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Advertência jurídica importante

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62000C0184

Conclusões do advogado-geral Geelhoed apresentadas em 27 de Junho de 2001. - Office des produits wallons ASBL contra Estado Belga. - Pedido de decisão prejudicial: Tribunal de première instance de Charleroi - Bélgica. - Sexta Directiva IVA - Artigo 11.º, A, n.º 1, alínea a) - Matéria colectável - Subvenções directamente relacionadas com o preço. - Processo C-184/00.

Colectânea da Jurisprudência 2001 página I-09115


Conclusões do Advogado-Geral


I - Introdução

1 No presente pedido de decisão a título prejudicial, o Tribunal de première instance de Charleroi (Bélgica) pede ao Tribunal de Justiça que interprete o artigo 11._, A, n._ 1, da Sexta Directiva 77/388/CEE do Conselho, de 17 de Maio de 1977, relativa à harmonização das legislações dos Estados-Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios - Sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado: matéria colectável uniforme (1) (a seguir «directiva»). Mais concretamente, trata-se de determinar se uma subvenção paga a uma organização que fornece bens e presta serviços está sujeita a IVA.

II - Enquadramento jurídico

2 O artigo 11._, A, n._ 1, da directiva determina a matéria colectável para efeitos de IVA para as operações dentro do território do país do seguinte modo:

«A matéria colectável é constituída :

a) No caso de entregas de bens e de prestações de serviços que não sejam as referidas nas alíneas b), c) e d), por tudo o que constitui a contrapartida que o fornecedor ou o prestador recebeu ou deve receber em relação a essas operações, do adquirente, do destinatário ou de um terceiro, incluindo as subvenções directamente relacionadas com o preço de tais operações;

[...]»

Este artigo foi transposto para o direito belga através do artigo 26._, primeiro parágrafo, do código do IVA.

III - Matéria de facto e tramitação processual

3 O Office des Produits Wallons ASBL (a seguir «OPW») assegura a promoção e a venda dos produtos valões e está, neste âmbito, sujeito a IVA. Publica, nomeadamente, uma revista. Obtém uma subvenção da Região da Valónia, com a qual assinou uma convenção-quadro.

4 A administração do IVA inspeccionou a contabilidade do OPW em 19 de Fevereiro de 1997, o que resultou num auto de 25 de Abril de 1997. A administração do IVA acusa o OPW de não ter pago o IVA pela subvenção da Região da Valónia. A administração exige, assim, o pagamento do montante de 6 712 500 BEF quanto ao período 1994-1996, além de um montante, não contestado, de 33 833 BEF.

5 Em 7 de Dezembro de 1998 foi-lhe enviado um aviso de liquidação para o pagamento de 6 746 333 BEF (IVA) e de 1 349 000 BEF (multas), montantes estes acrescidos de juros à taxa de 0,8% ao mês, contados a partir de 21 de Janeiro de 1997. Por requerimento de 14 de Janeiro de 1999, o OPW contestou este aviso de liquidação perante o Tribunal de première instance de Charleroi. Pediu a anulação do aviso de liquidação quanto à parte que excedia o montante de 33 833 BEF e a condenação do Estado belga no reembolso dos montantes indevidamente cobrados, acrescidos de juros à taxa legal.

6 O litígio entre o OPW e o Estado belga pendente perante o órgão jurisdicional nacional tem por base o artigo 26._ do código do IVA.

7 Ambas as partes em litígio aceitam que uma subvenção faz parte da matéria colectável se estiver directamente relacionada com o preço. Tal verifica-se quando:

- é paga ao produtor, fornecedor ou prestador de serviços;

- é paga por um terceiro;

- constitui a contrapartida ou um elemento da contrapartida de um fornecimento ou de um serviço.

As partes discordam quanto ao alcance da terceira condição.

8 Por decisão de 11 de Maio de 2000, entrada na Secretaria do Tribunal de Justiça em 16 de Maio de 2000, o Tribunal de première instance de Charleroi (2.° secção cível) pediu ao Tribunal de Justiça que se pronunciasse a título prejudicial sobre as seguintes questões:

«1) Para efeitos de aplicação do artigo 11._, A, da Sexta Directiva do Conselho, relativa à harmonização das legislações dos Estados-Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios (Directiva 77/388/CEE, de 17.5.1977), as subvenções de funcionamento que cobrem uma parte das despesas de exploração (ajudas ao investimento, participação nas despesas gerais ou nas despesas correntes, despesas de pessoal) de um sujeito passivo, de modo que influenciam o preço de custo final dos seus produtos e serviços, mas sem poderem ser individualizadas em relação a um preço de operação, constituem um montante tributável?

