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Advertência jurídica importante

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61996C0172

Conclusões do advogado-geral Lenz apresentadas em 16 de Septembro de 1997. - Commissioners of Customs & Excise contra First National Bank of Chicago. - Pedido de decisão prejudicial: High Court of Justice, Queen's Bench Division - Reino Unido. - Sexta Directiva IVA - Âmbito de aplicação - Operações de câmbio. - Processo C-172/96.

Colectânea da Jurisprudência 1998 página I-04387


Conclusões do Advogado-Geral


A - Introdução

1 No presente processo prejudicial, a High Court of Justice, Queen's Bench Division, submete ao Tribunal de Justiça questões relativas à interpretação da Sexta Directiva 77/388/CEE do Conselho, de 17 de Maio de 1977, relativa à harmonização das legislações dos Estados-Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios - Sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado: matéria colectável uniforme (a seguir «Sexta Directiva IVA») (1). Estas questões surgem a propósito da tributação de operações cambiais ou da possibilidade de a filial londrina do First National Bank of Chicago deduzir os impostos pagos a montante.

I - História do processo

2 Segundo as indicações do órgão jurisdicional de reenvio, o presente processo apresenta-se do seguinte modo: o banco, que está registado para os efeitos do imposto sobre o valor acrescentado e parcialmente isento do IVA, acordou com os Commissioners of Customs and Excise um método especial de isenção parcial. A proporção reembolsável dos impostos pagos a montante que o método acordado concede à parte do banco, a que pertence o departamento encarregado das operações cambiais, é determinada com base no número de operações efectuadas por esse serviço no decurso do período em causa, correspondendo, designadamente, a uma fracção cujo numerador é igual ao número de operações concluídas com os clientes estabelecidos fora da União Europeia, e o denominador ao número total de operações.

3 Na sua declaração fiscal relativa ao período de 1 de Maio de 1994 a 31 de Julho de 1994, que compreendia igualmente a sua regularização anual para o período compreendido entre o mês de Abril de 1993 e o mês de Abril de 1994, o banco teve em conta as operações cambiais concluídas no decurso do período de Abril de 1993 a Julho de 1994. Segundo os seus cálculos, o crédito dos impostos pagos a montante a que tinha direito nesse período prolongado de quinze meses, a título das operações cambiais concluídas com os clientes estabelecidos em países não membros da União Europeia, atingia 251 454,90 UKL.

4 Por decisão de 26 de Setembro de 1994, os Commissioners of Customs and Excise corrigiram o crédito de impostos pagos a montante que o banco exigiu, recusando ter em conta as operações cambiais concluídas com os clientes estabelecidos fora da União Europeia. Segundo a administração, o imposto dedutível total foi, deste modo, reduzido.

5 O banco interpôs um recurso perante o Value Added Tax Tribunal, em que, de comum acordo, os debates foram limitados à questão de saber se essas operações cambiais constituíam entregas de bens ou prestações de serviços na acepção do direito do IVA. O Value Added Tax Tribunal acolheu o recurso do banco, e os Commissioners of Customs and Excise interpuseram um recurso, limitado às questões jurídicas, perante a High Court of Justice. Esta considera importante decidir se as operações cambiais constituem, na acepção da directiva, entregas de bens ou prestações de serviços efectuadas a título oneroso.

II - As questões prejudiciais da High Court of Justice

6 A High Court of Justice apresentou ao Tribunal de Justiça, para decisão a título prejudicial, ao abrigo do artigo 177._ do Tratado CE, as seguintes questões:

«1) Numa correcta interpretação da Directiva 77/388/CEE do Conselho, de 17 de Maio de 1977, relativa à harmonização das legislações dos Estados-Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios (Sexta Directiva IVA), e em relação a operações cambiais tal como definidas pela British Bankers' Association (como indicado no n._ 1 da matéria de facto), constituem essas operações de câmbio entregas de bens ou prestações de serviços a título oneroso?

2) Se se tratar de entregas de bens ou de prestações de serviços a título oneroso, qual é a natureza da contrapartida em relação a tal operação?»

III - As actividades do banco no sector das operações cambiais

7 A British Bankers' Association definiu a noção de operações cambiais do seguinte modo:

«as operações entre as partes relativas à compra por uma parte de um montante acordado noutra divisa, nos termos das quais os dois montantes são pagáveis na mesma data-valor, e no quadro das quais as partes chegaram a acordo (oralmente, por meios electrónicos ou por escrito) quanto às divisas em causa, quanto aos montantes comprados e vendidos, quanto à identidade das partes que reciprocamente compram as divisas em causa e quanto à data-valor».

8 A filial de Londres do First National Bank of Chicago, que faz parte de uma associação bancária nacional de responsabilidade limitada de direito federal dos Estados Unidos da América, exerce numerosas actividades bancárias, entre as quais operações cambiais. À data do despacho de reenvio, empregava cerca de 440 trabalhadores, dos quais 40 trabalhavam no departamento de operações cambiais, com a assistência de membros do pessoal pertencente ao «back office».

9 O banco é um líder de mercado. Está sempre interessado em fornecer e receber as divisas em que se especializou. Entrega e recebe moeda estrangeira em operações que são comummente descritas como as de compra e venda. O banco, como os outros líderes de mercado, fixa os preços a que deseja comerciar como preços «bid» ou «offer» (compra ou venda). O preço de compra do banco é a taxa de câmbio a que o banco deseja comprar uma divisa. Num determinado momento, o banco propõe-se comprar a um determinado preço expresso como taxa de câmbio e, ao mesmo tempo, pede, ou seja, propõe-se vender a mesma divisa, na mesma quantidade, a um preço ligeiramente mais alto, expresso como taxa de câmbio, sendo a diferença entre as duas taxas conhecida como «spread» (margem).

10 Os clientes das actividades de câmbios do banco dividem-se, para fins operacionais, em três categorias. A primeira inclui sociedades que procuram controlar os seus riscos e necessidades em moeda estrangeira através das operações cambiais à vista e a prazo e de cobertura de risco cambial. A segunda categoria abrange gestores de fundos, tais como fundos de pensão. Os clientes deste grupo são tipicamente organizações que gerem o dinheiro doutras pessoas. A terceira categoria inclui outras instituições financeiras.

11 Todas estas três categorias de clientes efectuam essencialmente os mesmos tipos de operações cambiais com documentação confirmativa que inclui informações similares. Estas operações cambiais incluem operações «à vista» e «a termo». 65% das operações realizadas pelo banco são operações à vista; as restantes 35% são operações a termo.

