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CONCLUSÕES DO ADVOGADO-GERAL

GERARD HOGAN

apresentadas em 10 de abril de 2019 ( 1 )

Processo C-291/18

Grup Servicii Petroliere SA

contra

Agenţia Naţională de Administrare Fiscală — Direcţia Generală de Soluţionare a Contestaţiilor

Agenţia Naţională de Administrare Fiscală — Direcţia Generală de Administrare a Marilor Contribuabili

[pedido de decisão prejudicial apresentado pela Curtea de Apel Bucureşti (Tribunal de Recurso de Bucareste, Roménia)]

«Reenvio prejudicial — Imposto sobre o valor acrescentado (IVA) — Diretiva 2006/112/CE — Artigo 148.o, alíneas a) e c) — Isenção — Entrega de plataformas de perfuração offshore autoelevatórias — Embarcação — Definição — Pressuposto da navegação no alto-mar»

1. 

Uma plataforma de perfuração offshore«autoelevatória» é «uma embarcação afeta à navegação no alto-mar […]»? Esta é a principal questão a que o Tribunal de Justiça deve dar uma resposta na sequência do reenvio prejudicial submetido pela Curtea de Apel Bucureşti (Tribunal de Recurso de Bucareste, Roménia).

2. 

O presente pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe a Grup Servicii Petroliere SA (a seguir «GSP»), empresa com sede na Roménia, às autoridades fiscais romenas, num processo relativo a uma entrega isenta de IVA de três plataformas de perfuração offshore autoelevatórias a determinadas empresas maltesas. Neste contexto, o órgão jurisdicional de reenvio pretende saber se plataformas de perfuração offshore autoelevatórias deste tipo são abrangidas pela isenção prevista no artigo 148.o, alínea c) em conjugação com a alínea a), da Diretiva 2006/112/CE do Conselho, de 28 de novembro de 2006, relativa ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado (JO 2006, L 347, p. 1, a seguir «diretiva IVA»).

3. 

Resulta destas disposições que os Estados-Membros devem, nomeadamente, isentar a entrega de embarcações afetas à navegação no alto-mar que assegurem o transporte remunerado de passageiros ou ao exercício de uma atividade comercial, industrial ou de pesca. Como acabei de referir, a questão essencial a ser analisada é se tais plataformas de perfuração são abrangidas por esta isenção. Antes de abordar esta questão, é necessário, em primeiro lugar, especificar as disposições de direito internacional público, de direito da União e de direito nacional aplicáveis.

I. Quadro jurídico

A.   Direito internacional público

4.

A Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar, celebrada em Montego Bay em 10 de dezembro de 1982 (United Nations Treaty Series, Vol. 1833, 1834 e 1835, p. 3; a seguir «Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar»), entrou em vigor em 16 de novembro de 1994. Esta convenção foi aprovada em nome da Comunidade pela Decisão 98/392/CE do Conselho, de 23 de março de 1998 (JO 1998, L 179, p. 1).

5.

O artigo 2.o, n.os 1 e 2, da Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar, intitulado «Regime jurídico do mar territorial, seu espaço aéreo sobrejacente, leito e subsolo», prevê:

«1.   A soberania do Estado costeiro estende-se além do seu território e das suas águas interiores e, no caso de Estado arquipélago, das suas águas arquipelágicas, a uma zona e mar adjacente designada pelo nome de mar territorial.

2.   Esta soberania estende-se ao espaço aéreo sobrejacente ao mar territorial, bem como ao leito e ao subsolo deste mar.»

6.

O artigo 3.o da referida convenção, sob a epígrafe «Largura do mar territorial», tem a seguinte redação:

«Todo Estado tem o direito de fixar a largura do seu mar territorial até um limite que não ultrapasse 12 milhas marítimas, medidas a partir de linhas de base determinadas de conformidade com a presente convenção.»

7.

A parte V da referida convenção, intitulada «Zona económica exclusiva», inclui os artigos 55.o a 75.o

8.

O artigo 56.o, com a epígrafe «Direitos, jurisdição e deveres do Estado costeiro na zona económica exclusiva», prevê:

«1.   Na zona económica exclusiva, o Estado costeiro tem:

a)

Direitos de soberania para fins de exploração e aproveitamento, conservação e gestão dos recursos naturais, vivos ou não vivos das águas sobrejacentes ao leito do mar, do leito do mar e seu subsolo, e no que se refere a outras atividades com vista à exploração e aproveitamento da zona para fins económicos, como a produção de energia a partir da água, das correntes e dos ventos;

[…]

2.   No exercício dos seus direitos e no cumprimento dos seus deveres na zona económica exclusiva nos termos da presente convenção, o Estado costeiro terá em devida conta os direitos e deveres dos outros Estados e agirá de forma compatível com as disposições da presente convenção.

3.   Os direitos enunciados no presente artigo referentes ao leito do mar e ao seu subsolo devem ser exercidos de conformidade com a parte VI da presente convenção.»

9.

O artigo 58.o, n.o 1, da Convenção da Nações Unidas sobre o Direito do Mar, sob a epígrafe «Direitos e obrigações de outros Estados na zona económica exclusiva», tem a seguinte redação:

«Na zona económica exclusiva, todos os Estados, quer costeiros quer sem litoral, gozam, nos termos das disposições da presente convenção, das liberdades de navegação e sobrevoo e de colocação de cabos e ductos submarinos a que se refere o artigo 87.o, bem como de outros usos do mar internacionalmente lícitos, relacionados com as referidas liberdades, tais como os ligados à operação de navios, aeronaves, cabos e ductos submarinos e compatíveis com as demais disposições da presente convenção.»

10.

A parte VI da Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar, intitulada «Plataforma Continental», inclui os artigos 76.o a 85.o

11.

O artigo 77.o intitula-se «Direitos do Estado costeiro sobre a plataforma continental» e estipula no n.o 1:

«O Estado costeiro exerce direitos de soberania sobre a plataforma continental para efeitos de exploração e aproveitamento dos seus recursos naturais.»

12.

O artigo 78.o tem a epígrafe «Regime jurídico das águas e do espaço aéreo sobrejacentes e direitos e liberdades de outros Estados». Prevê, no n.o 2:

«O exercício dos direitos do Estado costeiro sobre a plataforma continental não deve afetar a navegação ou outros direitos e liberdades dos demais Estados, previstos na presente convenção, nem ter como resultado uma ingerência injustificada neles.»

B.   Direito da União

1. Sexta Diretiva

13.

