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Advertência jurídica importante

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62001C0384

Conclusões do advogado-geral Alber apresentadas em 10 de Outubro de 2002. - Comissão das Comunidades Europeias contra República Francesa. - Incumprimento de Estado - Sexta Directiva IVA - Artigo 12.º, n.º 3, alíneas a) e b) - Fornecimento de gás e de electricidade pelas redes públicas - Adesão às redes de distribuição - Taxa reduzida. - Processo C-384/01.

Colectânea da Jurisprudência 2003 página I-04395


Conclusões do Advogado-Geral


I - Introdução

1. A República Francesa alterou em 1998 a legislação relativa ao imposto sobre o valor acrescentado aplicável ao fornecimento de electricidade e de gás natural. Aplicou à subscrição, isto é, o montante certo a pagar pela adesão às redes de fornecimento durante um determinado período de tempo e que engloba ainda outras despesas fixas, a taxa reduzida de imposto sobre o valor acrescentado. Quanto ao mais, isto é, o montante variável a pagar em função do consumo, manteve a aplicabilidade da taxa normal. A Comissão imputa à França, no âmbito da presente acção por incumprimento, por um lado, não lhe ter transmitido devidamente e/ou totalmente as informações relativas à alteração que lhe incumbem prestar por força da Sexta Directiva IVA . Por outro lado, considera que a aplicação de taxas de imposto sobre o valor acrescentado diferenciadas para as duas prestações do conjunto da operação é inconciliável com o disposto na directiva.

II - Enquadramento jurídico

2. O artigo 12.° , n.° 3, alínea a), da Sexta Directiva dispõe:

«Os Estados-Membros fixarão a taxa normal do imposto sobre o valor acrescentado sob a forma de uma percentagem da matéria colectável, igual para o fornecimento de bens e a prestação de serviços. [...]

Os Estados-Membros podem igualmente aplicar uma ou duas taxas reduzidas. Essas taxas serão fixadas sob a forma de uma percentagem da matéria colectável que não pode ser inferior a 5% e serão aplicáveis ao fornecimento de bens e à prestação de serviços das categorias referidas no anexo H.»

3. O artigo 12.° , n.° 3, alínea b), da Sexta Directiva prevê ainda o seguinte:

«Os Estados-Membros podem aplicar uma taxa reduzida aos fornecimentos de gás natural e de electricidade, desde que não exista o risco de distorção da concorrência. Um Estado-Membro que pretenda aplicar essa taxa deve previamente informar a Comissão, que decidirá se existe ou não o risco de distorção da concorrência. Caso a Comissão não tome uma decisão no prazo de três meses a contar da recepção da informação, considera-se que não existe esse risco.»

4. O artigo 29.° da Loi de finance (lei das finanças francesa) n.° 98-1266 para 1999 determina, designadamente, que as subscrições para os fornecimentos de electricidade e de gás natural, distribuídos através de redes públicas, ficam sujeitos a uma taxa reduzida de imposto sobre o valor acrescentado, de 5,5%. Quanto ao mais, isto é, o montante variável a pagar em função do consumo, mantém-se a aplicabilidade da taxa normal de 19,60%, prevista no artigo 278.° do Code général des impôts (Código Geral dos Impostos).

III - Matéria de facto e tramitação processual

5. O Ministro da Economia, Finanças e Indústria francês informou a Comissão, por carta datada de 8 de Julho de 1998, do propósito de, nos termos do artigo 12.° , n.° 3, alínea a), da Sexta Directiva, aplicar ao montante da subscrição de adesão à rede de fornecimento de gás e de electricidade (l'abonnement aux réseaux de distribution de gaz et d'électricité) a taxa reduzida, de modo a estimular o consumo e de aumentar o poder de compra das famílias, em especial das mais desfavorecidas em termos sociais.

6. A Comissão interpretou esta carta como tratando-se da notificação a que alude o artigo 12.° , n.° 3, alínea b), da Sexta Directiva, tendo solicitado às autoridades francesas, por carta datada de 31 de Julho de 1998, a prestação de informações adicionais acerca das condições de execução da medida.

7. O ministério respondeu, por carta datada de 7 de Setembro de 1998, referindo que o montante da subscrição é parte da contrapartida devida pelos fornecimentos de gás e electricidade. Segundo o ministério, uma vez que a redução se aplica de igual modo a todas as empresas fornecedoras, está excluída a hipótese de distorção da concorrência.

8. A Comissão, por nova carta de 7 de Dezembro de 1998, exprimiu dúvidas quanto à argumentação da França, visto o montante da subscrição não se destinar verdadeiramente a pagar o consumo de energia, e solicitou às autoridades francesas que explicassem mais pormenorizadamente este aspecto, o que essas autoridades não fizeram.

9. O parlamento francês aprovou a lei em causa no dia 30 de Dezembro de 1998. Foi publicada no dia 31 de Dezembro de 1998 e entrou em vigor no dia 2 de Janeiro de 1999 .

10. No dia 22 de Outubro de 1999, a Comissão notificou a França, nos termos do artigo 226.° CE. Uma vez que não obteve resposta, remeteu à República Francesa, em 13 de Junho de 2000, um parecer fundamentado. A posição das autoridades francesas de 7 de Agosto de 2000 não convenceu a Comissão que, em 5 de Outubro de 2001, intentou uma acção por incumprimento, nos termos do artigo 226.° CE.

