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Processo C-303/07

processo intentado por

Aberdeen Property Fininvest Alpha Oy

(pedido de decisão prejudicial apresentado pela Korkein hallinto-oikeus)

«Liberdade de estabelecimento – Directiva 90/435/CEE – Imposto sobre as sociedades – Distribuição de dividendos – Retenção na fonte efectuada sobre os dividendos distribuídos a sociedades não residentes diferentes das sociedades mencionadas na referida directiva – Isenção dos dividendos distribuídos a sociedades residentes»

Sumário do acórdão

Livre circulação de pessoas – Liberdade de estabelecimento – Legislação fiscal – Imposto sobre as sociedades – Imposition des dividendes

[Artigo 43.° CE e 48.° CE; Directiva 90/435 do Conselho, artigo 2.°, alínea a)]

Os artigos 43.° CE e 48.° CE devem ser interpretados no sentido de que se opõem à legislação de um Estado-Membro que isenta do imposto por retenção na fonte os dividendos distribuídos por uma filial residente nesse Estado a uma sociedade anónima estabelecida no mesmo Estado, mas que sujeita ao imposto por retenção na fonte os dividendos semelhantes pagos a uma sociedade-mãe do tipo SICAV, residente noutro Estado-Membro, que reveste uma forma jurídica desconhecida do direito do primeiro Estado e que não consta da lista das sociedades mencionadas no artigo 2.°, alínea a), da Directiva 90/435, relativa ao regime fiscal comum aplicável às sociedades-mães e sociedades afiliadas de Estados-Membros diferentes, conforme alterada pela Directiva 2003/123/CE do Conselho, de 22 de Dezembro de 2003, e que, nos termos da legislação do outro Estado-Membro, está isenta do imposto sobre o rendimento.

Com efeito, essa diferença de tratamento fiscal dos dividendos entre as sociedades-mãe, em função do local da sua sede, é susceptível de constituir uma restrição à liberdade de estabelecimento, em princípio proibida pelos artigos 43.° CE e 48.° CE, uma vez que torna menos atraente o exercício da liberdade de estabelecimento por sociedades estabelecidas noutros Estados-Membros, as quais poderiam, consequentemente, renunciar à aquisição, à criação ou à manutenção de uma filial no Estado-Membro que aplica esta diferença de tratamento.

Na verdade, relativamente às medidas previstas por um Estado-Membro a fim de evitar ou atenuar a tributação em cadeia ou a dupla tributação económica dos lucros distribuídos por uma sociedade residente, os accionistas beneficiários residentes não se encontram necessariamente numa situação comparável à dos accionistas beneficiários residentes de outro Estado-Membro. Todavia, a partir do momento em que um Estado-Membro, de modo unilateral ou por via convencional, sujeita ao imposto sobre o rendimento não só os accionistas residentes mas também os accionistas não residentes, relativamente aos dividendos que recebam de uma sociedade residente, a situação dos referidos accionistas não residentes assemelha-se à dos accionistas residentes. Consequentemente, quando um Estado-Membro tenha optado por preservar as sociedades-mãe residentes de uma tributação em cadeia dos lucros distribuídos por uma filial residente, deve alargar esta medida às sociedades-mãe não residentes que se encontrem numa situação comparável, em razão do facto de uma tributação análoga incidente sobre estas sociedades não residentes resultar do exercício da sua competência fiscal sobre estas.

A circunstância de, no direito finlandês, não haver um tipo de sociedades com uma forma jurídica idêntica à de uma SICAV residente de outro Estado-Membro não pode, por si só, justificar um tratamento diferenciado, na medida em que, não estando o direito das sociedades dos Estados-Membros inteiramente harmonizado a nível comunitário, a liberdade de estabelecimento ficaria, desse modo, esvaziada de qualquer efeito útil. Além disso, a circunstância invocada pelo Governo finlandês relativa à não tributação dos rendimentos de uma SICAV no seu Estado-Membro de residência, não origina uma diferença entre esta sociedade e uma sociedade anónima residente, que justifique um tratamento diferenciado no que respeita ao imposto por retenção na fonte sobre os dividendos recebidos por estas duas categorias de sociedades, dado que o Estado-Membro da sociedade distribuidora dos dividendos optou por não exercer a sua competência tributária sobre tais rendimentos, quando são auferidos por sociedades residentes. Por outro lado, também não é pertinente o argumento segundo o qual, pelo facto de um Estado-Membro não tributar os rendimentos de uma SICAV, a tributação em cadeia intervém não ao nível desta sociedade mas sim ao nível dos seus sócios, devendo ser evitada pelo Estado-Membro onde estes têm residência, uma vez que é o Estado-Membro em causa que, ao sujeitar a imposto por retenção na fonte os rendimentos que já foram tributados a nível da sociedade distribuidora, criou a tributação em cadeia, tributação que este Estado-Membro optou por evitar em relação aos dividendos distribuídos às sociedades residentes. Nestas condições, as diferenças existentes entre uma SICAV estrangeira e uma sociedade anónima de direito nacional, não são suficientes para criar uma distinção objectiva em relação à isenção do imposto por retenção na fonte sobre os dividendos recebidos.

Esse regime fiscal não pode ser justificado por razões relativas à prevenção da evasão fiscal na medida em que não visa especificamente expedientes puramente artificiais, desprovidos de realidade económica e criados unicamente com o objectivo de eludir o imposto normalmente devido pelos lucros gerados por actividades realizadas no território nacional. Quanto ao argumento relativo à repartição equilibrada do poder de tributação, quando um Estado-Membro tenha optado por não tributar as sociedades beneficiárias estabelecidas no seu território, relativamente a este tipo de rendimentos, não pode invocar a necessidade de garantir uma repartição equilibrada do poder de tributação entre os Estados-Membros, para justificar a tributação das sociedades beneficiárias estabelecidas noutro Estado-Membro. A restrição à liberdade de estabelecimento operada pela referida regulamentação não pode também ser justificada pela necessidade de preservar a coerência do regime fiscal. Com efeito, a isenção do imposto por retenção na fonte dos dividendos não estando sujeita à condição de que os dividendos recebidos pela sociedade anónima sejam redistribuídos por esta e de que a sua tributação ao nível dos detentores das acções da referida sociedade permite compensar a isenção do imposto por retenção na fonte, não há nexo directo entre a isenção do imposto por retenção na fonte e a tributação dos referidos dividendos como rendimentos dos detentores das acções de uma sociedade anónima.