2) A sua natureza tributável está subordinada à existência de uma prestação individualizável a favor da entidade pública que subsidia e a uma equivalência entre o benefício obtido por esta última e a contraprestação fornecida?

3) Na afirmativa, como deve ser determinado o valor do benefício obtido pela entidade pública que concede a subvenção?»

IV - Jurisprudência aplicável

9 A última frase do artigo 11._, A, n._ 1, alínea a), da directiva é retomada pelo advogado-geral F. G. Jacobs, em certas considerações interessantes, nas conclusões que apresentou no processo Landboden-Agrardienste (2):

«12 É possível afirmar, com alguma razão, que faz pouco sentido, se é que faz algum, tributar os subsídios com IVA. Desta forma, a autoridade pública recupera pura e simplesmente dinheiro concedido por ela ou por outra autoridade pública; neste último caso, a tributação de subsídios conduz indiscutivelmente a uma forma indirecta - e onerosa - de redistribuir rendimentos entre as autoridades públicas. [...]

13 Além disso e a menos que o montante recuperado no imposto seja compensado com o aumento correspondente do montante do subsídio, a tributação reduzirá os efeitos económicos pretendidos com a concessão do subsídio. Se o beneficiário pode optar entre vender a sua produção e aceitar um subsídio em troca da sua não comercialização, a tributação do subsídio torná-lo-á menos atractivo.

14 A Sexta Directiva prevê a tributação dos subsídios só em termos limitados. O artigo 11._, parte A, n._ 1, alínea a), inclui na matéria colectável as `subvenções directamente relacionadas com o preço' das operações. Assim, o subsídio será incluído na matéria colectável se o seu pagamento estiver sujeito à condição de o beneficiário fornecer bens ou serviços. Por exemplo, uma medida de ajuda através da qual um agricultor recebe um certo montante por cada produto vendido faz parte da contrapartida pelo fornecimento. Pelo contrário, os subsídios menos relacionados com os fornecimentos concretos e mais vocacionados para o melhoramento da situação económica das empresas não fazem parte da matéria colectável. Exemplos desse tipo de subsídios são os que se destinam à aquisição de bens, à cobertura dos prejuízos e à reestruturação de uma empresa.

15 A distinção operada pela Sexta Directiva levanta algumas dificuldades. Como a Comissão observou no seu primeiro relatório [sobre a aplicação da directiva]:

`O artigo 11._, A, n._ 1, alínea a), da directiva determina que as subvenções recebidas por um sujeito passivo e que estejam 'directamente relacionadas com o preço' das operações por ele efectuadas devem ser incluídas na matéria colectável, a título de elementos do preço pagos por terceiros. Embora, numa primeira análise, seja relativamente fácil de considerar como 'directamente relacionados com o preço' as subvenções cujo montante é determinado quer por referência ao preço de venda dos bens ou dos serviços fornecidos, quer em função das quantidades vendidas, quer ainda em função do custo dos bens ou dos serviços oferecidos ao público gratuitamente, subsistem as maiores dúvidas no que respeita a outros tipos de subvenções, como as ditas de equilíbrio ou ditas de funcionamento, cujo pagamento se destina a sanear a situação económica de uma empresa e que são concedidas sem referência explícita a um qualquer preço. A ausência de uma distinção essencial entre estes dois tipos de subvenções (tendo as que estão 'directamente relacionadas com o preço' na maior parte dos casos também uma finalidade de saneamento), associada ao facto de um Estado-Membro poder converter uma subvenção do primeiro tipo numa subvenção do segundo, ilustra a fragilidade de uma distinção baseada em critérios puramente formais (a forma como o subsídio é concedido) e, consequentemente, a formulação inadequada da directiva nesta matéria.'

16 No entanto, o tratamento reservado às subvenções pela Sexta Directiva pode considerar-se conforme com a regra geral segundo a qual deve existir uma relação directa entre o fornecimento e a contrapartida. Esse tratamento também se poderá justificar pelo facto de os subsídios concedidos com referência a fornecimentos específicos produzirem, provavelmente, um impacto mais directo sobre a concorrência. Pelo menos à primeira vista, os argumentos no sentido de integrar este tipo de subvenções no preço pago pelo consumidor (ou por conta deste) parecem prevalecer.»

