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Advertência jurídica importante

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62001C0275

Conclusões do advogado-geral Alber apresentadas em 10 de Outubro de 2002. - Sinclair Collis Ltd contra Commissioners of Customs & Excise. - Pedido de decisão prejudicial: House of Lords - Reino Unido. - Sexta Directiva IVA - Artigo 13.º, B, alínea b) - Operações isentas - Locação de bens imóveis - Noção - Máquinas de venda automática de cigarros instaladas em locais comerciais. - Processo C-275/01.

Colectânea da Jurisprudência 2003 página I-05965


Conclusões do Advogado-Geral


I - Introdução

1. A House of Lords submeteu ao Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias uma questão relativa à interpretação da Sexta Directiva 77/388/CEE, do Conselho, de 17 de Maio de 1977, relativa à harmonização das legislações dos Estados-Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios - sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado: matéria colectável uniforme (a seguir «Sexta Directiva»). O órgão jurisdicional de reenvio pretende saber se o acordo relativo à colocação de uma máquina de venda automática de cigarros num estabelecimento de restauração constitui «locação de bens imóveis», a qual, nos termos do artigo 13.° , B, alínea b), da Sexta Directiva está isenta de imposto sobre o valor acrescentado.

II - Enquadramento jurídico

A - Direito comunitário

2. O artigo 2.° da Sexta Directiva dispõe:

«Estão sujeitas ao imposto sobre o valor acrescentado:

1. As entregas de bens e as prestações de serviços, efectuadas a título oneroso, no território do país, por um sujeito passivo agindo nessa qualidade;

[...]»

3. O artigo 13.° , B, da Sexta Directiva prevê:

«Sem prejuízo de outras disposições comunitárias, os Estados-Membros isentarão, nas condições por eles fixadas com o fim de assegurar a aplicação correcta e simples das isenções a seguir enunciadas e de evitar qualquer possível fraude, evasão e abuso:

[...]

b) A locação de bens imóveis, com excepção:

1. Das operações de alojamento, tal como são definidas na legislação dos Estados-Membros, realizadas no âmbito do sector hoteleiro ou de sectores com funções análogas, incluindo as locações de campos de férias ou de terrenos para campismo;

2. Da locação de áreas destinadas ao estacionamento de veículos;

3. Da locação de equipamento e maquinaria de instalação fixa;

4. Da locação de cofres fortes.

Os Estados-Membros podem prever outras excepções ao âmbito de aplicação desta isenção;

[...]»

B - Legislação nacional

4. A Sexta Directiva foi transposta no Reino Unido pela Section 31 do Value Added Tax Act 1994, nos termos do qual uma prestação de serviços está isenta do imposto se se enquadrar no disposto no anexo 9 do Act. Nos termos da parte II, grupo 1, ponto 1, do referido anexo, está incluída no mesmo:

«A concessão de um direito ou de uma autorização de ocupação de um bem imóvel (licence to occupy land)».

III - Matéria de facto e tramitação processual

5. A Sinclair Collis Ltd (a seguir «Sinclair Collis»), recorrente no processo principal, dedica-se à instalação de máquinas de venda automática de cigarros em bares, cafés e hotéis. Para este efeito, celebra acordos de instalação com os proprietários desses estabelecimentos.

6. Os acordos em causa prevêem o seguinte:

- Os proprietários obrigam-se a instalar as máquinas automáticas nos seus estabelecimentos. Os proprietários definem os locais das máquinas, as quais, desde que não sejam fixadas na parede, podem ser deslocadas para outro sítio. A Sinclair Collis pode, contudo, exigir que a máquina seja instalada num outro sítio, se, em seu entender, tal puder proporcionar mais vendas.

- A Sinclair Collis continua a ser proprietária das máquinas, dos cigarros bem como do dinheiro contido nas máquinas. Cabe-lhe o controlo exclusivo das máquinas, procedendo ao respectivo abastecimento de cigarros e recolhendo o dinheiro.

- Os proprietários dos estabelecimentos obrigam-se a fornecer a corrente eléctrica e a evitar que sejam instaladas no estabelecimento quaisquer outras máquinas de venda automática de cigarros.

- A Sinclair Collis mantém o direito exclusivo de fornecer cigarros e outros produtos de tabaco ao estabelecimento em questão.