(cf. n.os 41-44, 50-51, 54-56, 65-67, 73-76, disp.)







ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Primeira Secção)

18 de Junho de 2009 (*)

«Liberdade de estabelecimento – Directiva 90/435/CEE – Imposto sobre as sociedades – Distribuição de dividendos – Retenção na fonte efectuada sobre os dividendos distribuídos a sociedades não residentes diferentes das sociedades mencionadas na referida directiva – Isenção dos dividendos distribuídos a sociedades residentes»

No processo C-303/07,

que tem por objecto um pedido de decisão prejudicial nos termos do artigo 234.° CE, apresentado pelo Korkein hallinto-oikeus (Finlândia), por decisão de 27 de Junho de 2007, entrado no Tribunal de Justiça em 29 de Junho de 2007, no processo intentado por

Aberdeen Property Fininvest Alpha Oy,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Primeira Secção),

composto por: P. Jann, presidente de secção, A. Tizzano, A. Borg Barthet, E. Levits (relator) e J.-J. Kasel, juízes,

advogado-geral: J. Mazák,

secretário: C. Strömholm, administradora,

vistos os autos e após a audiência de 13 de Novembro de 2008,

vistas as observações apresentadas:

–        em representação da Aberdeen Property Fininvest Alpha Oy, por J. Laaksonen, oikeustieteen kandidaatti, e M. Virolainen, kauppatieteiden maisteri,

–        em representação do Governo finlandês, por J. Himmanen, na qualidade de agente,

–        em representação do Governo cipriota, por E. Neofitou, na qualidade de agente,

–        em representação do Governo italiano, por I. M. Braguglia, na qualidade de agente, assistido por P. Gentili, avvocato dello Stato,

–        em representação da Comissão das Comunidades Europeias, por R. Lyal e I. Koskinen, na qualidade de agentes,

ouvidas as conclusões do advogado-geral na audiência de 18 de Dezembro de 2008,

profere o presente

Acórdão

1        O pedido de decisão prejudicial tem por objecto a interpretação dos artigos 43.° CE, 48.° CE, 56.° CE e 58.° CE.

2        Este pedido foi apresentado pela sociedade de direito finlandês Aberdeen Property Fininvest Alpha Oy (a seguir «Alpha»), no âmbito de um processo que corre os seus termos no Korkein hallinto-oikeus (Supremo Tribunal Administrativo), a propósito da cobrança de um imposto por retenção na fonte sobre os dividendos a distribuir à Aberdeen Property Nordic Fund I SICAV (a seguir «Nordic Fund SICAV»), uma sociedade de investimento de capital variável (SICAV), de direito luxemburguês, estabelecida no Luxemburgo.

 Quadro jurídico

 Regulamentação comunitária

3        A Directiva 90/435/CEE do Conselho, de 23 de Julho de 1990, relativa ao regime fiscal comum aplicável às sociedades-mães e sociedades afiliadas de Estados-Membros diferentes (JO L 225, p. 6), conforme alterada pela Directiva 2003/123/CE do Conselho, de 22 de Dezembro de 2003 (JO 2004, L 7, p. 41, a seguir «Directiva 90/435»), prevê, no seu artigo 2.°:

«1.   Para efeitos de aplicação da […] [D]irectiva [90/435], a expressão ‘sociedade de um Estado-Membro’ designa qualquer sociedade:

a)      Que revista uma das formas enumeradas no anexo;

[…]

c)      Que, além disso, esteja sujeita, sem possibilidade de opção e sem deles se encontrar isenta, a um dos seguintes impostos:

[…]

–      impôt sur le revenu des collectivités, no Luxemburgo,

[…]

–               yhteisöjen tulovero/inkomstskatten för samfund, na Finlândia,

[…]»

4        O artigo 3.°, n.° 1, alínea a), primeiro parágrafo, da Directiva 90/435 dispõe que, para os efeitos desta directiva, é reconhecida a qualidade de sociedade-mãe, pelo menos, a qualquer sociedade de um Estado-Membro que satisfaça as condições enunciadas no artigo 2.° desta directiva e que detenha, no capital de uma sociedade de outro Estado-Membro que preencha as mesmas condições, uma participação mínima de 20%. Em conformidade com o mesmo artigo 3.°, n.° 1, alínea a), terceiro e quarto parágrafos, a partir de 1 de Janeiro de 2007, a percentagem mínima de participação no capital será de 15% e, a partir de 1 de Janeiro de 2009, de 10%.

5        Por força do artigo 5.° da referida directiva, os lucros distribuídos por uma sociedade afiliada à sua sociedade-mãe são isentos de imposto por retenção na fonte.

6        O anexo da Directiva 90/435, alíneas i) e m), tem a seguinte redacção:

«i)      As sociedades de direito luxemburguês denominadas ‘société anonyme’, ‘société en commandite par actions’, ‘société à responsabilité limitée’, ‘société coopérative’, ‘société coopérative organisée comme une société anonyme’, ‘association d’assurances mutuelles’, ‘association d’épargne-pension’, ‘entreprise de nature commerciale, industrielle ou minière de l’État, des communes, des syndicats de communes, des établissements publics et des autres personnes morales de droit public’, bem como outras sociedades de direito luxemburguês sujeitas ao imposto sobre as sociedades luxemburguês;

m)      As sociedades de direito finlandês denominadas osakeyhtiö/aktiebolag’, ‘osuuskunta/andelslag’, ‘säästöpankki/sparbank’ e ‘vakuutusyhtiö/försäkringsbolag’.»

 Legislação nacional

7        Em conformidade com o artigo 3.° da Lei relativa ao imposto sobre o rendimento [Tuloverolaki (1535/1992)], de 30 de Dezembro de 1992, entende-se por «pessoas colectivas», designadamente, as sociedades anónimas, as cooperativas, as caixas de poupança, os fundos de investimento e quaisquer outras pessoas colectivas ou patrimónios autónomos consagrados a um objectivo particular equiparável às pessoas colectivas referidas neste artigo.

8        O artigo 9.°, n.° 1, da lei relativa ao imposto sobre o rendimento prevê:

«Está sujeita ao imposto sobre o rendimento:

[…]

2)      qualquer pessoa singular que não esteja domiciliada na Finlândia durante o exercício fiscal e qualquer pessoa colectiva estrangeira, pelos rendimentos auferidos na Finlândia (sujeição limitada ao imposto).»