12 Uma operação «à vista» consiste na compra de uma divisa contra a venda de outra divisa, sendo a entrega e a venda concluídas dois dias após o do negócio, que é designado como a data do vencimento ou data-valor. Na sequência do acordo quanto a uma operação à vista, o banco entrega à outra parte na transacção um documento confirmativo dos termos da transacção e de como ela vai ser efectivada. Esta confirmação incluirá expressamente:

- o nome e endereço do cliente;

- a data da confirmação que será normalmente a data em que a operação foi acordada;

- a data da operação, que é a data que foi acordada para a efectivação da operação;

- a divisa e o montante a ser comprado ao cliente pelo banco;

- a data-valor para o vencimento da operação;

- a taxa de câmbio aplicável à operação;

- a divisa e o montante a ser vendido ao cliente pelo banco;

- a conta bancária para a qual o cliente irá transferir a divisa a entregar ao banco;

- a conta bancária para a qual o banco irá transferir as divisas a entregar ao cliente.

A confirmação indicará a taxa de câmbio acordada para a transacção. Não indica as taxas de compra ou de venda, mas estas são geralmente conhecidas do cliente que, na maioria dos casos, se informa junto do banco sobre isso.

13 Um cliente interessado numa operação à vista pode ser, por exemplo, um fabricante americano que exportou um produto manufacturado nos Estados Unidos para um cliente na Alemanha. Como pagamento do produto exportado, o fabricante recebe marcos alemães no estrangeiro. O fabricante deseja trocar os marcos alemães por dólares americanos. Telefona ao banco e pergunta o preço de venda à vista de marcos alemães por dólares americanos.

14 Uma operação «a termo» consiste na compra de uma moeda contra a venda de outra moeda, sendo a entrega e a venda concluídas numa data-valor futura, e os montantes fixados por referência à taxa de câmbio acordada na data do negócio. Na sequência de um acordo quanto a uma operação a termo, o banco entregará à outra parte um documento similar de confirmação, incluindo as mesmas informações que numa operação à vista. A diferença essencial em relação a uma operação à vista é que a data-valor confirmada será uma data futura mais de dois dias úteis posteriores à data do negócio.

15 Nas operações cambiais realizadas pelo banco, nenhum montante é fisicamente entregue sob forma de moedas cunhadas, notas ou outros bens móveis. O que é entregue é a disponibilidade de direitos de saque sobre um crédito aberto num banco na moeda «entregue».

16 As operações à vista ou a termo podem ser efectuadas de várias formas. Em primeiro lugar, por meio de um sistema informatizado, os preços dos montantes de divisas a serem trocadas são acordados telefonicamente pelos operadores (dealers) de ambas as partes e subsequentemente confirmados por escrito. A confirmação assume a forma de nota impressa em computador cujos detalhes são dactilografados no computador no momento em que a operação é acordada. Outras operações, concluídas com sociedades clientes de todo o mundo através de um sistema por meio do qual os operadores do banco indicam um preço por telex e recebem uma contraproposta pela mesma via. O banco também fornece divisas a clientes individuais. O dinheiro é obtido de um banco que use um sistema de telex e a confirmação é enviada em seguida pelo correio.

17 Não é cobrada nem facturada nenhuma taxa de operação ou comissão pelo banco por qualquer operação cambial. O banco, como qualquer outro operador do mercado, procura obter lucros com as suas operações cambiais, pelo menos como resultado da margem entre as suas propostas de compra e de venda. Em geral, quanto maior for o número de operações que o banco pode fazer, comprando e vendendo divisas aos seus preços de compra e de venda, maior será a possibilidade de obter lucros com as suas operações cambiais. Cada um dos seus operadores tem o seu próprio registo de divisas específicas e espera-se que ele obtenha lucro em períodos adequadamente fixados. Este lucro é o resultado de todas as operações que efectua durante esse período. Cada operação é realizada na crença de que aproveita ao banco, mas este não costuma avaliar cada operação individualmente.

18 Em qualquer operação cambial efectuada pelo banco, em especial nas operações a prazo, existem, pelo menos, dois riscos. O primeiro é o de incumprimento pela outra parte. O segundo, mais significativo, é o risco de as taxas do mercado se alterarem contra a posição assumida pelo banco. As taxas podem evoluir rapidamente ao longo de um dia na Bolsa. Assim, por exemplo, se o banco tiver contratado a compra de marcos alemães numa operação cambial a termo contra pagamento pelo banco em dólares e o marco alemão se depreciar em relação ao dólar, o banco corre o risco de prejuízos expressos em dólares. O banco procurará, portanto, limitar o seu risco potencial procurando contraentes para contratos a preços, data-valor e montantes que lhe interessem. Uma proporção significativa destas transacções será proposta ao banco por outras instituições financeiras que buscam a mesma protecção para si próprias.

19 O banco publica várias circulares e notas informativas, que distribui gratuitamente aos seus clientes. Estes documentos constituem uma forma de manter e aumentar a reputação do banco no mercado cambial. Por razões semelhantes, os membros do seu departamento de operações cambiais prestam conselhos gratuitos às empresas e aos gestores de fundos seus clientes.

IV - As disposições da Sexta Directiva IVA

20 O artigo 13._ da Sexta Directiva IVA prevê, no título B. Outras isenções, no que diz respeito às operações cambiais:

«Sem prejuízo de outras disposições comunitárias, os Estados-Membros isentarão, nas condições por eles fixadas com o fim de assegurar a aplicação correcta e simples das isenções a seguir enunciadas e de evitar qualquer possível fraude, evasão e abuso:

...

d) as seguintes operações:

...

4. As operações, incluindo a negociação, relativas a divisas, papel-moeda e moeda com valor liberatório, com excepção de moedas e notas de colecção;

...»

21 Sob o título C. Opções, o artigo 13._ prevê que os Estados-Membros podem conceder aos seus sujeitos passivos o direito de optar pela tributação das operações referidas em B, alínea d) (2), podendo restringir o âmbito do direito de opção e, além disso, fixar as regras do seu exercício.

22 Segundo o n._ 1 do artigo 17._ da Sexta Directiva, não é possível nenhuma dedução em matéria de operações cambiais, porque esta disposição prevê que o direito à dedução surge no momento «em que o imposto dedutível se torna exigível». Uma das excepções previstas no n._ 3 do artigo 17._ concede a dedução «na medida em que os bens e os serviços sejam utilizados para efeitos:

...

c) das operações isentas nos termos do disposto em B), a) e d), 1 a 5, do artigo 13._, quando o destinatário se encontre estabelecido fora da Comunidade...»

23 Nos termos do n._ 1 do artigo 6._, entende-se como prestação de serviços «qualquer prestação que não constitua uma entrega de bens na acepção do artigo 5._» Em virtude do n._ 1 do artigo 5._, da Sexta Directiva IVA, por entrega de bens entende-se «a transferência do poder de dispor de um bem corpóreo como proprietário».

B - Parecer

I - Quanto à primeira questão

24 A formulação desta questão refere-se ao n._ 1 do artigo 2._ da Sexta Directiva IVA, que define as actividades sujeitas ao imposto sobre o valor acrescentado. Trata-se de entregas de bens e de prestações de serviços, efectuadas a título oneroso no país por um contribuinte nessa qualidade. Pela primeira questão, o órgão jurisdicional de reenvio procura saber se as operações cambiais que o banco efectua e que estão descritas acima entram no âmbito de aplicação da directiva.