A Sexta Diretiva 77/388/CEE do Conselho, de 17 de maio de 1977, relativa à harmonização das legislações dos Estados-Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios — sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado (JO 1977, L 157, p. 1), com a redação que lhe foi dada pela Diretiva 91/680/CEE do Conselho, de 16 de dezembro de 1991 (JO 1991, L 376, p. 1) (a seguir «Sexta Diretiva»), previa no seu artigo 15.o:

«Sem prejuízo de outras disposições comunitárias, os Estados-Membros isentarão, nas condições por eles fixadas com o fim de assegurar a aplicação correta e simples das isenções a seguir enunciadas e de evitar qualquer possível fraude, evasão e abuso:

[…]

4.   As entregas de bens destinados ao abastecimento de barcos:

a)

Afetos à navegação no alto-mar, e que assegurem o transporte remunerado de passageiros ou o exercício de uma atividade comercial, industrial ou de pesca;

b)

De salvamento e de assistência no mar, ou afetos à pesca costeira, com exceção, relativamente a estes últimos, das provisões de bordo;

[…]

5.   A entrega, transformação, reparação, manutenção, fretamento e locação dos barcos referidos nas alíneas a) e b) do n.o 4 e bem assim a entrega, locação, reparação e manutenção dos objetos — incluindo o equipamento de pesca — incorporados nos referidos barcos ou que sejam utilizados na sua exploração;

[…]»

14.

A Sexta Diretiva foi revogada pela Diretiva IVA, que entrou em vigor em 1 de janeiro de 2007.

2. Diretiva IVA

15.

O considerando 3 da Diretiva IVA dispõe:

«A fim de assegurar que as disposições sejam apresentadas de forma clara e racional, em consonância com o princípio de legislar melhor, é conveniente reformular a estrutura e a redação da diretiva, sem que daí resultem em princípio alterações substanciais da legislação existente. Deverá ser todavia efetuado um número reduzido de alterações substantivas, inerentes ao exercício de reformulação. As alterações desse tipo que venham a ser efetuadas são enumeradas exaustivamente nas disposições que regem a transposição e a entrada em vigor da diretiva.»

16.

O artigo 146.o, n.o 1, da Diretiva IVA, dispõe no capítulo 6 intitulado «Isenções na exportação»:

«Os Estados-Membros isentam as seguintes operações:

a)

As entregas de bens expedidos ou transportados, pelo vendedor ou por sua conta, para fora da Comunidade;

b)

As entregas de bens expedidos ou transportados pelo adquirente não estabelecido no respetivo território, ou por sua conta, para fora da Comunidade, com exceção dos bens transportados pelo próprio adquirente e destinados ao equipamento ou ao abastecimento de embarcações de recreio, aviões de turismo ou qualquer outro meio de transporte para uso privado;

[…]

d)

As prestações de serviços que consistam em trabalhos relativos a bens móveis adquiridos ou importados para serem objeto desses trabalhos na Comunidade e que sejam expedidos ou transportados para fora da Comunidade pelo prestador de serviços, pelo destinatário não estabelecido no respetivo território ou por conta destes;

e)

As prestações de serviços, incluindo os transportes e as operações acessórias, com exceção das prestações de serviços isentas em conformidade com os artigos 132.o e 135.o, quando estiverem diretamente ligadas a exportações ou a importações de bens que beneficiem do disposto no artigo 61.o e na alínea a) do n.o 1 do artigo 157.o»

17.

O artigo 148.o da Diretiva IVA, no capítulo 7, intitulado «Isenções aplicáveis aos transportes internacionais», do título IX, tem a seguinte redação:

«Os Estados-Membros isentam as seguintes operações:

a)

As entregas de bens destinados ao abastecimento das embarcações afetas à navegação no alto-mar que assegurem o transporte remunerado de passageiros ou ao exercício de uma atividade comercial, industrial ou de pesca, bem como das embarcações de salvamento e de assistência no mar e das embarcações afetas à pesca costeira com exceção, relativamente a estas últimas, das provisões de bordo;

[…]

c)

A entrega, transformação, reparação, manutenção, fretamento e locação das embarcações referidas na alínea a), e bem assim a entrega, locação, reparação e manutenção dos objetos, incluindo o equipamento de pesca, incorporados nas referidas embarcações ou utilizados na sua exploração;

[…]».

18.

O artigo 156.o desta diretiva consta do capítulo 10, intitulado «Isenções aplicáveis a operações relacionadas com o tráfego internacional de bens». Dispõe:

«1.   Os Estados-Membros podem isentar as seguintes operações:

a)

As entregas de bens que se destinem a ser apresentados na alfândega e colocados, eventualmente, em depósito temporário;

b)

As entregas de bens que se destinem a ser colocados numa zona franca ou em entreposto franco;

c)

As entregas de bens que se destinem a ser colocados em regime de entreposto aduaneiro ou em regime de aperfeiçoamento ativo;

d)

As entregas de bens que se destinem a ser admitidos em águas territoriais para serem incorporados nas plataformas de perfuração ou de exploração para efeitos de construção, reparação, manutenção, transformação ou equipamento destas, ou em trabalhos de ligação das plataformas de perfuração ou de exploração ao continente;

e)

As entregas de bens que se destinem a ser admitidos em águas territoriais para abastecimento das plataformas de perfuração ou de exploração.

2.   Os locais referidos no n.o 1 são os definidos pelas disposições aduaneiras comunitárias em vigor.»

3. Regulamento de Execução (UE) n.o 282/2011 do Conselho

19.

O artigo 38.o do Regulamento de Execução (UE) n.o 282/2011 do Conselho, de 15 de março de 2011, que estabelece medidas de aplicação da Diretiva 2006/112 (JO 2011, L 77, p. 1), prevê:

«1.   Os “meios de transporte” a que se referem o artigo 56.o e a alínea g) do primeiro parágrafo do artigo 59.o da Diretiva 2006/112/CE incluem veículos, motorizados ou não, e outros equipamentos e dispositivos destinados ao transporte de pessoas ou objetos de um lugar para outro, que podem ser puxados, movidos por tração ou empurrados por veículos e que normalmente se destinam a ser utilizados para transporte e são efetivamente adequados a essa utilização.

2.   Os meios de transporte a que se refere o n.o 1, incluem, nomeadamente, os seguintes veículos:

[…]

d)

Embarcações;

[…]»

C.   Direito nacional

20.

O artigo 143.o da Legea n.o 571/2003, privind Codul fiscal (Lei n.o 571/2003 que aprovou o Código Tributário), com a epígrafe «Isenções para as exportações ou outras operações similares, para as entregas intracomunitárias de bens e para o transporte internacional e intracomunitário», prevê na versão em vigor em maio de 2008:

«1)   Estão isentas de imposto: […]

h)

No caso de embarcações afetas à navegação marítima, utilizadas para o transporte internacional de pessoas e/ou de bens, para a pesca ou qualquer outra atividade económica ou para operações de salvamento e de assistência no mar, as seguintes operações:

1.

A entrega, transformação, reparação, manutenção, fretamento, locação financeira e locação de embarcações, e bem assim a entrega, locação financeira, locação, reparação e manutenção dos objetos, incluindo o equipamento de pesca, incorporados nas referidas embarcações ou que sejam utilizados na sua exploração; […]»

21.