9        Em conformidade com o artigo 10.°, n.° 6, da referida lei, os dividendos pagos por uma sociedade anónima, uma cooperativa ou qualquer outra pessoa colectiva finlandesa constituem rendimento auferido na Finlândia.

10      A Lei relativa à tributação dos rendimentos da actividade económica [Laki elinkeinotulon verottamisesta (360/1968)], de 24 de Junho de 1968, que regula a fiscalidade dos dividendos recebidos pelas sociedades anónimas estabelecidas na Finlândia, dispõe, no seu artigo 6.°a, na versão da Lei de 30 de Julho de 2004:

«Os dividendos recebidos por uma sociedade não constituem rendimentos tributáveis. Sem prejuízo do disposto no segundo parágrafo, são, contudo, tributáveis por 75% do seu montante e isentos de imposto por 25% do mesmo montante, se:

1)      os dividendos tiverem sido recebidos como rendimentos de acções detidas nos activos e a sociedade que os distribui não for uma sociedade estrangeira na acepção do artigo 2.° da Directiva [90/435], cujo capital social seja, pelo menos em 10%, detido directamente pelo beneficiário dos dividendos, quando da distribuição dos dividendos;

2)      a sociedade que distribui os dividendos não for uma sociedade finlandesa nem uma sociedade estabelecida num Estado-Membro da União Europeia, como referida no ponto 1); ou

3)      a sociedade que distribui os dividendos for uma sociedade cotada, na acepção do artigo 33.°a, segundo parágrafo, da lei relativa ao imposto sobre o rendimento, e o beneficiário dos dividendos for uma sociedade não cotada que não detém directamente, quando da distribuição dos dividendos, pelo menos 10% do capital social da sociedade que distribui os dividendos.

Caso não exista convenção para evitar a dupla tributação entre o Estado de estabelecimento da sociedade estrangeira que distribui os dividendos referidos no primeiro parágrafo, ponto 2), e a [República da] Finlândia, aplicável aos dividendos distribuídos durante o exercício em causa, estes dividendos constituem um rendimento integralmente tributável.

[…]»

11      Em conformidade com o artigo 3.° da Lei relativa ao imposto sobre o rendimento dos contribuintes limitadamente tributados [Laki rajoitetusti verovelvollisen tulon verottamisesta (627/1978)], de 11 de Agosto de 1978, o imposto por retenção na fonte incide, designadamente, sobre os dividendos. O disposto nesta lei a respeito dos dividendos é igualmente aplicável à participação nos lucros dos fundos de investimento.

12      Nos termos do artigo 3.°, quinto parágrafo, da referida lei, na sua versão de 30 de Julho de 2004, não são sujeitos a imposto por retenção na fonte os dividendos pagos a uma sociedade domiciliada num Estado-Membro da União Europeia que detenha directamente, pelo menos, 20% do capital social da sociedade que distribui os dividendos, desde que o beneficiário seja uma sociedade na acepção do artigo 2.° da Directiva 90/435.

13      Os dividendos não abrangidos pela excepção prevista no referido artigo 3.°, quinto parágrafo, estão sujeitos a imposto por retenção na fonte, cuja taxa é determinada pela convenção fiscal celebrada entre o Estado-Membro de residência do beneficiário e a República da Finlândia e, não havendo essa convenção, esta taxa é fixada em 28% do montante bruto dos dividendos.

 A convenção para evitar a dupla tributação

14      A Convenção entre o Luxemburgo e a República da Finlândia, destinada a evitar a dupla tributação em matéria de impostos sobre o rendimento e sobre o património, celebrada em 1 de Março de 1982 (Mémorial A 1982, p. 1966), na sua redacção aplicável ao litígio no processo principal (a seguir «convenção fiscal»), não prevê disposições particulares a respeito das sociedades do tipo «SICAV» de direito luxemburguês, mas, segundo a jurisprudência do Korkein hallinto-oikeus, tal sociedade é considerada como uma pessoa domiciliada no Luxemburgo, para efeitos desta convenção.

15      Nos termos do artigo 10.° da convenção fiscal, os dividendos que uma sociedade domiciliada num dos Estados-Membros contratantes paga a uma pessoa domiciliada noutro Estado-Membro contratante podem ser tributados neste último Estado. Os dividendos também podem ser tributados no Estado-Membro contratante onde a sociedade que paga os dividendos está domiciliada, de acordo com a legislação deste Estado. Contudo, se o beneficiário dos dividendos for o titular dos benefícios fiscais ligados aos mesmos, o imposto não pode exceder 5% dos dividendos totais, se se tratar de uma sociedade que detenha, directa ou indirectamente, pelo menos, 25% do capital da sociedade que os distribui.

 Litígio no processo principal e questão prejudicial

16      A Alpha apresentou um pedido de decisão prévia à Keskusverolautakunta (comissão central dos impostos), relativamente à tributação dos dividendos pagos por esta sociedade à Nordic Fund SICAV, da qual viria a tornar-se filial a 100%, como resulta deste pedido. A sociedade Aberdeen Property Investors Luxemburg SA, membro do grupo Aberdeen Property Investors, seria responsável pela gestão da Nordic Fund SICAV.

17      As partes sociais da Nordic Fund SICAV deveriam ser propostas prioritariamente aos investidores institucionais, como sociedades seguradoras e fundos de pensões alemães. A Nordic Fund SICAV tinha por objectivo investir no sector imobiliário na Finlândia, por intermédio da Alpha, que adquiriria participações em sociedades imobiliárias, ou, sendo caso disso, se tornaria directamente proprietária de bens imóveis.

18      A Alpha solicitou uma informação vinculativa à Keskusverolautakunta sobre a questão de saber se era obrigada a proceder à retenção na fonte do imposto sobre os dividendos pagos à Nordic Fund SICAV, à luz dos artigos 43.° CE e 56.° CE e atendendo a que os dividendos pagos a uma sociedade anónima finlandesa análoga a uma sociedade do tipo SICAV, que exerça uma actividade de investimento em imóveis, ou a outra pessoa colectiva de natureza equivalente, estabelecida na Finlândia, não são considerados rendimentos tributáveis nos termos da legislação finlandesa e também não estão sujeitos a imposto por retenção na fonte.

19      Na sua decisão prévia n.° 2/2006, de 25 de Janeiro de 2006, relativa à cobrança do imposto a reter na fonte nos anos de 2005 e 2006, a Keskusverolautakunta considerou que a Alpha era obrigada a cobrar o imposto sobre os dividendos pagos à Nordic Fund SICAV.