1. As isenções previstas pela Sexta Directiva IVA

25 Como já referimos, essas operações cambiais não são normalmente decisivas para a tributação, porque o artigo 13._, parte B, alínea d), n._ 4 da Sexta Directiva IVA as isenta do imposto sobre o valor acrescentado. Nos termos do artigo 17._, n._ 3, alínea c), no entanto, mesmo no quadro dessas operações cambiais, há que conceder uma dedução quando o tomador esteja estabelecido fora da Comunidade. É esta dedução que reclama o First National Bank no processo principal. A primeira das condições a que está sujeita é naturalmente que as operações de câmbio do banco entrem no âmbito de aplicação do imposto sobre o valor acrescentado e, portanto, da Sexta Directiva IVA.

26 Em nossa opinião, isto resulta do simples facto de as operações relativas a divisas serem expressamente isentas do imposto sobre o valor acrescentado em virtude do artigo 13._, parte B, alínea d), ponto 4. Essa isenção só é necessária e útil se for possível tributar essas operações, ou seja, se estas entrarem no âmbito de aplicação do imposto sobre o valor acrescentado. Nesse sentido aponta a possibilidade que o artigo 13._, parte C, alínea b), oferece aos Estados-Membros de conceder aos seus contribuintes o direito de optar pela tributação das referidas operações. Daí resulta que essas operações cambiais, em certas condições, estão sujeitas ao imposto sobre o valor acrescentado. Seria, afinal, perfeitamente incompreensível que o artigo 17._, n._ 3, alínea c), concedesse a dedução para operações que não entrassem no âmbito de aplicação da directiva. Assim, o First National Bank e a Comissão sublinham igualmente que as disposições acima referidas seriam perfeitamente supérfluas e inúteis se as operações cambiais - tal como expõe o Reino Unido - não entrassem de modo algum no âmbito de aplicação da Sexta Directiva IVA.

2. A noção de contrapartida

27 O Reino Unido entende, contudo, que as disposições correspondentes dos artigos 13._ e 17._ não se aplicam a operações como as do presente processo, uma vez que a prestação do banco não tinha contrapartida. Tal como já referimos, se o banco não cobra comissão sobre o câmbio de divisas, no entanto, não deixa de fazer um lucro, que resulta, pelo menos em parte, da fixação das diversas taxas de compra e venda. A diferença entre as duas taxas, ou seja, a margem, não constitui, segundo o Reino Unido, uma contrapartida na acepção da Sexta Directiva IVA. Por seu lado, o banco, o Governo francês e a Comissão são de opinião contrária.

2.1. Comparação entre comissão e margem

28 O Reino Unido entende que o banco só trabalha a título oneroso quando submete a operação cambial à cobrança de uma comissão. Assim, cobrando, por exemplo, uma comissão de 2% sobre esta operação, um banco efectua indubitavelmente, segundo o Reino Unido, uma prestação a título oneroso na acepção da directiva. Na audiência, clarificou a sua tese, ilustrando-a com o exemplo de uma agência de câmbios. Em seu entender, não existiria qualquer diferença de princípio entre uma agência de câmbios e o banco, sendo as operações cambiais simplesmente de uma amplitude e complexidade maiores.

29 Em contrapartida, se essa agência de câmbios ou o banco não recebe qualquer comissão, mas tenta fazer lucro comprando e vendendo divisas a preços diferentes, não recebe, segundo o Reino Unido, qualquer contrapartida na acepção da directiva. O facto de o banco fazer lucro em diversas operações cambiais num determinado período não implica, segundo o Reino Unido, que preste um serviço a título oneroso para cada operação individual.

30 Continuando a ilustrar a sua tese com o exemplo da agência de câmbio, o Reino Unido expôs, além disso, na audiência, que, mesmo no caso de esta agência cobrar uma comissão pelo câmbio, só pode efectuar a operação se se oferecer para comprar divisas a determinado preço e as revender a outro preço, para arranjar as divisas correspondentes. Sendo o preço de venda superior ao preço de compra, obter-se-ia a um lucro durante um certo período. A agência exerceria uma actividade comercial. Efectuaria as operações cambiais no decurso normal das suas actividades económicas. Isso corresponderia - num quadro restrito - à actividade do banco.

31 Se - prossegue o Reino Unido - essa agência de câmbios decide deixar de cobrar comissão, também não recebe qualquer contrapartida pela conversão e não efectua uma prestação de serviços na acepção da directiva.

32 Assim, na opinião do Reino Unido, a agência de câmbio - tal como o banco no presente processo - trabalhariam gratuitamente nesse caso. Esta hipótese é, segundo a Comissão, muito improvável. O Reino Unido salienta aliás que o banco ou a agência de câmbios se esforçam igualmente por fazer lucro, efectuando essas operações cambiais gerais.

33 Se considerarmos agora os dois casos expostos pelo Reino Unido - as operações cambiais gerais que o banco ou a agência de câmbios efectuam, por um lado, e a cobrança suplementar de uma comissão a título de contrapartida do câmbio de divisas, por outro -, verifica-se que não se distinguem tanto uma da outra como o Reino Unido pretende. Ao expor o seu exemplo da agência de câmbios que sujeita a conversão de divisas à cobrança de uma comissão de 2%, o Reino Unido já admitiu que a conversão de montantes monetários noutra moeda é uma prestação de serviços na acepção da directiva e que não constitui, portanto, um fornecimento de bens.

34 Esta situação não se altera em nada se não for cobrada mais nenhuma comissão por esta actividade. O cliente continua a dirigir-se ao banco ou à agência de câmbios com vista a obter os meios de pagamento expressos noutra moeda. Mesmo no caso de o banco não cobrar qualquer comissão, exerce uma actividade para o cliente e «entrega-lhe» os meios de pagamento, permitindo-lhe beneficiar de um crédito aberto junto de um banco com a divisa «entregue». O banco continua, portanto, a prestar um serviço. Mesmo se - como expõe o Reino Unido - a contrapartida dessa prestação desaparece, não deixa de se tratar de uma prestação de serviços. A consequência é que, quando muito, sai do âmbito de aplicação da Directiva IVA. Em qualquer hipótese, o banco esforça-se por vender os meios de pagamento a um preço um pouco superior àquele a que os compra.

35 Como admite o próprio Reino Unido, o banco paga menos do que espera receber ao revender. Ora, isto significa necessariamente que «entrega» também menos dinheiro na divisa estrangeira e que realiza, assim, um ganho. Ou seja, o cliente paga também, neste caso, o serviço do banco. No quadro destas operações cambiais, que, como acabámos de ver, constituem sempre uma prestação de serviços para o cliente, o banco esforça-se por fazer lucro; isto significa que se esforça por cobrir os seus custos e obter uma margem. Os custos gerados pelas operações cambiais de um volume tão importante como as que o banco realiza são bastante superiores aos de uma pequena agência de câmbios. Tal como já expusemos, requerem a utilização de computadores e de meios técnicos importantes.

