava prestações de serviços a título oneroso, por não existir nexo directo entre o serviço prestado e a contrapartida recebida.

O Tribunal considerou, com efeito, que, embora os produtores individuais beneficiassem de vantagens, estas só indirectamente derivavam das vantagens que revertiam de forma geral para o conjunto do sector e que, além disso, não existia qualquer relação entre o nível das vantagens que os produtores individuais obtinham dos serviços da Apple and Pear Development Council e o montante das taxas obrigatórias que eram obrigados a pagar.

15 Podemos ainda referir com alguma utilidade o acórdão de 3 de Março de 1994, Tolsma (10), no qual o Tribunal de Justiça observou que uma prestação de serviços só é efectuada «a título oneroso» na acepção do artigo 2._, n._ 1, da directiva,

«... se existir entre o prestador e o beneficiário uma relação jurídica durante a qual são transacionadas prestações recíprocas, constituindo a retribuição recebida pelo prestador o contravalor efectivo do serviço fornecido ao beneficiário» (11).

Nessa ocasião, o Tribunal recordou que:

«... o Tribunal de Justiça decidiu já, a propósito do conceito de prestação de serviços efectuada a título oneroso, utilizada pelo artigo 2._, alínea a), da Segunda Directiva, cuja redacção é semelhante à do artigo 2._, n._ 1, da Sexta Directiva, que as operações tributáveis pressupõem, no âmbito do sistema do IVA, a existência de uma transacção entre as partes com a estipulação de um preço ou de um contravalor. Daí o Tribunal de Justiça deduziu que, quando a actividade de um prestador consiste em fornecer exclusivamente prestações sem contrapartida directa, não existe matéria colectável não estando, portanto, estas prestações sujeitas ao IVA (v. acórdão de 1 de Abril de 1982, Hong-Kong Trade Development Council, 89/81, Recueil, p. 1277, n.os 9 e 10)» (12).

Ou ainda:

«Nos acórdãos de 5 de Fevereiro de 1981, Coöperatieve Aardappelenbewaarplaats (154/80, Recueil, p. 445, n._ 12), e de 23 de Novembro de 1988, Naturally Yours Cosmetics (280/87, Colect., p. 6365, n._ 11), o Tribunal de Justiça esclareceu a este respeito que a matéria colectável de uma prestação de serviços é constituída por tudo o que é recebido em contrapartida do serviço prestado e que, deste modo, uma prestação de serviços só é tributável se existir um nexo directo entre o serviço prestado e a contrapartida recebida (v. igualmente acórdão de 8 de Março de 1988, Apple and Pear Developement Council, 102/86, Colect., p. 1443, n.os 11 e 12)» (13).

16 Desta jurisprudência podem deduzir-se os três critérios seguintes que permitem delimitar o conceito de prestação de serviços efectuada «a título oneroso» (14):

- deve existir uma relação directa entre o serviço prestado e o contravalor recebido; (15)

- o contravalor deve poder ser expresso em dinheiro; (16)

- este contravalor deve ser o valor subjectivo que lhe atribuem as partes. (17)

17 Ora, as três condições assim exigidas pela jurisprudência do Tribunal para reconhecer a uma prestação de serviços o carácter oneroso, susceptível de a tornar tributável em sede de imposto sobre o valor acrescentado, não se verificam no caso vertente.

18 Uma simples «fracção, a avaliar, da prestação de trabalho efectuada pelo assalariado», segundo os termos do órgão jurisdicional de reenvio, não pode ser considerada como uma verdadeira contrapartida da prestação de transporte recebida pelo assalariado.

19 Não pode observar-se neste caso qualquer nexo directo entre o serviço prestado e o contravalor recebido.

20 O serviço, que consiste neste caso numa prestação de transporte, é, com efeito, prestado independentemente de qualquer contrapartida recebida. O assalariado, que faz uso do transporte gratuito colectivo colocado à sua disposição pela entidade patronal, não paga qualquer montante nem no seu salário é inscrita como contrapartida qualquer importância que possa representar este serviço. Além disso, não se pode considerar o salário uma contrapartida deste serviço; este só é pago em razão da prestação de trabalho fornecida.