10 O Tribunal de Justiça debruçou-se, em dois casos, sobre a sujeição a IVA de certas subvenções pagas a particulares pelas autoridades públicas. Tanto no acórdão Mohr (3) como acórdão Landboden-Agrardienste (4) tratava-se de uma remuneração paga aos produtores agrícolas os quais, em troca de tal remuneração, se comprometiam a reduzir a sua produção. O Tribunal de Justiça confirmou nestes acórdãos que uma remuneração paga pelos poderes públicos no interesse geral pode constituir uma contrapartida de um serviço, na acepção da directiva. «Assim e para determinar se uma prestação de serviços cabe no âmbito de aplicação da Sexta Directiva, importa examinar a transacção à luz dos objectivos e das características do sistema comum de IVA» (5). Em certos casos, todavia, «o produtor agrícola não fornece serviços a um consumidor identificável nem uma vantagem susceptível de ser considerada como um elemento constitutivo do custo da actividade de outra pessoa na cadeia comercial» (6).

11 A segunda questão a decidir no presente processo é a de saber o que deve ser entendido por contrapartida. Segundo uma jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, «esta contrapartida constitui o valor `subjectivo', ou seja, efectivamente cobrado em cada caso concreto, e não um valor calculado segundo critérios objectivos» (7).

12 No caso de uma subvenção, conclui-se rapidamente pela existência de um valor subjectivo. O que é mais interessante determinar é a questão de saber se este valor subjectivo também constitui a contrapartida de um fornecimento de bens ou de uma prestação de serviços. O que está então em causa é o nexo directo. Segundo uma jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, «uma prestação de serviços só é tributável se existir um nexo directo entre o serviço prestado e a contrapartida recebida» (8). Do acórdão Tolsma pode retirar-se um bom exemplo da interpretação que o Tribunal de Justiça faz da noção de «nexo directo». Passo a citar: «Deste modo, quando um músico que toca na via pública recebe contribuições dos passantes, estas receitas não podem ser consideradas como constituindo a contrapartida de um serviço prestado a estes últimos» (9). Não há, com efeito, qualquer contrato entre as partes, nem nexo necessário entre a operação e o pagamento. O pagamento é, de facto, autónomo relativamente ao prazer proporcionado pela prestação musical.

13 Remete-se também para o acórdão Apple and Pear Development Council (10). Este processo respeitava a uma organização que tinha por missão fazer publicidade, conduzir acções de promoção e melhorar a qualidade das maçãs e pêras produzidas em Inglaterra e no País de Gales. Esta missão é comparável à do OPW. Os rendimentos do Council provinham, porém, de contribuições pagas pelos produtores em questão. O Tribunal de Justiça considerou que «contribuições obrigatórias tais como as impostas aos produtores não constituem um contravalor que tenha um nexo directo com as vantagens que têm os produtores individuais devido ao exercício das suas funções pelo Council» (11). Saliente-se que não se tratava, nesse caso, de subvenções. O Tribunal de Justiça devia determinar se a contribuição paga pelos produtores poderia ser considerada como uma contrapartida do serviço que lhes era prestado.

14 O advogado-geral Sir Gordon Slynn entendeu, nas suas conclusões, que era importante o facto de o Council ter sido criado no interesse geral e de as contribuições se destinarem a cobrir as despesas administrativas e outras associadas a uma série de actividades.

15 O acórdão First National Bank of Chicago (12) fornece esclarecimentos sobre a força do nexo entre a operação e a contrapartida quanto a dois aspectos. Este processo respeita a uma comissão facturada pelo banco por operações cambiais. Tal comissão é constituída por uma margem entre o preço de compra e o preço de venda das divisas. Não é necessário, em primeiro lugar, que exista um nexo identificável entre a operação (a operação cambial) e a contrapartida exigida em troca da mesma. O Tribunal de Justiça admitiu que «a contrapartida, isto é, o montante de que o banco pode efectivamente dispor por sua própria conta, é constituída pelo resultado bruto das suas operações ao longo de um dado período» (13). Em segundo lugar, «a possibilidade de tributar uma transacção também não requer o conhecimento, nem pelo sujeito passivo que entrega os bens ou executa o serviço nem pela outra parte na transacção, do montante exacto da contrapartida que constitui a matéria colectável» (14).