36 Conclui-se, em qualquer caso, que o banco deve fixar os seus preços de tal maneira que receba um pagamento pela sua prestação de serviços. Isto significa que, mesmo na hipótese de se esforçar por realizar um lucro apenas por meio da compra e venda de divisas, o banco não trabalha gratuitamente - contrariamente à opinião do Reino Unido -, mas cobra a sua prestação aos seus clientes, sob a forma de uma contrapartida menor para as divisas compradas e de uma contrapartida superior para as divisas vendidas.

2.2. A jurisprudência do Tribunal de Justiça

37 O facto de serem efectivamente obtidas receitas por uma actividade não tem necessariamente por consequência que esta actividade seja exercida a título oneroso na acepção da Sexta Directiva IVA (3). O Tribunal de Justiça, que já se pronunciou várias vezes sobre a questão, fixou as condições dentro das quais este critério se encontra preenchido. Assim, o Tribunal declarou, no seu acórdão Tolsma (4), remetendo para os seus acórdãos Coöperatieve Aardappelenbewaarplaats (5) e Naturally Yours Cosmetics (6), que uma prestação de serviços só é tributável se existir uma ligação directa entre o serviço prestado e a contrapartida recebida (7).

38 O Tribunal de Justiça deduz daí que «uma prestação de serviços não é efectuada a `título oneroso', na acepção do artigo 2._, n._ 1, da Sexta Directiva, e portanto só é tributável se existir entre o prestador de serviços e o destinatário uma relação jurídica em que tenham sido trocadas prestações recíprocas, constituindo a retribuição recebida pela prestador a contrapartida efectiva do serviço prestado ao destinatário» (8).

39 A Comissão e o First National Bank sublinham e bem que todas estas condições estão igualmente preenchidas no presente processo.

40 Existe entre o prestador e o destinatário uma relação jurídica na qual foram trocadas prestações recíprocas. Resulta das indicações do órgão jurisdicional de reenvio que, aquando das negociações relativas à operação cambial considerada, o cliente e o banco celebraram um acordo nos termos do qual o primeiro deposita uma certa quantia em dinheiro, numa determinada divisa, numa dada conta, enquanto que o segundo se obriga, em contrapartida, a depositar uma certa quantia em dinheiro, noutra divisa, na conta que o cliente lhe indicar. Este último e o banco obrigam-se, portanto, a prestações recíprocas.

41 A questão aqui é a de saber se a retribuição recebida pelo prestador, neste caso o banco, constitui o contravalor efectivo da prestação efectuada ao destinatário.

42 No processo Tolsma, o Tribunal de Justiça respondeu pela negativa. A questão era a de saber se os ganhos de um músico que toca na via pública podiam ser considerados como a contrapartida da prestação musical que efectuava. Segundo o Tribunal de Justiça, não existe nenhuma convenção entre as partes, porque os transeuntes pagam a título voluntário uma gratificação cujo montante é determinado ao seu critério. O Tribunal entende, por outro lado, que não há nenhuma ligação necessária entre a prestação musical e os pagamentos a que dá lugar, porque os transeuntes não pediram que se tocasse música para eles ouvirem. Além disso, prossegue o Tribunal, esses transeuntes dão dinheiro não em função da prestação musical, mas de motivações subjectivas que podem basear-se em considerações de simpatia (9).

43 No presente processo, a situação é diferente. É o cliente que interpela o banco e pede a execução de uma prestação, a saber, o câmbio de uma moeda. Segundo as declarações do banco, o cliente tem consciência de que esta prestação não é efectuada a título gratuito. Este ponto, aliás, só é contestado pelo Reino Unido, que não vê, na margem existente entre os preços de compra e venda, nenhuma contrapartida para o serviço. O Reino Unido não expõe tão-pouco que os clientes se informam, regra geral, junto do banco sobre os dois preços, isto é, igualmente sobre a margem. Assim, os clientes sabem quanto é a diferença entre o montante a que as divisas são vendidas e o montante a que são compradas e, portanto, que pagam pela prestação e quanto.

44 O banco, que é, bem entendido, a outra parte da relação jurídica, tem perfeita consciência de que o pagamento que recebe pela sua prestação de câmbio resulta da margem. Assim, não subsiste qualquer dúvida entre o prestador e o destinatário quanto ao facto de a prestação ser efectuada a título oneroso e de a retribuição se referir à operação considerada.

45 No que respeita aos preços a que o banco aceita comprar e vender divisas aos seus clientes, há que considerar que a margem resultante da diferença dos preços constitui o pagamento do serviço prestado pelo banco. Este fixa os preços em função desta finalidade. Na audiência, o próprio Reino Unido confirmou que havia prestação a título oneroso desde que a diferença entre os preços de compra e venda «dissimulasse» uma comissão susceptível de ser identificada. A comissão «dissimula-se» aqui na margem, na medida em que esta constitui o pagamento da prestação e que corresponde, nessa medida, a uma comissão. Esta última, por conseguinte, é igualmente identificável.

46 Por esta razão, é possível subdividir em duas partes, como propõe a Comissão, a soma que o cliente paga ao banco numa certa divisa:

- o montante correspondente ao contravalor da soma paga pelo banco noutra divisa, e

- a contrapartida do serviço, a saber, a margem.

47 O Reino Unido considera, todavia, impossível estabelecer o contravalor do montante pago pelo banco, porque não existiria preço correspondente de mercado por meio do qual se pudesse encontrar uma definição. Existiriam apenas os preços de compra e venda fixados pelo banco.

48 A Comissão tem uma opinião diferente a este respeito. Entende que existe um preço de mercado, cujo valor se situa entre o preço de compra e o preço de venda.

49 Em nossa opinião, além dos preços de compra e de venda fixados pelo banco para os seus clientes, são perfeitamente possíveis outras formas de exprimir o valor de uma certa soma de dinheiro por um contravalor noutra divisa. Limitar-nos-emos a recordar que as diferentes moedas são igualmente negociadas na Bolsa, onde são fixados os preços correspondentes. Quanto à medida em que é efectivamente possível definir um contravalor numa outra divisa, cabe ao órgão jurisdicional nacional decidir.

50 Mas, mesmo que fosse impossível definir um contravalor preciso por meio de um preço de mercado, o facto de a prestação do banco ser paga pela margem não seria afectado por isso. Tal como já explicámos acima, o banco fixa os seus preços de modo a receber um pagamento pela sua prestação, em cada operação. A margem, com efeito, é calculada para cada conversão, ou seja, para qualquer operação, o cliente recebe do banco uma soma menor do que aquela que paga. Assim, o First National Bank expôs, na audiência, que o cliente compra uma divisa estrangeira a um preço superior ao que receberia se a revendesse imediatamente.

