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CONCLUSÕES DO ADVOGADO-GERAL

MELCHIOR WATHELET

apresentadas em 13 de dezembro de 2012(1)

Processo C-565/11

Mariana Irimie

contra

Administraţia Finanţelor Publice Sibiu,

Administraţia Fondului pentru Mediu

[pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Tribunalul Sibiu (Roménia)]

«Restituição de impostos cobrados por um Estado-Membro em violação do direito da União — Regulamentação nacional que limita os juros a pagar pelo referido Estado sobre os impostos restituídos — Princípios da equivalência, da efetividade e da proporcionalidade»





I —    Introdução

1.        O presente pedido de decisão prejudicial foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe M. Irimie à Administraţia Finanţelor Publice Sibiu (administração das finanças públicas de Sibiu) e à Administraţia Fondului pentru Mediu (administração do fundo para o ambiente), no qual M. Irimie pediu a restituição de um imposto cobrado em violação do direito da União, ou seja, do artigo 110.° TFUE, e o pagamento dos juros legais desde a data do pagamento do referido imposto até à data da restituição efetiva.

2.        M. Irimie foi obrigada a pagar um imposto sobre a poluição aquando da matrícula de um veículo automóvel proveniente doutro Estado-Membro (2).

3.        No seu acórdão TATU (3) relativo ao imposto em causa, o Tribunal de Justiça declarou que o artigo 110.° TFUE devia ser interpretado no sentido de que se opõe a que um Estado-Membro crie um imposto sobre a poluição que incide sobre os veículos automóveis no momento da sua primeira matrícula nesse Estado-Membro, se essa medida fiscal for estruturada de tal maneira que desencoraje a colocação em circulação, no referido Estado-Membro, de veículos usados adquiridos noutros Estados-Membros, sem, no entanto, desencorajar a compra de veículos usados da mesma idade e com o mesmo desgaste no mercado nacional.

4.        Através do seu pedido de decisão prejudicial apresentado na Secretaria do Tribunal de Justiça em 10 de novembro de 2011, o órgão jurisdicional de reenvio interroga-se sobre o facto de saber se uma regulamentação nacional, que prevê o pagamento dos juros sobre o imposto a restituir a partir do dia seguinte à data do pedido de restituição e não a contar da data do pagamento do imposto, é compatível com o direito da União. Assim sendo, o órgão jurisdicional de reenvio interroga-se em particular sobre o facto de saber se a regulamentação nacional é compatível com os princípios da equivalência, da efetividade, e da proporcionalidade e o direito da propriedade, consagrado no artigo 17.° da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (a seguir «Carta»), lido em conjugação com o artigo 6.° TUE.

II — Quadro jurídico romeno

5.        Na ordem jurídica romena, o procedimento fiscal é regulado pelo despacho do Governo n.° 92, relativo ao código de processo tributário (Ordonanţa Guvernului n.° 92 privind Codul de procedură fiscală), de 24 de dezembro de 2003 (Monitorul Oficial al României, parte I, n.° 513, de 31 de julho de 2007), conforme alterado e completado anteriormente (a seguir «OG n.° 92/2003»).

6.        No seguimento de um pedido de esclarecimento do Tribunal de Justiça, de 3 de julho de 2012, o órgão jurisdicional de reenvio indicou que, em aplicação do artigo 124.° do OG n.° 92/2003, lido em conjugação com o seu artigo 70.°, os juros sobre os montantes a restituir a partir dos fundos públicos devem ser pagos a partir do dia seguinte à data do pedido de restituição. Precisou que a jurisprudência nacional a este respeito é assente e inequívoca.

7.        O órgão jurisdicional de reenvio também indicou, no seguimento deste pedido de esclarecimento, que após o processo judicial nele pendente, e mesmo que este tenha sido precedido de um processo administrativo, era impossível ao contribuinte intentar outro processo judicial para pedir o complemento dos juros, ou seja, os relativos ao período compreendido entre o pagamento do imposto ilegal e o pedido de restituição.

III — Litígio no processo principal e questão prejudicial

8.        Em dezembro de 2007, M. Irimie comprou um veículo automóvel matriculado na Alemanha (4). Apresentou-se às autoridades romenas para efeitos da primeira matrícula do veículo na Roménia em setembro de 2008 e pagou o montante de 6 707,00 RON a título do imposto sobre a poluição.