11. A Comissão pede que o Tribunal de Justiça se digne:

- declarar que, ao aplicar uma taxa reduzida de IVA à parte fixa dos preços dos fornecimentos de gás e de electricidade efectuados pelas redes públicas, a República Francesa não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 12.° , n.° 3, alíneas a) e b), da Sexta Directiva 77/388/CEE do Conselho, de 17 de Maio de 1977, relativa à harmonização das legislações dos Estados-Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios - Sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado: matéria colectável uniforme;

- condenar a República Francesa na totalidade das despesas.

12. A República Francesa pede que o Tribunal de Justiça se digne:

- julgar a acção improcedente;

- condenar a Comissão na totalidade das despesas.

13. Não se realizou audiência oral.

IV - Argumentos das partes

A - Comissão

14. Tal como resulta da fundamentação da petição inicial, a Comissão imputa à República Francesa duas violações da Sexta Directiva. Considera, por um lado, que a França introduziu a taxa reduzida sem que tivesse sido devidamente cumprido o processo de notificação previsto no artigo 12.° , n.° 3, alínea b), da Sexta Directiva. Por outro lado, a Comissão considera que a legislação relativa ao imposto sobre o valor acrescentado não é, do ponto de vista substantivo, conciliável com o estatuído no artigo 12.° , n.° 3, alíneas a) e b), da Sexta Directiva.

15. De acordo com a interpretação da Comissão, o prazo previsto no artigo 12.° , n.° 3, alínea b), quarto período, da Sexta Directiva, foi novamente interrompido através do segundo pedido de informações, remetido em 7 de Dezembro de 1998. A França não podia, por isso, presumir o deferimento tácito da Comissão relativamente à medida e não podia, consequentemente, executá-la.

16. O segundo pedido de informações não foi abusivo e não se destinava a protelar o processo. Sucede que a Comissão necessitava de mais informações, a fim de poder apreciar a influência da medida ao nível da concorrência intracomunitária e de poder tomar uma decisão devidamente fundamentada na acepção do artigo 253.° CE.

17. A acusação de violação material da Comissão assenta numa fundamentação com alternativa.

18. Se por montante da subscrição se considerar o pagamento de um serviço distinto do fornecimento de energia, então não se lhe aplica o artigo 12.° , n.° 3, alínea b), da Sexta Directiva, que prevê a possibilidade de os Estados-Membros aplicarem uma taxa reduzida aos fornecimentos de energia. Nesse caso, também não se está perante nenhuma das outras situações em que se permite a aplicação de taxa reduzida, previstas nos termos conjugados do artigo 12.° , n.° 3, alínea a), e do anexo H, ambos da Sexta Directiva.

19. Por outro lado, se se considerar o montante da subscrição como sendo parte da contrapartida devida pelo fornecimento de energia, então a medida viola o princípio contido no artigo 12.° , n.° 3, alínea a), da Sexta Directiva, nos termos do qual devem ser aplicadas taxas iguais para prestações iguais. Este princípio é, por sua vez, uma decorrência do princípio da neutralidade fiscal.

20. A legislação conduz a um tratamento desigual entre vários grupos de consumidores. Ao consumidor que tiver optado por um modelo tarifário de subscrição mais elevada, mas com preço de consumo mais reduzido, será aplicada em média uma taxa de imposto sobre o valor acrescentado mais reduzida do que ao consumidor que tiver optado por um modelo tarifário de subscrição mais reduzida, mas com preço de consumo mais elevado.

B - Governo francês

21. O Governo francês entende que forneceu à Comissão todas as informações necessárias logo após o primeiro pedido nesse sentido. A Comissão, para redigir a fundamentação com alternativa de violação da directiva, não necessitou de informações adicionais. Segundo o Governo francês, não se compreende por que razão as informações foram suficientes para se poder intentar uma acção por incumprimento e não o foram para permitir uma tomada de decisão nos termos do artigo 12.° , n.° 3, alínea b), da Sexta Directiva.

22. O facto de as autoridades francesas não terem respondido ao segundo pedido de informações da Comissão, datado de 7 de Dezembro de 1998 - que, do seu ponto de vista, era desnecessário -, não viola o artigo 12.° , n.° 3, alínea b), da Sexta Directiva. Este pedido não interrompeu o prazo dentro do qual a Comissão se podia opor à adopção da taxa reduzida . Nessa medida, o prazo terminou no dia 7 de Dezembro de 1998, ou seja, três meses após a recepção pela Comissão da carta do Governo francês, devendo-se considerar a medida tacitamente deferida.

23. O Governo francês só a título subsidiário contesta a acusação assente na violação material da directiva. Sempre referiu que a subscrição constitui a contrapartida pelos fornecimentos de gás natural e de electricidade e não por outra prestação de serviços.

24. Também não se violou o princípio da uniformidade da taxa para prestações iguais. O fornecimento de energia através de redes públicas é composto por várias prestações diferentes, às quais se podem aplicar taxas distintas. Por um lado, permite-se ao cliente aderir à rede, sendo-lhe facultada a possibilidade de, através dela, receber gás e/ou electricidade. Por outro, é fornecida uma determinada quantidade de energia, cobrando-se em função do consumo.

25. O Governo francês entende que a acusação de discriminação entre vários grupos de consumidores deve ser considerada inadmissível, uma vez que não constava do parecer fundamentado. As empresas Gaz de France (GDF) e Électricité de France (EDF) aplicam valores de subscrição diferentes em função da ordem de grandeza do consumo e da voltagem, o tipo de cliente (clientes particulares, clientes institucionais, pequenas indústrias e indústrias) e, ainda, dentro de cada tipo de cliente, consoante o modelo tarifário escolhido. O exemplo apresentado pela Comissão não é, por isso, susceptível de demonstrar a existência de discriminação.