O artigo 144.o da Lei n.o 571/2003, que aprova o Código Tributário, sob a epígrafe «Isenções especiais conexas com o tráfego internacional de bens», prevê:

«1)   Estão isentas de imposto:

a)

As entregas de bens que se destinem a ser: […]

7.

admitidos em águas territoriais

para serem incorporados nas plataformas de perfuração ou de exploração para efeitos de construção, reparação, manutenção, transformação ou da sua recuperação, ou em trabalhos de ligação das plataformas de perfuração ou de exploração ao continente,

para abastecimento das plataformas de perfuração ou de exploração.»

22.

O artigo 23.o da Ordonanța Guvernului n.o 42/1997, privind transportul maritim și pe căile navigabile interioare (Decreto Legislativo n.o 42/1997 relativo ao transporte marítimo e por vias navegáveis internas), prevê:

«Para efeitos do presente Decreto Legislativo, consideram-se embarcações:

a)

as embarcações de navegação interior ou marítima de qualquer tipo, motorizadas ou não motorizadas, que naveguem à superfície ou submersas, destinadas ao transporte de mercadorias e/ou passageiros, à pesca, ao reboque ou ao arrasto;

b)

instalações flutuantes, nomeadamente, dragas, elevadores flutuantes, gruas flutuantes, baldes flutuantes e similares, motorizados ou não motorizados;

c)

unidades flutuantes normalmente não destinadas a deslocações, nomeadamente, cais e docas flutuantes, pontões, cabines flutuantes para embarcações, plataformas de perfuração e similares, navios farol;

d)

embarcações de recreio.»

23.

O ponto 1 da Decizia n.o 3/2015 a Comisiei fiscale centrale (Decisão n.o 3/2015 da Comissão Tributária Central) menciona:

«1. No período entre 1 de janeiro de 2007 e 31 de dezembro de 2013: no caso de embarcações afetas à navegação marítima, utilizadas para o transporte internacional de pessoas e/ou de bens, para a pesca ou qualquer outra atividade económica marítima, as isenções do IVA a que se refere o artigo 143.o, n.o 1, alínea h), da Lei n.o 571/2003 […] aplicam-se no caso de a embarcação ser efetiva e predominantemente utilizada para a navegação no mar. Para efeitos de determinar se uma embarcação é efetiva e predominantemente utilizada no mar não podem ser exclusivamente tomados em consideração critérios objetivos, como o comprimento ou a arqueação da embarcação, que todavia podem ser utilizados para excluir do âmbito de aplicação das isenções as embarcações que, em qualquer caso, não satisfazem as condições enunciadas no artigo 143.o, n.o 1, alínea h), do Código Tributário, nomeadamente por não serem adequadas para a navegação marítima. […] O conceito de navegação “no mar” nos termos da [Diretiva IVA] e do artigo 143.o, n.o 1, alínea h), do Código Tributário compreende qualquer parte do mar fora das águas territoriais de qualquer país, situada para além do limite das 12 milhas náuticas, medido a partir das linhas de base determinadas de acordo com o Direito Internacional do Mar (Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar, celebrada em Montego Bay em 10 de dezembro de 1982).»

II. Processo principal e questões prejudiciais

24.

Em maio de 2008, a GSP vendeu a alguns compradores malteses três plataformas de perfuração offshore autoelevatórias, situadas no Mar Negro (mais especificamente, de acordo com a informação constante do pedido prejudicial, nas águas territoriais da Roménia), com vista ao exercício da atividade de perfuração. As plataformas de elevação automática, ou unidades autoelevatórias, são plataformas móveis que consistem num casco flutuante equipado com várias pernas móveis. O casco flutuante permite o transporte da unidade de perfuração e demais máquinas anexas para o local de perfuração proposto com as pernas para cima e o casco flutuando à superfície da água. Uma vez no local, as pernas são então estendidas (ou «levantadas») na água. As pernas ancoram, assim, no leito do mar e o equipamento e a plataforma do casco é então elevada bem acima da superfície do mar. Nesta posição estendida (ou «levantada»), cria-se uma plataforma estática. Apenas quando as pernas são retiradas, no final da operação de perfuração, o casco volta a flutuar.

25.

Afigura-se, dos autos remetidos ao Tribunal de Justiça, que as três plataformas em causa têm propulsão própria ou são manobradas por reboque, o Tribunal de Justiça foi, no entanto, informado na audiência de que as três unidades em questão não são autopropulsionadas. E embora o Tribunal de Justiça também tenha sido informado na audiência de que a plataforma conta com uma tripulação, de que existe um diário de bordo e de que a plataforma pode ser manobrada através dos seus motores para lidar com as correntes marítimas e a deriva no mar, parece-me que — ainda que estes sejam factos que, em última análise, compete ao órgão jurisdicional de reenvio verificar —, mesmo quando se encontre a flutuar, a plataforma é transportada de um local para outro por um rebocador.

26.

Para todos os efeitos, a GSP emitiu faturas, aplicando o regime de isenção de IVA previsto na legislação nacional (artigo 143.o, n.o 1, alínea h), do Código Tributário), que transpõe o artigo 148.o, alínea c), da Diretiva IVA relativo à entrega destas plataformas. Após a venda das plataformas, a GSP continuou a explorá-las no Mar Negro, nos termos de uma locação em casco nu.

27.

Em 23 de maio de 2016, na sequência da aprovação de um relatório da inspeção tributária, a administração fiscal romena emitiu um aviso de cobrança retificativo para regularização do IVA alegando que, embora as plataformas de perfuração possam ser consideradas embarcações na aceção da legislação nacional e sejam adequadas para uso ilimitado e sem restrições no mar, elas não navegam durante a atividade de perfuração, assumindo antes uma posição de estacionamento: as suas colunas ficam em posição baixa, e assentam no leito do mar para elevar o pontão (a parte flutuante) acima do mar, de uma altura de 60 a 70 metros. Para que a entrega de plataformas fosse abrangida pela isenção prevista no artigo 143.o, n.o 1, alínea h), do Código Tributário, era necessário determinar se a embarcação em questão se encontrava a navegar de forma eficaz e predominantemente no alto-mar. A administração fiscal considerou, contudo, que o uso real e preponderante das plataformas ocorria quando estas se encontram estacionadas para fins de atividade de perfuração, e não quando navegam, que é apenas acessória da atividade de perfuração.

28.

A GSP apresentou uma reclamação contra este aviso, que foi indeferida por decisão da administração fiscal nacional da Roménia em 24 de novembro de 2016.

29.

A recorrente recorreu do aviso de cobrança retificativo, do relatório de inspeção fiscal e da decisão sobre a reclamação, para o órgão jurisdicional de reenvio.

III. Pedido de decisão prejudicial e tramitação processual no Tribunal de Justiça

30.