9.        Por petição de 31 de agosto de 2009, aperfeiçoada em 10 de dezembro de 2009 e em 7 de julho de 2011, M. Irimie intentou uma ação junto do Tribunalul Sibiu (Roménia) contra a Administraţia Finanţelor Publice Sibiu e a Administraţia Fondului pentru Mediu a fim de estas serem condenadas, por um lado, a restituírem-lhe o montante pago a título de imposto sobre a poluição e, por outro, a pagarem-lhe os juros legais referentes a este imposto, a partir da data do pagamento deste.

10.      O órgão jurisdicional de reenvio declara que a decisão relativa ao pedido de restituição do montante pago a título de imposto sobre a poluição não deveria suscitar problemas de maior tendo em conta o acórdão Tatu (5), já referido. Contudo, no que diz respeito ao pedido de restituição da totalidade dos juros legais referentes a este imposto, calculados a contar da data do pagamento deste, o órgão jurisdicional de reenvio sublinha que não é possível julgar o mesmo procedente atendendo às disposições conjugadas dos artigos 124.° e 70.° do OG n.° 92/2003, segundo as quais os juros sobre os montantes a restituir a partir dos fundos públicos só são atribuídos a partir do dia seguinte à data do pedido de restituição.

11.      O órgão jurisdicional de reenvio tem dúvidas quanto à conformidade de tal norma com o direito da União, nomeadamente com os princípios da equivalência, da efetividade e da proporcionalidade das ações indemnizatórias que os particulares podem intentar na sequência de uma violação do direito da União, assim como com o direito de propriedade consagrado no artigo 17.° da Carta, lido em conjugação com o artigo 6.° TUE.

12.      Nestas condições, o Tribunalul Sibiu decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça a seguinte questão prejudicial:

«Pode considerar-se que o[s] princípio[s] da efetividade, equivalência e proporcionalidade das vias de ressarcimento por violações do direito [da União] que afetem particulares em consequência da aplicação de uma disposição não conforme com o direito [da União], princípio[s] esse[s] que decorre[m] da jurisprudência do Tribunal de Justiça da União Europeia e do direito de propriedade consagrado no artigo 6.° do [TUE] e no artigo 17.° da [Carta], [podem ser interpretados no sentido de que se opõem] a disposições do direito interno que limitam o montante do prejuízo pelo qual o particular que tenha sofrido a violação de um direito pode ser ressarcido?»

IV — Tramitação processual no Tribunal de Justiça

13.      M. Irimie, a Roménia, o Reino de Espanha, a República Portuguesa e a Comissão Europeia apresentaram observações escritas. M. Irimie, a Roménia, o Reino de Espanha e a Comissão formularam observações orais na audiência de 17 de outubro de 2012.

14.      M. Irimie observa que o direito da União se opõe a uma regulamentação interna que limita o montante do prejuízo (lucros cessantes), cuja reparação integral é devida ao particular que pagou um imposto contrário ao direito da União, atribuindo somente os juros a partir do pedido de restituição e não a contar do pagamento do imposto ilícito.

15.      A Roménia observa que a legislação romena permite reparar na íntegra o prejuízo sofrido pelos contribuintes que foram obrigados a pagar um imposto declarado posteriormente ilegal. Além disso, segundo a Roménia, compete aos Estados-Membros estabelecer as modalidades da atribuição de juros para a reparação dos prejuízos causados aos particulares pelo pagamento de impostos cobrados em violação do direito da União, em conformidade com os princípios da equivalência, da efetividade e da proporcionalidade das soluções.

16.      O Reino de Espanha considera que o direito da União não se opõe, em princípio, a disposições do direito interno que limitam o montante da indemnização do prejuízo que o particular cujo direito foi violado pode obter ou o montante a restituir-lhe em razão do pagamento indevido. Segundo o Reino de Espanha, só há violação do princípio da efetividade se o pagamento de juros tivesse sido de valor tão baixo que limitaria consideravelmente, «esvaziaria excessivamente da sua substância» ou reduziria a nada o direito ao pagamento de juros. O Reino de Espanha considera que o pagamento de juros a partir do pedido de restituição do imposto ilegal não esvazia da sua substância o referido direito.

17.      A República Portuguesa considera que cabe ao Estado-Membro precisar as modalidades do montante ao qual o particular tem direito em razão da violação do direito da União, desde que essas modalidades não causem uma redução substancial do montante ao qual o particular tem direito e não possam ser consideradas um obstáculo ao exercício desse mesmo direito.