Da mesma forma que no processo Apple and Pear Development Council, já referido, em que todos os produtores de maçãs e de peras pagavam as mesmas taxas ao organismo em questão, sem que houvesse qualquer relação entre a taxa paga e os benefícios realizados, os assalariados são, neste caso, obrigados ao mesmo trabalho e recebem o mesmo salário, quer aproveitem ou não uma vantagem de transporte gratuito: não existe qualquer contrapartida que tenha um nexo directo com o transporte oferecido pela entidade patronal.

A entidade patronal é obrigada a pôr à disposição de cada um dos assalariados uma possibilidade de transporte gratuito em conformidade com as disposições da convenção colectiva de trabalho aplicável, mas estes são livres de utilizar ou não esta prestação.

21 Por isso, não é possível considerar uma fracção da prestação de trabalho do assalariado tomada individualmente como sendo a contrapartida (avaliada) da prestação de transporte.

22 Note-se, além disso, que não foi proposta por qualquer das partes no decurso do processo nenhuma forma de avaliação de um fracção isolada da prestação de trabalho, como constituindo a contrapartida da prestação de transporte.

23 Por consequência, uma vez que não pode delimitar-se qualquer contrapartida que apresente um nexo directo com o serviço prestado, é impossível a fortiori neste caso exprimir o contravalor «em dinheiro», como exige a referida jurisprudência, e reconhecer-lhe um valor «subjectivo» que as partes lhe atribuam.

24 Não podendo reconhecer-se à prestação de transporte gratuito oferecida pela entidade patronal aos seus assalariados o carácter «oneroso» na acepção do artigo 6._, n._ 2, da directiva, a mesma não é abrangida pelo âmbito de aplicação desta disposição e não pode ser tributada em imposto sobre o valor acrescentado nos termos desse artigo.

25 Deve, pois, responder-se pela negativa à primeira questão.

Quanto à segunda questão

26 Em caso de resposta negativa à primeira questão, o órgão jurisdicional de reenvio solicita ao Tribunal que declare se as prestações de transporte controvertidas são abrangidas pelo âmbito de aplicação das operações tributáveis nos termos do artigo 6._, n._ 2, da directiva.

27 Esta disposição está redigida da forma seguinte:

«2. São equiparadas a prestações de serviço efectuadas a título oneroso:

a) A utilização de bens afectos à empresa para uso privado do sujeito passivo ou do seu pessoal ou, em geral, para fins estranhos à própria empresa, sempre que, relativamente a esses bens, tenha havido dedução total ou parcial do imposto sobre o valor acrescentado;

b) As prestações de serviço a título gratuito efectuadas pelo sujeito passivo para seu uso privado ou do seu pessoal ou, em geral, para fins estranhos à própria empresa.

Os Estados-Membros podem derrogar o disposto no presente número, desde que tal derrogação não conduza a distorções de concorrência.»

28 Em conformidade com o artigo 11._, parte A, n._ 1, alínea c), da directiva, a matéria colectável das operações referidas no n._ 2 do artigo 6._ é constituída «... pelo montante das despesas suportadas pelo sujeito passivo na execução da prestação de serviços».

29 A formulação da questão prejudicial parece convidar a fazer uma distinção entre «a utilização de um bem afecto à empresa» [artigo 6._, n._ 2, alínea a)], e as «prestações de serviços a título gratuito» [artigo 6._, n._ 2, alínea b)].

Todavia, esta distinção não nos parece necessária nas circunstâncias do caso vertente. Só os conceitos de «uso privado do sujeito passivo ou do seu pessoal» e de «fins estranhos à própria empresa», comuns às duas variantes, são determinantes.

