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CONCLUSÕES DO ADVOGADO-GERAL

JÁN MAZÁK

apresentadas em 11 de setembro de 2012 (1)

Processo C-299/11

Staatssecretaris van Financiën

contra

Gemeente Vlaardigen (município de Vlaardigen)

[Pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Hoge Raad der Nederlanden (Países Baixos)]

(IVA — Operações tributáveis — Afetação por um sujeito passivo aos fins da própria empresa de um bem produzido «no âmbito da atividade de empresa»)





1.        «There is no such thing as a good tax» [não existem bons impostos]. Esta afirmação incisiva é generalizadamente atribuída a Sir Winston Churchill. O presente processo suscita a questão de saber se, no contexto de uma denominada «prestação presumida», a tributação de um terreno enquanto tal pelas autoridades neerlandesas constituiu — do ponto de vista do sujeito passivo — se não um «bom imposto», pelo menos um «imposto lícito» no quadro da Sexta Diretiva IVA (2).

2.        Parece haver uma grande incerteza, nos Países Baixos, relativamente à interpretação e à aplicabilidade das regras neerlandesas que transpõem (partes das) disposições respeitantes aos fornecimentos que podem ser equiparados a entrega efetuada a título oneroso. Com efeito, o desfecho do presente pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Hoge Raad der Nederlanden (Supremo Tribunal dos Países Baixos) poderia significar que as empresas pagaram IVA em excesso no passado porque o valor dos seus terrenos foi incluído na base tributável da prestação presumida (3). O Hoge Raad decidiu, por conseguinte, pedir esclarecimentos sobre a interpretação da disposição pertinente da Sexta Diretiva, a saber artigo 5.°, n.° 7, proémio e alínea a). O pedido de decisão prejudicial foi suscitado no âmbito de um processo que opõe o Staatssecretaris van Financiën (Secretário de Estado das Finanças) à Gemeente Vlaardingen (município de Vlaardingen; a seguir «Gemeente»).

3.        Em especial, levanta-se a questão de saber se a Sexta Diretiva permite às autoridades fiscais equiparar determinadas operações a entrega efetuada a título oneroso (prestação presumida), equiparando à «entrega de um bem» a produção, por um terceiro, de um bem imóvel que consiste em trabalhos (de construção) efetuados no terreno do sujeito passivo (Gemeente), e incluir na cobrança do IVA o valor do terreno, mesmo que esse terreno tenha sido anteriormente utilizado pelo sujeito passivo para fins da própria empresa isentos de IVA (arrendamento de campos a associações desportivas) e que o sujeito passivo não tenha beneficiado, relativamente a esse terreno, da dedução do IVA (4).

I —    Quadro jurídico

A —    Direito da União Europeia

4.        O artigo 5.°, n.° 7, proémio e alínea a), da Sexta Diretiva dispõe:

«Os Estados-Membros podem equiparar a entrega efetuada a título oneroso:

a)      A afetação por um sujeito passivo aos fins da própria empresa de um bem produzido, construído, extraído, transformado, comprado ou importado no âmbito da atividade de empresa, no caso de a aquisição de tal bem a outro sujeito passivo não conferir direito à dedução total do [IVA];

5.        O artigo 11, A, n.° 1, proémio e alínea b), da Sexta Diretiva determina, no que diz respeito à matéria coletável:

«A. No território do país

1. A matéria coletável é constituída:

b)      No caso de operações referidas nos n.os 6 e 7 do artigo 5.o, pelo preço de compra dos bens ou de bens similares, ou, na falta de preço de compra, pelo preço de custo, determinados no momento em que tais operações se efetuam;

6.        Com efeitos a partir de 1 de janeiro de 2007, a Sexta Diretiva foi substituída pela Diretiva 2006/112/CE do Conselho (5). O artigo 18.° da Diretiva 2006/112 corresponde, essencialmente, ao artigo 5.°, n.° 7, da Sexta Diretiva.

B —    Direito nacional

7.        À data da entrada em vigor da Lei de 1968 relativa ao imposto sobre o volume de negócios (Wet op de omzetbelasting 1968, a seguir «Wet OB»), em 1 de janeiro de 1969, o seu artigo 3.°, n.° 1, proémio e alínea h), tinha o seguinte teor:

«1.      Constitui uma entrega de bens:

[…]

h)      a afetação aos fins da própria empresa de bens nela produzidos, nos casos em que, estando em causa bens de um empresário, não seria permitida a dedução total ou parcial do imposto que onera esses bens; aos bens produzidos na própria empresa são equiparados os bens produzidos sob encomenda e com o fornecimento de materiais.»

8.        O disposto no artigo 3.°, n.° 1, alínea h), da Wet OB sofreu posteriormente um aditamento e passou a ter, desde então, a seguinte redação (6):

«1.      Constitui uma entrega de bens:

[…]

h)      a afetação aos fins da própria empresa de bens nela produzidos, nos casos em que, estando em causa bens de um empresário, não seria permitida a dedução total ou parcial do imposto que onera esses bens; aos bens produzidos na própria empresa são equiparados os bens produzidos sob encomenda e com o fornecimento de materiais, incluindo o terreno; são excluídos deste número os terrenos não construídos que não sejam terrenos de construção na aceção do artigo 11.°, n.° 4.»

9.        Nos Países Baixos, este imposto é denominado «imposto de integração».

10.      Nos termos do artigo 8.°, n.° 3, da Wet OB:

«Relativamente às entregas referidas no artigo 3.°, n.° 1, alíneas g) e h), e artigo 3.°A, n.° 1, o seu preço é fixado no montante sem IVA que teria sido pago pelos bens, se estes tivessem sido adquiridos ou produzidos no momento da entrega, no estado em que se encontravam nessa data.»

II — Matéria de facto e questão prejudicial

11.      A Gemeente é empresária na aceção da Wet OB e é proprietária de vários complexos desportivos, que incluem vários campos de jogos. A Gemeente dá estes campos relvados de arrendamento a associações desportivas há vários anos, com isenção do IVA.