V - Apreciação jurídica

A - Violação do processo de notificação

26. O artigo 12.° , n.° 3, alínea b), da Sexta Directiva concede aos Estados-Membros a possibilidade de aplicarem aos fornecimentos de gás natural e de electricidade uma taxa reduzida de imposto sobre o valor acrescentado, desde que não exista o risco de distorção da concorrência.

27. O Estado-Membro tem de informar a Comissão antes da aplicação da redução. A Comissão toma uma decisão expressa ou deixa esgotar o prazo de três meses sem tomar a decisão. Neste último caso, presume-se que não existe risco de distorção da concorrência.

28. O artigo 12.° , n.° 3, alínea b), da Sexta Directiva não contém outras regras processuais para além destas. A disposição não proíbe expressamente - ao invés do que sucede no artigo 88.° , n.° 3, terceiro período, CE, a propósito de regulamentação semelhante aplicável aos auxílios de Estado - que as reduções entrem em vigor antes de ser proferida uma decisão da Comissão ou antes de ter decorrido o prazo de três meses.

29. Contudo, uma interpretação da disposição assente no effet utile permite presumir a existência de uma tal proibição de execução. Caso o Estado-Membro pudesse aplicar a taxa reduzida ainda antes de a Comissão tomar uma decisão, então poderiam ter lugar distorções da concorrência que a Comissão só posteriormente viria porventura a verificar existirem. Para além disso, caso a Comissão se opusesse à medida, o legislador nacional teria que revogar logo de seguida uma disposição que só recentemente entrou em vigor. Estas alterações legislativas implicariam transtornos inúteis para os contribuintes e para a administração fiscal e causariam uma considerável insegurança jurídica.

30. A favor desta interpretação também releva o facto de a medida ser considerada conforme às regras da concorrência caso a Comissão não se tenha pronunciado no prazo de três meses após a notificação. Esta ficção jurídica, ou este deferimento tácito atribuído à Comissão, visa garantir que o Estado-Membro não fique, durante um período de tempo excessivamente longo, numa situação indefinida quanto ao resultado da apreciação que a Comissão vai fazer. É de exigir ao Estado-Membro que não introduza a taxa reduzida antes de terem decorrido esses três meses que correspondem à duração máxima, em condições normais, do processo de apreciação.

31. A validade do que se acaba de expor não é afectada pelo facto de a alteração da taxa do imposto sobre o valor acrescentado aplicável ao fornecimento de energia ser uma decisão política de grande alcance, por causa do grande número de contribuintes abrangidos e dos efeitos substanciais ao nível do orçamento geral do Estado.

32. Por conseguinte, a República Francesa só devia ter aplicado a taxa reduzida de imposto sobre o valor acrescentado aplicável aos fornecimentos de gás natural e de electricidade, nos termos do artigo 12.° , n.° 3, alínea b), da Sexta Directiva, depois de a Comissão ter constatado que a medida não implica risco de distorção da concorrência ou depois de terem decorrido três meses, contados desde a prestação de informações à Comissão, sem que esta tenha tomado uma decisão. Tendo em conta que a Comissão não tomou nenhuma decisão de conteúdo positivo, a alteração da taxa do imposto sobre o valor acrescentado só pode ter sido introduzida sem a ocorrência de irregularidades processuais caso se tenha verificado esta segunda hipótese.

33. Por isso, cumpre analisar quando se iniciou a contagem do prazo de três meses e quando chegou o mesmo ao fim.

34. A Comissão parece partir do princípio de que a contagem do prazo se iniciou com a primeira prestação de informações, mas foi interrompida pelos dois pedidos de informações adicionais realizados em 31 de Julho de 1998 e em 7 de Dezembro de 1998, tendo de cada uma das vezes começado o prazo a contar de novo. De acordo com este entendimento, o prazo ainda não teria decorrido quando a lei fiscal entrou em vigor.

35. A Sexta Directiva não contém regras que determinem com exactidão quais as informações que os Estados-Membros têm de prestar no âmbito da notificação e quais os efeitos que a falta de informações completas produz sobre o decurso do prazo de decisão, caso a Comissão tenha de solicitar informações adicionais. Consequentemente, cumpre estabelecer, atendendo ao sentido e ao objectivo da norma, as linhas orientadoras relativas ao processo de prestação de informações, previsto no artigo 12.° , n.° 3, alínea b), que devem ser respeitadas.

36. Estas linhas orientadoras devem ter em consideração o princípio que impõe aos Estados-Membros e às instituições comunitárias deveres recíprocos de cooperação leal, que inspira, nomeadamente, o artigo 10.° CE . Para além disso, podem ser estabelecidos pontos de contacto com o processo de notificação relativamente a auxílios de Estado. Os interesses do Estado-Membro e da Comissão são, em ambos os processos, idênticos. No que toca ao regime jurídico da atribuição de auxílios, as consequências da notificação incompleta sobre o decurso do prazo para a tomada de decisão foram concretizadas primeiro pela jurisprudência e depois também pelo legislador.