51 Portanto, há que considerar que, em cada operação cambial, o cliente paga a prestação do banco por meio da margem existente entre os preços de venda e de compra, margem em razão da qual recebe, no momento de cada operação cambial, menos do que deu ao banco. O facto de as flutuações de preços ocorridas entretanto poderem, no fim de contas, levá-lo a realizar um ganho, não é relevante para este efeito. Voltaremos posteriormente a este ponto (10).

2.3. Necessidade de uma segunda operação para realizar a contrapartida

52 O Reino Unido refere, todavia, outras razões para explicar que as receitas recebidas pelo banco com base na margem não são consideradas como uma contrapartida da operação individual. Indica, em primeiro lugar, que o ganho proveniente da diferença entre os preços de compra e de venda só se realiza por ocasião da operação seguinte, ou seja, quando o banco revende o dinheiro comprado ao cliente a outro cliente.

53 No entanto, como já explicámos acima, o banco vende igualmente uma certa divisa em cada operação. Nessa ocasião, «entrega» menos ao cliente do que recebe dele. O banco e a Comissão são igualmente de opinião que a margem tem o efeito de, em cada operação, o cliente não receber todo o contravalor da soma que cambia. A Comissão cita, a este respeito, igualmente o VAT Tribunal, que considera também que o preço a que o banco vende a divisa ao cliente inclui os custos da operação, ou seja, a prestação de serviços.

2.4. Ligação directa entre o serviço prestado e a contrapartida recebida (apreciação individual)

54 Como argumento seguinte, avançado para justificar a tese segundo a qual a margem não pode constituir a contrapartida da prestação cambial, o Reino Unido expõe que uma contrapartida, na acepção da Directiva IVA, deve poder ser determinada para cada operação. Refere, a este respeito, a jurisprudência do Tribunal de Justiça, segundo a qual uma prestação de serviços só é tributável se existir uma ligação directa entre o serviço prestado e a contrapartida recebida (11).

55 Tal como resulta da exposição das partes e do despacho de reenvio, o banco efectua cada operação na crença de que lhe traz uma vantagem. Todavia, acrescenta-se que o banco não costuma avaliar cada operação individualmente. Ou seja, o banco calcula o seu lucro durante um certo período. Segundo o Reino Unido, este procedimento é demasiado impreciso para que daí se possa concluir que o serviço prestado pelo banco é, em de cada operação, efectuado a título oneroso. O Reino Unido apoia-se, a este respeito, igualmente nas conclusões apresentadas no processo Glawe (12). O advogado-geral indicou que as operações de jogo de azar não se coadunavam com a aplicação do imposto sobre o valor acrescentado (13). Noutra passagem, precisa que pode haver alguma dificuldade teórica em considerar, por exemplo, os ganhos líquidos de um bookmaker como a contrapartida de serviços (14). Segundo o Reino Unido, estas dificuldades e esta característica de não se coadunarem com a aplicação do imposto sobre o valor acrescentado reúnem-se a fortiori no presente caso das operações cambiais, porque a contrapartida aqui não só seria difícil de estabelecer, mas simplesmente não existiria.

56 Tal como já expusemos, não se pode afirmar que a prestação efectuada pelo banco no quadro de operações cambiais não dê lugar a nenhuma contrapartida. Todavia, não se pode negar que a sua determinação não deixa de suscitar certas dificuldades. Tal como expõe, com razão, o Reino Unido, as receitas do banco provêm da sua participação em toda uma série de operações, que são concluídas em condições de mercado e a preços diferentes. O facto de as operações cambiais não se coadunarem com a aplicação do imposto sobre o valor acrescentado constitui talvez a razão pela qual a Sexta Directiva IVA as isenta do imposto. Estas dificuldades na determinação da contrapartida não levam, no entanto, a considerar, mesmo à luz das conclusões no processo Glawe, que não existe nenhuma contrapartida na acepção da directiva, e portanto as operações de câmbio não entram no âmbito de aplicação do imposto sobre o valor acrescentado. Temos que sublinhar aqui ainda que o banco fixa uma margem para cada conversão. Esta margem resulta da diferença entre o preço negociado para a operação e o preço de venda (ou o preço de mercado, se é que existe). O banco não avalia, no entanto, cada operação individualmente e o mesmo se passa com a margem. Segundo o Reino Unido, este procedimento é demasiado impreciso, porque a margem não é facturada ao cliente. O Reino Unido entende, além disso, que o lucro do banco não pode ser considerado, em princípio, como uma contrapartida na acepção da directiva.

57 Retorquir-se-á primeiro que o facto, por si só, de o banco não avaliar cada operação individual não permite concluir pela impossibilidade dessa avaliação individual. É possível que o banco renuncie a uma avaliação individual, por ser muito complicada - não há dúvida - e não lhe ser necessária. Se a avaliação individual é tão complexa, é porque não lhe basta, para determinar o ganho que afinal realizou, conhecer as somas envolvidas, a data da operação e o câmbio a que foi efectuada, mas é ainda preciso ter em conta a situação do mercado nessa data e - para as operações a prazo - a sua evolução posterior. Por esta razão, uma apreciação individual, se fosse possível, só o seria a posteriori. O Tribunal de Justiça não dispõe de informações suficientes que lhe permitam decidir se o banco estaria em posição de realizar essa avaliação individual. Compete ao órgão jurisdicional nacional decidir se é esse o caso.

2.5. Necessidade de apreciação individual (acórdão Glawe e processo Fischer)

58 Tendo em consideração o acórdão do Tribunal de Justiça no processo Glawe (15), há que verificar, no entanto, se essa apreciação individual é necessária para a cobrança do imposto sobre o valor acrescentado.

59 O processo Glawe dizia respeito à cobrança do imposto sobre o valor acrescentado sobre os aparelhos automáticos de jogos a dinheiro com possibilidade de ganhos, instalados e explorados nas lojas de bebidas. O funcionamento destas máquinas é regulado por lei imperativa. São constituídas, entre outros, por uma coluna de empilhamento, destinada ao pagamento dos ganhos, e uma caixa. Se, após a distribuição dos ganhos, a coluna de empilhamento já não estiver completamente cheia, as moedas introduzidas pelos jogadores não caem na caixa, mas são encaminhadas em direcção à coluna de empilhamento. Além disso, as máquinas são obrigatoriamente concebidas de forma a que pelo menos 60% das moedas introduzidas pelos jogadores (as apostas) sejam distribuídas como ganhos, permanecendo o resto, cerca de 40%, na caixa.

60 O Tribunal de Justiça seguiu as conclusões do advogado-geral e considerou que as apostas se compunham de duas partes: por um lado, uma proporção destinada à reconstituição do conteúdo da coluna de empilhamento e, por conseguinte, ao pagamento dos ganhos e, por outro, a proporção restante, encaminhada em direcção à caixa da máquina (16).

61 Nas suas conclusões, o advogado-geral definiu com mais precisão esta proporção restante. Trata-se, em seu entender, do preço pago pelo serviço prestado pelo explorador. Acrescentou que, num dado período, os dois elementos correspondiam aos montantes recolhidos, respectivamente, pela caixa e pela coluna de empilhamento (17).