- Aos proprietários cabe, como contrapartida, uma determinada percentagem do lucro líquido das máquinas automáticas.

- O acordo é celebrado pelo prazo de dois anos.

7. Em Janeiro de 1996, os Commissioners of Customs and Excise decidiram que as prestações de serviços em análise se referiam a direitos de ocupação de um bem imóvel e, consequentemente, estavam isentas de imposto sobre o valor acrescentado nos termos do artigo 13.° , B, alínea b), da Sexta Directiva.

8. A Sinclair Collis, a quem interessava que as prestações de serviços em causa fossem sujeitas a imposto, para, por seu turno, poder deduzir o imposto a montante, interpôs recurso dessa decisão para o Manchester VAT and Duties Tribunal. Este órgão jurisdicional deferiu o pedido da recorrente. Como fundamento, referiu que as prestações de serviços em causa estão sujeitas a imposto, uma vez que o objecto principal do acordo consiste na instalação da máquina de venda automática e não na ocupação ou utilização do bem imóvel no qual a máquina está instalada.

9. Os Commissioners recorreram da decisão do VAT and Duties Tribunal para a High Court (England & Wales). A High Court revogou a decisão do Tribunal. O Lord Lightman realçou que a questão decisiva é a de saber qual o tipo de prestação de serviços a que o proprietário do estabelecimento se obrigou, através da correcta interpretação do acordo. A resposta a esta pergunta é a de que se trata do direito de instalar uma máquina de venda automática num estabelecimento. Trata-se aqui do direito de ocupar um bem imóvel, conjugado com determinados direitos subordinados ou acessórios. A prestação de serviços em causa está, consequentemente, isenta de imposto sobre o valor acrescentado.

10. A Sinclair Collis interpôs recurso desta decisão para a Court of Appeal. Este órgão jurisdicional confirmou a decisão da High Court. A Sinclair Collis interpôs então novo recurso para a House of Lords.

IV - Pedido de decisão prejudicial

11. A House of Lords tem dúvidas de que as prestações de serviço em causa devam ser qualificadas como «locação de bens imóveis» na acepção do artigo 13.° , B, alínea b), da Sexta Directiva e, que, em consequência, sejam consideradas isentas do imposto sobre o valor acrescentado.

12. Decidiu, por isso, submeter ao Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias a seguinte questão prejudicial:

«Corresponde à locação de bens imóveis, na acepção do artigo 13.° , B, alínea b), da Directiva 77/388/CEE do Conselho, de 17 de Maio de 1977, relativa à harmonização das legislações dos Estados-Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios, a concessão pelo proprietário de um local ao proprietário de uma máquina de venda automática de cigarros do direito de instalar, utilizar e manter a máquina, no interior do local designado pelo proprietário, por um período de dois anos, em troca de uma percentagem dos lucros ilíquidos provenientes da venda, nesse local, de cigarros e outro tabaco, mas sem nenhum outro direito além do estabelecido no acordo escrito celebrado pelas partes; e quais os princípios aplicáveis à questão de saber se um acordo corresponde à noção de locação de bens imóveis, na acepção acima referida?»

13. Lord Slynn of Hadley, Lord Steyn, Lord Nicholls of Birkenhead, Lord Millet e Lord Scott of Foscote expressaram por escrito a sua posição quanto ao pedido de decisão prejudicial. Estas posições serão abordadas no âmbito da apreciação jurídica.

V - Argumentos das partes

14. A recorrente considera que contratos de instalação de máquinas de venda automática como os que estão aqui em causa não preenchem as condições da «locação de bens imóveis» na acepção do artigo 13.° , B, alínea b), da Sexta Directiva. O acordo não especifica qualquer lugar determinado para a instalação da máquina automática. Em vez disso, obriga essencialmente o proprietário do estabelecimento a definir um local adequado para a máquina. O proprietário do estabelecimento não pode, contudo, sem motivo, negar o seu consentimento na instalação da máquina de venda automática num sítio que a recorrente considere adequado tendo em vista o objectivo do mais elevado número de vendas possível. Também o facto de a maioria das máquinas automáticas poderem ser deslocadas pelos proprietários dos estabelecimentos dentro do mesmo espaço, contraria a ideia de ocupação de uma determinada parte do bem imóvel.