37. Nesta medida, já antes da entrada em vigor do Regulamento (CE) n.° 659/1999 do Conselho, de 22 de Março de 1999, que estabelece as regras de execução do artigo 93.° do Tratado CE (actual artigo 88.° CE) (a seguir «Regulamento n.° 659/1999»), se reconhecia que só uma notificação completa é susceptível de provocar o início da contagem do prazo desenvolvido no acórdão Lorenz , para tomada de posição . Esta condição ganhou estatuto de direito positivo através do artigo 4.° , n.° 5, segunda frase, do Regulamento n.° 659/1999.

38. O artigo 4.° , n.° 5, terceira frase, do Regulamento n.° 659/1999 determina ainda que a notificação considerar-se-á completa se, no prazo de dois meses a contar da sua recepção ou da recepção de qualquer informação adicional, a Comissão não solicitar mais nenhuma informação.

39. Estes princípios desenvolvidos no âmbito do regime jurídico dos auxílios são igualmente aplicáveis à notificação prevista no artigo 12.° , n.° 3, alínea b), da Sexta Directiva. Só quando a Comissão dispõe de todas as informações necessárias à apreciação da questão de saber se a aplicação da taxa reduzida comporta ou não o risco de distorção da concorrência é que se inicia a contagem do prazo de três meses.

40. Como bem refere o advogado-geral F. G. Jacobs nas conclusões no processo Áustria/Comissão (C-99/98), a propósito do regime jurídico da atribuição de auxílios, a Comissão constata implicitamente o carácter incompleto de uma notificação ao dirigir ao Estado-Membro um pedido de prestação de informações adicionais . Caso a notificação não tenha sido efectivamente completa, o que compete ao Tribunal de Justiça apreciar , então a contagem do prazo não chegou sequer a iniciar-se e logo também não pode ser interrompida. Se a Comissão não solicitar informações adicionais dentro do prazo de três meses, então a informação deve ser considerada completa, nos termos do artigo 12.° , n.° 3, alínea b), da Sexta Directiva.

41. Importa, assim, analisar se a informação era completa, ou se podia ser considerada completa, de modo a que a contagem do prazo pudesse ter tido início.

42. A primeira comunicação do Governo francês, datada de 8 de Julho de 1998, não consubstancia uma informação completa. Só no final dessa carta, que é no essencial dedicada a outras questões relacionadas com o regime jurídico do imposto sobre o valor acrescentado, é que o Governo francês sucintamente comunicou o seu propósito de aplicar ao montante devido pela adesão à rede de fornecimento de gás e de electricidade a taxa reduzida de imposto sobre o valor acrescentado. O objectivo era incentivar o consumo e aumentar o poder de compra das famílias.

43. Para além disso, a comunicação fazia referência ao artigo 12.° , n.° 3, alínea a), da Sexta Directiva e não à regra efectivamente aplicável, contida na alínea b). Este lapso podia criar mal-entendidos. A Comissão podia ter presumido que a subscrição não deveria ser considerada um fornecimento de energia, mas sim uma prestação nos termos do artigo 12.° , n.° 3, alínea a), conjugado com o anexo H, ambos da Sexta Directiva.

44. A informação também não pode ser considerada completa, visto a Comissão ter, em 31 de Julho de 1998, solicitado informações adicionais.

45. Em 7 de Setembro de 1998, o Governo francês aditou informações aos elementos previamente fornecidos. Posteriormente, em 7 de Dezembro de 1998, a Comissão dirigiu-se novamente ao Governo francês. É duvidoso que esta carta deva ser considerada como um pedido de informações adicionais.

46. É verdade que a Comissão chama a atenção para o facto de a carta interromper novamente o prazo. Ou seja, a Comissão atribui à sua própria carta o efeito de um pedido de informações adicionais. Porém, a Comissão não coloca nenhuma questão concreta e não solicita nenhumas informações específicas, limitando-se a expor as suas reservas quanto à possibilidade de se poder considerar a subscrição como um fornecimento de energia, uma vez que ela não implica, em si mesma, qualquer consumo de energia. Refere, para além disso, que lhe parece que o artigo 12.° , n.° 3, alínea a), da Sexta Directiva tem igualmente de ser chamado à colação no âmbito da análise da questão.

47. O acórdão Áustria/Comissão permite concluir que uma carta, na qual a Comissão não pede esclarecimentos específicos sobre certo auxílio de Estado, não pode servir para prolongar artificialmente a fase de exame preliminar .

48. No âmbito da análise da carta, há ainda que ter em mente que a notificação tem, em primeira linha, de conter informações factuais relativas à medida interna prevista e dados acerca das condições do mercado em que se insere a prestação sobre a qual se vai aplicar a taxa reduzida. Já o Estado-Membro não tem qualquer obrigação de proceder a uma exposição jurídica acerca da qualificação da medida, uma vez que a apreciação jurídica da matéria de facto é tarefa da Comissão.

49. Assim, a carta do dia 7 de Dezembro de 1998 não deve ser considerada como um pedido de informações adicionais, pois a Comissão não solicita que lhe sejam fornecidas informações relativas à legislação nacional prevista ou à matéria de facto. O que a Comissão faz é solicitar ao Governo francês que se pronuncie acerca da classificação jurídica da subscrição enquanto parte do fornecimento de energia. A referência ao artigo 12.° , n.° 3, alínea a), da Sexta Directiva também não visa a obtenção de informações factuais, limitando-se a transmitir - de modo aliás muito vago - as considerações jurídicas da Comissão.