20      Por um lado, a Keskusverolautakunta assinalou que, dado que as SICAV não constam da lista do anexo da Directiva 90/435 e não pagam imposto sobre o rendimento no Estado-Membro onde estão estabelecidas, a Nordic Fund SICAV não pode ser considerada uma sociedade na acepção dessa directiva e, consequentemente, os dividendos que lhe são pagos não podem ser isentos do imposto por retenção na fonte.

21      Por outro lado, a Keskusverolautakunta indicou que, embora a Nordic Fund SICAV seja comparável a uma sociedade anónima finlandesa («osakeyhtiö»), estas sociedades apresentam várias diferenças. Com efeito, diferem, em primeiro lugar, na medida em que o capital social da sociedade anónima finlandesa está bloqueado, e, durante o período de actividade desta, não pode ser reembolsado aos accionistas. Estas sociedades distinguem-se, em segundo lugar, pelo facto de a sociedade anónima finlandesa ser tributável no Estado do estabelecimento e, em terceiro lugar, por esta ser uma sociedade referida na Directiva 90/435. Por conseguinte, estes dois tipos de sociedades não são comparáveis na acepção do direito comunitário.

22      A Alpha impugnou a decisão da Keskusverolautakunta no órgão jurisdicional de reenvio. Considerando que a resolução do litígio nele pendente requer uma interpretação do direito comunitário, o Korkein hallinto-oikeus decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça a seguinte questão prejudicial:

«Os artigos 43.° CE e 48.° CE e os artigos 56.° CE e 58.° CE devem ser interpretados no sentido de que, para a realização das liberdades fundamentais por eles garantidas, uma sociedade anónima ou um fundo de investimento de direito finlandês e uma SICAV de direito luxemburguês devem ser considerados comparáveis, apesar de não existir no direito finlandês um tipo de sociedade completamente idêntico a uma SICAV, tendo simultaneamente em conta que a SICAV, que é uma sociedade de direito luxemburguês, não é enumerada na lista das sociedades que são abrangidas pelo artigo 2.°, alínea a), da Directiva 90/435 – com a qual a legislação finlandesa em matéria de retenção na fonte aplicável ao caso em apreço se encontra harmonizada – e ainda que, de acordo com a legislação fiscal do Grão-Ducado do Luxemburgo, a SICAV está isenta do imposto sobre o rendimento? Nestas circunstâncias, é contrário aos referidos artigos do Tratado CE que a SICAV domiciliada no Luxemburgo, beneficiária dos dividendos, não esteja isenta na Finlândia do imposto por retenção na fonte sobre os dividendos que aí recebe?»

 Quanto à questão prejudicial

23      Através da sua questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, no essencial, se os artigos 43.° CE, 48.° CE, 56.° CE e 58.° CE se opõem à legislação de um Estado-Membro que isenta do imposto por retenção na fonte os dividendos distribuídos por uma filial domiciliada nesse Estado a uma sociedade anónima ou a um fundo de investimento estabelecidos no mesmo Estado, mas que sujeita a imposto por retenção na fonte os dividendos semelhantes pagos a uma sociedade-mãe do tipo SICAV domiciliada noutro Estado-Membro, que reveste uma forma jurídica desconhecida do direito do primeiro Estado e que não consta da lista das sociedades referidas no artigo 2.°, alínea a), da Directiva 90/435, e que, nos termos da legislação do outro Estado-Membro, está isenta do imposto sobre o rendimento.

24      A título liminar, deve recordar-se que, de acordo com jurisprudência assente, embora a fiscalidade directa seja da competência dos Estados-Membros, estes devem, todavia, exercer essa competência com observância do direito comunitário (v., designadamente, acórdãos de 13 de Dezembro de 2005, Marks & Spencer, C-446/03, Colect., p. I-10837, n.° 29; de 12 de Setembro de 2006, Cadbury Schweppes e Cadbury Schweppes Overseas, C-196/04, Colect., p. I-7995, n.° 40; de 12 de Dezembro de 2006, Test Claimants in Class IV of the ACT Group Litigation, C-374/04, Colect., p. I-11673, n.° 36; e de 8 de Novembro de 2007, Amurta, C-379/05, Colect., p. I-9569, n.° 16).

25      Importa também referir que, não havendo medidas de unificação ou de harmonização comunitária, os Estados-Membros continuam a ser competentes para determinar, por via convencional ou unilateral, os critérios de repartição do seu poder tributário, de modo a, nomeadamente, eliminar a dupla tributação (acórdãos de 12 de Maio de 1998, Gilly, C-336/96, Colect., p. I-2793, n.os 24 e 30; de 21 de Setembro de 1999, Saint-Gobain ZN, C-307/97, Colect., p. I-6161, n.° 57; de 7 de Setembro de 2006, N, C-470/04, Colect., p. I-7409, n.° 44; e Amurta, já referido, n.° 17).

26      A isenção do imposto por retenção na fonte dos dividendos distribuídos por uma filial à sua sociedade-mãe é imposta aos Estados-Membros pelo artigo 5.° da Directiva 90/435, apenas em relação às distribuições de dividendos abrangidos pelo âmbito de aplicação da mesma.

27      Como indica o órgão jurisdicional de reenvio, a situação em causa no processo principal não é abrangida pelo âmbito de aplicação da Directiva 90/435, na medida em que uma sociedade do tipo SICAV não preenche os requisitos enunciados no artigo 2.°, n.° 1, alíneas a) e c), desta directiva.

28      O Tribunal de Justiça já decidiu que, para participações não abrangidas pela Directiva 90/435, compete aos Estados-Membros determinar se, e em que medida, deve ser evitada a dupla tributação económica dos lucros distribuídos e adoptar, para esse efeito, de modo unilateral ou através de convenções celebradas com outros Estados-Membros, mecanismos destinados a evitar ou a atenuar essa dupla tributação económica. No entanto, esta situação não lhes permite aplicar medidas contrárias às liberdades de circulação garantidas pelo Tratado (v. acórdãos, já referidos, Test Claimants in Class IV of the ACT Group Litigation, n.° 54, e Amurta, n.° 24).