V - Apreciação

A - Observações preliminares

16 Não é óbvio incluir, num regime de IVA, uma disposição que dispõe que as subvenções estão sujeitas a IVA. Tal como o advogado-geral F. G. Jacobs sublinhou, com razão, nas conclusões que apresentou no processo Landboden-Agrardienste (15), as autoridades públicas tiram assim com uma mão uma percentagem do que deram com a outra. O argumento avançado pela Comissão para justificar a sua posição segundo a qual certas subvenções estão sujeitas a IVA, nomeadamente porque influenciam a concorrência, também não é muito convincente. O exercício de influência sobre a concorrência é uma característica geral das subvenções concedidas aos operadores económicos. Para evitar os efeitos indesejáveis sobre a concorrência, o Tratado CE dispõe, no seu artigo 87._ (que passou, após alteração, a artigo 83._ CE) e nos artigos seguintes um regime de controlo (preventivo) por parte da Comissão. Por que razão deveria haver, além disso, uma sujeição a IVA quanto a certas formas de subvenções? Acresce ainda que os efeitos decorrentes da cobrança do IVA são limitados. O facto de saber que o IVA deve ser deduzido da subvenção pode levar quem a concede a adicionar-lhe uma certa percentagem para compensar este IVA.

17 O legislador comunitário optou, em todo o caso, pela sujeição a IVA de certas subvenções. Assim sendo, há que encontrar uma explicação para o critério «subvenções directamente relacionadas com o preço de tais operações», que tem por consequência a possibilidade de a cobrança ser feita de modo eficaz. Todavia, na prática, o critério previsto pela directiva nem sempre é racional. Independentemente da explicação dada pelo Tribunal de Justiça, a entidade que concede a subvenção será sempre tentada a dar-lhe uma forma tal que não corresponda ao critério. Desse modo, não será devido o IVA. Noutra hipótese, se um Estado-Membro conceder uma subvenção que esteja efectivamente «directamente relacionada com o preço», aumentará o montante da subvenção de modo a que o beneficiário não seja desfavorecido pela cobrança do IVA. Sublinhe-se, a título superabundante, que a Comissão indicou que tencionava apresentar uma proposta de alteração da directiva quanto a este aspecto.

18 Todavia, o Tribunal de Justiça está, naturalmente, vinculado pelo texto da directiva na sua redacção actual. A interpretação do artigo 11._, A, n._ 1, alínea a), da directiva deve estabelecer uma distinção entre dois tipos de subvenção:

- antes de mais, as subvenções que devem ser directamente associadas a uma actividade económica do beneficiário e que implicam, assim, uma redução do preço de um bem ou de um serviço, e

- depois, as subvenções que não devem ser associadas a uma actividade económica determinada.

Para poder estabelecer esta distinção, há que examinar o beneficiário em termos de economia de empresa. Deste modo assegura-se, na medida do possível, o efeito útil da disposição. Não é a forma da subvenção que é determinante, mas sim as suas consequências ao nível da empresa.

B - Primeira questão

Argumentação das partes

19 O OPW, o Governo belga, o Governo francês e a Comissão apresentaram as suas observações ao Tribunal de Justiça. Na audiência de 22 de Março de 2001, o OPW, o Governo belga e a Comissão expuseram a sua posição. Todas as partes concordam em que não basta um nexo indirecto com o preço para que uma subvenção seja tributável.

20 O OPW sustenta que as subvenções concedidas no caso em apreço não estão sujeitas a IVA. Trata-se de subvenções de funcionamento que não podem ser associadas a uma operação tributável individualizável, por um lado, porque não existe nexo directo entre a operação tributável (o fornecimento de bens e a prestação de serviços) e a subvenção e, por outro lado, porque a subvenção só aproveita ao consumidor de forma indirecta.

21 O critério do «nexo directo» exige que a subvenção seja calculada em função de um preço de referência correspondente ao preço que o beneficiário teria cobrado pelos bens e serviços. A subvenção tem como efeito a facturação ao cliente de um preço mais baixo.

22 O litígio no processo principal respeita, porém, a uma subvenção que visa promover uma região. A missão dos beneficiários é atingir tal objectivo. A subvenção não está directamente associada ao preço, visando, pelo contrário, as despesas de exploração, não tendo senão um efeito indirecto sobre o preço.