50. É verdade que é bastante duvidoso que o Governo francês tenha fornecido à Comissão todas as informações necessárias à apreciação da medida. Faltam, por exemplo, informações acerca dos mercados por ela abrangidos. Também não foram entregues elementos exactos relativos às tarifas praticadas em França para os fornecimentos de gás e de electricidade, designadamente acerca da proporção, no preço global do fornecimento de energia, entre o montante da subscrição e o valor a pagar em função do consumo.

51. É duvidoso o argumento do Governo francês de que as informações prestadas devem ser consideradas suficientes à luz dos objectivos da Sexta Directiva, uma vez que a Comissão, com base nessas mesmas informações, esteve em condições de intentar a presente acção por incumprimento. Os dois processos visam fins diferentes. Além disso, sempre se poderia entender que os deveres de prova da Comissão são menos intensos quando o Estado-Membro não colaborou na prestação de informações acerca da matéria de facto.

52. Sucede, contudo, que nem sequer é essencial saber se as informações que o Governo francês prestou à Comissão são ou não suficientes para efeitos de apreciação nos termos do artigo 12.° , n.° 3, alínea b), da Sexta Directiva. A Comissão não colocou questões concretas ao Governo francês das quais se pudesse presumir que necessitava de informações adicionais acerca da matéria de facto e que, por isso, considerava a comunicação incompleta. Era isto que impunha o princípio da cooperação leal.

53. O mero facto de a Comissão afirmar na sua carta que a mesma interrompe a contagem do prazo em nada altera esta apreciação. Se a Comissão pudesse, deste modo, influenciar o momento do início da contagem do prazo, então esvaziar-se-ia de conteúdo a regra que prevê que passados três meses se deve ficcionar a inexistência de distorções da concorrência. O que estaria em contradição com o objectivo desta mesma regra, que é impedir que os Estado-Membros fiquem numa situação de incerteza quanto à apreciação da medida prevista durante um período de tempo excessivamente longo.

54. Por conseguinte, a comunicação do Governo francês deve ser considerada completa a partir do momento em que prestou informações adicionais por carta de 7 de Setembro de 1998. Decorridos três meses após a sua recepção pela Comissão, haveria que presumir que não existe risco de distorção da concorrência.

55. A República Francesa podia então aplicar a taxa reduzida ao fornecimento de energia. Não procede a alegada violação das regras do procedimento de notificação previsto no artigo 12.° , n.° 3, alínea b), da Sexta Directiva.

B - Violação das disposições materiais do artigo 12.° , n.° 3, alíneas a) e b), da Sexta Directiva

1. Admissibilidade de uma fundamentação com alternativa

56. O pedido da Comissão assenta numa fundamentação com alternativa. De acordo com a primeira alternativa, a violação consiste no facto de o artigo 12.° , n.° 3, alínea a), conjugado com o anexo H, ou ainda outra disposição da Sexta Directiva, não prever a aplicação de uma taxa reduzida à subscrição de adesão à rede de fornecimento de gás natural e de electricidade, que é uma prestação distinta do fornecimento de energia em si mesmo.

57. Com a segunda alternativa, censura-se a violação do princípio da uniformidade da taxa do imposto sobre o valor acrescentado. Ainda que a Comissão também faça derivar este princípio do artigo 12.° , n.° 3, alínea a), da Sexta Directiva, a verdade é que com esta segunda alternativa censura-se uma violação do direito completamente distinta.

58. A Comissão faz depender a resposta à questão de saber qual destas duas alternativas é aplicável da resposta que for dada à questão prévia de saber se o valor da subscrição deve ser considerado uma parte do pagamento do fornecimento de energia ou o pagamento de uma prestação autónoma. A Comissão, na sua petição inicial, não deu preferência a nenhuma destas teses nem se debruçou acerca das indicações do Governo francês, prestadas no decurso da fase pré-contenciosa, nos termos das quais, segundo interpretação deste, a subscrição deve ser considerada parte do fornecimento de energia. Só na réplica é que a Comissão defendeu a interpretação de que a colocação à disposição do consumidor da rede pública de fornecimento é uma prestação autónoma e não uma parte do fornecimento de energia.

59. Coloca-se a questão de saber se esta forma de acusação assente num incumprimento de obrigações decorrentes do Tratado é suficientemente exacta, de modo a não prejudicar o direito de defesa do Governo francês. Apesar de o Governo francês não ter apresentado a respectiva impugnação, o Tribunal de Justiça não deixa, a título oficioso, de poder analisar esta questão relacionada com a admissibilidade.

60. A Comissão não hierarquizou expressamente as duas alternativas. Resulta, porém, do contexto dos seus argumentos que entende, em primeira linha, que a colocação à disposição da rede pública não deve ser encarada como um fornecimento de gás e de electricidade. Assim sendo, a questão da violação do princípio da uniformidade da taxa do imposto sobre o valor acrescentado só tem relevância caso o Tribunal de Justiça considere que a colocação à disposição da rede pública não consubstancia uma prestação autónoma, mas sim uma parte do fornecimento de energia. Nesta medida, a segunda alternativa deve ser considerada como tendo carácter subsidiário.

61. É admissível basear o incumprimento numa fundamentação apresentada a título principal e numa fundamentação apresentada a título subsidiário. A acusação da Comissão está, deste modo, redigida de forma suficientemente clara. Consequentemente, o direito de defesa do Governo francês não foi restringido.