29      Tendo o órgão jurisdicional de reenvio colocado a sua questão em relação tanto aos artigos 43.° CE e 48.° CE como aos artigos 56.° CE e 58.° CE, há que determinar previamente se, e em que medida, uma regulamentação nacional como a que está em causa no processo principal é susceptível de afectar as liberdades garantidas por estes artigos.

 Quanto à liberdade aplicável

30      Importa assinalar que uma legislação nacional, nos termos da qual a aplicação da isenção do imposto por retenção na fonte aos dividendos distribuídos por uma sociedade residente depende, em primeiro lugar, do facto de a sociedade beneficiária ser uma sociedade residente ou não residente e, em segundo lugar, quanto às sociedades beneficiárias não residentes, da extensão da participação detida na sociedade distribuidora pela sociedade beneficiária e da qualificação desta como sociedade na acepção do artigo 2.° da Directiva 90/435, pode ser abrangida tanto pelo artigo 43.° CE, relativo à liberdade de estabelecimento, como pelo artigo 56.° CE, relativo à livre circulação de capitais.

31      Com efeito, não podem beneficiar da isenção do imposto por retenção na fonte as sociedades não residentes cujas participações na sociedade distribuidora sejam inferiores ao limite fixado pela legislação nacional, que corresponde, à época dos factos no processo principal, a 20% do capital social, nem as sociedades que, apesar das suas participações serem superiores a este limite, não preenchem a definição de sociedade na acepção do artigo 2.° da Directiva 90/435.

32      Como resulta do despacho de reenvio, no processo principal, considera-se que a sociedade beneficiária dos dividendos detém 100% das participações da sociedade distribuidora, mas esta não é entendida como uma sociedade na acepção do artigo 2.° da referida directiva.

33      Por conseguinte, cumpre reconhecer que o litígio no processo principal diz exclusivamente respeito ao impacto da legislação nacional em causa na situação de uma sociedade residente que distribuiu dividendos a accionistas que nela detêm uma participação que lhes confere uma influência segura nas decisões da referida sociedade e lhes permite determinar as respectivas actividades (v., neste sentido, acórdãos de 12 de Dezembro de 2006, Test Claimants in the FII Group Litigation, C-446/04, Colect., p. I-11753, n.° 38, e de 26 de Junho de 2008, Burda, C-284/06, Colect., p. I-4571, n.° 72).

34      Ora, segundo jurisprudência assente, quando uma sociedade detém uma participação noutra sociedade que lhe confere uma influência segura nas decisões dessa sociedade e lhe permite determinar as respectivas actividades, são as disposições do Tratado relativas à liberdade de estabelecimento que se aplicam (v., designadamente, acórdãos Cadbury Schweppes e Cadbury Schweppes Overseas, já referido, n.° 31; Test Claimants in Class IV of the ACT Group Litigation, já referido, n.° 39; de 13 de Março de 2007, Test Claimants in the Thin Cap Group Litigation, C-524/04, Colect., p. I-2107, n.° 27; de 18 de Julho de 2007, Oy AA, C-231/05, Colect., p. I-6373, n.° 20; e Burda, já referido, n.° 69).

35      Admitindo que a legislação em causa no processo principal tenha efeitos restritivos na livre circulação de capitais, esses efeitos são a consequência inelutável de um eventual obstáculo à liberdade de estabelecimento e, portanto, não justificam uma análise autónoma dessa legislação à luz do artigo 56.° CE (v., neste sentido, acórdãos, já referidos, Cadbury Schweppes e Cadbury Schweppes Overseas, n.° 33, Test Claimants in the Thin Cap Group Litigation, n.° 34, e Oy AA, n.° 24).

36      Importa, portanto, responder à questão submetida apenas em relação aos artigos 43.° CE e 48.° CE.

 Quanto à existência de uma restrição à liberdade de estabelecimento

37      Resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça que a liberdade de estabelecimento, que o artigo 43.° CE reconhece aos nacionais da Comunidade e que compreende tanto o acesso às actividades não assalariadas e o seu exercício como a constituição e a gestão de empresas, nas condições definidas na legislação do país de estabelecimento para os seus próprios nacionais, inclui, nos termos do artigo 48.° CE, para as sociedades constituídas em conformidade com a legislação de um Estado-Membro e que tenham a sua sede social, a administração central ou o estabelecimento principal na Comunidade Europeia, o direito de exercerem a sua actividade no Estado-Membro em causa através de uma filial, de uma sucursal ou de uma agência (acórdãos de 23 de Fevereiro de 2006, Keller Holding, C-471/04, Colect., p. I-2107, n.° 29, e de 14 de Dezembro de 2006, Denkavit Internationaal e Denkavit France, C-170/05, Colect., p. I-11949, n.° 20).

38      Em relação às sociedades, importa referir que a sua sede, na acepção do artigo 48.° CE, serve para determinar, à semelhança da nacionalidade das pessoas singulares, a sua subordinação à ordem jurídica de um Estado-Membro. Admitir que o Estado-Membro de residência possa livremente aplicar um tratamento diferente unicamente pelo facto de a sede de uma sociedade estar situada noutro Estado-Membro significaria, portanto, esvaziar o artigo 43.° CE do seu conteúdo. A liberdade de estabelecimento tem, assim, por objectivo garantir o benefício do tratamento nacional no Estado-Membro de acolhimento, proibindo qualquer discriminação baseada no local da sede das sociedades (v. acórdãos, já referidos, Test Claimants in Class IV of the ACT Group Litigation, n.° 43, Denkavit Internationaal e Denkavit France, já referido, n.° 22, Burda, n.° 77; e acórdão de 22 de Dezembro de 2008, Truck Center, C-282/07, ainda não publicado na Colectânea, n.° 32).

39      No caso em apreço, não é contestado que uma sociedade anónima ou um fundo de investimento de direito finlandês estabelecidos na Finlândia e que recebem dividendos de uma outra sociedade que tem também a sua sede nesse Estado-Membro estão, em princípio, isentos de imposto sobre estes, enquanto os dividendos pagos por uma sociedade residente a uma sociedade não residente, que não é considerada uma sociedade na acepção do artigo 2.° da Directiva 90/435, estão sujeitos a retenção na fonte.

40      Na medida em que os dividendos distribuídos por uma sociedade residente são tributados como lucros realizados, uma sociedade beneficiária não residente, que não é considerada uma sociedade na acepção do artigo 2.° da Directiva 90/435, sofre, em razão da retenção na fonte, uma tributação em cadeia desses dividendos, ao passo que esta tributação em cadeia não ocorre em relação aos dividendos recebidos por uma sociedade anónima ou por um fundo de investimento residentes.