30 Com efeito, para esquematizar, ou se considera que os transportes controvertidos são efectuados para uso privado do pessoal, para fins estranhos à empresa, ou se considera pelo contrário que estes transportes respondem a necessidades da empresa, caso em que escapam a qualquer tributação nos termos do artigo 6._, n._ 2, da directiva.

31 No decurso deste processo foram defendidas as duas teses.

32 A demandante, antes de mais, sustenta que o transporte dos assalariados serve única e directamente os fins da empresa e se situa, por isso, no âmbito do exercício das relações profissionais e não releva da esfera «privada» dos assalariados. Argumenta a este propósito que, se, em princípio, os transportes relevam do domínio da esfera privada dos empregados, a convenção colectiva por força da qual estes são efectuados neste caso os faz passar para o domínio profissional. Conclui, por conseguinte, pela não aplicação do artigo 6._, n._ 2, neste caso.

33 As outras partes consideram, pelo contrário, que o transporte gratuito dos assalariados satisfaz as suas necessidades privadas e serve, portanto, fins estranhos à empresa; segundo eles, é, por conseguinte, aplicável o artigo 6._, n._ 2.

34 O Governo do Reino Unido e a Comissão são de opinião, todavia, de que se devem tomar em consideração circunstâncias particulares próprias do caso do processo principal, que justificam a não tributação prevista no artigo 6._, n._ 2.

35 Aderimos a esta posição.

36 Parece-nos dificilmente contestável, antes de mais, que o transporte dos assalariados do seu domicílio até ao seu local de trabalho seja uma questão que releva, em princípio, do âmbito da sua vida privada.

37 Com efeito, é o assalariado que escolhe a localização do seu domicílio, eventualmente em consideração do seu local de trabalho, que determina a distancia do percurso de um ao outro e a natureza do meio de transporte que deve escolher para este trajecto. A entidade patronal não intervém de forma alguma nestas considerações, sendo a obrigação do assalariado em relação a ela a de se apresentar no seu local de trabalho à hora acordada. É ao assalariado que compete tomar as suas decisões para se dirigir a esse local, cabendo-lhe a ele próprio a escolha da forma como procede. Por conseguinte, em circunstâncias normais, o transporte do assalariado do seu domicílio para o seu local de trabalho serve um «uso privado do pessoal», efectuado para «fins estranhos à empresa». Que este transporte possa ser organizado pela entidade patronal, que põe à disposição dos assalariados que o desejem a possibilidade de um transporte colectivo gratuito, não altera em nada estas considerações.

38 Por isso, e em princípio, o transporte gratuito dos assalariados assegurado por uma entidade patronal através de um veículo afecto à própria empresa deve ser considerado como tributável em sede de imposto sobre o valor acrescentado, por ser equiparado a uma prestação de serviços efectuada a título oneroso, em conformidade com as disposições do artigo 6._, n._ 2, da directiva.

39 Esta proposição de princípio é conforme com o objectivo prosseguido por essa disposição, que «... pretende evitar a não tributação de um bem afecto à empresa e utilizado para fins privados...» (18).

40 Todavia, pensamos que é necessário admitir, a título de excepção, em virtude de circunstâncias particulares ligadas, no caso vertente, à natureza da actividade da empresa, que o transporte oferecido pela entidade patronal possa ser considerado como assegurado para fins que não são estranhos à empresa.

41 É normal numa empresa de construção civil que os assalariados sejam afectados não de forma definitiva ao local de trabalho previamente acordado com a entidade patronal, mas, em função das necessidades da clientela da empresa, às obras localizadas de forma variável. Esta afectação pode mudar dum dia para o outro, ou mesmo no decurso de um mesmo dia de trabalho. O assalariado deve poder ser mobilizado mediante simples pedido da entidade patronal. Essa é uma particularidade própria dos assalariados do sector da construção civil neste caso em relação aos empregados que são obrigados a efectuar a sua prestação de trabalho no lugar previamente fixado, por exemplo nas instalações da empresa que os emprega. Assim, a distância do trajecto que separa o domicílio do empregado do seu local de trabalho escapa à sua livre escolha e ao seu controlo.