18.      Segundo a Comissão, uma disposição de direito interno que, como no presente caso, limita consideravelmente o direito do contribuinte de recuperar as perdas que representa a indisponibilidade do valor ilegalmente cobrado, não respeita o princípio da efetividade.

V —    Análise

19.      A título preliminar, há que recordar que não cabe ao Tribunal de Justiça qualificar juridicamente a petição submetida por M. Irimie ao órgão jurisdicional de reenvio. Cabe à demandante no processo principal precisar a natureza e o fundamento da sua ação (pedido de restituição ou ação de indemnização do prejuízo) sob controlo do órgão jurisdicional de reenvio (6).

20.      Poderia decorrer da redação da questão prejudicial submetida pelo órgão jurisdicional de reenvio que a ação intentada por M. Irimie nesse órgão jurisdicional consiste numa ação de ressarcimento de um prejuízo causado por uma violação do direito da União. Contudo, sob reserva de verificação pelo órgão jurisdicional de reenvio e segundo os autos submetidos ao Tribunal de Justiça, o recurso interposto por M. Irimie no órgão jurisdicional de reenvio parece ter como objetivo a restituição de um imposto cobrado indevidamente em violação do direito da União, mais precisamente do artigo 110.° TFUE (7), assim como o pagamento dos juros legais para o período compreendido entre o pagamento do referido imposto e a sua restituição efetiva.

21.      Constitui jurisprudência consolidada e de longa data que, não obstante a falta de disposições da União relativas à restituição dos impostos nacionais incompatíveis com o direito da União, o direito de obter o reembolso desses impostos é a consequência e o complemento dos direitos conferidos aos litigantes pelas disposições do direito da União, tal como têm sido interpretadas pelo Tribunal de Justiça. O Estado-Membro está, desta forma, obrigado (8) a reembolsar os impostos cobrados em violação do direito da União, uma vez que este direito de reembolso é um direito subjetivo conferido pela ordem jurídica da União (9).

22.      Na falta de regulamentação da União na matéria, cabe ao ordenamento jurídico interno de cada Estado-Membro designar, em aplicação do princípio da autonomia processual, os órgãos jurisdicionais competentes e regular as modalidades processuais das ações judiciais destinadas a garantir a salvaguarda dos direitos que para os litigantes decorrem do direito da União, desde que, por um lado, essas modalidades não sejam menos favoráveis do que as das ações análogas de natureza interna (princípio da equivalência) e, por outro, não tornem, na prática, impossível ou excessivamente difícil o exercício dos direitos conferidos pela ordem jurídica da União (princípio da efetividade) (10). Além disso, contrariamente ao que o Reino de Espanha e a República Portuguesa defendem nos n.os 16 e 17 destas conclusões, embora o princípio da autonomia processual dos Estados-Membros atribua à ordem jurídica interna de cada Estado-Membro a competência para determinar as vias processuais destinadas a garantir a salvaguarda dos direitos que para os cidadãos decorrem do direito da União, o mesmo não pode ter como consequência limitar ou afetar a substância desses direitos.

23.      Enquanto o princípio do reembolso dos impostos nacionais incompatíveis com o direito da União estava bem assente, a obrigação de um Estado-Membro, que cobrou um imposto em violação das disposições do direito da União, de pagar os juros relativos ao valor principal a restituir suscitou interrogações.

24.      Foi assim que, no acórdão Ansaldo Energia e o. (11), o pagamento de juros pôde ser considerado uma questão acessória ao reembolso dos impostos incompatíveis com o direito da União e que coube às autoridades nacionais regular esta questão, aplicando as suas regras internas relativas à taxa de juro e à data a partir da qual os juros deviam ser calculados.

25.      Esta conceção pode ser entendida como relegando essencialmente para o direito nacional a questão, não só das modalidades do cálculo dos juros sobre os impostos a reembolsar, mas igualmente a do direito do contribuinte a cobrar estes juros.

26.      Embora o Tribunal de Justiça, no seu acórdão Metallgesellschaft e o., já referido, tenha reiterado, no n.° 86, que o pagamento «eventual» (12) de juros sobre os impostos indevidamente cobrados era uma questão acessória, declarou, no entanto, cingindo-se ao caso concreto, que o pedido de pagamento de juros que cubram o custo da imobilização das importâncias pagas em violação do direito comunitário não era acessório, mas constituía o próprio objeto das reclamações das demandantes no processo principal. Segundo o Tribunal de Justiça, a violação do direito comunitário em causa não resultava do pagamento do próprio imposto, mas do caráter prematuro da sua exigibilidade (13). Nestas circunstâncias, a atribuição de juros representava o «reembolso» do que tinha sido indevidamente pago e afigurava-se como indispensável para o respeito pelas regras do Tratado. Em consequência, as demandantes no processo principal tinham direito, nomeadamente, à restituição dos juros sobre os valores pagos durante o período compreendido entre o pagamento antecipado do imposto e a data da sua exigibilidade.