41      Semelhante diferença de tratamento fiscal dos dividendos entre as sociedades-mãe, em função do local da sua sede, é susceptível de constituir uma restrição à liberdade de estabelecimento, em princípio proibida pelos artigos 43.° CE e 48.° CE, uma vez que torna menos atraente o exercício da liberdade de estabelecimento por sociedades estabelecidas noutros Estados-Membros, as quais poderiam, consequentemente, renunciar à aquisição, à criação ou à manutenção de uma filial no Estado-Membro que aplica esta diferença de tratamento (v., neste sentido, acórdão Denkavit Internationaal e Denkavit France, já referido, n.os 29 e 30).

42      É certo que o Tribunal de Justiça já declarou que, relativamente às medidas previstas por um Estado-Membro a fim de evitar ou atenuar a tributação em cadeia ou a dupla tributação económica dos lucros distribuídos por uma sociedade residente, os accionistas beneficiários residentes não se encontram necessariamente numa situação comparável à dos accionistas beneficiários residentes de outro Estado-Membro (acórdãos, já referidos, Denkavit Internationaal e Denkavit France, n.° 34, e Amurta, n.° 37).

43      Todavia, a partir do momento em que um Estado-Membro, de modo unilateral ou por via convencional, sujeita ao imposto sobre o rendimento não só os accionistas residentes mas também os accionistas não residentes, relativamente aos dividendos que recebam de uma sociedade residente, a situação dos referidos accionistas não residentes assemelha-se à dos accionistas residentes (acórdãos, já referidos, Test Claimants in Class IV of the ACT Group Litigation, n.° 68, Denkavit Internationaal e Denkavit France, n.° 35, e Amurta, n.° 38).

44      Consequentemente, quando um Estado-Membro tenha optado por preservar as sociedades-mãe residentes de uma tributação em cadeia dos lucros distribuídos por uma filial residente, deve alargar esta medida às sociedades-mãe não residentes que se encontrem numa situação comparável, em razão do facto de uma tributação análoga incidente sobre estas sociedades não residentes resultar do exercício da sua competência fiscal sobre estas (v., neste sentido, acórdão Denkavit Internationaal e Denkavit France, já referido, n.° 37).

45      No entanto, o Governo finlandês considera que, dado que a legislação nacional não permite, na Finlândia, a criação de sociedades com uma forma jurídica idêntica à de uma SICAV de direito luxemburguês, esta encontra-se, em razão da sua forma jurídica e do seu tratamento fiscal, numa situação objectivamente diferente das sociedades ou dos fundos de investimento estabelecidos na Finlândia.

46      O referido governo alega que, diferentemente de uma sociedade anónima finlandesa, uma SICAV não está sujeita ao imposto sobre o rendimento no Estado-Membro de estabelecimento, na medida em que, no Luxemburgo, esta sociedade apenas está sujeita a um imposto sobre o capital à taxa de 0,01% e os lucros por esta distribuídos a uma pessoa domiciliada noutro Estado-Membro não dão lugar a nenhum imposto por retenção na fonte. Em contrapartida, os dividendos recebidos pelas sociedades finlandesas só são isentos de imposto a fim de evitar a sua tributação em cadeia quando da distribuição dos lucros entre sociedades anónimas, ao passo que os seus outros rendimentos são sujeitos a imposto.

47      O Governo italiano acrescenta, a este respeito, que uma SICAV imobiliária, não abrangida pela Directiva 85/611/CEE do Conselho, de 20 de Dezembro de 1985, que coordena as disposições legislativas, regulamentares e administrativas respeitantes a alguns organismos de investimento colectivo em valores mobiliários (OICVM) (JO L 375, p. 3), e que tem como única razão de ser o investimento colectivo dos fundos recolhidos mediante a venda das suas próprias acções ao público, constitui uma entidade fundamentalmente transparente que visa, através da gestão colectiva, valorizar o contributo individual de cada sócio e não é comparável, em si mesma, a uma sociedade ordinária. O carácter específico de tal sociedade justifica que seja isenta do imposto sobre o rendimento no Estado de estabelecimento, pois o único rendimento a tomar em consideração é, na realidade, o de cada sócio. O problema da tributação em cadeia põe-se, portanto, não ao nível da SICAV mas sim ao nível dos sócios, incumbindo, então, ao direito do Estado-Membro em causa solucioná-lo.

48      No que respeita à comparação de uma SICAV de direito luxemburguês com um fundo de investimento de direito finlandês, o Governo finlandês assinala, por um lado, que, durante o período em causa no processo principal, a regulamentação nacional proibia a um fundo dessa natureza, isento de impostos, efectuar investimentos imobiliários como os evocados no pedido de decisão prejudicial. Por outro lado, os lucros distribuídos por uma SICAV não geram imposto por retenção na fonte, no Luxemburgo, contrariamente aos lucros pagos por um fundo de investimento de direito finlandês a uma pessoa residente noutro Estado-Membro, a menos que uma disposição de uma convenção destinada a evitar a dupla tributação preveja o contrário.

49      Esta argumentação não pode ser acolhida.

50      Em primeiro lugar, importa assinalar que a circunstância de, no direito finlandês, não haver um tipo de sociedades com uma forma jurídica idêntica à de uma SICAV de direito luxemburguês não pode, por si só, justificar um tratamento diferenciado, na medida em que, não estando o direito das sociedades dos Estados-Membros inteiramente harmonizado a nível comunitário, a liberdade de estabelecimento ficaria, desse modo, esvaziada de qualquer efeito útil.

51      Em segundo lugar, a circunstância invocada pelo Governo finlandês relativa à não tributação dos rendimentos de uma SICAV no Luxemburgo, supondo que foi demonstrada, não origina uma diferença entre esta sociedade e uma sociedade anónima residente, que justifique um tratamento diferenciado no que respeita ao imposto por retenção na fonte sobre os dividendos recebidos por estas duas categorias de sociedades.

52      Com efeito, por um lado, segundo o Governo finlandês, os dividendos pagos por uma sociedade residente a outra sociedade residente não estão sujeitos a imposto, nem através de retenção na fonte nem enquanto parte dos rendimentos da sociedade beneficiária. Consequentemente, a não tributação desta categoria de rendimentos no Luxemburgo não é susceptível de justificar a sua tributação pelo Estado finlandês, visto que este optou por não exercer a sua competência tributária sobre tais rendimentos, quando são auferidos por sociedades estabelecidas na Finlândia.