23 O Governo belga distingue três tipos de subvenções. O primeiro tipo de subvenção tem a intervenção de três partes: a autoridade que paga a subvenção, o beneficiário e o cliente do beneficiário. Alega que, neste tipo de subvenção, a condição do nexo directo não implica que o montante da subvenção esteja necessariamente relacionado com o preço de cada operação subvencionada ou com o volume de tais operações. O montante da subvenção pode assim ser fixo ou pré-estabelecido. O beneficiário tem a possibilidade de limitar as suas despesas e, desse modo, de oferecer preços mais baixos.

24 No caso do segundo tipo de subvenção, existe um nexo bilateral entre a autoridade que a paga e o beneficiário. A autoridade é, neste caso, o cliente que compra os bens ou serviços. Há sempre sujeição a IVA neste caso.

25 O terceiro tipo de subvenção respeita às subvenções de funcionamento, que abrangem as subvenções destinadas a financiar certas actividades. O Governo belga sustenta que todas as subvenções de funcionamento influenciam o preço dos bens e serviços fornecidos a terceiros. A influência indirecta que esta subvenção exerce sobre os bens e serviços não é, todavia, suficiente para justificar a cobrança do IVA. A questão de saber se a subvenção está, assim, sujeita a IVA depende da apreciação da matéria de facto.

26 O Governo belga explicou na audiência que a exigência de um nexo directo e identificável entre a subvenção e o preço terá por consequência que quase todas as subvenções de funcionamento escaparão à cobrança do IVA.

27 O Governo belga retira depois um paralelo com o caso que deu origem ao acórdão Naturally Yours Cosmetics (16). A este propósito, considera importante que a subvenção concedida ao OPW tenha sido reduzida, uma vez que o OPW não tinha publicado a revista Wallonie Nouvelle em conformidade com as condições estipuladas na convenção-quadro.

28 O Governo francês formula dois critérios para a existência de um nexo directo entre a operação tributável (o fornecimento de bens e a prestação de serviços) e a subvenção. Antes de mais, a subvenção deve ser concedida relativamente a operações tributáveis que o beneficiário realiza em benefício dos seus clientes. Em segundo lugar, a subvenção deve estar relacionada com o preço ou a contribuição recebida pelo cliente. Este governo deduz do acórdão First National Bank of Chicago (17) que basta um nexo global entre a subvenção e o preço.

29 A Comissão declara que a subvenção deve ser paga com vista ao fornecimento de um bem ou serviço determinado. Uma subvenção de funcionamento que apenas influencia o preço indirectamente não está sujeita a IVA. Segundo a Comissão, aplicam-se três condições: a subvenção deve ser paga à pessoa que fornece os bens ou serviços; deve ser paga por um terceiro; e deve constituir a contrapartida de um bem ou serviço, ou um elemento dela.

30 A questão de saber se a subvenção constitui um elemento da contrapartida deve ser apreciada casuisticamente. É ao órgão jurisdicional nacional que compete apreciar a matéria de facto. Na audiência, a Comissão citou ainda um exemplo de factos que podem ser relevantes. Poderia admitir-se a existência de um nexo directo no caso de se demonstrar claramente que a redução da subvenção em 1996 resultou na venda da revista Wallonie Nouvelle, no ano seguinte, a um preço mais elevado.

Apreciação

31 A questão do órgão jurisdicional de reenvio respeita ao alcance da noção de «subvenções directamente relacionadas com o preço das operações». A questão que se coloca mais especificamente é a de saber se estão sujeitas a IVA as subvenções de funcionamento que não são pagas directamente pelo fornecimento de bens ou de serviços, mas que podem ter por consequência poderem os bens ou serviços ser vendidos a um preço inferior.

32 Antes de mais, gostaria de salientar duas condições de aplicação do artigo 11._, A, n._ 1, alínea a), que podem ser deduzidas dos acórdãos Mohr e Landboden-Agrardienste (18). O beneficiário deve fornecer, contra pagamento, bens ou serviços a um consumidor ou a outro operador do circuito económico. Constata-se, em segundo lugar, que a questão do órgão jurisdicional de reenvio respeita a uma subvenção paga em benefício de actividades de terceiros e não ao pagamento de um bem ou serviço. O caso em apreço distingue-se, neste aspecto, do processo Apple and Pear Development Council (19), que respeitava à questão de saber se uma contribuição devia ser considerada como um pagamento.