27.      É verdade que se poderia pensar em restringir o acórdão Metallgesellschaft e o., já referido, aos factos específicos destes processos e, desta forma, ao pagamento antecipado de um imposto. Contudo, o Tribunal de Justiça declarou, no acórdão Test Claimants in the FII Group Litigation, já referido (14) de forma mais geral a propósito do pagamento de impostos discriminatórios (15) que, quando um Estado-Membro tinha cobrado impostos em violação das regras de direito comunitário, os litigantes tinham direito ao reembolso não só do imposto indevidamente cobrado mas também dos montantes pagos a esse Estado ou por este retidos, diretamente relacionados com esse imposto. 

28.      Além disso, no seu recente acórdão Littlewoods Retail e o., já referido, o Tribunal de Justiça, baseando-se na sua jurisprudência Metallgesellschaft e o., já referida, bem como na sua jurisprudência Test Claimants in the FII Group Litigation, já referida, declarou que os Estados-Membros eram obrigados a restituir, com juros, os montantes dos impostos cobrados em violação do direito da União (16). O Tribunal de Justiça observou que, embora caiba à ordem jurídica interna de cada Estado-Membro prever as condições nas quais tais juros devem ser pagos, indicando a taxa e o modo de cálculo desses juros, as regras nacionais não podem privar o sujeito passivo de uma indemnização adequada pela perda causada pelo pagamento indevido do imposto (17).

29.      O direito a juros que representem uma indemnização adequada pela perda ocasionada pelo pagamento indevido do imposto, em violação do direito da União, situa-se, na minha opinião, na sequência do acórdão Littlewoods Retail e o., já referido, no mesmo patamar (18) que o direito ao reembolso deste imposto e constitui, por conseguinte, um direito subjetivo conferido pela ordem jurídica da União (19). Este direito subjetivo implica necessariamente, no meu entender, o pagamento de juros a partir da data do pagamento desse imposto. É manifestamente a partir dessa data, e não de qualquer outra data posterior, que o contribuinte sofre perdas causadas pela indisponibilidade dos montantes de dinheiro em causa.

30.      De resto, é notório que os contribuintes que não pagaram os impostos são, em princípio, e salvo circunstâncias excecionais, obrigados a pagar ao Tesouro público dos Estados-Membros os impostos não pagos, os juros sobre esses impostos desde a data do seu vencimento assim como os juros de mora e/ou as coimas (20).

31.      A título puramente subsidiário, no caso de a petição de M. Irimie no processo principal ser analisada enquanto ação de ressarcimento de um prejuízo causado por violação do direito da União pelo Estado-Membro, a questão seria saber se, em circunstâncias como as do processo principal, a violação do art. 110.° TFUE por um Estado-Membro conferiria aos contribuintes um direito ao pagamento de prejuízos e juros de montante igual não só ao imposto cobrado em violação do direito da União, mas também aos juros legais vencidos relativos a esse imposto desde a data do seu pagamento.

32.      O Tribunal de Justiça declarou que o princípio da responsabilidade do Estado pelos prejuízos causados aos particulares por violações do direito da União que lhe sejam imputáveis é inerente ao sistema do Tratado (21). Resulta do acórdão de 5 de março de 1996, Brasserie du pêcheur e Factortame (22), que a reparação dos prejuízos causados aos particulares por violações do direito comunitário deve ser adaptada ao prejuízo sofrido e adequado para garantir uma proteção efetiva dos seus direitos. No que respeita mais especialmente ao prejuízo sofrido, o Tribunal de Justiça, no seu acórdão Metallgesellschaft e o., já referido, declarou que uma reparação integral do prejuízo sofrido não pode abstrair de elementos, como o decurso do tempo, suscetíveis de reduzir o seu montante e que a atribuição de juros é uma componente indispensável de um ressarcimento (23). Além disso, o Tribunal de Justiça declarou no seu acórdão, de 13 de julho de 2006, Manfredi e o. (24), que resulta do princípio da efetividade e do direito dos particulares de pedirem a reparação do dano causado por um contrato ou um comportamento suscetível de restringir ou de falsear o jogo da concorrência que as pessoas que tenham sofrido um dano devem poder pedir a reparação não só do dano real (damnum emergens) mas também dos lucros cessantes (lucrum cessans), bem como o pagamento de juros.