15. Acresce que a recorrente tem, inclusive, o direito de acesso à máquina de venda automática para a respectiva manutenção, retirar o dinheiro e abastecê-la novamente de cigarros. Porém, não tem de forma nenhuma a possibilidade de controlar no restante o acesso à máquina e de excluir os outros desse acesso. Esse direito assiste antes apenas ao proprietário do estabelecimento.

16. Nestas circunstâncias, não estão preenchidas as condições para que se considere existir uma «locação de bens imóveis» ou, em todo o caso, estas não coincidem com o carácter geral do contrato. O contrato em causa respeita em primeira linha à instalação da própria máquina de venda automática, e não, pelo contrário, à utilização ou à ocupação do bem imóvel no qual a máquina foi instalada.

17. O Governo do Reino Unido entende, pelo contrário, que, a instalação da máquina implica desde logo a ocupação do correspondente local com exclusão de outrem («occupying the land by the machine»). Esta situação é, nessa medida, muito distinta da de quem se senta a uma mesa para tomar um café ou passeia num parque ou num terreno de golfe.

18. Esta ocupação também em nada é alterada pela possível deslocação da máquina de venda automática. Neste caso, é apenas alterada por acordo entre as partes do imóvel ocupada.

19. Acresce que à recorrente assiste, em todo o caso, um direito de controlo limitado no que respeita ao acesso à máquina de venda automática. Cabe-lhe um direito exclusivo de acesso à máquina para proceder à respectiva manutenção, abastecê-la de cigarros e retirar o dinheiro. Este direito exclusivo de acesso é suficiente para os objectivos da ocupação do bem imóvel. Na verdade, um direito de acesso ilimitado não é de modo algum condição necessária à ocupação de um bem imóvel. O direito de acesso deve apenas corresponder à finalidade da ocupação.

20. As prestações de serviços em causa constituem, assim, «locação de bens imóveis» na acepção do artigo 13.° , B, alínea b), da Sexta Directiva devendo, consequentemente, ser consideradas isentas de IVA.

21. A Comissão não faz quaisquer considerações mais precisas relativamente à classificação do acordo em análise. Refere apenas que o simples direito de instalação da máquina de venda automática não implica em regra qualquer direito de ocupação de um bem imóvel nem de controlo do acesso ao mesmo. Só é de concluir no sentido da «locação de bens imóveis», na acepção do artigo 13.° , B, alínea b), da Sexta Directiva, se se verificarem não só a ocupação como também o controlo.

VI - Apreciação jurídica

22. A instalação de uma máquina de venda automática constitui uma prestação de serviços a título oneroso na acepção do artigo 6.° , n.° 1, da Sexta Directiva, que, nos termos do artigo 2.° , n.° 1, da mesma está, em princípio, sujeita a imposto sobre o valor acrescentado. O proprietário do estabelecimento, enquanto prestador de serviços é, em princípio, sujeito passivo do imposto, nos termos do artigo 4.° , n.° 1, da Sexta Directiva.

23. A única questão que se coloca é a de saber se um acordo como o que está em análise deve ser considerado «locação de bens imóveis» na acepção do artigo 13.° , B, alínea b), da Sexta Directiva, estando, consequentemente, isento de IVA.

A - «Locação de bens imóveis» na acepção do artigo 13.° , B, alínea b), da Sexta Directiva

24. O conceito de «locação de bens imóveis» não está definido na Sexta Directiva .

25. Contudo, segundo jurisprudência constante, as isenções previstas no artigo 13.° da Sexta Directiva constituem conceitos autónomos de direito comunitário e devem, nessa medida, ser objecto de uma definição comunitária .

26. O objectivo pretendido com o estabelecimento de uma lista comum de isenções na Sexta Directiva consistiu, designadamente, em proporcionar uma base uniforme para a cobrança de IVA nos Estados-Membros. Este objectivo apenas pode ser garantido se as isenções de IVA previstas na Sexta Directiva forem também definidas através de um conceito uniforme de direito comunitário .

27. Acresce que, segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, as isenções referidas no artigo 13.° da Sexta Directiva devem ser interpretadas em sentido estrito, dado constituírem excepções ao princípio geral de que todas as prestações de serviços efectuadas por um sujeito passivo a título oneroso estão sujeitas a imposto sobre o valor acrescentado .