O órgão jurisdicional de reenvio considera que é necessário esclarecer, em primeiro lugar, se a isenção prevista no artigo 148.o, alínea c), em conjugação com o disposto na alínea a), da Diretiva IVA, se aplica à entrega de plataformas de perfuração offshore autoelevatórias, isto é, se tal plataforma se enquadra no conceito de «embarcação» conforme definido na referida disposição. Em segundo lugar, e caso a resposta à primeira questão seja afirmativa, o órgão jurisdicional de reenvio pretende saber se a isenção prevista no artigo 148.o, alínea c), lida em conjugação com a alínea a), da Diretiva IVA fica subordinada à condição de que a atividade de navegação no alto-mar prevalece sobre a de perfuração.

31.

Nestas circunstâncias, a Curtea de Apel Bucureşti (Tribunal de Recurso de Bucareste) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)

Deve o artigo 148.o, alínea c), conjugado com o disposto na alínea a), da Diretiva [IVA], relativa ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado, ser interpretado no sentido que a isenção do imposto sobre o valor acrescentado se aplica, em determinadas condições, à entrega de plataformas de perfuração offshore autoelevatórias, ou seja, se a plataforma de perfuração offshore autoelevatória é abrangida pelo conceito de “embarcação” na aceção da referida norma de direito da União, na medida em que desta norma resulta, com base no título do capítulo 7 da mesma diretiva, que regula as “[i]senções aplicáveis aos transportes internacionais”?

2)

Em caso de resposta afirmativa à questão anterior, se da interpretação do artigo 148.o, alínea c), conjugado com o disposto na alínea a), da Diretiva [IVA], resultar que constitui um requisito essencial para a aplicação da isenção do imposto sobre o valor acrescentado que, durante a sua utilização (enquanto atividade comercial/industrial), a plataforma de perfuração offshore autoelevatória, que navegou até ao alto-mar, tenha permanecido efetivamente em estado de mobilidade, em flutuação, com deslocação no mar de um ponto até outro, por um período de tempo superior àquele em que se encontra em estado estacionário, imóvel, tendo em vista a atividade de perfuração no mar, ou seja, se a atividade de navegação deve efetivamente prevalecer em relação à de perfuração?»

32.

Foram apresentadas observações escritas pela Grup Servicii Petroliere, pelos Governos belga, italiano e romeno e pela Comissão Europeia. Além disso, a Grup Servicii Petroliere, o Governo romeno e a Comissão Europeia foram ouvidos em alegações na audiência de 28 de fevereiro de 2019.

IV. Análise

A.   Observação preliminar

33.

Em primeiro lugar, importa referir que o considerando 3 da Diretiva [IVA] especifica que a adoção desta diretiva não produziu, em princípio, alterações substanciais da legislação existente relativa ao sistema comum do IVA, com exceção de um número reduzido de alterações substantivas enumeradas de forma exaustiva nas disposições que regem a transposição e a entrada em vigor da diretiva. Por conseguinte, a presente diretiva pode ser considerada essencialmente como tendo a natureza de um texto legislativo na sua versão consolidada.

34.

Uma vez que nenhuma das disposições que regulam a transposição e a entrada em vigor da Diretiva [IVA], consagradas nos artigos 411.o a 414.o dessa diretiva, remete para o artigo 148.o, alíneas a) ou c), este último artigo deve ser considerado como tendo o mesmo significado que o artigo 15.o, n.o 4, da Sexta Diretiva, que tinha uma redação semelhante ( 2 ). Daqui decorre, portanto, que deve ser tomada em consideração a jurisprudência existente relativa ao artigo 15.o, n.o 4, da Sexta Diretiva, a fim de interpretar o artigo 148.o, alíneas a) e c), da Diretiva [IVA] ( 3 ).

35.

No que diz respeito ao artigo 15.o, n.o 4, da Sexta Diretiva, o Tribunal de Justiça declarou que as operações abrangidas por esta disposição estão isentas pelo facto de serem «equiparadas às operações de exportação» ( 4 ). Por outras palavras, essas operações devem ser tratadas como se tivessem ocorrido fora do território da União ( 5 ).

36.

No seu Acórdão de 3 de setembro de 2015, Fast Bunkering Klaipėda (C-526/13, EU:C:2015:536, n.o 26), o Tribunal de Justiça confirmou que uma operação abrangida pelo artigo 148.o, alíneas a) e c) está isenta devido ao facto de ser equiparada a operações de exportação.

37.

É à luz destes objetivos que as duas questões submetidas podem, assim, ser apreciadas.

B.   Quanto às duas questões

38.

Com as suas duas questões, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 148.o, alínea c), da Diretiva IVA, lido em conjugação com o disposto na alínea a), da mesma diretiva, deve ser interpretado no sentido de que a isenção prevista na primeira disposição é aplicável a plataformas de perfuração offshore autoelevatórias.

39.

Como ponto de partida, importa recordar que, nos termos do artigo 148.o, alínea c), da Diretiva IVA, o fornecimento das embarcações referidas na alínea a) deste artigo está isento de IVA. Por conseguinte, para determinar se as plataformas de perfuração offshore autoelevatórias são abrangidas por esta isenção, é necessário definir, em primeiro lugar, o que se deve entender pelo termo «embarcação», tal como utilizado no artigo 148.o, alínea c) e, em segundo lugar, quais as características que uma embarcação deve apresentar para poder ser abrangida pelo âmbito de aplicação do artigo 148.o, alínea a), da Diretiva IVA, e para que a sua entrega possa, por sua vez, ficar isenta.

1. Significado comum dos termos «embarcação» e «navegação»

40.

Quanto à definição do conceito de embarcação, depende muito, é claro, do contexto específico da disposição em questão.

41.

É verdade que, nos termos do direito internacional, talvez não seja de estranhar, por exemplo, que a Convenção Internacional para a Prevenção da Poluição por Navios (1973) (MARPOL) (conforme alterada pelo Protocolo de 1978) (Londres) definiu navio como «uma embarcação de qualquer tipo que opere no meio marinho, incluindo embarcações de sustentação dinâmica, veículos de sustentação por ar, submersíveis, estruturas flutuantes e plataformas fixas ou flutuantes» ( 6 ). No entanto, uma vez que esta convenção visa prevenir a poluição marinha, é natural que tenha definido o conceito de embarcação de forma muito ampla. À luz deste critério, é essencialmente irrelevante se tal poluição provinha de uma plataforma fixa que suportava uma plataforma de perfuração ou de uma embarcação náutica convencional, como um navio ou um barco. É por isso que, no essencial, a Convenção MARPOL inclui na definição do termo «navio» plataformas fixas ou flutuantes deste tipo.

42.

No entanto, a redação do atual artigo 148.o, alíneas a) e c), da Diretiva IVA não é destituído de importância. Afinal, a isenção não se refere pura e simplesmente a «embarcações», mas sim a «embarcações afetas à navegação no alto-mar». A este respeito, a diretiva faz uso da mesma linguagem carregada de elementos importantes da legislação marítima contidos nos estatutos de alguns Estados-Membros ( 7 ). A frase «[…] afeta à navegação no alto-mar […]» é, contudo, uma importante e, a meu ver, decisiva qualificação do termo «embarcação».

43.