42 Os locais de afectação dos assalariados em questão são a maior parte das vezes dificilmente acessíveis pelos meios tradicionais, porque se trata de obras, que podem estar situadas, por exemplo, em zonas industriais ou fora de qualquer perímetro urbano.

43 Por outro lado, e tendo em consideração que, consoante a sua afectação, as obras sobre as quais devem trabalhar podem encontrar-se afastadas do seu domicílio, os horários de trabalho dos empregados do sector da construção civil podem levar estes últimos a terem de se levantar particularmente cedo de manhã para poderem cobrir em tempo útil a distancia que os separa do seu local de trabalho.

44 Nestas circunstâncias, deixar apenas aos empregados a responsabilidade da escolha do seu meio de transporte do seu domicílio até ao seu local de trabalho pode implicar para a entidade patronal uma parte de risco prejudicial à boa actividade da sua empresa. Pode conceber-se, com efeito, que os outros meios de transporte, mais tradicionais, tais como os transportes colectivos, se mostrem inadaptados ou mesmo não existam nestas circunstâncias.

45 Por isso, a organização pela entidade patronal do transporte dos seus assalariados do respectivo domicílio até aos seus lugares de afectação pode, em circunstâncias particulares, como no caso presente, responder às exigências imperativas do bom funcionamento da actividade da empresa. Embora seja incontestável que os empregados têm uma vantagem derivada da organização assim posta à sua disposição, esta parece acessória em relação às necessidades da empresa, em consideração das quais se procedeu à organização dos transportes colectivos gratuitos.

46 O facto de uma convenção colectiva ter, além disso, previsto expressamente esses transportes, embora não seja determinante, tende, apesar disso, a confirmar que o sector da construção civil releva de uma actividade cujas particularidades devem ser tomadas em conta.

47 Consideramos, por consequência, em resposta à segunda questão, que, embora, em princípio, o transporte dos assalariados do seu domicílio até ao seu local de trabalho através de um veículo que pertence à entidade patronal deva ser considerado como destinado ao uso privado destes assalariados e ser, nesse contexto, tributável nos termos do artigo 6._, n._ 2 da directiva, o mesmo não acontece quando, em razão de circunstâncias particulares, próprias por exemplo da natureza da actividade da empresa, estas prestações de transporte correspondem a fins que não são estranhos à empresa. Nesta última hipótese, encontramo-nos fora do âmbito de aplicação do artigo 6._, n._ 2, e a operação não é tributável.

Quanto à terceira questão

48 Através desta questão, o Bundesfinanzhof pede ao Tribunal de Justiça, na hipótese de ser dada uma resposta afirmativa à segunda questão, que aprecie a incidência do facto de os transportes controvertidos poderem ser confiados a um assalariado da empresa, que os executa com o seu veículo privado.

49 Tendo em consideração a resposta que propomos seja dada à segunda questão, a terceira ficaria, neste caso, sem resposta.

50 Todavia, se as circunstâncias não justificassem que os transportes controvertidos fossem considerados como realizados para fins que não são estranhos à empresa, a terceira questão não deveria, em nossa opinião, ter um tratamento diferente da precedente. Um assalariado a quem a entidade patronal confia o cumprimento de uma actividade, na acepção da directiva, não age de forma independente na acepção do artigo 4._, n._ 1, da directiva; a prestação de transporte assegurada pelo assalariado deve ser considerada como equiparada a uma prestação de transporte efectuada pela entidade patronal que é sujeito passivo, uma vez que é efectuada por conta desta última.