28. Até ao presente, o Tribunal de Justiça ainda não interpretou de forma exaustiva o conceito de «locação de bens imóveis» na acepção do artigo 13.° , B, alínea b), da Sexta Directiva. Nas ocasiões em que o Tribunal abordou esta questão anteriormente ao presente pedido de decisão prejudicial, tratou-se, entre outros casos, da apreciação da renúncia aos direitos decorrentes de um arrendamento , da autorização para utilização de um terreno de golfe bem como da autorização de utilização de uma infra-estrutura rodoviária mediante o pagamento de uma portagem .

29. Dos referidos acórdãos bem como das correspondentes conclusões dos advogados-gerais podem extrair-se alguns critérios para a interpretação do conceito de «locação de bens imóveis». No acórdão Comissão/Reino Unido , o Tribunal de Justiça decidiu, por exemplo, que a fixação de uma determinada duração da fruição do bem imóvel é um elemento essencial de um contrato de locação de bens imóveis:

«[Não podem incluir-se no conceito de locação de bens imóveis] contratos caracterizados [...] pela ausência, no acordo entre as partes, de consideração da duração do gozo do bem imóvel, que é um elemento essencial do contrato de locação.»

30. O advogado-geral F. G. Jacobs, nas conclusões que apresentou no processo Stockholm Lindöpark considerou, por outro lado, como característica marcante e típica da locação a circunstância de ser «concedido ao interessado um certo direito de ocupar a propriedade como se se tratasse de coisa sua e de excluir ou admitir outras pessoas». Além disso, o direito deve estar em conexão com determinado bem imóvel.

31. Estes critérios bastam para a resposta à questão submetida pelo órgão jurisdicional nacional, pelo que neste ponto não é necessária uma interpretação mais aprofundada do conceito de «locação de bens imóveis». Irrelevante para a classificação da prestação principal do contrato é, pelo contrário, que a contraprestação pela instalação da máquina de venda automática não consista num montante fixo mas sim numa percentagem dos lucros resultantes da venda de cigarros. Também na locação de superfícies comerciais é corrente a renda depender, na prática, do volume de negócios.

B - Classificação do contrato em questão, relativo à instalação de uma máquina de venda automática

32. Compete ao órgão jurisdicional nacional determinar a natureza exacta do acordo em análise. Tendo em conta os critérios desenvolvidos supra na parte A, não se afigura que um acordo como o descrito constitua qualquer «locação de bens imóveis», na acepção do artigo 13.° , B, alínea b), da Sexta Directiva.

33. O acordo para instalação da máquina de venda automática foi celebrado por um determinado período de tempo, designadamente dois anos. A situação é, por isso, diferente da analisada, por exemplo, nos acórdãos Comissão/Irlanda e Comissão/Reino Unido , nos quais estava em causa a utilização de uma infra-estrutura rodoviária mediante o pagamento de uma portagem.

34. Nesses processos, o Tribunal de Justiça decidiu que não se verificava uma «locação de bens imóveis», na acepção do artigo 13.° , B, alínea b), da Sexta Directiva, dado que a duração temporal da utilização do bem imóvel não foi tida em conta no acordo entre as partes:

«Com efeito, o caso da colocação à disposição de uma infra-estrutura rodoviária, o que interessa ao utente é a possibilidade que lhe é oferecida de efectuar um determinado percurso de um modo rápido e com maior segurança. A duração da utilização da infra-estrutura rodoviária não é tida em conta pelas partes, nomeadamente no que respeita à determinação do preço» .

35. Contudo, é questionável se no acordo em exame este direito abrange a faculdade de ocupar um determinado bem imóvel e de excluir os outros do acesso a esse bem imóvel.

36. Conforme foi referido nos n.os 14 a 16 supra, a recorrente entende que não é este o caso, uma vez que o acordo não estabelece qualquer local para a instalação e que, na verdade, embora aquela detenha um direito limitado de acesso, não pode, porém, excluir o acesso de terceiros ao referido local. Desta opinião são Lord Nicholls of Birkenhead e Lord Millet.

37. O Governo do Reino Unido, bem como Lord Slynn of Hadley são, pelo contrário, de opinião de que através da instalação de uma máquina de venda automática se opera a ocupação do local correspondente, com a exclusão de todas as outras pessoas (occupying the land by the machine). Esta ocupação em nada é prejudicada pela deslocação da máquina automática. Através dessa deslocação apenas é alterada por acordo entre as partes a parte do bem imóvel ocupada.