33 No caso de uma subvenção, basta a existência de um nexo com o preço de um bem ou serviço menos estreito do que no caso de um pagamento. De qualquer modo, não é necessário ter em conta, quando a subvenção é concedida, o preço dos bens ou serviços a fornecer. É o que deduzo, nomeadamente, do acórdão First National Bank of Chicago (20). O preço da operação não deve ter qualquer relevo no âmbito da concessão da contrapartida, no caso em apreço, da subvenção. A autoridade que concede a subvenção não tem qualquer necessidade de saber o preço de tal operação. Também por esta razão, considero a tese do OPW incorrecta quanto a este aspecto.

34 Nas conclusões que apresentou no processo Landboden-Agrardienste (21), o advogado-geral F. G. Jacobs cita alguns exemplos de subvenções que não têm nexo directo com o preço de uma actividade. Trata-se de subvenções com vista à aquisição de elementos do activo, à cobertura de prejuízos e à reestruturação da empresa. Não há dúvidas de que, nestes exemplos, não existe qualquer relação directa com o preço. A situação é menos clara no caso de subvenções de funcionamento. Com efeito, se o funcionamento de uma organização é pago, em parte, pelas autoridades públicas, é possível reduzir os custos da produção.

35 Para responder à questão do órgão jurisdicional de reenvio, considero decisivo determinar se as subvenções de exploração devem ser directamente associadas a uma actividade económica determinada do beneficiário, que consiste no fornecimento de um bem ou serviço. Será esse o caso se as subvenções implicarem uma diminuição do preço de um bem ou de um serviço que o beneficiário fornece ao consumidor, ou se delas resultar um aumento da quantidade de bens e serviços fornecidos. Uma subvenção de funcionamento pode, assim, ter como consequência que o beneficiário produz uma maior quantidade, sabendo que parte dos riscos são assumidos pela autoridade que concede a subvenção.

36 Para determinar se existe uma influência directa sobre o preço ou sobre a quantidade, podem ser relevantes, nomeadamente, os seguintes elementos:

- Se o fornecimento de bens ou serviços aos consumidores constitui uma actividade principal do beneficiário, é mais fácil presumir que a subvenção tem influência directa sobre o preço ou a quantidade.

- Se a subvenção é concedida tendo em conta as despesas fixas do beneficiário, não se pode concluir tão depressa pela existência de uma influência directa como no caso de a subvenção ser afecta à cobertura de despesas variáveis associadas às actividades efectivamente exercidas pelo beneficiário.

- A intenção da autoridade que concede a subvenção. Haverá mais tendência a constatar a existência de uma influência directa se a autoridade que concede a subvenção visa precisamente, através desta, promover o fornecimento de bens ou serviços (a um preço razoável). O fornecimento de bens ou serviços pode até ser uma condição da concessão da subvenção.

- Do mesmo modo, falar-se-á mais de influência directa se for necessário estabelecer uma relação matemática entre a evolução do montante da subvenção, a quantidade produzida e a evolução do preço dos bens ou serviços em questão.

37 Há que apreciar, à luz das circunstâncias do caso em apreço, se uma subvenção de funcionamento implica uma diminuição do preço ou um aumento da quantidade de bens ou serviços fornecidos pelo beneficiário da subvenção. Esta apreciação deve basear-se, sobretudo, em considerações respeitantes à economia da empresa. Em caso de dúvida, o relatório de um contabilista pode fornecer a solução.

C - Segunda e terceira questões

38 No fundo, estas duas questões não decorrem directamente do litígio no processo principal, como o OPW e o Governo belga sustentam nas observações que apresentaram ao Tribunal de Justiça. Como se pode constatar à luz das informações de que o Tribunal de Justiça dispõe, o OPW não fornece qualquer serviço à Região da Valónia em contrapartida da subvenção que lhe é paga.

39 Se a leitura dos factos que faço é correcta, o Tribunal de Justiça não deve responder à segunda e à terceira questões. É certo que a determinação das questões colocadas ao Tribunal de Justiça cabe no âmbito dos poderes discricionários do órgão jurisdicional de reenvio, em conformidade com o artigo 234._, segundo parágrafo, CE, mas decorre da jurisprudência constante do Tribunal de Justiça - nomeadamente do acórdão Butterfly Music (22) - que o Tribunal de Justiça rejeita o pedido de um órgão jurisdicional se for manifesto que a interpretação do direito comunitário que lhe é pedida não tem qualquer nexo directo com o litígio real ou com o objecto do litígio no processo principal.