Conclusão

51 Pelas considerações expostas, propomos que o Tribunal responda da forma seguinte às questões apresentadas pelo Bundesfinanzhof:

«1) O artigo 2._, n._ 1, da Sexta Directiva 77/388/CEE do Conselho, de 17 de Maio de 1977, relativa à harmonização das legislações dos Estados-Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios - Sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado: matéria colectável uniforme, deve ser interpretado no sentido de que uma entidade patronal que assegure um transporte dos seus assalariados do respectivo domicílio para o seu local de trabalho, a título gratuito e sem nexo concreto com a prestação de trabalho nem com o salário, não efectua uma prestação de serviços a `título oneroso' na acepção dessa disposição.

2) O artigo 6._, n._ 2, da referida Directiva deve ser interpretado no sentido de que se aplica à hipótese de um transporte gratuito de assalariados pela sua entidade patronal entre o seu domicílio e o seu local de trabalho, na medida em que este satisfaça em princípio o uso privado do pessoal e sirva, por conseguinte, fins estranhos à empresa. Esta disposição não deve, todavia, aplicar-se quando, como no caso dos autos, em razão da particularidade da actividade da empresa, a prestação de transporte não é efectuada para fins estranhos à empresa e satisfaz as necessidades desta.

3) A resposta dada no primeiro parágrafo do número anterior, é igualmente válida quando a entidade patronal não transporta os assalariados nos seus próprios veículos, mas confia essa tarefa a terceiros (e, no caso dos autos, a um dos seus assalariados).»

(1) - Sexta Directiva 77/388/CEE do Conselho, de 17 de Maio de 1977, relativa à harmonização das legislações dos Estados-Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios - Sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado: matéria colectável uniforme (JO L 145, p. 1; EE 09 F1, p. 54).

(2) - § 1, n._ 1, ponto 1, segunda frase, alínea b), da Umsatzteuergesetz de 1980 (lei relativa ao imposto sobre o volume de negócios, a seguir «UStG 1980»).

(3) - V R 30/84 e V R 114/83 (BFHE 153, 155, 162, BStBl II 1988, 643, 651).

(4) - O órgão jurisdicional de reenvio observa (número II.1 do despacho de reenvio) que, através destes acórdãos, o Bundesfinanzhof inverteu o sentido da sua jurisprudência. Enquanto anteriormente se isolava uma fracção fictícia da prestação de trabalho do assalariado como constituindo uma contrapartida da prestação de transporte fornecida pela entidade patronal, este órgão jurisdicional considera a partir de agora que é impossível determinar o valor dessa contrapartida constituída por uma fracção fictícia do trabalho do assalariado.

(5) - Página 8 da tradução portuguesa do despacho de reenvio.

(6) - Sublinhado nosso.

(7) - 154/80, Recueil, p. 445 (n.os 12 e 13).

(8) - Segunda Directiva 67/228/CEE do Conselho, de 11 de Abril de 1967, relativa à harmonização das legislações dos Estados-Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios - estrutura e modalidades de aplicação do sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado (JO 1967, 71, p. 1303; EE 09 F1 p. 6).

(9) - 102/86, Colect., p. 1443.

(10) - C-16/93, Colect. p. I-743.

(11) - N._ 14.

(12) - N._ 12.

(13) - N._ 13.

(14) - V., neste sentido, o n._ 14 das conclusões do advogado-geral C. O. Lenz relativas ao acórdão Tolsma, já referido.

(15) - Acórdãos já referidos, Coöperatieve Aardappelenbewaarplaats (n._ 12), Apple and Pear Development Council (n._ 11), e Naturally Yours Cosmetics (n._ 11).

(16) - Acórdãos já referidos, Coöperatieve Aardappelenbewaarplaats (n._ 13), e Naturally Yours Cosmetics (n._ 16).

(17) - Acórdãos já referidos, Coöperatieve Aardappelenbewaarplaats (n.os 13 e 14), e Naturally Yours Cosmetics (n._ 16).

(18) - Acórdão de 25 de Maio de 1993, Mohsche (C-193/91, Colect. p. I-2615, n._ 8). V. também o acórdão de 27 de Junho de 1989, Kühne (50/88, Colect. p. 1925, n._ 8).