2. Admissibilidade da apreciação de violações materiais

62. Uma vez que decorreu o prazo de três meses sem que a Comissão se tivesse pronunciado acerca do risco de distorções da concorrência, há que partir do princípio de que não existe tal risco, nos termos do artigo 12.° , n.° 3, alínea b), da Sexta Directiva. O Governo francês é da opinião de que a Comissão está impedida de impugnar a medida em sede de acção por incumprimento, visto o decurso do prazo ter gerado o seu deferimento tácito.

63. Esta interpretação não merece adesão. Não releva aqui saber se após o decurso do prazo tem lugar uma ficção jurídica ou se ao silêncio da Comissão deve ser atribuído o valor de deferimento tácito - como defende o Governo francês.

64. Com efeito, a ficção ou o deferimento tácito apenas recai sobre o risco de distorção da concorrência. Não abrange os demais pressupostos de facto previstos no artigo 12.° , n.° 3, alínea b), e noutras disposições da Sexta Directiva. Nestes termos, uma prestação relativamente à qual se pretende aplicar uma taxa reduzida não passa a valer como um fornecimento de gás natural e de electricidade só porque a Comissão não se pronunciou definitivamente acerca dessa questão dentro do prazo de três meses após a notificação. Por isso, é em todo o caso admissível o conhecimento da acusação principal da Comissão, nos termos da qual a República Francesa qualificou erradamente a prestação como tratando-se de um fornecimento de energia, com a consequência de o artigo 12.° , n.° 3, alínea b), da Sexta Directiva não poder servir de fundamento à introdução da taxa reduzida.

65. No caso em apreço, a acusação subsidiária formulada pela Comissão, relativa à violação do princípio da uniformidade da taxa do imposto sobre o valor acrescentado, é igualmente válida. É verdade que existe uma certa relação entre uma eventual violação deste princípio e a influência da medida sobre a concorrência, como ainda se irá demonstrar . Porém, a Comissão alega, em primeira linha, ter sido violado o artigo 12.° , n.° 3, alínea a), da Sexta Directiva. Só em determinadas condições é que se deverá estudar, no âmbito da análise do mérito, em que medida a Comissão está vinculada pela sua apreciação do risco de distorção da concorrência que serve de base ao seu deferimento tácito ou à ficção de conformidade com as regras da concorrência.

66. Por último, deve ser tido em conta que a Comissão já expusera as suas dúvidas quanto à classificação da subscrição como fornecimento de gás e de electricidade nas suas cartas de 31 de Julho de 1998 e de 7 de Dezembro de 1998. Nesta última, chegou mesmo a expor as suas dúvidas quanto ao artigo 12.° , n.° 3, alínea a), da Sexta Directiva. Nesta medida, ainda que a Comissão tenha deixado decorrer o prazo para se pronunciar sobre a questão da distorção da concorrência, certo é que não se lhe pode imputar a prática de quaisquer comportamentos contraditórios no que toca às acusações formuladas no âmbito da acção por incumprimento.

3. Quanto à acusação principal: classificação da colocação à disposição da rede de fornecimento como prestação autónoma

67. É pressuposto da procedência da acusação principal, formulada pela Comissão, que a subscrição não seja parte do fornecimento de gás natural e de electricidade, mas sim uma prestação de outro tipo. Nos termos do artigo 12.° , n.° 3, alínea a), terceiro parágrafo, da Sexta Directiva, a taxa reduzida só pode ser aplicada às categorias de prestações referidas no anexo H. Uma vez que a subscrição para fornecimento de energia ou a colocação à disposição das redes de fornecimento não corresponde a nenhuma das categorias do anexo H, a aplicação da taxa reduzida seria, no caso em apreço, inadmissível.

68. Cabe, em primeiro lugar, constatar que a Comissão não fundamenta na sua petição inicial o ponto de vista segundo o qual a subscrição é uma prestação autónoma, apesar de o Governo francês ter expressamente rejeitado esta interpretação, na sua carta de 7 de Setembro de 1998.

69. A Comissão só na réplica é que refere que o conceito de «fornecimento», adoptado no artigo 12.° , n.° 3, alínea b), da Sexta Directiva, impede que também se entenda como tal a subscrição. A possibilidade de obtenção de energia concedida através dela é, na verdade, uma prestação que antecede o próprio fornecimento.

70. Poderá ficar em aberto, caso a interpretação da Comissão se venha a revelar desajustada, se esta não terá incumprido com o dever de fundamentação que sobre ela recai, no âmbito das acções por incumprimento, ao limitar-se a apresentar - para além do mais apenas na réplica - uma fundamentação algo superficial.

71. A subscrição só pode ser considerada uma prestação autónoma caso se trate de uma prestação que se deva distinguir do efectivo fornecimento de gás natural e de electricidade. Aqui cumpre ter em consideração dois aspectos. A favor dessa separabilidade relevaria, por um lado, o facto de também se poder proceder à subscrição sem que à mesma estivesse necessariamente acoplado o fornecimento, em sentido estrito, de gás natural ou de electricidade. Ou seja, o gás natural e a electricidade teriam também de poder ser obtidos a partir de um terceiro. A subscrição limitar-se-ia, assim, na prática, à pura e simples utilização da rede de fornecimento. Por outro lado, o preço da subscrição teria de ter uma relação efectiva com determinados custos fixos, tais como os custos de exploração da rede.

72. O regime jurídico dos mercados em causa releva para efeitos de resposta à questão sobre a separação entre subscrição/exploração da rede e fornecimento de determinadas quantidades de energia.