33.      Nas circunstâncias como as do processo principal, a atribuição de juros a partir da data do pagamento do imposto em questão parece-me indispensável para o ressarcimento adequado do prejuízo causado pela violação do artigo 110.° TFUE, porque é a partir dessa data que o contribuinte sofreu perdas que consistem na indisponibilidade dos montantes de dinheiro em causa.

34.      À luz da análise dos n.os 22 a 33 das presentes conclusões, considero que é supérfluo examinar a compatibilidade da limitação do montante do prejuízo, segundo o direito romeno, que pode ser obtido por M. Irimie, com os princípios da efetividade e da proporcionalidade, bem como com o direito de propriedade consagrado pelo artigo 6.° TUE em conjugação com o artigo 17.° da Carta.

VI — Conclusão

35.      Tendo em conta as considerações que precedem, proponho ao Tribunal de Justiça que responda da seguinte forma à questão prejudicial submetida pelo Tribunalul Sibiu:

O direito da União deve ser interpretado no sentido de que, em caso de cobrança por um Estado-Membro de um imposto incompatível com o direito da União, concretamente o artigo 110.° TFUE, esse Estado é obrigado a restituir o montante desse imposto e a pagar os juros sobre o montante do mesmo a partir da data do seu pagamento pelo contribuinte.


1 —      Língua original: francês.


2 —      No momento dos factos na origem do litígio no processo principal, o despacho de urgência do Governo n.° 50/2008, de 21 de abril de 2008, que cria o imposto sobre a poluição dos veículos automóveis (Ordonanţă de Urgenţă a Guvernului n.° 50/2008 pentru instituirea taxei pe poluare pentru autovehicule) (Monitorul Oficial al României, parte I, n.° 327, de 25 de abril de 2008), que entrou em vigor em 1 de julho de 2008, estabelecia, no artigo 3.°, um imposto sobre a poluição para os veículos das categorias M1 a M3 e N1 a N3.


3 —      Acórdão de 7 de abril de 2011 (C-402/09, Colet., p. I-2711).


4 —      O veículo foi matriculado pela primeira vez na Alemanha em 23 de março de 1999.


5 —      O órgão jurisdicional de reenvio cita também a jurisprudência que confirma este acórdão, nomeadamente os despachos de 8 de abril de 2011, Obreja e Darmi (C-136/10 e C-178/10), Ijac (C-336/10), Sfichi e Ilaş (C-29/11 e C-30/11), o acórdão de 7 de julho de 2011, Nisipeanu (C-263/10), bem como os despachos de 13 de julho de 2011, Vijulan (C-335/10), Druţu (C-438/10), e Micşa (C-573/10). Este órgão jurisdicional também especificou, no seguimento do pedido de esclarecimentos, de 3 de julho de 2012, que desde o acordão Tatu, já referido, os órgãos jurisdicionais nacionais têm dado provimento aos recursos dos contribuintes, ordenando a restituição do imposto e a atribuição dos juros a partir do dia seguinte à data do pedido de restituição.


6 —      V. acórdãos de 8 de março de 2001, Metallgesellschaft e o. (C-397/98 e C-410/98, Colet., p. I-1727, n.° 81), de 12 de dezembro de 2006, Test Claimants in the FII Group Litigation (C-446/04, Colet., p. I-11753, n.° 201), e de 13 de março de 2007, Test Claimants in the Thin Cap Group Litigation (C-524/04, Colet., p. I-2107, n.° 109).


7 —      Há que referir que o artigo 110.° TFUE é de aplicação direta. V. acórdão de 29 de abril de 1982, Pabst & Richarz (17/81, Receuil, p. 1331). Portanto, cabe a todas as autoridades dos Estados-Membros assegurar, no âmbito das suas competências, o respetivo respeito.


8 —      Uma vez que a recusa de reembolso de um imposto indevidamente instituído constitui uma limitação de um direito subjetivo conferido pela ordem jurídica da União, o Tribunal de Justiça considera que essa recusa deve ser interpretada de maneira restritiva. A repercussão direta do imposto indevido no comprador, apesar de constituir para o sujeito passivo um enriquecimento sem causa, constitui a única exceção ao direito de reembolso dos impostos cobrados em violação do direito da União. V. acórdão de 6 de setembro de 2011, Lady & Kid e o. (C-398/09, Colet., p. I-7375, n.° 20). A este respeito, no n.° 21 do referido acórdão, o Tribunal de Justiça reiterou a sua jurisprudência segundo a qual, mesmo na hipótese de se provar que o imposto [indevido] foi repercutido em terceiros, o seu reembolso ao operador não implica necessariamente enriquecimento sem causa por parte deste, visto que a integração do montante do referido imposto nos preços praticados pode provocar prejuízos associados à diminuição do volume das suas vendas.