Na linguagem comum, a palavra «embarcação» denota uma estrutura de algum tipo que é capaz de fazer algo na água envolvendo o transporte de pessoas ou bens, independentemente de isso ser feito de forma remunerada ou de outra forma ou simplesmente para fins recreativos ( 8 ). Portanto, duvido que este tipo de plataforma possa ser qualificada como uma «embarcação» propriamente dita, uma vez que não transporta pessoas ou bens na água: assume antes a natureza de uma construção de origem humana em larga escala que, após ser deslocada, é afixada no mar para fins de perfuração. Embora seja verdade que, tal como o Tribunal de Justiça foi informado na audiência, há uma tripulação a bordo da plataforma e que esta conta com um diário de bordo, pode-se observar, no entanto, que uma plataforma de perfuração autoelevatória parece carecer de muitas das características elementares de uma embarcação à vela, como uma proa ou âncoras ou um leme, apesar de isso ser, em última instância, uma questão que cabe ao tribunal nacional analisar casuisticamente. Também não me parece que estas plataformas possuam qualquer mecanismo de direção convencional: afigura-se, por exemplo, a inexistência de uma casa do leme, embora se admita mais uma vez que a verificação destes pormenores é da competência do órgão jurisdicional de reenvio. Além disso, como o Tribunal de Justiça foi informado na audiência, as plataformas em causa no presente processo têm ainda a natureza de plataformas que não possuem qualquer meio de autopropulsão.

44.

Ainda que esteja errado neste ponto e que uma plataforma de perfuração «autoelevatória» possa, apesar de tudo, ser considerada uma «embarcação» propriamente dita, o facto de a plataforma poder ser qualificada (contrariamente à minha opinião) como «embarcação», não significa que se trate de uma embarcação «afeta à navegação no alto-mar», como exige o artigo 148.o, alínea a), da Diretiva IVA.

45.

É verdade que, em algumas das suas versões linguísticas, o artigo 148.o, alínea a), não menciona expressamente o requisito de afetação à navegação. Por exemplo, a versão alemã afirma simplesmente que a embarcação deve ser utilizada no mar ( 9 ). Contudo, uma vez que o artigo 148.o tem por objetivo isentar a entrega de embarcações abrangidas pelo âmbito geográfico da Diretiva IVA, mas que se destinam a realizar atividades económicas fora deste âmbito, a aplicação desta disposição a uma embarcação exige, implícita mas necessariamente, que a embarcação seja, pelo menos, navegável, a fim de sair das águas da União.

46.

Daqui decorre, portanto, que, mesmo que uma plataforma de perfuração deva ser considerada uma «embarcação», para ser abrangida pela definição contida no artigo 148.o, alínea a), deverá, contudo, ser afeta à navegação no alto-mar. A navegação é essencialmente a arte náutica do mar. Implica que a localização da embarcação possa ser determinada e o futuro rumo da embarcação traçado/a pelo seu navegador.

47.

No que diz respeito ao termo «alto-mar», resulta do artigo 86.o da Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar que o direito internacional considera o alto-mar como «todas as partes do mar não incluídas na zona económica exclusiva, no mar territorial ou nas águas interiores de um Estado, nem nas águas arquipelágicas de um Estado arquipélago».

48.

Por conseguinte, o contexto do artigo 148.o, alínea a) e c), pressupõe necessariamente que a embarcação em causa deve, pelo menos, ser suscetível de ser navegada longe da costa. Isto, por sua vez, implica que a direção da embarcação também possa ser comandada pelo navegador e que a embarcação seja, portanto, autopropulsionada. E independentemente das qualidades náuticas das plataformas de perfuração em questão, é perfeitamente claro que tais plataformas não são afetas à navegação no alto-mar, precisamente porque não possuem qualquer capacidade de propulsão própria.

49.

É verdade que estas plataformas são concebidas para resistir a condições meteorológicas adversas e, como foi confirmado na audiência, podem ser transportadas no alto-mar e ali funcionar regularmente nessa qualidade. Isso, no entanto, não é o mesmo que dizer que tais plataformas de perfuração «são afetas à navegação no alto-mar». Qualquer outra conclusão seria, na minha opinião, uma deturpação do teor da linguagem e seria justamente vista com certo ceticismo pela comunidade marítima. Não se pode, creio eu, qualificar, de forma realista esta plataforma como um «navio de mar».

50.

Poder-se-ia, por outro lado, observar igualmente que qualquer isenção do âmbito de aplicação da Diretiva IVA deve ser interpretada com rigor e de forma estrita ( 10 ), e a possibilidade de integração deste tipo de plataformas de perfuração «autoelevatórias» no âmbito de aplicação do artigo 148.o, alínea c), não foi claramente demonstrada.

51.

Daqui decorre, por conseguinte, que, por estes motivos, a isenção prevista no artigo 148.o, alínea a), não se aplica a plataformas de perfuração deste tipo.

2. Abordagem alternativa

52.

De qualquer forma, mesmo que o sentido comummente aceite dos termos «embarcação» e «navegação» seja posto de lado, considero, no entanto, que, em circunstâncias como as do processo principal, se chega precisamente à mesma conclusão, ou seja, que a isenção prevista no artigo 148, alínea c), da Diretiva IVA não é aplicável.

53.

É verdade que, se tivermos em conta apenas o objetivo prosseguido pelo artigo 148.o, alíneas a) e c), que consiste em isentar [de IVA] certas operações pelo facto de serem «equiparadas às operações de exportação» ou, mais precisamente, por estarem relacionadas com a entrega de bens ou prestação de serviços destinados a serem utilizados fora do território da União, há que admitir que tal objetivo implica que a expressão «embarcação» seja necessariamente entendida no sentido de se referir a uma estrutura suscetível de ser deslocada para fora das águas da União, embora necessariamente por conta própria ( 11 ). Além disso, e ainda nesta perspetiva, a palavra «navegação» poderá ser entendida no sentido de se referir ao movimento que uma embarcação deve realizar para abandonar as águas da União a fim de levar a cabo as suas atividades fora do âmbito de aplicação da legislação em matéria de IVA.

54.

Todavia, importa igualmente recordar que o artigo 148.o, alínea c), da Diretiva IVA também exige que, para que uma entrega de navios esteja isenta, estejam preenchidos dois outros requisitos, além de se tratar de uma embarcação usada para navegação. Em primeiro lugar, a embarcação deve estar afeta a uma das atividades referidas no artigo 148.o, alínea a), dessa diretiva. Em segundo lugar, como o Tribunal de Justiça já declarou no âmbito da Sexta Diretiva ( 12 ) e da Diretiva IVA ( 13 ) tanto no caso das embarcações que transportam passageiros como no caso das embarcações utilizadas para fins comerciais ou industriais, esta isenção não é aplicável exceto se tais atividades forem exercidas no alto-mar.

55.