40 Todavia, se o Tribunal de Justiça entender que as segunda e terceira questões têm efectivamente um nexo com o litígio no processo principal, há que ter em conta os seguintes elementos. Tal como a Comissão, entendo que, na situação descrita pelo órgão jurisdicional de reenvio, não se trata de uma subvenção, mas sim do pagamento de um serviço fornecido às autoridades públicas. Este serviço pode consistir, nomeadamente, no facto de o OPW publicar a revista Wallonie Nouvelle por conta ou, pelo menos, em benefício da Região da Valónia. O pagamento feito pela Região da Valónia é a própria contrapartida (preço da operação) e não uma subvenção associada ao preço. Tal pagamento está sujeito a IVA. O artigo 11._, A, n._ 1, primeiro período, da Sexta Directiva não se aplica a tal pagamento.

Conclusão

À luz dos elementos anteriores, proponho ao Tribunal de Justiça que responda do seguinte modo às questões prejudiciais do Tribunal de première instance de Charleroi:

«1) Quanto à primeira questão:

Nos termos do artigo 11._, A, da Sexta Directiva 77/388/CEE do Conselho, de 17 de Maio de 1977, relativa à harmonização das legislações dos Estados-Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios - Sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado: matéria colectável uniforme, as subvenções que cobrem uma parte dos custos de funcionamento de um sujeito passivo são tributáveis, na medida em que tais subvenções estejam directamente associadas a uma actividade económica determinada do beneficiário e impliquem, desse modo, uma diminuição do preço de um bem ou de um serviço que o beneficiário fornece a um consumidor ou um aumento da quantidade dos bens ou serviços fornecidos. É à luz das circunstâncias do caso que se deve apreciar se uma subvenção de funcionamento implica uma diminuição do preço ou um aumento da quantidade. Esta apreciação deve basear-se, sobretudo, em considerações respeitantes à economia da empresa.

2) Quanto às segunda e terceira questões:

Não é necessário responder a estas duas questões, uma vez que não têm qualquer nexo com o objecto do litígio no processo principal.

Não partilhando o Tribunal de Justiça da minha opinião, a sua resposta às questões pode ser apresentada do seguinte modo: na situação descrita pelo órgão jurisdicional de reenvio, não se trata de uma subvenção, mas sim do pagamento de um serviço fornecido às autoridades públicas. Tal pagamento está sujeito a IVA.»

(1) - JO L 145, p. 1; EE 09 F1 p. 54.

(2) - Acórdão de 18 de Dezembro de 1997 (C-384/95, Colect., p. I-7387).

(3) - Acórdão de 29 de Fevereiro de 1996 (C-215/94, Colect., p. I-959).

(4) - Já referido na nota 3.

(5) - Acórdão Landboden-Agrardienste, já referido na nota 3, n._ 21.

(6) - Acórdão Landboden-Agrardienste, já referido na nota 3, n._ 23.

(7) - V., nomeadamente, o acórdão de 24 de Outubro de 1996, Elida Gibbs (C-317/94, Colect., p. I-5339, n._ 27).

(8) - Acórdão de 3 de Março de 1994, Tolsma (C-16/93, Colect., p. I-743, n._ 13).

(9) - Acórdão já referido na nota 9, n.os 16 e segs.

(10) - Acórdão de 8 de Março de 1988 (102/86, Colect., p. 1443).

(11) - Acórdão já referido na nota 11, n._ 16.

(12) - Acórdão de 14 de Julho de 1998 (C-172/96, Colect., p. I-4387).

(13) - N._ 47.

(14) - N._ 49.

(15) - Já referido na nota 3.

(16) - Acórdão de 23 de Novembro de 1988 (230/87, Colect., p. 6365). Este acórdão respeitava ao fornecimento de um «produto de incitamento» com vista à organização de reuniões durante as quais tais produtos podiam ser comprados.

(17) - Já referido na nota 13.

(18) - Já referidos nas notas 3 e 4.

(19) - Já referido na nota 11.

(20) - V. o n._ 15 das presentes conclusões.

(21) - V. o n._ 9 das presentes conclusões.

(22) - Acórdão de 29 de Junho de 1999 (C-60/98, Colect., p. I-3939, n._ 13).