12.      Em 2003, a Gemeente adjudicou a empreiteiros um contrato para substituir os campos relvados por campos de basquetebol e de futebol com relva artificial, e campos de andebol com asfalto (a seguir «campos»).

13.      Após a conclusão dos trabalhos, em 2004, os campos foram novamente arrendados pela Gemeente, com isenção do IVA, e, de facto, às mesmas associações desportivas que anteriormente os arrendavam.

14.      A quantia total faturada pelos empreiteiros à Gemeente pelos trabalhos realizados, no montante de 1 547.440 euros, incluía o montante de IVA de € 293.993. A Gemeente não deduziu imediatamente este último montante na sua declaração para efeitos do IVA.

15.      O Inspecteur considerou o arrendamento dos campos pela Gemeente — prestação isenta nos termos do artigo 11.°, n.° 1, proémio e alínea b), da Wet OB — uma afetação, aos fins da própria empresa, de bens produzidos sob encomenda e com o «fornecimento» de materiais, em particular do solo (e subsolo), na aceção do artigo 3.°, n.° 1, alínea h), da Wet OB. Segundo o Inspecteur, daí resulta que se considera que a Gemeente efetuou uma entrega dos campos relativamente à qual é devido IVA, após a dedução do IVA faturado à Gemeente pelos empreiteiros. Posteriormente, o Inspetor aplicou à Gemeente uma liquidação adicional do imposto sobre o volume de negócios, referente ao período compreendido entre 1 de janeiro de 2004 e 31 de dezembro de 2004, a qual, após reclamação, foi confirmada por decisão do Inspecteur.

16.      O Rechtbank te ‘s-Gravenhage negou provimento ao recurso interposto dessa decisão pela Gemeente. A Gemeente interpôs recurso para o Gerechtshof te’s-Gravenhage da decisão do Rechtbank.

17.      No Gerechtshof, o Inspecteur tomou a posição de que a liquidação adicional em apreço é excessiva. Por conseguinte, foi considerado, em sede de recurso, que podia dar-se por provada a liquidação adicional do IVA no montante de € 116.099, calculada da seguinte forma:

Custo da instalação dos campos

Valor do terreno

Base Tributável

EUR       1 547 440

EUR       610 940 +

EUR       2 158 380

19% IVA sobre EUR 2 158 380

Dedução do IVA relativamente à instalação

IVA devido

EUR       410 092

EUR       293 993 –

EUR       116 099


18.      Em 26 de junho de 2009, o Gerechtshof anulou a sentença do Rechtbank, julgou procedente o recurso interposto da decisão do Inspecteur e anulou essa decisão e a liquidação adicional. Em especial, o Gerechtshof decidiu que o artigo 3.°, n.° 1, alínea h), da Wet OB viola o artigo 5.o, n.° 7, proémio e alínea a), da Sexta Diretiva, na medida em que esta disposição, relativa à cobrança do IVA, também considera uma entrega a afetação de bens cuja produção o empresário encomendou a terceiros e para a qual forneceu materiais que incluem o terreno. O Staatssecretaris van Financiën interpôs recurso dessa decisão no Hoge Raad der Nederlanden.

19.      Nesse contexto, o Hoge Raad der Nederlanden decidiu suspender a decisão e submeter ao Tribunal de Justiça a seguinte questão prejudicial:

«O artigo 5.°, n.° 7, proémio e alínea a), da Sexta Diretiva, lido em conjugação com os artigos 5.°, n.° 5, e 11.°, A, proémio, n.° 1, alínea b), da [mesma diretiva], deve ser interpretado no sentido de que um Estado-Membro pode cobrar IVA, em caso de ocupação por um sujeito passivo, para fins isentos, de um bem imóvel se:

¾        esse bem imóvel consistir em trabalhos (de construção) efetuados por um terceiro, mediante pagamento, num terreno desse sujeito passivo e por sua incumbência, e

¾        esse terreno tiver sido anteriormente utilizado pelo sujeito passivo para (os mesmos) fins da própria empresa isentos de IVA, e o sujeito passivo não tiver já beneficiado, relativamente a esse terreno próprio, da dedução do IVA,

tendo como consequência a inclusão do (valor do) terreno do sujeito passivo na cobrança do IVA?»

III — Apreciação

A —    Principais argumentos das partes

20.      A Gemeente considera que a resposta à questão prejudicial deve ser negativa. Sustenta que, no caso de um sujeito passivo — como o empreiteiro do caso em apreço — produzir um bem com o fornecimento de materiais pelo cliente (a Gemeente), a produção desse bem deve considerar-se efetuada «no âmbito da atividade de empresa [do sujeito passivo]» e não no âmbito da atividade de empresa do cliente. Na medida em que a produção desse bem esteja sujeita a IVA, por força do artigo 5.°, n.° 5, da Sexta Diretiva — transposto pelo artigo 3.°, n.° 1, alínea c), da Wet OB — o mesmo bem não pode, simultaneamente, ser equiparado (7) a um bem produzido no âmbito da atividade de empresa do cliente.

21.      A Gemeente também refere que o artigo 5.°, n.° 7, proémio e alínea a), da Sexta Diretiva procura assegurar a igualdade de tratamento fiscal entre sujeitos passivos que adquirem bens a outro sujeito passivo («bens adquiridos») e entre sujeitos passivos que produzem bens no âmbito da atividade da própria empresa («bens produzidos»). Para assegurar a igualdade de tratamento, é suficiente que o IVA deduzido seja recuperado. Não é necessário, no entanto, que a carga fiscal seja repartida uniformemente entre bens adquiridos e bens produzidos. Em apoio da sua posição, a Gemeente também invoca os trabalhos preparatórios que conduziram à adoção da Segunda Diretiva 67/228/CEE do Conselho (8), assim como a Sexta Diretiva.

22.      Em todo o caso, exigir o pagamento de IVA, tal como foi feito no caso submetido ao órgão jurisdicional de reenvio — em que foi exigido o pagamento do IVA sobre o valor do terreno dos campos pertencentes ao sujeito passivo e em que estes campos são afetados por este último aos fins de uma atividade isenta — aumentaria consideravelmente a carga fiscal desse sujeito passivo e violaria a neutralidade fiscal, um princípio que é inerente ao sistema do IVA.