No que diz respeito às atividades que uma embarcação deve exercer a fim de a sua entrega ser isenta, o órgão jurisdicional de reenvio salientou, na sua primeira questão, que o artigo 148.o da Diretiva IVA é mencionado no capítulo 7 dessa diretiva, sob a epígrafe «Isenções aplicáveis aos transportes internacionais».

56.

Contudo, como o título de um capítulo é escolhido na perspetiva de refletir os elementos das disposições principais nele previstas, nem todas as disposições contidas num capítulo necessariamente um âmbito de aplicação limitado à matéria mencionada no título desse capítulo ( 14 ). No caso do artigo 148.o, alínea a), resulta da própria redação desta disposição que as atividades abrangidas não se limitam simplesmente ao transporte, mas incluem também atividades comerciais, de pesca ou industriais ( 15 ).

57.

Evidentemente, não há dúvida de que a realização de perfurações offshore através de uma plataforma de perfuração é uma das atividades referidas no artigo 148.o, alínea a), uma vez que a atividade industrial inclui a perfuração.

58.

No que respeita ao requisito relativo ao alto-mar, o Governo romeno e a Comissão Europeia alegam que tal requisito implica que a embarcação deva nele ser utilizada, enquanto os Governos belga e italiano argumentam que uma embarcação só precisa de ser adequada para navegar nestas águas, independentemente do tempo passado em alto-mar. Na sua opinião, uma embarcação que exerça a sua atividade nas águas territoriais de um dos Estados-Membros poderia, apesar de tudo, beneficiar da isenção consagrada no artigo 148.o, alínea c), mesmo sem ser utilizada no alto-mar, desde que pudesse ser aí deslocada.

59.

No entanto, como já referi, as operações abrangidas pelo artigo 148.o, alíneas a) e c), estão isentas porque se referem a bens ou prestações de serviços adquiridos nos territórios da União, mas que se espera que sejam utilizados fora destes territórios. Por outras palavras, isto significa que a embarcação em questão deve deslocar-se de um local situado nas águas da União para um local fora delas, onde serão exercidas as atividades em causa. É precisamente por estas razões que, contrariamente aos argumentos apresentados pelos Governos belga e italiano, considero que não basta que uma embarcação seja adequada para ser utilizada no alto-mar. Em meu entender, a embarcação deve estar essencial e efetivamente envolvida numa atividade exercida em alto-mar.

3. O conceito de alto-mar à luz do artigo 148.o, alínea a), da Diretiva IVA

60.

Por último, é necessário analisar o que se entende pelo conceito de «alto-mar» no artigo 148.o, alínea a), da Diretiva IVA.

61.

Uma vez que o objetivo prosseguido por esse artigo 148.o, que visa isentar as operações equiparadas a exportações, considero que o conceito de alto-mar deve ser entendido no sentido de designar a água fora do âmbito de aplicação territorial da Diretiva IVA do Conselho.

62.

O âmbito de aplicação territorial desta diretiva é fixado no artigo 5.o Segundo esta disposição, a Diretiva IVA aplica-se às operações ocorridas numa parte do território de um dos Estados-Membros «ao qual o Tratado que institui a Comunidade Europeia, que foi substituído desde então pelo Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, em conformidade com o [artigo 52.o TUE e com os artigos 349.o e 355.o TFUE], é aplicável com exclusão do ou dos territórios referidos no artigo 6.o da presente diretiva».

63.

Na falta de uma definição, no Tratado, do conceito de território, este deve ser determinado em conformidade com os princípios de direito internacional público.

64.

A este respeito, o Governo romeno e a Comissão alegaram na audiência que, quando foi adotada a Sexta Diretiva IVA, que já continha a isenção agora prevista no artigo 148.o, alínea a), apenas a Convenção sobre o Mar Territorial e a Zona Contígua, assinada em Genebra em 29 de abril de 1958 (United Nations Treaty Series, Vol. 516, p. 205), estava em vigor e que, portanto, as noções de «territórios» e «alto-mar» deveriam ser interpretadas à luz desta convenção.

65.

Há que recordar, contudo, que o primado dos acordos internacionais celebrados pela União Europeia sobre os instrumentos de direito derivado significa que tais instrumentos devem ser interpretados, a partir da data de entrada em vigor do presente acordo, de uma forma que seja consistente com eles ( 16 ). Consequentemente, na medida em que a Decisão 98/392 entrou em vigor em 13 de julho de 1998, antes da compra das plataformas em causa no processo principal, o território dos Estados-Membros teve de ser apreciado à luz da Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar ( 17 ).

66.

De acordo com o artigo 2.o da Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar, a soberania do Estado costeiro estende-se ao mar territorial, bem como ao seu leito e subsolo.

67.

De acordo com o artigo 3.o desta Convenção, cada Estado tem o direito de fixar a largura do seu mar territorial até um limite que não ultrapasse 12 milhas marítimas, medidas a partir de linhas de base determinadas em conformidade com a presente Convenção.

68.

Para além deste limite, a Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar prevê que cada Estado costeiro exerce direitos de soberania sobre a zona económica exclusiva e a plataforma continental. Estes direitos limitam-se, no entanto, às atividades previstas respetivamente nos artigos 56.o e 77.o da Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar.

69.

De igual modo, no seu Acórdão de 29 de março de 2007, Aktiebolaget NN (C-111/05, EU:C:2007:195, n.os 59 e 60), o Tribunal de Justiça declarou que «a soberania do Estado costeiro sobre a zona económica exclusiva, bem como sobre a plataforma continental, é meramente funcional e, como tal, está limitada ao direito de exercer as atividades de exploração e de aproveitamento previstas nos artigos 56.o e 77.o da Convenção sobre o Direito do Mar».

70.

Uma vez que a atividade em causa no Acórdão Aktiebolaget NN era a entrega e a colocação de um cabo submarino, que não constava das atividades enumeradas nos artigos 56.o e 77.o da Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar, o Tribunal de Justiça decidiu que esta atividade estava subtraída à soberania do Estado-Membro costeiro e, portanto, não se encontrava abrangida pelo âmbito de aplicação territorial do sistema comum do IVA ( 18 ).

71.

No presente caso, não obstante as plataformas beneficiarem da liberdade de navegação referida nos artigos 58.o, n.o 1, 78.o e 87.o da Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar, mantém-se o facto de a atividade que exercem ser de exploração e aproveitamento dos recursos naturais do subsolo agudo leito do mara. Esta, no entanto, é uma das atividades a que os artigos 56.o e 77.o da Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar se referem como estando sujeitas aos direitos de soberania do Estado costeiro.

72.

Portanto, contrariamente à atividade em causa no Acórdão Aktiebolaget NN, quando uma embarcação realiza uma atividade de perfuração na zona económica exclusiva ou na plataforma continental de um Estado-Membro, tal atividade é exercida no âmbito de aplicação territorial da Diretiva IVA. Por conseguinte, a fim de ficar isenta [de IVA] ao abrigo do artigo 148.o, alínea c), conjugado com o disposto na alínea a), dessa diretiva a plataforma não pode exercer as suas atividades nem no mar territorial, nem na zona económica exclusiva, nem na plataforma continental de um Estado-Membro da União.