73. No que toca ao mercado de electricidade, cumpre remeter para a Directiva 96/92/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 19 de Dezembro de 1996, que estabelece regras comuns para o mercado interno da electricidade , sendo que deveria ter sido transposta até ao dia 19 de Fevereiro de 1999. O artigo 19.° desta directiva prevê uma abertura progressiva dos mercados, sendo que, de início, só aos grandes clientes é concedida a possibilidade de escolherem livremente os seus fornecedores.

74. De acordo com o primeiro relatório de avaliação da Comissão relativo à execução do mercado interno de electricidade e de gás natural de 3 de Dezembro de 2001 , nesta data - portanto já muito tempo depois do prazo estabelecido no parecer fundamentado - só 30% do mercado francês é que se encontrava aberto; só os consumidores finais com um consumo anual igual ou superior a 16 Gwh é que podiam escolher livremente o seu fornecedor . As famílias, que são os principais afectados pela legislação relativa à tributação da subscrição, só podiam, à época em questão, obter a electricidade da empresa EDF, que detém o monopólio e a quem pagam a subscrição.

75. A liberalização do fornecimento de gás está regulado na Directiva 98/30/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 22 de Junho de 1998, relativa a regras comuns para o mercado do gás natural . Esta directiva deveria ter sido transposta até 10 de Agosto de 2000, o que não aconteceu em França . De resto, também neste domínio é apenas aos grandes clientes que, no início, é concedida a possibilidade de escolherem o seu fornecedor .

76. Parece assim que, à época, as famílias e muitos clientes institucionais só podiam obter electricidade e gás através das empresas EDF e GDF, a quem também pagavam a subscrição. O que contraria a classificação da subscrição como uma prestação diferenciada.

77. O segundo critério também indicia a inseparabilidade da prestação. Nada indica que o montante do preço da subscrição esteja em relação directa com determinados custos fixos. É verdade que as tarifas da subscrição variam em função da ordem de grandeza do consumo ou da voltagem e consoante o tipo de cliente, de modo que se poderia presumir a existência de um nexo entre a intensidade da utilização da infra-estrutura e o preço da subscrição. Mas, por outro lado, o Governo francês afirmou, na sua carta à Comissão de 7 de Setembro de 1998, que as receitas provenientes da cobrança da subscrição só cobrem cerca de 27% dos custos totais das empresas fornecedoras, apesar de os custos fixos corresponderem, na verdade, a mais de metade dos custos totais. Portanto, uma parte dos custos fixos é coberto pelas receitas provenientes dos pagamentos relacionados com o consumo.

78. A divisão da contrapartida pelo fornecimento de gás natural e de electricidade numa parte fixa e noutra variável assume, nestas circunstâncias, o carácter de uma medida tomada pelas empresas fornecedoras no âmbito da livre fixação dos preços de uma prestação integrada . Não se trata de dois pagamentos distintos devidos por duas prestações separáveis.

79. A Directiva 90/377/CEE do Conselho, de 29 de Junho de 1990, que estabelece um processo comunitário que assegure a transparência dos preços no consumidor final industrial de gás e electricidade , também acolhe esta perspectiva. De acordo com o anexo I, n.° 9 (relativo ao gás), e o anexo II, n.° 8 (relativo à electricidade), deve ser calculado um preço único, que inclua os custos fixos e os custos dependentes do consumo.

80. Nestes termos, não está excluída a aplicação de uma taxa reduzida de imposto sobre o valor acrescentado com base no artigo 12.° , n.° 3, alínea b), da Sexta Directiva, desde logo porque a subscrição deve ser considerada fornecimento de gás natural e de electricidade na acepção dessa disposição. Deve, por isso, ser julgada improcedente a acusação principal da Comissão.

81. No entanto, esta constatação apenas se aplica ao momento que se seguiu ao decurso do prazo fixado no parecer fundamentado. Por força da progressiva liberalização dos mercados, é possível que esta situação se tenha entretanto alterado.

4. Quanto à acusação suscitada a título subsidiário: violação do princípio da uniformidade da taxa de imposto

82. A Comissão, para o caso de a subscrição dever ser considerada fornecimento de gás natural e de electricidade, censura a violação do princípio nos termos do qual devem ser aplicadas taxas de IVA iguais para prestações iguais.

83. A Comissão faz derivar este princípio do disposto no artigo 12.° , n.° 3, alínea a), da Sexta Directiva, nos termos do qual «[o]s Estados-Membros fixarão a taxa normal do imposto sobre o valor acrescentado sob a forma de uma percentagem da matéria colectável, igual para o fornecimento de bens e a prestação de serviços». Este princípio, inerente ao regime jurídico aplicável ao imposto sobre o valor acrescentado, visa evitar discriminações entre pessoas que adquirem os mesmos bens ou a quem são prestados os mesmos serviços.

84. Sucede, contudo, que do enunciado da disposição não se pode retirar o princípio invocado. Esta norma limita-se determinar que a taxa normal deve ser igual para as prestações de serviços e para o fornecimento de bens. Não resulta da norma que para prestações de serviços iguais e para o fornecimento de bens iguais se deva aplicar a mesma taxa de imposto sobre o valor acrescentado.

85. O princípio referido pela Comissão consubstancia, porém, parte do princípio da neutralidade fiscal, que é reconhecido como princípio essencial do sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado. O Tribunal de Justiça, no acórdão Comissão/França, decidiu:

«[...] Daqui resulta que a instituição e a manutenção de uma taxa de 2,1% para as especialidades farmacêuticas reembolsáveis, enquanto o fornecimento de especialidades farmacêuticas não reembolsáveis é onerado com uma taxa de 4,5%, só são admissíveis se não violarem o princípio da neutralidade fiscal inerente ao sistema comum do IVA e no respeito do qual os Estados-Membros devem transpor a Sexta Directiva [...].