23.      O Governo neerlandês alega que, mediante a utilização de termos como «produzido, construído, extraído, transformado, comprado ou importado» no artigo 5.°, n.° 7, proémio e alínea a), da Sexta Diretiva, o legislador da União optou por empregar uma formulação muito ampla. Além disso, a expressão «no âmbito da atividade de empresa» mostra que é possível colocar no mesmo nível (i) «a entrega de um bem» e (ii) «a produção de um bem» por um terceiro com materiais próprios colocados à sua disposição, logo que se verifique que esse bem foi encomendado pelo sujeito passivo no âmbito da atividade da própria empresa.

24.      O Governo neerlandês sustenta que o artigo 5.°, n.° 7, proémio e alínea a), da Sexta Diretiva sucedeu ao artigo 5.°, n.° 3, alínea b), da Segunda Diretiva, que previa que «são equiparadas a entrega efetuada a título oneroso: […] a utilização, por um sujeito passivo, para os fins da sua empresa, de bens produzidos ou extraídos por ele próprio ou por um terceiro por sua conta». Os termos «produzidos ou extraídos por ele próprio ou por um terceiro por sua conta» foram substituídos, na Sexta Diretiva, por termos mais amplos. Portanto, não pode haver dúvida de que a Sexta Diretiva permite que determinadas operações sejam equiparadas a entrega efetuada a título oneroso, como foi feito no caso em apreço.

25.      Além disso, apesar do facto de — ao contrário do artigo 5.°, n.° 3, alínea b), da Segunda Diretiva — o artigo 5.°, n.° 7, proémio e alínea a), da Sexta Diretiva não conter os termos «por ele próprio ou por um terceiro por sua conta», é óbvio que o artigo 5.°, n.° 7, proémio e alínea a), engloba todas as situações em que um sujeito passivo adquire bens, ou seja, também cobre uma situação em que o trabalho, realizado por conta do sujeito passivo, teve lugar nos campos pertencentes a essa pessoa. Porém, o que essa disposição não cobre é a situação em que esse sujeito passivo incumbiu um terceiro de produzir um bem com material que já pertencia a esse terceiro.

26.      O Governo neerlandês refere ainda que, num caso como o presente, a equiparação da operação em causa a entrega efetuada a título oneroso é conforme com o princípio da neutralidade do IVA: no caso de um terceiro que produz bens por conta de um sujeito passivo com materiais pertencentes a este último, essa «equiparação» garante que o valor desse bens (9) seja tido em conta quando é calculado o IVA. À luz do princípio da neutralidade fiscal, isto é necessário para assegurar que a carga fiscal é a mesma que no caso de o sujeito passivo produzir os bens com o seu próprio material ou de um terceiro produzir os bens com o seu material e depois vender esses bens ao sujeito passivo.

27.      Por último, o Governo neerlandês alega que a equiparação da operação em causa a entrega efetuada a título oneroso é válida mesmo que o terreno do sujeito passivo, colocado à disposição de um terceiro para os fins do trabalho realizado por conta do sujeito passivo, tenha sido anteriormente utilizado para as atividades isentas do sujeito passivo.

28.      De igual modo, o Governo neerlandês sustenta que a questão prejudicial deve ser respondida no sentido de que o artigo 5.°, n.° 7, proémio e alínea a), da Sexta Diretiva deve ser interpretado no sentido de que permite a um Estado-Membro equiparar à entrega de um bem a conclusão e entrega por um terceiro, por conta do sujeito passivo e no seu próprio terreno, de um bem imóvel que consiste em trabalhos (de construção) e, consequentemente, tomá-la em consideração para efeitos de IVA. É irrelevante, nesse contexto, o facto de o sujeito passivo ter utilizado anteriormente o terreno para fins da própria empresa isentos de IVA e de não ter anteriormente beneficiado, relativamente a esse terreno, da dedução do IVA.

29.      A Comissão alega, essencialmente, que o Tribunal de Justiça deve responder à questão prejudicial que o artigo 5.°, n.° 7, proémio e alínea a), da Sexta Diretiva não permite aos Estados-Membros equiparar a entrega efetuada a título oneroso a afetação por um sujeito passivo aos fins das operações isentas de um bem produzido no âmbito da própria empresa por um terceiro com materiais fornecidos, se os materiais já tiverem sido anteriormente afetados a essas necessidades não tributáveis do sujeito passivo.

B —    Análise

30.      Com a sua questão, o Hoge Raad pretende saber se o artigo 5.°, n.° 7, proémio e alínea a), da Sexta Diretiva, lido em conjugação com os artigos 5.°, n.° 5, e 11.°, A, proémio, n.° 1, alínea b), da mesma diretiva, deve ser interpretado no sentido de que as autoridades fiscais neerlandesas podem cobrar IVA, em caso de ocupação por um sujeito passivo (a Gemeente), para fins isentos — ou seja, o arrendamento desses campos a associações desportivas — de um bem imóvel (campos desportivos), se esses campos desportivos consistirem em trabalhos efetuados por um terceiro, mediante pagamento, num terreno da Gemeente e por incumbência desta, embora esse terreno tenha sido anteriormente utilizado pela Gemeente para os mesmos fins isentos, e a Gemeente não tenha ainda beneficiado, relativamente a esse terreno próprio, da dedução do IVA, tendo como consequência a inclusão do valor do terreno na cobrança do IVA (10).

31.      Em primeiro lugar, começo por recordar que, segundo a lógica do sistema instituído pela Sexta Diretiva, os impostos que tenham incidido a montante sobre os bens ou os serviços utilizados por um sujeito passivo para os fins das suas operações tributáveis podem ser deduzidos. A dedução dos impostos pagos a montante está ligada à cobrança dos impostos a jusante (11). Quando os bens ou os serviços adquiridos por um sujeito passivo são utilizados para efeitos de operações isentas ou não abrangidas pelo âmbito de aplicação do IVA, não pode existir cobrança do imposto a jusante nem dedução do imposto a montante (12).

32.      Nessa situação, é claro que o sujeito passivo não pode recuperar o IVA pago no âmbito da atividade de aquisição de bens de que faz uso.