53      Por outro lado, o Governo finlandês não indicou de que forma o tratamento fiscal das outras categorias de rendimentos das sociedades residentes e das SICAV não residentes é pertinente para apreciar a comparabilidade destes dois tipos de sociedades em relação à isenção do imposto por retenção na fonte sobre os dividendos recebidos.

54      Em terceiro lugar, também não é pertinente o argumento do Governo italiano segundo o qual, pelo facto de o Grão-Ducado do Luxemburgo não tributar os rendimentos de uma SICAV, a tributação em cadeia intervém não ao nível desta sociedade mas sim ao nível dos seus sócios, devendo ser evitada pelo Estado-Membro onde estes têm residência. Com efeito, foi a República da Finlândia que, ao sujeitar a imposto por retenção na fonte os rendimentos que já foram tributados a nível da sociedade distribuidora, criou a tributação em cadeia, tributação que este Estado-Membro optou por evitar em relação aos dividendos distribuídos às sociedades residentes.

55      Nestas condições, as diferenças existentes entre uma SICAV de direito luxemburguês e uma sociedade anónima de direito finlandês, invocadas pelos Governos finlandês e italiano, não são suficientes para criar uma distinção objectiva em relação à isenção do imposto por retenção na fonte sobre os dividendos recebidos. Consequentemente, já não há que examinar em que medida as diferenças entre uma SICAV de direito luxemburguês e um fundo de investimento de direito finlandês, alegadas pelos referidos governos, são pertinentes para criar tal diferença de situação objectiva.

56      Consequentemente, a diferença de tratamento entre as SICAV não residentes e as sociedades anónimas residentes em relação à isenção do imposto por retenção na fonte sobre os dividendos que lhes são distribuídos por sociedades residentes constitui uma restrição à liberdade de estabelecimento proibida, em princípio, pelos artigos 43.° CE e 48.° CE.

 Quanto à justificação da restrição à liberdade de estabelecimento

57      Resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça que uma restrição da liberdade de estabelecimento só pode ser admitida se se justificar por razões imperiosas de interesse geral. Mas é ainda necessário, em tal caso, que seja adequada para garantir a realização do objectivo em causa e que não ultrapasse o que é necessário para atingir esse objectivo (v. acórdãos de 15 de Maio de 2008, Lidl Belgium, C-414/06, Colect., p. I-3601, n.° 27, e de 23 de Outubro de 2008, Krankenheim Ruhesitz am Wannsee-Seniorenheimstatt, C-157/07, ainda não publicado na Colectânea, n.° 40 e jurisprudência citada).

58      O Governo finlandês alega, a este respeito, que o regime nacional visa evitar a evasão fiscal na medida em que a isenção do imposto por retenção na fonte de dividendos pagos a uma sociedade estabelecida num Estado-Membro que não seja a República da Finlândia, que não pague ela própria imposto sobre esse rendimento e cuja distribuição de lucros também não esteja sujeita a imposto por retenção na fonte, comporta o risco de surgirem expedientes artificiais destinados a impedir qualquer forma de tributação de rendimentos.

59      Além disso, o regime fiscal em causa no processo principal visa evitar comportamentos susceptíveis de comprometer o direito da República da Finlândia de exercer a sua competência fiscal em relação às actividades desenvolvidas no seu território. A aplicação da regra da retenção na fonte justifica-se, assim, pela necessidade de salvaguardar uma repartição equilibrada do poder de tributação acordada entre este Estado-Membro e o Grão-Ducado do Luxemburgo na convenção fiscal, nos termos da qual o Estado de origem do rendimento conserva o direito de tributar por retenção na fonte à taxa de 5%.

60      O Governo italiano acrescenta que a isenção do imposto por retenção na fonte incita os grupos de sociedades a instalar as suas sociedades-mãe nos Estados onde os impostos sejam menos elevados, ou até inexistentes, o que finalmente confere aos grupos de sociedades o poder de escolher onde e em que medida os dividendos originados no território de um Estado-Membro devem ser tributados, despojando-o da sua competência fiscal sobre esses dividendos. Ainda segundo este governo, a necessidade de evitar a evasão fiscal e de salvaguardar a repartição equilibrada do poder de tributação justifica a aplicação do imposto por retenção na fonte.

61      Por último, segundo o Governo finlandês, a regulamentação em causa no processo principal justifica-se pela necessidade de preservar a coerência do regime fiscal finlandês, baseado no princípio de que a isenção do imposto por retenção na fonte dos dividendos recebidos pela sociedade anónima e pelo fundo de investimento residentes é compensada pela tributação do rendimento correspondente ao nível da pessoa singular beneficiária, dado que o sócio da sociedade anónima paga um imposto sobre estes dividendos e que o lucro pago pelo fundo de investimento é considerado na Finlândia um rendimento de capital, que é tributado à taxa de 28%.

62      As justificações assim invocadas pelos Governos finlandês e italiano não podem ser admitidas.

63      Em primeiro lugar, quanto ao argumento relativo à prevenção da evasão fiscal, há que recordar que, segundo jurisprudência assente, uma medida nacional que restrinja a liberdade de estabelecimento pode ser justificada quando vise especificamente os expedientes puramente artificiais cuja finalidade é escapar à aplicação da legislação do Estado-Membro em causa (v., neste sentido, acórdão de 16 de Julho de 1998, ICI, C-264/96, Colect., p. I-4695, n.° 26; e acórdãos, já referidos, Marks & Spencer, n.° 57, Cadbury Schweppes e Cadbury Schweppes Overseas, n.° 51, e Test Claimants in the Thin Cap Group Litigation, n.° 72).

64      Para que uma restrição à liberdade de estabelecimento possa ser justificada por motivos de combate a práticas abusivas, o objectivo específico de tal restrição deve ser o de impedir comportamentos que consistam em criar expedientes puramente artificiais, desprovidos de realidade económica, com o objectivo de eludir o imposto normalmente devido pelos lucros gerados por actividades realizadas no território nacional (acórdãos, já referidos, Cadbury Schweppes e Cadbury Schweppes Overseas, n.° 55, e Test Claimants in the Thin Cap Group Litigation, n.° 74).