38. O Governo do Reino Unido entende ainda que assiste à recorrente um direito de controlo relativamente ao acesso à máquina de venda automática. A recorrente tem um direito exclusivo de acesso à máquina automática para proceder à manutenção da mesma, retirar o dinheiro e abastecê-la de cigarros. Este direito exclusivo é o bastante para as finalidades da ocupação do bem imóvel. Para esse efeito não necessita de um direito de acesso ilimitado.

39. É de subscrever a opinião da recorrente. Na realidade, o acordo em análise não abrange a ocupação pela recorrente de um bem imóvel ou de uma parte definida de um bem imóvel.

40. Isto resulta, desde logo, do facto de no acordo não ser estabelecida qualquer superfície, determinada segundo as suas dimensões e localização no interior do estabelecimento, para a colocação da máquina de venda automática. É, assim, essencialmente ao proprietário do estabelecimento que compete determinar a localização da máquina. À recorrente assiste apenas o direito de solicitar a colocação num outro local, se considerar que esse local é mais adequado tendo em vista o objectivo de maiores vendas. Consequentemente, não pode tratar-se da ocupação pela recorrente de um local definido e delimitado com precisão.

41. Acresce que, ao contrário da situação clássica de locação de um bem imóvel, a localização da máquina não tem, nos termos do acordo em questão, qualquer significado directo. Apenas é referida na medida em que a mesma deve garantir o maior número possível de vendas. A ocupação de um local definido não é, consequentemente, neste caso, verdadeiramente um fim, mas apenas um meio para alcançar esse fim.

42. Contra a ideia de ocupação de uma parte definida de um bem imóvel aponta ainda o facto de, em todo o caso, as máquinas de venda automática que não são previstas para montagem na parede poderem ser movidas para qualquer lugar no espaço do estabelecimento pelo proprietário.

43. Neste contexto, mostra-se questionável o argumento do Governo do Reino Unido e de Lord Slynn segundo o qual, no caso de a máquina automática ser deslocada, é alterada por acordo das partes a parte do bem imóvel ocupada.

44. Isto pressuporia que o proprietário do estabelecimento não poderia só por si alterar o local nos termos do contrato, devendo cada deslocação da máquina ser previamente acordada com a recorrente. Compete ao órgão jurisdicional de reenvio decidir se o acordo contém uma cláusula deste tipo. No caso de isso não suceder e de o proprietário do estabelecimento poder por si só alterar o local da máquina, não se pode, em todo o caso, concluir no sentido de uma alteração consensual da parte do bem imóvel ocupada.

45. Há que concordar com o Governo do Reino Unido e com Lord Slynn em que, através da sua instalação, a máquina de venda automática vai ocupar um espaço. Contudo, isso não basta para a ocupação de uma parte definida de um bem imóvel, já que a exigência de espaço é uma característica essencial de qualquer objecto corpóreo. Isto mesmo foi de modo convincente afirmado por Lord Nicholls of Birkenhead na sua tomada de posição relativamente ao pedido de decisão prejudicial.

46. Assim sendo, o elemento essencial do acordo referido no pedido de decisão prejudicial não consiste na ocupação de uma parte definida de um bem imóvel, mas sim na realização de uma prestação, designadamente no que respeita à instalação da máquina de venda automática, para a qual o bem imóvel por si só, embora sendo necessário, não é condição suficiente.

47. Consequentemente, a situação em análise é equiparável à tomada de uma refeição no restaurante de um hotel em contraposição à locação de um quarto do hotel: enquanto no segundo caso é decisiva a ocupação do próprio quarto, na tomada da refeição assumem, consequentemente, primeiro plano as diversas prestações de serviços. Com efeito, para a recepção das prestações de serviços é indispensável que o cliente se sente à mesa do restaurante, utilizando temporariamente uma determinada parte do imóvel. Esta utilização não desempenha, no entanto, um papel essencial, em conformidade com o sentido e objectivo do contrato. Assim, não se pode entender que se verifica uma ocupação da parte do imóvel sobre a qual se encontra a mesa .