33.      Por outro lado, alguns sujeitos passivos não adquirem bens que utilizam no âmbito da atividade da própria empresa a outros sujeitos passivos (opção 1); em vez disso, preferem produzir eles próprios esses bens (opção 2); ou optam pela sua produção nas suas próprias instalações por um terceiro (opção 3, que é a única relevante no caso em apreço).

34.      Os bens adquiridos de acordo com a opção 3 são, por vezes, utilizados para fins da própria empresa isentos de IVA. É precisamente isto que acontece no caso em apreço.

35.      Se considerarmos a legislação nacional relevante, pode-se depreender dos trabalhos preparatórios do artigo 3.°, n.° 1, alínea h), da Wet OB que, ao adotar esta norma em 1969, o legislador neerlandês pretendeu transpor para a Wet OB o disposto no artigo 5.°, n.° 3, alínea b), da Segunda Diretiva.

36.      Este artigo referia que «é equiparada a entrega efetuada a título oneroso: […] b) a utilização, por um sujeito passivo, para os fins da sua empresa, de bens produzidos ou extraídos por ele próprio ou por um terceiro por sua conta.»

37.      O artigo 5.°, n.° 3, alínea b), da Segunda Diretiva foi retomado pela Sexta Diretiva. Contudo, importa salientar que a formulação das duas disposições não corresponde plenamente.

38.      O artigo 5.°, n.° 7, proémio e alínea a), da Sexta Diretiva (13) dispõe que «os Estados-Membros podem equiparar a entrega efetuada a título oneroso: a) a afetação por um sujeito passivo aos fins da própria empresa de um bem produzido, construído, extraído, transformado, comprado ou importado no âmbito da atividade de empresa, no caso de a aquisição de tal bem a outro sujeito passivo não conferir direito à dedução total do imposto sobre o valor acrescentado. Por outras palavras, o artigo 5.°, n.° 7, proémio e alínea a), da Sexta Diretiva apenas se refere às operações realizadas «no âmbito da atividade de empresa» e não menciona o segmento de frase contido no artigo 5.°, n.° 3, alínea b), da Segunda Diretiva relativo a um bem produzido ou obtido «por um terceiro por sua conta». Pode-se acrescentar que o artigo 5.°, n.° 7, proémio e alínea a), também é aplicável a bens «construídos, transformados, comprados ou importados» no âmbito da atividade do sujeito passivo.

39.      Basta dizer que, apesar da pequena diferença de redação, não vislumbro por que motivo e de que modo o artigo 5.°, n.° 7, proémio e alínea a), da Sexta Diretiva prossegue um objetivo ou um resultado diferente em relação ao artigo 5.°, n.° 3, alínea b), da Segunda Diretiva. Com efeito, não há nada na Sexta Diretiva que o sugira.

40.      Resulta dos autos que, no caso em apreço, o Inspecteur considerou o início da utilização (ou seja, o início do arrendamento) dos campos pela Gemeente como a entrega de um bem na aceção do artigo 3.°, n.° 1, alínea h), da Wet OB, uma vez que está em causa a afetação aos fins da própria empresa de campos produzidos por terceiros sob encomenda da Gemeente e com o fornecimento por esta dos seus próprios campos de relvado natural. O conceito de «bens produzidos» utilizado no artigo 3.°, n.° 1, alínea h), da Wet OB também compreende os trabalhos de construção (incorporados no solo).

41.      Além disso, para efeitos de aplicação do artigo 3.°, n.° 1, alínea h), da Wet OB, o trabalho imobiliário produzido é considerado, com o solo, um único bem (imóvel). Com base nas considerações anteriores, o Inspecteur também incluiu na base tributável dos campos o valor do solo, tendo como consequência, em última análise, a cobrança do IVA também sobre o valor dos antigos campos de relvado natural da recorrida.

42.      Portanto, coloca-se a questão de saber se o disposto no artigo 3.°, n.° 1, alínea h), da Wet OB, aplicado à presente situação, é compatível com a faculdade que foi concedida aos Estados-Membros pelo artigo 5.°, n.° 7, proémio e alínea a), da Sexta Diretiva.

43.      Em especial, como esclarece o órgão jurisdicional de reenvio, pretende-se saber qual o alcance e preciso âmbito de aplicação do disposto no artigo 5.°, n.° 7, proémio e alínea a), da Sexta Diretiva, nas circunstâncias do presente processo.

44.      Tanto quanto parece, até à presente data o Tribunal de Justiça só terá sido chamado uma vez a pronunciar-se sobre a norma que rege a equiparação, nos termos do artigo 5.°, n.° 7, proémio e alínea a) da Sexta Diretiva, de determinadas operações a entrega efetuada a título oneroso, a saber no processo Gemeente Leusden e Holin Groep (14). No entanto, nesse acórdão, o Tribunal de Justiça centrou-se claramente sobre outras regras previstas na Sexta Diretiva. Quanto à disposição que aqui nos ocupa, o Tribunal de Justiça limitou-se a afirmar que o artigo 5.°, n.° 7, proémio e alínea a), tal como o artigo 20.°, n.° 2, da Sexta Diretiva, tem o «efeito económico» de obrigar um sujeito passivo a pagar os montantes correspondentes às deduções a que não tinha direito (n.° 90).

45.      No que respeita à finalidade do artigo 5.°, n.° 7, proémio e alínea a), da Sexta Diretiva, que se refere às entregas de «bens», diria que esta consiste — tal como a finalidade da disposição semelhante do artigo 6.°, n.° 3, que se refere às autoprestações de «serviços» (15) — na prevenção da distorção da concorrência (16).O sujeito passivo que exerça atividades isentas pode adquirir os bens utilizados para essas atividades a terceiros, e pagar sobre essa aquisição IVA que não é dedutível ou pode produzir ele próprio esses bens e, nesse caso, por força do artigo 5.°, n.° 7, proémio e alínea a), da Sexta Diretiva, deve pagar IVA, igualmente não dedutível, sobre o valor desses bens. Como salientaram corretamente o Governo neerlandês e a Comissão, um sujeito passivo que exerce uma atividade isenta de IVA, e que não pode, portanto, deduzir o imposto pago na fase anterior sobre os bens adquiridos para os fins dessa atividade, poderia, produzindo esses bens no âmbito da atividade da própria empresa, obter uma vantagem económica sobre um empresário que exerce a mesma atividade não tributável, mas que não pode — ou não deseja — produzir ele próprio os bens necessários para esse efeito. Por conseguinte, também foi prevista a sujeição a IVA do sujeito passivo que produz bens no âmbito da atividade da própria empresa.