9 —      V. acórdão de 19 de julho de 2012, Littlewoods Retail e o. (C-591/10, n.° 24 e jurisprudência referida).


10 —      V., neste sentido, acórdãos Metallgesellschaft e o. (n.° 85), e Test Claimants in the FII Group Litigation (n.° 203), já referidos.


11 —      V. acórdão de 15 de setembro de 1998 (C-279/96 a C-281/96, Colet., p. I-5025, n.° 20. V., também, acórdão de 7 de setembro de 2006, N (C-470/04, Colet., p. I-7409, n.° 61.


12 —      Há que notar que a palavra «eventual» não consta da versão inglesa do acórdão nesse processo, cuja língua do processo era o inglês.


13 —      Com efeito, o Tribunal de Justiça declarou que o que era contrário ao direito comunitário não era o facto de um imposto ter sido cobrado no Reino Unido por ocasião do pagamento de dividendos de uma filial à sua sociedade-mãe, mas o facto de as filias residentes no Reino Unido de sociedades-mãe com sede noutro Estado-Membro terem sido obrigadas a pagar esse imposto antecipadamente, enquanto as filiais residentes de sociedades-mãe residentes tinham a possibilidade de escapar a esta obrigação (v. n.° 83 do referido acórdão).


14 —      V., também, acórdão Test Claimants in the Thin Cap Group Litigation, já referido (n.° 112).


15 —      Concretamente, não estava em causa o pagamento antecipado de um imposto, mas a incompatibilidade do imposto com o Tratado.


16—      V. acórdão Littlewoods Retail e o., já referido (n.os 25 e 26).


17 —      Há que notar que resulta do n.° 8 do acórdão Littlewoods Retail e o., já referido, que a data a partir da qual os juros deveriam ser calculados segundo o direito inglês aplicável ao caso, era a data em que as autoridades fiscais britânicas beneficiavam do IVA que tinham recebido em excesso e que a data em que este cálculo terminava era a data em que as referidas autoridades tinham autorizado o reembolso do montante sobre o qual eram devidos juros. Considero que a falta de menção, no n.° 27 do referido acórdão, da data a partir da qual os juros deviam ser calculados, entre as condições que cabia à ordem jurídica interna de cada Estado-Membro prever, é particularmente reveladora. Trata-se, a meu ver, de uma aprovação tácita pelo Tribunal de Justiça do período pelo qual eram devidos juros segundo o direito inglês e da consagração do direito subjetivo a um nível de juros que representava uma indemnização adequada pela perda devida causada pelo pagamento indevido do imposto.


18 —      No n.° 30 das suas conclusões no processo que deu lugar ao acórdão Littlewoods Retail e o., já referido, a advogada-geral V. Trstenjak afirmou que «[o]s sujeitos passivos dispõem […] de um direito ao reembolso do imposto bem como [de] um direito ao pagamento de juros, fundamentando-se estes direitos do sujeito passivo nas disposições do direito da União nos termos das quais os impostos cobrados são proibidos».


19—      V. n.° 21 das presentes conclusões. A este respeito, há que notar que o Tribunal de Justiça, no acórdão Littlewoods Retail e o., já referido, não fez qualquer referência à natureza acessória da questão dos juros.


20 —      Os juros de mora e as coimas no domínio fiscal são instrumentos de coerção utilizados pelos Estados-Membros no interesse público com o objetivo de garantir o pagamento (atempado) dos impostos devidos pelos contribuintes.


21 —      V., acórdãos de 19 de novembro de 1991, Francovich e o. (C-6/90 e C-9/90, Colet., p. I-5357, n.° 35), e de 8 de outubro de 1996, Dillenkofer e o. (C-178/94, C-179/94 e C-188/94 a C-190/94, Colet., p. I-4845, n.° 20.


22 —      C-46/93 e C-48/93, Colet., p. I-1029, n.° 82.


23 —      V. n.° 94.


24 —      C-295/04 a C-298/04, Colet., p. I-6619, n.° 100.