62 O Tribunal de Justiça decidiu que, como a proporção das apostas dos jogadores que é redistribuída a título de ganhos é obrigatoriamente fixada com antecedência, não pode considerar-se que faça parte da contrapartida da disponibilização das máquinas a dinheiro aos jogadores, nem que constitua a remuneração de um outro serviço prestado aos jogadores (18). A matéria colectável é constituída, deste modo, pelas receitas do explorador da máquina, isto é, do conteúdo da caixa do aparelho. Assim, também não se procede, neste processo, a uma avaliação individual de cada jogo, consoante tenha ganho o aparelho ou o jogador, mas considerou-se que as receitas do explorador, calculadas num certo período, formavam a matéria colectável.

63 Estas questões foram igualmente objecto de um processo actualmente pendente, relativo à tributação de um jogo equivalente à roleta (19). Os jogadores também recebem fichas, que colocam numa mesa de jogo semelhante à da roleta. Este jogo permite-lhes igualmente ganhar um múltiplo das suas apostas; os ganhos são distribuídos no fim de cada jogo sob a forma de fichas. Os que não desejem jogar mais podem trocar as fichas que lhes restam por dinheiro.

64 Também aqui, o advogado-geral expõe, nas suas conclusões, que, no plano jurídico, cada ficha colocada na mesa compreende dois elementos: por um lado, a aposta e, por outro, a contrapartida dos serviços prestados pelo organizador, ou seja, o preço pago pelos jogadores para ter o direito a participar no jogo e conseguir uma oportunidade de ganho. Este preço, que consiste nos proveitos que o estabelecimento reserva para si tendo em vista as probabilidades determinadas em seu favor pode, indica ele, ser calculado com precisão e constitui uma percentagem fixa que varia segundo o tipo de jogo de roleta em causa. É pago por cada jogador cada vez que este coloca uma ficha na mesa. O organizador poderia perfeitamente separar os dois elementos, suprimindo a vantagem de que o estabelecimento dispõe e substituindo-a por uma taxa diferente que servisse para cobrir os seus custos e para produzir um lucro (20).

65 O advogado-geral chega, por fim, à conclusão que os cálculos individuais com base em cada ficha colocada sobre a mesa não são, na prática, necessários. O total dos montantes recebidos em contrapartida das operações individuais corresponde, segundo o advogado-geral, às receitas líquidas do organizador (após o pagamento dos ganhos) durante um dado período. Acrescenta que, ao longo de um período, as receitas líquidas do organizador são necessariamente iguais à vantagem que ele reserva para si. Sublinha, além disso, mais uma vez, que a existência, na prática, de um método mais simples de apuramento da matéria colectável não significa que as operações individuais não sejam objecto da tributação (21).

66 E como é no presente caso? O que o cliente paga ao banco é aqui igualmente divisível em duas partes. Como já dissemos, um elemento constitui o contravalor da soma de dinheiro que entrega ao banco, enquanto o segundo componente forma a contrapartida ou o preço da prestação de câmbio. Nos processos Glawe e Fischer, este componente correspondia, respectivamente, à percentagem legal de distribuição de ganhos e à oportunidade de ganho que o organizador reservava para si. No presente caso, corresponde à margem. Tal como no processo Fischer, este componente - a margem - poderia ser cobrado sob a forma de uma taxa ou de uma comissão. Pode-se, portanto, concluir que, à semelhança dos processos Glawe e Fischer, uma parte do que paga o cliente no momento de cada operação individual se considera aqui, igualmente, como a contrapartida de um serviço, cuja parte é precisamente definível.

67 No entanto, há que apreciar se este componente que constitui o preço está tão bem definida no presente processo como nos processos Glawe e Fischer. No processo Glawe, estava estabelecido à partida que o explorador de uma máquina recebe, como receitas líquidas, uma certa percentagem das apostas introduzidas nos aparelhos. Não era possível apurar, no fim de um determinado período, o montante das somas introduzidas nos aparelhos. No entanto, estava definido que o montante que se encontrava em caixa após um certo tempo em que os jogadores tinham ganho e perdido correspondia a uma percentagem definida das apostas. Ou seja, a percentagem era definida desde o início, mas o montante preciso só era definido ao fim de determinado período.

68 No presente caso, a contrapartida é definida pela margem. Esta é fixa desde o momento da operação, porque resulta da diferença entre os diversos preços. Mas o seu montante preciso também só se realiza posteriormente, como é o caso, por exemplo, para as operações a longo termo. O facto de a margem variar de uma operação para outra é, em nossa opinião, irrelevante, desde que possa ser claramente estabelecida para cada operação. Assim, nas conclusões apresentadas no processo Glawe, o advogado-geral verificou que, no caso de um bookmaker, o «preço», por exemplo, que este recebe pelo seu serviço é variável e depende parcialmente da sorte e em parte da sua habilidade no cálculo das probabilidades de vitória (22). Todavia, isto não levou a excluir este serviço do âmbito de aplicação da directiva.

69 Portanto, no presente processo o elemento preço não é, de qualquer modo, definido com menos rigor à partida do que nos processos Glawe e Fischer. Assim, pode considerar-se aqui, como nesses processos, que as operações individuais são tributadas. Simultaneamente, não se vislumbra nenhuma razão que justifique a impossibilidade de efectuar um desconto relativamente a um certo período, tal como era necessário nos processos Glawe e Fischer e a pratica o banco no presente processo. Portanto, há que considerar que, no presente processo, as operações individuais são tributadas e que o desconto do banco basta para a tributação. Por conseguinte, está estabelecido que o banco efectua, em matéria de operações cambiais, uma prestação de serviços a título oneroso na acepção da Sexta Directiva IVA.

2.6. Comparação com casos correntes de sujeição ao imposto sobre o valor acrescentado

70 Portanto, está igualmente estabelecido que o lucro do banco pode considerar-se aqui como a contrapartida de um serviço - ao contrário da tese do Reino Unido. Como expôs o advogado-geral no processo Fischer, obtém-se assim o resultado mais próximo possível daquele a que se chega na hipótese do caso corrente de sujeição ao imposto sobre o valor acrescentado (23). Na hipótese, por exemplo, de um fabricante vender uma mercadoria a um certo preço mais IVA, o montante restante após a dedução do IVA constitui o montante que cobre a sua margem de lucro, os seus custos de material e todos os outros impostos a que está sujeito. O imposto é, então, exactamente proporcional ao preço, porque a relação entre o preço, ou seja, entre as receitas totais, e o imposto sobre o valor acrescentado corresponde à taxa legal do IVA. No presente processo, o lucro do banco, ou seja, as suas receitas, constitui o montante necessário para cobrir a sua margem de lucro, os custos ligados à regulação das operações, bem como os custos gerados pelo funcionamento do banco e do departamento de divisas. A este respeito, há que sublinhar que o montante a ter em conta não é o lucro líquido do banco, mas a totalidade do que recebe por causa da margem.