46.      Tal como resulta do anexo A, n.° 7, da Segunda Diretiva, o artigo 5.°, n.° 3, alínea b), desta diretiva (e, por conseguinte, também o artigo 5.°, n.° 7, alínea a), da Sexta Diretiva) destina-se a garantir a igualdade de tratamento fiscal, por um lado, dos bens adquiridos que se destinam aos fins da própria empresa e não dão direito à dedução imediata ou total e, por outro, dos bens produzidos ou obtidos pelo sujeito passivo ou por sua conta por um terceiro e que são utilizados para os mesmos fins, que é o que se verifica no processo principal.

47.      Com efeito, o acima exposto constitui claramente uma aplicação do princípio da neutralidade fiscal, que é inerente ao sistema de IVA (17) e constitui não mais do que um princípio fundamental desse sistema (18). Esse princípio tem como principal objetivo assegurar a igualdade de tratamento dos sujeitos passivos (19).

48.      De salientar ainda, que o presente processo levanta a questão de saber se os campos desportivos em causa podem ser considerados, após o seu revestimento com relva artificial ou asfalto, bens «produzidos» de novo, na aceção do artigo 5.°, n.° 7, proémio e alínea a), da Sexta Diretiva — aparentemente a posição das autoridades fiscais neerlandesas e do Governo neerlandês, assim como do órgão jurisdicional de reenvio — ou se devem ser considerados os mesmos bens, que foram simplesmente renovados ou urbanizados.

49.      Em meu entender, está longe de ser óbvio que os campos desportivos constituam bens que foram «produzidos» de novo. De facto, não estou de modo algum convencido de que o sejam.

50.      A esse respeito, o despacho de 1 de junho de 2006, V.O.F. Dressuurstal Jespers (20) recorda que, no acórdão Van Dijk’s Boekhuis (21), — depois de salientar que «em linguagem comum, o conceito de fabrico implica a criação de um bem que ainda não existia» — o Tribunal de Justiça declarou que só existe uma produção de bens a partir de materiais do cliente no caso de o empreiteiro produzir um novo bem a partir dos materiais que lhe foram confiados pelo cliente.

51.      Gostaria de acrescentar que o Tribunal de Justiça também esclareceu, no acórdão Van Dijk’s Boekhuis (22), que só é produzido um bem novo quando o trabalho do empreiteiro dá origem a um bem «cuja função, na opinião geral, é diferente da que tinha o material fornecido. Cabe ao órgão jurisdicional nacional, tendo em conta o uso que pode ser feito do bem, decidir se foi ou não produzido um novo bem».

52.      À primeira vista, parece que não era esse o caso presente, na medida em que é difícil perceber que os campos desportivos — pelo facto de terem sido revestidos de relva artificial ou de asfalto — se tenham tornado bens que ainda não existiam.

53.      De facto, importa acrescentar que, no acórdão Van Dijk’s Boekhuis (23), o Tribunal de Justiça explicou que as reparações (em causa nesse processo), por muito radicais que sejam, que se limitam a restaurar a função anterior do bem confiado ao empreiteiro, sem criarem um novo bem, não constituem uma produção de bens a partir de materiais do cliente.

54.      Apesar do facto de o trabalho realizado nos campos desportivos em questão ter tido mais impacto do que uma simples reparação ou renovação, não é menos verdade, a meu ver, que estes continuam a ser campos desportivos arrendados às mesmas associações desportivas — e que, portanto, conservam a mesma função na aceção da jurisprudência acima referida (24).

55.      Seja como for, não cabe ao Tribunal de Justiça, mas ao órgão jurisdicional de reenvio avaliar essa questão concreta em pormenor, designadamente tendo em conta o uso que é feito dos novos campos, e proceder ao apuramento dos factos. Consequentemente, as presentes conclusões devem basear-se e limitar-se aos factos apurados pelo órgão jurisdicional de reenvio e que constam do despacho de reenvio.

56.      Parece resultar do despacho de reenvio, que o Hoge Raad considerou que estes eram bens produzidos de novo.

57.      Penso que o órgão jurisdicional de reenvio pode ter chegado a essa conclusão por causa da importância do trabalho efetuado nos campos desportivos. Refira-se, nesse contexto, que os custos relativos à realização do revestimento em relva artificial e do revestimento em asfalto representam, aparentemente, quase duas vezes e meia o valor do terreno.

58.      A Comissão tem razão quando sublinha, a esse respeito, que o órgão jurisdicional de reenvio devia provavelmente reapreciar essa questão particular — quanto mais não seja porque, se os campos desportivos em questão no processo principal fossem, não obstante, definitivamente considerados pelo órgão jurisdicional de reenvio como não constituindo novos bens, seria em todo o caso impossível o recurso ao artigo 5.°, n.° 7, proémio e alínea a), da Sexta Diretiva.

59.      Consequentemente, as seguintes considerações só são relevantes se o órgão jurisdicional de reenvio confirmar que os novos campos desportivos devem, com efeito, ser considerados bens produzidos de novo, na aceção do artigo 5.°, n.° 7, proémio e alínea a), da Sexta Diretiva.

60.      Como sugeriu acertadamente a Comissão, a questão seguinte consiste em saber se o artigo 5.°, n.° 7, proémio e alínea a), da Sexta Diretiva também se aplica aos bens abrangidos pela segunda parte do artigo 3.°, n.° 1, alínea h), da Wet OB: «[…] os bens produzidos sob encomenda e com o fornecimento de materiais, incluindo o terreno; […]» (25)

61.      Na minha opinião, a resposta é, em princípio, afirmativa. A expressão «no âmbito da atividade de empresa» contida no artigo 5.°, n.° 7, proémio e alínea a), da Sexta Diretiva não abrange necessariamente apenas os bens produzidos pela própria empresa. Indubitavelmente, essa expressão também pode abranger os bens produzidos por um terceiro com os materiais fornecidos pelo sujeito passivo.