73.

No seu pedido de decisão prejudicial, o órgão jurisdicional de reenvio indicou que as plataformas em causa no processo principal, quando foram adquiridas, realizavam atividades de perfuração em águas territoriais romenas no Mar Negro e que continuaram a exercer essas atividades após a data em que foram adquiridas.

74.

Todas as partes se mostraram de acordo, durante a audiência, que o Mar Negro é inteiramente abrangido por uma ou outra zona económica exclusiva dos seus vários Estados costeiros. Por conseguinte, nenhuma parte do mar Negro pode ser considerada como zona de alto-mar na aceção do artigo 148.o, alínea c), da Diretiva IVA ( 19 ). Conclui-se, portanto, que mesmo que (contrariamente à minha perceção) estas plataformas possam ser consideradas «embarcações» que foram «afetas à navegação no alto-mar», a sua entrega não está abrangida pelo artigo 148.o, alínea c), precisamente devido ao local onde realizaram as suas atividades no imediatamente após terem sido adquiridas.

75.

Contrariamente ao que sustenta a Grup Servicii Petroliere, esta conclusão não invalida o facto de estas plataformas poderem ser eventualmente deslocadas para o Mar Mediterrâneo ou o Mar do Norte, nem viola o princípio da neutralidade fiscal, aqui entendido no sentido de igualdade de tratamento ( 20 ).

76.

Com efeito, por uma questão de princípio, a afetação que deve ser considerada para determinar as regras do IVA aplicáveis é a que surge imediatamente após a aquisição e bens ou prestação de serviços em questão e não a que poderia hipoteticamente ser estabelecida no futuro ( 21 ).

77.

Além disso, no que se refere ao princípio da neutralidade fiscal, que impede que bens ou serviços similares que estão em concorrência entre si sejam tratados de forma diferente para efeitos de IVA ( 22 ), deve recordar-se que tal só pode ser oponível às disposições nacionais ( 23 ).

78.

É certo que, de acordo com uma determinada jurisprudência, o princípio da neutralidade é a tradução do princípio da igualdade de tratamento em matéria de IVA ( 24 ), o que implica que situações comparáveis não sejam tratadas de maneira diferente, a menos que tal diferenciação se justifique objetivamente ( 25 ). No entanto, o Tribunal de Justiça tem afirmado repetidamente que a questão de saber se situações são ou não comparáveis deve ser apreciada à luz do objeto e da finalidade das disposições em causa e do objetivo prosseguido por estas, embora também devam ser tidos em conta para o efeito os princípios e objetivos do domínio em questão ( 26 ).

79.

Uma vez que o artigo 148.o, alínea c), da Diretiva IVA isenta determinadas operações por serem «equiparadas às operações de exportação», só as embarcações entregues no território da União com o objetivo de exercer as suas atividades fora deste antes de regressar à sua posição de partida pode ser considerada como situação comparável à luz desse objetivo. Por conseguinte, o legislador pode tratar as plataformas de forma diferente, sem violar o princípio da igualdade de tratamento, consoante elas exerçam ou não as suas atividades no alto-mar ( 27 ).

80.

Do mesmo modo, considero que a solução a que chegámos não viola o princípio da igualdade de tratamento no que diz respeito ao disposto no artigo 156.o, alínea d), da Diretiva IVA. Com efeito, considero que esta disposição não é relevante no presente caso, inclusivamente na perspetiva do princípio da neutralidade fiscal. Enquanto o Artigo 156.o, alínea d), declara que as entregas de bens que se destinem a ser admitidos em águas territoriais para serem incorporados nas plataformas de perfuração ou de exploração, para fins de construção, reparação, manutenção, transformação ou equipamento de tais plataformas, ou em trabalhos de ligação das plataformas de perfuração ou de exploração ao continente, podem ser isentas de IVA, a redação deste artigo não menciona entre as operações abrangidas a revenda de plataformas de perfuração.

Conclusões

81.

À luz das considerações precedentes, proponho que o Tribunal de Justiça responda às questões submetidas pela Curtea de Apel Bucureşti (Tribunal de Recurso de Bucareste, Roménia) de modo que o artigo 148.o, alínea c) em conjugação com a alínea a), da Diretiva 2006/112/CE do Conselho, de 28 de novembro de 2006, relativa ao sistema comum do IVA, seja interpretado no sentido de que a isenção prevista nesta primeira disposição não é aplicável às plataformas de perfuração offshore autoelevatórias como as que estão em causa o processo principal.


( 1 ) Língua original: inglês.

( 2 ) V., por analogia, Acórdão de 16 de junho de 2016, Kreissparkasse Wiedenbrück (C-186/15, EU:C:2016:452, n.o 40).

( 3 ) Acórdão de 3 de setembro de 2015, Fast Bunkering Klaipėda (C-526/13, EU:C:2015:536, n.o 25).

( 4 ) Acórdãos de 26 de junho de 1990, Velker International Oil Company (C-185/89, EU:C:1990:262, n.o 21) e de 14 de setembro de 2006, Elmeka (C-181/04C-183/04, EU:C:2006:563, n.o 21).

( 5 ) Esta disposição serve como medida para garantir a competitividade. Com efeito, uma vez que as atividades exercidas pela embarcação em causa decorreram fora do âmbito de aplicação territorial do sistema comum do IVA, ou seja, fora das águas da União, os bens e serviços necessários ao exercício dessas atividades, incluindo as embarcações, poderiam ser facilmente entregues por operadores não comunitários. Além disso, no que respeita à situação dos bens destinados ao abastecimento de embarcações, na falta do artigo 148.o, alínea a), os fornecedores da União poderiam ficar tentados a esperar que as embarcações abandonassem as águas da União para as abastecer a fim de obter o benefício da isenção de IVA.

( 6 ) O sublinhado é meu.

( 7 ) Notavelmente, por exemplo, a Lei da Marinha Mercante do Reino Unido, de 1894, p. 742, definiu uma «embarcação» como incluindo «qualquer navio ou barco ou qualquer outra descrição de embarcação utilizada na navegação».

( 8 ) Ou, para citar as palavras do Supremo Tribunal da Irlanda em The Von Rocks [1998] 3 Irish Reports 41, o prazer que muitos tiram de apenas «brincar aos barcos». A citação é por sua vez retirada de K. Grahame, The Wind in the Willows.

( 9 ) Os termos utilizados em alemão são que a embarcação «auf hoher See […] eingesetzt sind».

( 10 ) V., por exemplo, Acórdão de 18 de outubro de 2007, Navicon (C-97/06, EU:C:2007:609, n.os 21 e 22 e jurisprudência referida).

( 11 ) Esta conclusão não é contestada pelo artigo 38.o do Regulamento de Execução (UE) n.o 282/2011 do Conselho. Com efeito, embora este último inclua as embarcações na noção de «meios de transporte» que são definidos como quaisquer dispositivos destinados ao transporte de pessoas ou objetos de um lugar para outro, decorre da redação desta disposição que o âmbito de aplicação desta definição circunscreve-se à noção de «meio de transporte» referida no artigo 56.o e no artigo 59.o, primeiro parágrafo, alínea g), da Diretiva IVA.