71 A título complementar, mencionaremos ainda que, mesmo nos casos correntes de prestações de serviços, a matéria colectável é constituída pelo que recebe o prestador em contrapartida do seu serviço. Do mesmo modo, como indica a Comissão, não há nenhum imposto a pagar na hipótese, bastante improvável na prática, de o banco, durante um certo período, ter perdas.

72 No caso de um banco cobrar uma comissão, propondo a compra e a venda de divisas a preços diferentes, não é apenas esta comissão que há que considerar como a contrapartida do seu serviço, mas também a margem, como expõe a Comissão.

2.7. Delimitação em relação à troca de meios de pagamento

73 A tese do Reino Unido segundo a qual efectuar uma operação cambial a um preço convencionado consiste simplesmente em trocar um meio de pagamento por outro não pode afectar a necessidade de considerar a margem como a contrapartida do banco. Converter dólares em marcos, por exemplo, é mais do que trocar uma nota em moedas da mesma divisa. A conversão de divisas diferentes impõe, com efeito, a fixação das taxas de câmbio. Mesmo que, tendo sido convencionada a taxa de câmbio, a conversão das divisas já não se distinga do caso acima referido da troca de uma nota em moedas, há que observar, todavia, que as operações cambiais do banco comportam antes de mais uma negociação da taxa de câmbio, o que obriga a ter em conta a situação dos mercados de divisas, e que a referida taxa é, em seguida, confirmada com o auxílio de meios electrónicos. Assim, o próprio Reino Unido menciona a compra e venda ao falar de operações cambiais, mostrando assim que o banco faz mais do que simplesmente trocar meios de pagamento.

2.8. Contrapartida em caso de perdas do banco

74 O facto de o banco poder sofrer perdas por ocasião de uma operação individual não pode afectar mais este resultado. Mesmo um organizador de jogos de azar pode ter grandes perdas. Todavia, isto não altera nada quanto ao facto de um componente de cada aposta constituir - tal como expusemos acima - o pagamento do organizador. Podemos ilustrar este ponto quanto ao presente caso salientando que, mesmo em caso de operações com perdas (a fundo perdido), estas perdas seriam ainda maiores se, em vez de calcular uma margem, o banco tivesse pago todo o contravalor. Tendo integrado esta margem, o banco não precisa de ter em conta todo o contravalor para verificar as suas perdas.

2.9. Delimitação em relação à forma simples do jogo de azar

75 Pretendemos ainda analisar um argumento do Reino Unido, que se refere às conclusões apresentadas no processo Glawe. O advogado-geral expôs aí que o jogo de azar a dinheiro, sob a sua forma mais simples, implica despesas para os jogadores sem dar lugar a um consumo de bens ou de serviços. Referia, a este respeito, a hipótese de uma aposta privada em que os dois jogadores colocam os montantes das respectivas apostas em cima da mesa. Mesmo que estas apostas impliquem um desembolso, não constituem, segundo o advogado-geral, um consumo de bens ou serviços, que é o facto gerador do imposto no sistema do IVA (24). Baseando-se nesta observação, o Reino Unido sustenta que só haveria aqui igualmente um movimento de dinheiro do banco para o cliente e do cliente para o banco. Sustenta que não se pode deduzir daí que se trate de um consumo de serviços no sentido do sistema do IVA.

76 O advogado-geral precisa, todavia, mais à frente que os jogos de azar organizados para fins comerciais são diferentes, na medida em que o seu organizador proceder de tal maneira que, em média, os seus ganhos bastem para que possa fazer face aos seus custos de organização do jogo de azar, e para que esses ganhos lhe assegurem um lucro razoável. Refere o exemplo de um «bookmaker» que calcula as probabilidades da vitória para as apostas sobre as corridas de cavalos de maneira a garantir a realização de um lucro global sobre as apostas feitas. Acrescenta que, nessa medida, o organizador do jogo de azar pode ser considerado não só como um participante no próprio jogo de azar, mas também como um prestador aos outros jogadores de um serviço que consiste na organização do jogo (25). As coisas não são diferentes no presente processo. O banco vai fixar os preços de modo a garantir a realização de um lucro global sobre as suas operações cambiais. O próprio Reino Unido não o contesta. Por este motivo, há que considerar que a actividade prosseguida pelo banco no quadro das operações cambiais não pode ser comparada com a forma simples do jogo de azar, que não constitui um consumo de prestações de serviços no sentido da Directiva IVA. É igualmente nesse sentido que se pronuncia o First National Bank.

77 Assim, concluímos que, no quadro das suas operações cambiais, o banco efectua uma prestação de serviços a título oneroso na acepção da Sexta Directiva IVA. As referidas operações entram, portanto, no seu âmbito de aplicação e - mesmo que estejam isentas - dão direito à dedução, em aplicação do artigo 17._, n._ 3, alínea c), quando são concluídas com pessoas estabelecidas fora da Comunidade. A contrapartida pode ser determinada de modo preciso, e atribuída às diferentes operações, mesmo que não seja calculada para cada uma delas.

II - Quanto à segunda questão

1. Necessidade de uma resposta

78 A resposta à primeira questão prejudicial já nos obrigou a determinar precisamente a contrapartida, portanto já respondemos à segunda questão. Todavia, uma resposta não seria supérflua - como sugere o First National Bank -, porque não se poderia demonstrar, em nosso entender, a existência de uma remuneração, no sentido da Sexta Directiva IVA, sem definir precisamente essa remuneração.

2. Análise dos argumentos contrários

79 Uma vez que a nossa resposta à segunda questão não corresponde à tese que o First National Bank privilegia, queremos ainda analisar rapidamente a argumentação apresentada pelo banco. Segundo o banco, há que tributar como contrapartida a totalidade do montante em divisas pago pelo cliente. Sustenta a sua tese referindo que o IVA é um imposto sobre o volume de negócios e não sobre os lucros. Apoia-se, a este respeito, no artigo 11._, parte A, n._ 1, alínea a), da Sexta Directiva IVA, em virtude do qual a matéria colectável é constituída, quanto às prestações de serviços, por tudo o que constitui a contrapartida que o prestador recebeu do destinatário em relação a essas operações. O banco deduz daí que a matéria colectável corresponde à totalidade do que recebe do cliente.

2.1. Redacção do artigo 11._, parte A, n._ 1, alínea b)

80 Tal como expõem a Comissão e o Reino Unido, com razão, o artigo 11._, todavia, não apoia esta tese. Dispõe simplesmente que a matéria colectável é tudo o que constitui a contrapartida recebida. Não se pode assimilá-la a «tudo o que recebe o prestador». Portanto, é necessário determinar o montante da contrapartida.