62.      Contudo, para evitar a dupla tributação, é necessário ter em conta — no contexto do cálculo do montante devido — o facto de o sujeito passivo já ter pago o IVA incluído na fatura emitida pelo terceiro para a produção dos seus bens. Aparentemente, foi o que fizeram as autoridades fiscais neerlandesas no caso submetido ao órgão jurisdicional de reenvio: tiveram em conta o facto de que já tinha sido paga uma fatura com IVA.

63.      Com efeito, no que diz respeito à equiparação, nos termos do artigo 5.°, n.° 5 e n.° 7, da Sexta Diretiva, de determinadas operações a entrega efetuada a título oneroso, essa equiparação tem lugar no momento em que o bem (ou serviço) produzido no âmbito da atividade de uma empresa é afetado pelo sujeito passivo aos fins das suas atividades isentas.

64.      Ao contrário da posição defendida pelo Governo neerlandês, considero que, num caso como este — em que, antes da sua transformação ou integração num novo bem, os materiais já tinham sido afetados pelo sujeito passivo (Gemeente) aos fins das suas atividades isentas —, as autoridades fiscais devem ter em conta este facto, no contexto da aplicação do artigo 5.°, n.° 7, proémio e alínea a), da Sexta Diretiva. Por outras palavras, o valor desses materiais (o terreno enquanto tal) já não pode ser incluído na base tributável para efeitos de cálculo do IVA.

65.      Na audiência, a Comissão apresentou um bom exemplo a este respeito. Suponhamos que a Gemeente não possui, mas gostaria de possuir, campos desportivos para poder arrendá-los. Nessas circunstâncias, pode-se conceber duas situações: a) adquirir campos desportivos já prontos para serem utilizados e, portanto, pagar IVA sobre o preço de aquisição, que incluiria o valor do terreno e o preço de custo dos trabalhos de urbanização desses campos; ou b) [utilizar] um terreno que possui disponível. Suponhamos que, na situação b), a Gemeente possui um terreno na floresta. Assim, poderia preparar e urbanizar esse terreno de modo a convertê-lo em campos desportivos. Depois de esses campos desportivos serem arrendados, isto é afetados pelo sujeito passivo aos fins da própria empresa, em aplicação do artigo 5.°, n.° 7, proémio e alínea a), da Sexta Diretiva, também seria devido IVA em relação à totalidade — incluindo o valor do terreno.

66.      A meu ver, isso corresponde ao tratamento fiscal idêntico de duas situações: a aquisição de campos desportivos prontos para usar, por um lado, e o desenvolvimento destes campos desportivos em terreno próprio, por outro.

67.      No entanto, no caso pendente no órgão jurisdicional de reenvio, o terreno em questão é não só atualmente utilizado para os fins dos campos desportivos, mas também foi utilizado para esses fins no passado. O facto de os campos desportivos em questão serem, há vários anos, arrendados às (mesmas) associações desportivas resulta claramente dos autos.

68.      Daí resulta que esses campos já foram afetados pela Gemeente aos seus próprios fins. O que é importante é que a afetação do terreno não seja tida em conta pelo sujeito passivo aos fins da própria empresa mais de uma vez como entrega efetuada a título oneroso.

69.      De outro modo, correr-se-ia o risco da dupla tributação e ficaria ameaçado o princípio da neutralidade fiscal. Como assinalou corretamente a Comissão na audiência, se a Gemeente tivesse cortado as árvores da sua floresta e, numa primeira fase, tivesse urbanizado o respetivo terreno e coberto o mesmo com um simples revestimento de relva natural para convertê-lo em campos desportivos; e, mais tarde, numa segunda fase, alguns anos depois, tivesse decidido revesti-lo de relva artificial, essas duas operações seriam, nessa altura, segundo a interpretação do Governo neerlandês, sujeitas ao IVA. Daí resulta que, de acordo com esse Governo, o IVA deve ser cobrado duas vezes sobre o valor do terreno.

70.      Entendo, portanto, que não deve ser permitido aos Estados-Membros, para efeitos de aplicação do artigo 5.°, n.° 7, proémio e alínea a), da Sexta Diretiva, ter em conta o valor dos materiais, no caso de esses já terem sido afetados pelo sujeito passivo, no passado, aos fins da própria empresa.

71.      Na audiência, o Governo neerlandês alegou que o sistema de IVA não era, em todo o caso, ideal (26). Considero, contudo (tal como a Comissão), que, em caso de dúvida, quando sejam possíveis diferentes interpretações, é necessário defender a interpretação que melhor permita evitar a dupla tributação.

72.      De igual modo, o Governo neerlandês alegou na audiência que, seja como for, o critério que defendo nas presentes conclusões não é relevante neste caso, na medida em que não existe dupla tributação no processo principal, porque nunca tinha sido pago IVA sobre os campos desportivos em questão.

73.      A Gemeente tentou refutar a afirmação do Governo neerlandês sobre o facto de não ter sido pago IVA sobre o terreno. Alegou que — apesar do facto de os campos desportivos já terem sido urbanizados há muito tempo — não deixava de ser verdade que, no quadro do regime aplicável à data, a Gemeente também tinha pago o imposto de integração. Embora o artigo 3.°, n.° 1, alínea h), da Wet OB, na versão atualmente em vigor, preveja uma exceção relativamente aos terrenos que não sejam terrenos de construção, tal exceção não era possível nessa altura. Assim, a Gemeente afirmou categoricamente que tinha pago IVA sobre o terreno, assim como sobre o custo da sua urbanização e conversão nos campos desportivos originais.

74.      A meu ver, basta dizer que o critério relevante é outro. A questão-chave não consiste em saber se já tinha ou não sido pago IVA sobre esses campos, mas se os campos (os materiais) já tinham sido afetados pelo sujeito passivo, no passado, aos fins da própria empresa.