48. Do mesmo modo, o advogado-geral F. G. Jacobs, nas conclusões que apresentou no processo Stockholm Lindöpark, no qual estava em causa a autorização para utilização de um terreno de golfe, referiu:

«Mesmo que seja, evidentemente, difícil jogar golfe se não existir um campo para o efeito, o serviço prestado neste caso consiste na possibilidade proporcionada ao interessado de jogar e não na possibilidade de ocupar o terreno. Efectivamente, pode dizer-se que o praticante de golfe não ocupa o terreno, mas sim que o atravessa» .

49. Igualmente nas conclusões que apresentámos no processo, Comissão/Irlanda (portagens) foi, no mesmo sentido, referido:

«O objectivo essencial do contrato entre as partes não é tanto o de usar um bem imóvel mas o de usar uma prestação de serviços fornecida sobre este bem imóvel. Para o automobilista, a curta utilização do bem imóvel é secundária, porque só lhe importa atingir o seu destino rapidamente e com toda a segurança» .

50. Acresce que a recorrente não tem, na situação descrita, qualquer direito de controlar o acesso ao local onde se encontra a máquina de venda automática e de excluir os outros desse acesso.

51. Efectivamente, nos termos do acordo em questão, assiste à recorrente o direito exclusivo de acesso à máquina de venda automática para proceder à manutenção da mesma, retirar dinheiro e abastecê-la de cigarros, estando este direito limitado às horas de abertura do estabelecimento. Contudo, não lhe foi conferido nos termos do acordo um direito mais amplo de controlo e restrição do acesso de terceiros. Este direito pertence unicamente ao proprietário do estabelecimento.

52. O proprietário do estabelecimento, enquanto dono da casa e igualmente por força do dever que lhe foi imposto nos termos do acordo de proteger a máquina de venda automática, tem o direito de controlar e definir o acesso ao local onde a máquina se encontra, por exemplo, o de recusar o acesso a clientes que não se comportem devidamente.

53. Contrariamente à opinião do Governo do Reino Unido, não é evidente de que forma poderia resultar do próprio direito de acesso da recorrente um direito - embora também limitado - de controlo do acesso quanto ao restante.

54. Poderia, em todo o caso, afirmar-se que a recorrente tem o direito de controlo do acesso à própria máquina de venda automática, designadamente ao seu interior. Contudo, tal não assume qualquer relevância, uma vez que, para a questão da «locação de bens imóveis», o que é relevante não é o acesso à própria máquina de venda automática mas sim o acesso ao local onde a mesma se encontra.

55. Também quanto a este aspecto, a situação em análise é novamente comparável à utilização de um campo de golfe ou de uma infra-estrutura rodoviária mediante um pagamento. Na realidade, também nestes casos, o próprio jogador de golfe ou o condutor podem utilizar o campo de golfe ou a infra-estrutura rodoviária, mas não podem impedir o acesso de outras pessoas .

56. Nestes termos, não se verifica na situação em análise a ocupação de uma parte definida de um bem imóvel nem o direito, decorrente da ocupação, de excluir o acesso de outras pessoas ao bem imóvel em causa.

57. Um acordo como o referido pelo órgão jurisdicional nacional não constitui assim, sem prejuízo das conclusões do tribunal de reenvio, referidas no n.° 44 supra, qualquer «locação de bens imóveis» na acepção do artigo 13.° , B, alínea b), da Sexta Directiva.

VII - Conclusão

58. Consequentemente, propõe-se que o Tribunal de Justiça responda da seguinte forma à questão prejudicial:

Não constitui locação de bens imóveis na acepção do artigo 13.° , B, alínea b), da Sexta Directiva 77/388/CEE do Conselho, de 17 de Maio de 1977, relativa à harmonização das legislações dos Estados-Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios - sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado: matéria colectável uniforme, a situação em que o proprietário de determinados espaços (o «proprietário do estabelecimento») confere ao proprietário de uma máquina de venda automática de cigarros a faculdade de instalar essa máquina no espaço em causa por um período de dois anos, num local definido pelo proprietário do estabelecimento, mediante uma percentagem do lucro líquido proveniente da venda de cigarros e outros produtos de tabaco no seu estabelecimento, procedendo à respectiva exploração e manutenção, sem que, porém, lhe assistam quaisquer direitos de posse e de controlo para além dos expressamente indicados no acordo escrito entre as partes.