O referido princípio opõe-se, nomeadamente, a que mercadorias semelhantes, que estão, portanto, em concorrência entre si, sejam tratadas de maneira diferente do ponto de vista do IVA. [...] Consequentemente, o princípio da neutralidade fiscal inclui igualmente os dois outros princípios [...] da uniformidade do IVA e da eliminação das distorções da concorrência.» .

86. Coloca-se a questão de saber se a acusação da Comissão deve ser julgada improcedente, uma vez que assenta no artigo 12.° , n.° 3, alínea a), da Sexta Directiva e não no princípio geral da neutralidade fiscal.

87. Contra o entendimento de que a fundamentação deve, por isso, ser julgada improcedente releva, por um lado, o facto de o princípio da uniformidade da taxa do imposto sobre o valor acrescentado ser, em última análise, uma parte do princípio da neutralidade fiscal. Por outro lado, a Comissão, no seu parecer fundamentado, expôs de forma suficientemente aprofundada o conteúdo do princípio cuja violação era invocada, de modo a que o Governo francês podia depreender qual a violação que a Comissão efectivamente lhe imputava. O facto de a Comissão ter erradamente indicado o artigo 12.° , n.° 3, alínea a), da Sexta Directiva como sendo a disposição que contém o princípio da uniformidade da taxa do imposto sobre o valor acrescentado não pode, por isso, conduzir à improcedência desta acusação.

88. O princípio da neutralidade fiscal seria violado se a legislação fiscal francesa fosse de molde a que prestações iguais, que se encontram numa relação de concorrência, fossem tratadas de forma diferente em sede de imposto sobre o valor acrescentado.

89. Tal como já se expôs, a subscrição e o fornecimento de gás natural e/ou de electricidade consubstanciam, para a grande maioria dos consumidores finais, uma prestação integrada que abrange a prestação de serviços e o fornecimento de bens , e não prestações distintas. É apenas o preço da prestação que é dividido em duas partes, que são o montante da subscrição e o valor variável a pagar em função da quantidade do consumo.

90. A aplicação de duas taxas distintas de imposto sobre o valor acrescentado, efectivamente, faz com que a prestação fique sujeita a uma taxa de imposto sobre o valor acrescentado que corresponde à média ponderada das taxas de imposto sobre o valor acrescentado que recaem sobre ambos os componentes do preço. O fornecimento de gás natural e de electricidade fica efectivamente sujeito a uma pluralidade de taxas de imposto sobre o valor acrescentado cujo valor depende da proporção, no preço final, entre o montante da subscrição e o valor variável a pagar em função do consumo.

91. Esta situação viola o artigo 12.° , n.° 3, alínea a), da Sexta Directiva, uma vez que esta disposição apenas prevê a aplicação de, no máximo, duas taxas reduzidas, para além da taxa normal. Porém, uma vez que a Comissão não invocou esta violação, não pode o Tribunal de Justiça conhecer dela no âmbito deste processo.

92. Para além disso, este regime fiscal pode atentar contra o princípio da neutralidade fiscal. Com efeito, aplicam-se a prestações iguais taxas de imposto diferentes.

93. O que não se altera pelo facto de, como alega o Governo francês, o montante a pagar pela subscrição variar em função da prestação e do tipo de cliente. Por exemplo, é verdade que os fornecimentos de electricidade de voltagem baixa e média podem consubstanciar prestações diferentes. Contudo, dentro de cada nível de voltagem aplicar-se-iam novamente, em termos efectivos, várias taxas de imposto sobre o valor acrescentado, de acordo com o consumo de electricidade e a proporção da parte a pagar em função do mesmo, que está sujeita à taxa normal de imposto sobre o valor acrescentado.

94. De resto, o princípio da neutralidade fiscal também visa excluir «que mercadorias semelhantes, que estão em concorrência entre si, sejam tratadas de maneira diferente», como refere o Tribunal de Justiça . Trata-se, mais precisamente, de não falsear a concorrência entre os responsáveis pela colocação no mercado das mercadorias em questão.

95. Com efeito, é possível que, no momento aqui em apreço, a EDF e a GDF disponibilizassem, em França, vários modelos tarifários. Assim sendo, o regime fiscal terá afectado de forma diferente os vários tipos de cliente. Porém, a Comissão nada alegou quanto à efectiva existência de concorrência, à época, nos mercados franceses de fornecimento de gás natural e de electricidade e quanto ao risco de distorção dessa mesma concorrência entre os vários operadores no mercado que esse regime fiscal podia implicar.

96. Nestes termos, a Comissão não fez prova quanto a um pressuposto essencial da violação do princípio da neutralidade fiscal. Esta acusação não pode, pois, proceder.

VI - Despesas

97. A decisão sobre as despesas assenta no artigo 69.° , n.° 2, do Regulamento de Processo, em que se dispõe que a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Uma vez que a República Francesa apresentou requerimento nesse sentido e que a acção deve ser julgada improcedente, deve a Comissão ser condenada nas despesas.

VII - Conclusões

98. Nos termos do exposto, propõe-se que se decida do seguinte modo:

«1) A acção é julgada improcedente.

2) A Comissão é condenada nas despesas.»