2.2. O IVA como imposto sobre o volume de negócios

81 No que respeita ao argumento segundo o qual o imposto sobre o valor acrescentado não pode, enquanto imposto sobre o volume de negócios, aplicar-se a uma matéria colectável constituída pelo lucro do banco, a próprio First National Bank remete para o acórdão proferido no processo Glawe, para daí concluir que o princípio de que parte esse acórdão, a saber, que as receitas do explorador das máquinas a dinheiro constituem a matéria colectável, pode ser considerada correcta. Tal como já mencionámos acima, resulta das conclusões apresentadas no processo Fischer que o princípio de que parte é o que mais se aproxima do caso normal de sujeição ao imposto sobre o valor acrescentado (26).

2.3. Consequências práticas da tese defendida pelo banco

82 Isto manifesta-se claramente quando se segue a tese que o banco privilegia. Se o banco devesse sujeitar ao imposto tudo o que recebe do cliente, ou seja, a totalidade do montante em divisas, teria de pagar um imposto desproporcionado em relação às suas receitas - que correspondem apenas à sua margem. Tal como demonstrámos acima, o montante tributado é, em matéria de IVA, o preço de uma prestação de serviço, ou seja, o que ganha o prestador. A tese do banco comportaria, portanto, uma distorção do sistema do IVA, o que, no presente processo, lhe permitiria fazer valer um crédito de impostos igualmente desproporcionado (27).

2.4. Exemplos contrários

83 O Reino Unido salienta, além disso, com razão, que, no caso de o serviço de troca ser pago por uma comissão, está claramente definido que apenas esta comissão é tributada e não a soma formada por esta e o montante em divisas cambiado pelo cliente. É no mesmo sentido que se manifesta a Comissão, que toma o exemplo de uma comissão cobrada por ocasião de uma troca dentro da mesma divisa - isto é, a troca de uma nota em moedas. Não vemos também, nesse caso, porque se haveria de tributar, além da comissão, a soma a trocar. Na audiência, a Comissão referiu, além disso, o exemplo da tributação de uma prestação de serviços em geral. Trata-se da limpeza de um casaco, efectuada por um dado preço. Neste último caso, é igualmente claro que apenas é tributado o preço da limpeza, e não esse preço acrescido do valor do casaco.

2.5. Proposta de décima nona directiva IVA

84 A Comissão salienta finalmente que a sua proposta de décima nona directiva IVA, que comportava disposições relativas às operações cambiais, onde se partia de uma tese que apenas considerava igualmente como contrapartida a comissão ou as despesas reclamadas ao comprador em pagamento da prestação, falhou não por causa deste princípio, mas por outras razões.

85 Não nos resta, portanto, senão confirmar uma vez mais que a contrapartida da troca de divisas é a margem.

2.6. As operações de câmbio como operações de troca?

86 Não entraremos mais na argumentação do First National Bank segundo a qual há que considerar as operações cambiais como operações de troca. Embora uma divisa seja trocada por outra, isso não se passa de modo que o banco entregue fisicamente o dinheiro ao cliente sob a forma de moedas ou de notas e receba ao mesmo tempo moedas ou notas. O banco dá antes ao cliente a possibilidade de beneficiar de um crédito aberto junto de um banco na divisa que desejar. O interesse do banco concentra-se essencialmente no montante da margem e menos no tipo de divisas que o cliente entrega. O próprio banco salienta que a margem lhe paga a troca. Daí resulta que não se trata de uma operação de troca, mas sim de uma prestação de serviços, a saber, a conversão de divisas.

C - Conclusão

87 Propomos, portanto, responder do seguinte modo às questões prejudiciais:

«1) Ao efectuar as operações cambiais no sentido da definição da British Bankers' Association (28), o banco efectua uma prestação de serviços a título oneroso na acepção da Sexta Directiva IVA, mesmo quando este serviço é pago não por meio de uma comissão, mas pela margem entre os preços de compra e de venda.

2) A contrapartida da prestação de serviços é o que o banco recebe com base na margem existente entre os preços de venda e de compra.»

(1) - JO L 145, p. 1; EE 09 F1 p. 54.

(2) - Artigo 13._, parte C, alínea b).

(3) - V. as nossas conclusões de 20 de Janeiro de 1994 no acórdão de 3 de Março de 1994, Tolsma (C-16/93, Colect., p. I-743, em especial p. I-745, n._ 13).

(4) - Acórdão já referido na nota 3.

(5) - Acórdão de 5 de Fevereiro de 1981 (154/80, Recueil, p. 445, n._ 12).

(6) - Acórdão de 23 de Novembro de 1988 (230/87, Colect., p. 6365, n._ 11).

(7) - Acórdão Tolsma, já referido na nota 4, n._ 13; v., também, o acórdão de 8 de Março de 1988, Apple and Pear Development Council (102/86, Colect., p. 1443, n.os 11 e 12).

(8) - Acórdão Tolsma, já referido na nota 3, n._ 14.

(9) - Acórdão Tolsma, já referido na nota 3, n._ 17.

(10) - V. infra, n._ 74.

(11) - Acórdãos Naturally Yours Cosmetics, já referido na nota 6, n._ 11, e Coöperatieve Aardappelenbewaarplaats, já referido na nota 5, n._ 12.

(12) - Conclusões de 3 de Março de 1994, acórdão de 5 de Maio de 1994 (C-38/93, Colect., p. I-1679, em especial p. I-1681).

(13) - Conclusões apresentadas no processo Glawe, já referidas na nota 12, n._ 16.

(14) - Conclusões apresentadas no processo Glawe, já referidas na nota 12, n._ 22.

(15) - Acórdão já referido na nota 12.

(16) - Acórdão Glawe, já referido na nota 12, n._ 11.

(17) - Conclusões apresentadas no processo Glawe, já referidas na nota 12, n._ 29.

(18) - Acórdão Glawe, já referido na nota 12, n._ 12.

(19) - Conclusões apresentadas em 20 de Março de 1997, Fischer (C-283/95, ainda não publicadas na Colectânea).

(20) - Conclusões apresentadas no processo Fischer, já referidas na nota 19, n._ 47.

(21) - Conclusões apresentadas no processo Fischer, já referidas na nota 19, n._ 49.

(22) - Conclusões apresentadas no processo Glawe, já referidas na nota 12, n._ 22.

(23) - Conclusões apresentadas no processo Fischer, já referidas na nota 19, n._ 45.

(24) - Conclusões apresentadas no processo Glawe, já referidas na nota 12, n._ 20.

(25) - Conclusões apresentadas no processo Glawe, já referidas na nota 12, n._ 21.

(26) - Conclusões apresentadas no processo Fischer, já referidas na nota 19, n._ 45.

(27) - Não é seguro que, no presente processo, fosse efectivamente esta a consequência, porque - como expõe o First National Bank - o método especial de isenção parcial convencionado com os Commissioners of Customs and Excise prevê que entre no cálculo do imposto sobre o valor acrescentado e das deduções não o volume de negócios, mas apenas o número das operações realizadas com o estrangeiro.

(28) - V. supra, n._ 7.