( 12 ) V., Acórdão de 14 de setembro de 2006, Elmeka (C-181/04C-183/04, EU:C:2006:563, n.o 14). Além do motivo exposto neste acórdão, gostaria de sublinhar que, interpretar o artigo 148.o, alínea a), da Diretiva IVA como sendo aplicável apenas às embarcações que asseguram o transporte remunerado de passageiros, inviabilizaria este pressuposto, uma vez que o transporte de passageiros é também uma atividade comercial que está expressamente isenta por força deste artigo.

( 13 ) Acórdão de 21 de março de 2013, Comissão/França (C-197/12, não publicado, EU:C:2013:202, n.o 22).

( 14 ) V., por analogia, uma disposição cujo âmbito de aplicação vai além do objeto do regulamento em que esta disposição é mencionada, Acórdão de 13 de junho de 2018, Deutscher Naturschutzring (C-683/16, EU:C:2018:433, n.o 43 e segs.)

( 15 ) Por último, deve recordar-se novamente que, de acordo com a jurisprudência, as operações abrangidas pelo artigo 148.o estão isentas por serem «equiparadas às operações de exportação». Como, no caso de uma embarcação, esta deve navegar fora do âmbito [de aplicação territorial] para ser abrangida por esta disposição, considero que este movimento poderia explicar por que razão esta disposição foi colocada no capítulo 7, sob o epígrafe «Isenções aplicáveis aos transportes internacionais».

( 16 ) V., por exemplo, Acórdão de 11 de abril de 2013, HK Danmark (C-335/11C-337/11, EU:C:2013:222, n.os 28 a 30).

( 17 ) A este propósito, note-se que a Decisão 98/392/CE não refere a data de entrada em vigor. No entanto, nos termos do artigo 297.o TFUE, um ato legislativo, que não menciona qualquer data a esse respeito entra em vigor no vigésimo dia após a sua publicação. Uma vez que a Decisão 98/392/CE foi publicada em 23 de junho de 1998, deve considerar-se que entrou em vigor em 13 de julho de 1998.

( 18 ) O Tribunal de Justiça sublinhou que esta conclusão foi confirmada pelos artigos 58.o, n.o 1, e 79.o, n.o 1, da Convenção, que reservam, sob determinadas condições, o direito de colocar cabos submarinos nestas zonas a qualquer Estado.

( 19 ) Na realidade, o problema no processo principal parece ter origem no facto de a Roménia não ter transposto corretamente o artigo 148.o, alínea c), no momento da compra. Com efeito, o artigo 143.o, n.o 1, alínea h), da Lei n.o 571/2003, que aprovou o Código fiscal, não exigia, como requisito para beneficiar da isenção, que as atividades das embarcações consistissem no transporte remunerado de passageiros ou no exercício de atividades comerciais, industriais ou de pesca, no alto-mar. Aparentemente, foi apenas com a adoção da Decisão n.o 3/2015 que este pressuposto foi introduzido na legislação nacional.

( 20 ) A noção de neutralidade fiscal é utilizada de duas formas diferentes em matéria de IVA. Por um lado, este princípio é utilizado para caracterizar o objetivo prosseguido pelo mecanismo de dedução previsto na Sexta Diretiva, ou seja, libertar inteiramente o empresário da carga fiscal que representa o IVA devido ou pago em relação a todas as suas atividades económicas sujeitas a IVA. Por outro lado, esta noção é utilizada num sentido semelhante ao do princípio da igualdade de tratamento. V., a este respeito, Acórdão de 15 de novembro de 2012, Zimmermann (C-174/11, EU:C:2012:716, n.o 48).

( 21 ) V., neste sentido, Acórdão de 25 de julho de 2018, Gmina Ryjewo (C-140/17, EU:C:2018:595, n.o 34). Como as plataformas são bens de investimento, qualquer alteração na sua utilização deve ser feita sem prejuízo do disposto no artigo 187.o Diretiva IVA.

( 22 ) V., neste sentido, Acórdão de 8 de maio de 2003, Comissão/França (C-384/01, EU:C:2003:264, n.o 25). Na medida em que o legislador da União dispõe de um amplo poder de apreciação para adotar medidas fiscais, pode tratar de forma diferente bens ou serviços que se encontrem em concorrência logo que apresentem uma característica que os distinga à luz do objeto e da finalidade das disposições em causa e do objetivo por eles prosseguido.

( 23 ) Acórdão de 29 de outubro de 2009, NCC Construction Danmark (C-174/08, EU:C:2009:669, n.os 41 a 43).

( 24 ) Segundo alguns acórdãos, o princípio da neutralidade é a «tradução» do princípio da igualdade de tratamento em matéria IVA (Acórdãos de 19 de dezembro de 2012, Grattan, C-310/11, EU:C:2012:822, n.o 28, e de 28 de novembro de 2013, MDDP, C-319/12, EU:C:2013:778, n.o 38), enquanto outros o consideram como uma expressão específica do princípio da igualdade de tratamento (Acórdãos de 19 de dezembro de 2012, Orfey Balgaria, C-549/11, EU:C:2012:832, n.o 33, e de 7 de março de 2013, Efir, C-19/12, não publicado, EU:C:2013:148, n.o 28) que não coincide, ou seja não se confunde, com este último (Acórdão de 25 de abril de 2013, Comissão/Suécia, C-480/10, EU:C:2013:263, n.os 17 e 18). No seu recente Acórdão de 7 de março de 2017, RPO (C-390/15, EU:C:2017:174, n.o 38) a Grande Secção adotou uma abordagem mais rigorosa, que consiste em considerar que, na sua segundo aceitação, a noção de neutralidade fiscal é equiparada ao princípio da igualdade de tratamento, mas que, na adoção de uma medida fiscal, deve ser dado um amplo poder discricionário ao legislador da União.

( 25 ) V., Acórdãos de 12 de novembro de 2014, Guardian Industries e Guardian Europe/Comissão (C-580/12 P, EU:C:2014:2363, n.o 51), e de 4 de maio de 2016, Pillbox 38 (C-477/14, EU:C:2016:324, n.o 35).

( 26 ) V., neste sentido, Acórdão de 16 de dezembro de 2008, Arcelor Atlantique et Lorraine e o. (C-127/07, EU:C:2008:728, n.o 26 e jurisprudência referida).

( 27 ) Aqui, a alegada violação do princípio da igualdade de tratamento é a consequência da existência de duas disposições distintas da Diretiva IVA. Dado que estas duas disposições prosseguem objetivos distintos e que a questão de saber se as duas situações são comparáveis deve ser determinada à luz dos objetivos por elas perseguidos, em princípio, não pode ser invocada qualquer violação do princípio da igualdade de tratamento.