75.      Como os campos desportivos em questão já tinham sido arrendados durante «vários anos» antes da sua renovação, a situação do processo principal é completamente diferente, do ponto de vista económico, da situação que se verificaria se a Gemeente comprasse nesta data novos campos a um terceiro. Considero, portanto, que a situação do processo principal não deve ser equiparada a entrega efetuada a título oneroso. Como salientou corretamente a Comissão, essa conclusão é totalmente conforme com o sistema IVA.

76.      Com efeito, a única atividade económica realizada foi a colocação do revestimento de relva artificial e do revestimento de asfalto por conta da Gemeente. O IVA foi cobrado sobre essa atividade; não podendo a Gemeente deduzir esse imposto porque a sua própria atividade — arrendamento de campos a associações desportivas — está isenta. Assim, não foi produzido nem fornecido qualquer outro bem ou serviço que estivesse sujeito a IVA.

77.      Antes de terminar, observarei ainda que a conclusão acima referida não é posta em causa pelo artigo 5.°, n.° 5, da Sexta Diretiva, também referido na questão prejudicial. Nos termos dessa disposição, «os Estados-Membros podem considerar entrega, na aceção do n.° 1, […] a entrega de determinados trabalhos imobiliários.»

78.      Entendo, todavia, que a Comissão tem razão ao afirmar que o artigo 5.°, n.° 5, da Sexta Diretiva não tem qualquer relevância para as questões suscitadas no presente processo. Acrescento que, em todo o caso, o órgão jurisdicional de reenvio não explicou o motivo da referência a este artigo.

79.      Em segundo lugar, a minha apreciação também não é posta em causa pelo artigo 11.°, A, proémio, n.° 1, alínea b), da Sexta Diretiva, que é igualmente referido na questão prejudicial. Esta última disposição limita-se a definir o significado de «matéria coletável (27)» para efeitos da Sexta Diretiva. Com efeito, refere que, no caso de operações referidas nos n.os 6 e 7 do artigo 5.o, a matéria coletável (28) é constituída pelo preço de compra dos bens ou de bens similares, ou, na falta de preço de compra, pelo preço de custo, determinados no momento em que tais operações se efetuam;

80.      É suficiente assinalar que a aplicação do artigo 11.°, A, proémio, n.° 1, alínea b), da Sexta Diretiva se baseia na verificação da situação referida no artigo 5.°, n.° 7, proémio e alínea a).

81.      Resulta do conjunto das considerações precedentes que o artigo 5.°, n.° 7, proémio e alínea a), da Sexta Diretiva, deve ser interpretado no sentido de que um Estado-Membro pode cobrar IVA, em caso de ocupação por um sujeito passivo, para fins isentos, de um bem imóvel se: esse bem imóvel consistir em trabalhos (de construção) efetuados por um terceiro, mediante pagamento, num terreno desse sujeito passivo e por sua incumbência; e tendo como consequência a inclusão do (valor do) terreno do sujeito passivo na cobrança do IVA, exceto se o terreno em questão já tiver sido afetado, no passado, aos mesmos fins isentos da própria empresa.

IV — Conclusão

82.      Pelas razões acima expostas, entendo que a questão prejudicial submetida pelo Hoge Raad der Nederlanden deveria ser respondida do seguinte modo:

«O artigo 5.°, n.° 7, alínea a), da Sexta Diretiva 77/388/CEE do Conselho, de 17 de maio de 1977, relativa à harmonização das legislações dos Estados-Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios — Sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado: matéria coletável uniforme, deve ser interpretado no sentido de que um Estado-Membro pode cobrar IVA, em caso de ocupação por um sujeito passivo, para fins isentos, de um bem imóvel se esse bem imóvel consistir em trabalhos de construção efetuados por um terceiro, mediante pagamento, num terreno desse sujeito passivo e por sua incumbência, tendo como consequência a inclusão do valor do terreno do sujeito passivo na cobrança do IVA, exceto se o terreno em questão já tiver sido afetado, no passado, aos mesmos fins isentos da própria empresa.»


1 —      Língua original: inglês.


2 —      Sexta Diretiva 77/388/CEE do Conselho, de 17 de maio de 1977, relativa à harmonização das legislações dos Estados-Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios — Sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado: matéria coletável uniforme (JO L 145, p. 1; EE 09 F p. 54), conforme alterada.


3 —      V. PricewaterhouseCoopers, Should own land be included in the taxable amount? [os terrenos próprios devem ser incluídos na matéria coletável?], 20 de outubro de 2011.


4 —      Para mais pormenores, v. o quadro factual do processo e a redação integral da questão referida no n.° 11 e seguintes infra.


5 —      Diretiva do Conselho de 28 de novembro de 2006 relativa ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado (JO L 347, p. 1). A Diretiva 2006/112 substituiu, com efeitos a partir de 1 de janeiro de 2007, a legislação da União em matéria de IVA, nomeadamente a Sexta Diretiva.


6 —      Alteração em itálico.


7 —      Nos termos do artigo 5.°, n.° 7, alínea a), da Sexta Diretiva, transposto pelo artigo 3.°, n.° 1, alínea h), da Wet OB.


8 —      Segunda Diretiva 67/228/CEE do Conselho, de 11 de abril de 1967, relativa à harmonização das legislações dos Estados-Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios — Estrutura e modalidades de aplicação do sistema comum de imposto sobre o valor acrescentado (JO 1967, 71, p. 1303; EE 09 F1 p. 6).


9 —      Neste caso, o valor imobiliário do terreno/campos desportivos.