65      Ora, é suficiente assinalar que o regime fiscal em causa no processo principal não visa especificamente tais expedientes puramente artificiais, desprovidos de realidade económica e criados unicamente com o objectivo de eludir o imposto normalmente devido pelos lucros gerados por actividades realizadas no território nacional, e, consequentemente, não pode ser justificado por razões relativas à prevenção da evasão fiscal.

66      Em seguida, quanto ao argumento relativo à repartição equilibrada do poder de tributação, há que recordar que esta justificação pode ser aceite, designadamente, quando o regime em causa tenha por objectivo evitar comportamentos susceptíveis de comprometer o direito de um Estado-Membro exercer a sua competência fiscal em relação às actividades realizadas no seu território (v. acórdão de 29 de Março de 2007, Rewe Zentralfinanz, C-347/04, Colect., p. I-2647, n.° 42, e acórdãos, já referidos, Oy AA, n.° 54, e Amurta, n.° 58).

67      No entanto, quando um Estado-Membro tenha optado por não tributar as sociedades beneficiárias estabelecidas no seu território, relativamente a este tipo de rendimentos, não pode invocar a necessidade de garantir uma repartição equilibrada do poder de tributação entre os Estados-Membros, para justificar a tributação das sociedades beneficiárias estabelecidas noutro Estado-Membro (acórdão Amurta, já referido, n.° 59).

68      A este respeito, é desprovido de pertinência o facto de a convenção fiscal reservar à República da Finlândia o direito de exercer a sua competência fiscal sobre os dividendos pagos pelas sociedades estabelecidas nesse Estado-Membro aos beneficiários que residem no Luxemburgo.

69      Com efeito, um Estado-Membro não pode invocar uma convenção destinada a evitar a dupla tributação, a fim de escapar às obrigações que lhe incumbem por força do Tratado (v. acórdãos, já referidos, Denkavit Internationaal e Denkavit France, n.° 53, e Amurta, n.° 55).

70      Além disso, na medida em que os dividendos distribuídos pelas sociedades residentes estão sujeitos a tributação, ao nível das sociedades distribuidoras, como lucros realizados, a isenção do imposto por retenção na fonte sobre estes dividendos não priva a República da Finlândia do direito de tributar os rendimentos relativos às actividades realizadas no seu território.

71      Por último, quanto ao argumento relativo à preservação da coerência do regime fiscal finlandês, importa lembrar que o Tribunal de Justiça admitiu que a necessidade de preservar essa coerência pode justificar uma restrição ao exercício das liberdades fundamentais garantidas pelo Tratado (v. acórdãos de 28 de Janeiro de 1992, Bachmann, C-204/90, Colect., p. I-249, n.° 28, e Comissão/Bélgica, C-300/90, Colect., p. I-305, n.° 21; acórdãos, já referidos, Keller Holding, n.° 40, Amurta, n.° 46; e acórdão de 28 de Fevereiro de 2008, Deutsche Shell, C-293/06, Colect., p. I-1129, n.° 37).

72      Para que um argumento baseado nessa justificação possa ter sucesso, o Tribunal de Justiça exige, porém, um nexo directo entre a vantagem fiscal em causa e a compensação dessa vantagem através de uma imposição determinada (acórdãos de 14 de Novembro de 1995, Svensson e Gustavsson, C-484/93, Colect., p. I-3955, n.° 18; ICI, já referido, n.° 29; de 7 de Setembro de 2004, Manninen, C-319/02, Colect., p. I-7477, n.° 42; e Keller Holding, já referido, n.° 40), devendo o carácter directo deste nexo ser apreciado à luz do objectivo prosseguido pela regulamentação em causa (acórdãos, já referidos, Manninen, n.° 43, e Deutsche Shell, n.° 39; e acórdão de 27 de Novembro de 2008, Papillon, C-418/07, ainda não publicado na Colectânea, n.° 44).

73      Ora, no âmbito do regime fiscal em causa no processo principal, a isenção do imposto por retenção na fonte dos dividendos não está sujeita à condição de que os dividendos recebidos pela sociedade anónima sejam redistribuídos por esta e de que a sua tributação ao nível dos detentores das acções da referida sociedade permita compensar a isenção do imposto por retenção na fonte.

74      Consequentemente, não há nexo directo, na acepção da jurisprudência referida no n.° 72 do presente acórdão, entre a isenção do imposto por retenção na fonte e a tributação dos referidos dividendos como rendimentos dos detentores das acções de uma sociedade anónima.

75      Por conseguinte, a restrição à liberdade de estabelecimento operada pela regulamentação em causa no processo principal não pode ser justificada pela necessidade de preservar a coerência do regime fiscal finlandês.

76      Atendendo às considerações precedentes, há que responder à questão submetida que os artigos 43.° CE e 48.° CE devem ser interpretados no sentido de que se opõem à legislação de um Estado-Membro que isenta do imposto por retenção na fonte os dividendos distribuídos por uma filial residente nesse Estado a uma sociedade anónima estabelecida no mesmo Estado, mas que sujeita ao imposto por retenção na fonte os dividendos semelhantes pagos a uma sociedade-mãe do tipo SICAV, residente noutro Estado-Membro, que reveste uma forma jurídica desconhecida do direito do primeiro Estado e que não consta da lista das sociedades mencionadas no artigo 2.°, alínea a), da Directiva 90/435, e que, nos termos da legislação do outro Estado-Membro, está isenta do imposto sobre o rendimento.

 Quanto às despesas

77      Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efectuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Primeira Secção) declara:

Os artigos 43.° CE e 48.° CE devem ser interpretados no sentido de que se opõem à legislação de um Estado-Membro que isenta do imposto por retenção na fonte os dividendos distribuídos por uma filial residente nesse Estado a uma sociedade anónima estabelecida no mesmo Estado, mas que sujeita ao imposto por retenção na fonte os dividendos semelhantes pagos a uma sociedade-mãe do tipo SICAV, residente noutro Estado-Membro, que reveste uma forma jurídica desconhecida do direito do primeiro Estado e que não consta da lista das sociedades mencionadas no artigo 2.°, alínea a), da Directiva 90/435/CEE do Conselho, de 23 de Julho de 1990, relativa ao regime fiscal comum aplicável às sociedades-mães e sociedades afiliadas de Estados-Membros diferentes, conforme alterada pela Directiva 2003/123/CE do Conselho, de 22 de Dezembro de 2003, e que, nos termos da legislação do outro Estado-Membro, está isenta do imposto sobre o rendimento.

Assinaturas


* Língua do processo: finlandês.