10 —      Dos processos nacionais relativos ao artigo 5.°, n.° 7, alínea a), o mais próximo que a minha investigação me permitiu encontrar é o processo da House of Lords, Reino Unido, em: Robert Gordon’s College contra Customs and Excise Commissioners [1996] 1 W.L.R. 201 (HL) [IVA — Entregas de bens e prestações de serviços — Sujeito passivo que presta serviços educativos isentos — Desenvolvimento de terreno para utilização como campos de jogos escolares — Custos de desenvolvimento dos empreiteiros — Sujeito passivo dá em arrendamento a sociedade afiliada a 100% — Concessão de licença não exclusiva para utilização dos como campos de jogos pelo sujeito passivo — Se se trata de um autofornecimento pelo sujeito passivo — Se os custos de desenvolvimento são dedutíveis como imposto pago a montante — Sexta Diretiva: artigos 5.°, n.° 7, alínea a), e 6.° n.° 3]. A esse respeito, v. também McKay, H., «Back to College», British Tax Review B.T.R. 321, 1996, disponível no sítio Web Westlaw UK: como afirmou Lord Hoffmann, os artigos 5.°, n.° 7, alínea a), e 6.°, n.° 3, permitem a equiparação do autofornecimento de bens e serviços a uma operação tributável no caso de, se os bens ou serviços tivessem sido adquiridos a terceiro, não haver direito à dedução total do IVA. A hipótese sublinhada só podia aplicar-se se, na realidade, os bens ou serviços não tivessem sido recebidos de um terceiro, mas tivessem, de facto, sido realizados (como o edifício construído no seu terreno) pelo próprio sujeito passivo. Se os bens ou serviços foram adquiridos a terceiro, a questão de saber se o imposto pago a montante sobre essa aquisição é ou não dedutível deve ser determinada segundo o procedimento normal; ou seja, verificando se esta pode ser imputada a uma operação tributável. Não há lugar para qualquer determinação hipotética de qual teria sido a situação se os bens ou serviços tivessem sido adquiridos a um terceiro. Os artigos 5.°, n.° 7, alínea a) e 6.°, n.° 3, têm por objetivo permitir a adoção de legislação pelos Estados-Membros para evitar as distorções que poderiam ocorrer no mercado se um sujeito passivo pudesse obter uma vantagem fiscal adquirindo bens ou serviços de uma determinada forma e não de outra: ou seja, fornecendo este bens ou serviços a si próprio em lugar de os adquirir a terceiro. No processo Robert Gordon’s College, o College fazia uso do novo terreno desportivo de acordo com os serviços (licença) que lhe eram fornecidos por um terceiro (Countesswells). Portanto, na opinião do Lord Hoffmann, não podia haver lugar a uma cobrança do autofornecimento na aceção da Sexta Diretiva. Por conseguinte, a hipótese sublinhada não podia aplicar-se.


11 —      Ou seja, o imposto pago a montante é devido sobre os bens e serviços fornecidos pela pessoa que explora uma empresa e o imposto a jusante é devido sobre os bens ou serviços entregues ou prestados a essa pessoa para os fins da atividade.


12 —      V. acórdão de 30 de março de 2006, Uudenkaupungin kaupunki (C-184/04, Colet., p. I-3039, n.° 24); e de 14 de setembro de 2006, Wollny (C-72/05, Colet., p. I-8297, n.° 20). V. também acórdão de 8 de fevereiro de 2007, Investrand (C-435/05, Colet., p. I-1315).


13 —      Atual artigo 18.°, alínea a), da Diretiva 2006/112.


14 —      Acórdão de 29 de abril de 2004, Gemeente Leusden e Holin Groep (C-487/01 e C-7/02, Colet., p. I-5337). V. também acórdão de 17 de maio de 2001, Fischer e Brandenstein (C-322/99 e C-323/99, Colet., p. I-4049, n.° 56 e a jurisprudência referida), quanto ao artigo 5.°, n.° 6, da Sexta Diretiva, e o acórdão Uudenkaupungin kaupunki, já referido na nota 12, n.° 30, quanto ao artigo 20.° e aos artigos 5.° e 6.° da Sexta Diretiva.


15 —      Nos termos dessa disposição da Sexta Diretiva: «A fim de evitar distorções de concorrência, e sem prejuízo da consulta prevista no artigo 29.°, os Estados-Membros podem equiparar a uma prestação de serviços efetuada a título oneroso a execução, por um sujeito passivo, de um serviço, para os fins da própria empresa, sempre que a execução desse serviço, se efetuado por outro sujeito passivo, não confira direito à dedução total do [IVA].»


16 —      Sobre a prevenção da distorção da concorrência, v., designadamente, acórdão de 16 de setembro de 2008, Isle of Wight Council e o. (C-288/07, Colet., p. I-7203).


17 —      V., designadamente, acórdãos de 11 de junho de 1998, Fischer (C-283/95, Colet., p. I-3369, n.° 27), e de 7 de setembro de 1999, Gregg (C-216/97, Colet., p. I-4947, n.° 19).


18 —      V. acórdão de 29 de outubro de 2009, SKF (C-29/08, Colet., p. I-10413, n.° 67 e a jurisprudência referida).


19 —      V., designadamente, acórdãos de 29 de outubro de 2009, NCC Construction Danmark (C-174/08, Colet., p. I-10567, n.° 41); de 10 de junho de 2010, CopyGene A/S (C-262/08, Colet., p. I-5053, n.° 64); e de 10 de novembro de 2011, Rank Group (C-259/10 e C-260/10, Colet., p. I-10947, n.° 61). V. também acórdão de 7 de dezembro de 2006, Eurodental (C-240/05, Colet., p. I-11479, n.° 55).


20 —      Despacho de 1 de junho de 2006, V.O.F. Dressuurstal Jespers (C-233/05, n.° 27, Colet., p. I-00072*, publicação sumária, n.° 27).


21 —      Acórdão de 14 de maio de 1985, Van Dijk’s Boekhuis (C-139/84, Recueil, p. 1405, n.os 20 e 21).


22 —      Já referido na nota 21, n.° 22.


23 —      Já referido na nota 21, n.° 23.


24 —      V. notas 20 e 21.


25 —      Sublinhado meu.


26 —      O Governo neerlandês acrescenta, a este respeito, que é sobretudo por causa das exceções que o sistema não é ideal e conduz, por vezes, à dupla tributação de determinados elementos do preço de custo.


27 —      N.T. Na realidade, trata-se da «base tributável»; na versão portuguesa da Sexta Diretiva é utilizado, incorretamente, o termo «matéria coletável».


28 —      N.T. Idem.